Aventura
repleta de surpresas
Pedro J. Bondaczuk
A vida é tão variada e
surpreendente, que nenhuma situação (boa ou má) que enfrentamos hoje é
definitiva. Salvo, claro, a morte. Morrer, todavia, é a antítese do viver.
Portanto, não conta neste caso. Afligimo-nos ou nos entusiasmamos
prematuramente, achando, em ambos casos, que os motivos das aflições ou dos
entusiasmos são irreversíveis. Podem até ser, mas como saber? Não há como!
Quando menos esperamos, tudo se modifica, se altera, se embaralha e anula todas
as possíveis previsões, e respectivos planos, que tenhamos feito. É esse
caráter mutante que mais me fascina e ao mesmo tempo mais me aterroriza nessa
magnífica e instável aventura.
A experiência dos muitos anos
(para os padrões humanos atuais) que já vivi me indica que os maus momentos não
devem nos desanimar e nem levar a entregar os pontos. Quando menos esperarmos,
o que nos afligia será superado e não passará de dolorosa lembrança da qual, se
formos prudentes, extrairemos as devidas lições. Todavia, não devemos nos
acomodar e nem nos encher de grande entusiasmo diante de situações favoráveis.
Elas também tendem a passar, mais cedo ou mais tarde, e devemos, por
conseguinte, estar minimamente prevenidos para isso. Raramente estamos.
O prudente seria continuar nos
empenhando para consolidar nossas conquistas, já que nada nos garante que elas
não irão passar. Quase nunca agimos assim. Nossa tendência é a da acomodação,
satisfeitos com o mínimo, mesmo quando o máximo nos seja, mesmo que
teoricamente, viável, ou pelo menos possível. Estamos constantemente mudando:
de idéias, conceitos, valores, amizades
e inimizades, mesmo que não venhamos a perceber tais mudanças. Aliás, são
poucas as coisas a que atentamos ao longo de nossas vidas. Erich Fromm nos lembra: “Viver é nascer a
cada instante”. E nascemos de fato. Nosso próprio corpo se renova por inteiro,
de um dia para o outro. Todas nossas células – não importa de que tecidos e
órgãos – se renovam. As de ontem, morrem e são sucedidas por suas “filhas”,
nesse processo contínuo de mudanças que só termina com nossa morte.
Temos componente animal que está
acima da nossa vontade. Alguns conseguem dissimulá-lo, escondê-lo, mantê-lo sob
vigilância. Mas ele sempre estará lá, no fundo da consciência, ou, mais
propriamente, da inconsciência. Em determinado momento, essa bomba-relógio,
esse nosso componente animal (e não raro nos esquecemos que o somos, mesmo que
racionais) pode explodir, à nossa revelia e ou causar estragos irreparáveis, se
for uma compulsão para a violência e ódio, ou determinar magníficas criações,
obras-primas de causar espanto e inveja, caso seja positiva. Esse processo,
admitamos ou não, está fora do nosso controle. É comum ouvir-se por aí, ou se
ler em livros, artigos e crônicas, que as paixões cegam as pessoas e as impedem
de conquistar o que mais desejam, por falta de clarividência.
Trata-se de mera generalização e,
por isso, de “meia verdade”. Depende de a qual tipo de paixão esses
pseudo-especialistas se referem. As negativas, como ódio, cobiça e inveja, de
fato têm a característica de ofuscar a visão dos que são possuídos por elas. Já
no caso do amor (por uma pessoa, ideal ou causa) ocorre o contrário. A
complicação está, todavia, no fato de nunca sabermos qual (ou quais) irão
prevalecer e se impor. Essas paixões são instintivas e, portanto, “explodem” à
nossa revelia. O tal do livre-arbítrio é relativo. Pode-se fazer, até, um jogo
de palavras com esse conceito e ainda assim não fugir (pelo menos não muito),
da realidade, classificando-o de “arbitrário”.
O fato é que a vida se transforma
a cada instante, sem que tenhamos o menor controle sobre essa transformação.
Milhões de pessoas nascem todos os dias, e outros tantos milhões morrem. Mas
não é – pelo menos na atualidade – processo de mera substituição, de mera
renovação do antigo pelo novo. A população mundial, no saldo entre nascimentos
e mortes, aumenta sem cessar. Onde isso vai parar, levando em conta que vivemos
em um Planeta de dimensões fixas, que não “estica”, como se fosse de borracha?
Como saber?
De acordo com Programa de População
da ONU, nascem, atualmente, em média, três bebês por segundo no Planeta.
Descontando os indivíduos que morrem – por doenças, assassinatos, acidentes,
guerras, fome ou velhice – a espaçonave Terra ganha, diariamente, cerca de 250
mil passageiros a mais. E isso ocorre, notadamente, em maior quantidade, em
países paupérrimos, inviáveis, do ponto de vista econômico, de tão pobres que
são. Não precisa ser nenhum gênio para
concluir que um dia o limite de pessoas será atingido, se é que já não foi.
Afinal, reitero, o Planeta não é elástico, não estica, não amplia
automaticamente seu território.
O trágico é que 90% desse
crescimento populacional ocorre onde a prudência manda que se limite a
natalidade. Ou seja, nas regiões mais pobres do mundo, o que só multiplica a
miséria, a fome, as doenças, os conflitos sociais e a violência. Como controlar
esse processo? Ele é controlável? Se a resposta fosse positiva (mas não é) a
quem caberia a tarefa de controle? Quem pode, quem tem o direito de decidir
sobre quem deva viver e quem não? Baseado no que, se todos, absolutamente todos
os 7,2 bilhões de seres humanos são rigorosamente iguais, por se tratarem de
indivíduos mortais? Esse é um dos tantos enigmas que me preocupam e apavoram.
Quem pode garantir que uma
criança nascida nos grotões mais miseráveis da África ou da Ásia não possa, um
dia, por uma dessas circunstâncias do acaso, se transformar em um benfeitor,
quem sabe até salvador da humanidade? O mesmo raciocínio vale para o mal. Como
assegurar que um bebê, nascido em “berço de ouro”, com todas as facilidades e
regalias que sua condição econômico-social lhe oferece, não venha a se
transformar, quando adulto, em um monstro humano, num Átila, num Nero ou num
Hitler, responsável por milhões de mortes e por desgraças inconcebíveis de toda
a sorte? Cada criança que nasce pode ser uma coisa ou outra. Como saber o que
será? Não há como! É esta inconstância da vida – aventura única que tanto adoro
a despeito de seus riscos e possibilidades ruins – que me apavora. Esta e outras
tantas...
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