Wednesday, December 28, 2011







Sucessora de Agatha Christie

Pedro J. Bondaczuk

A norte-americana Faye Kellerman, nos seus tempos de estudante, sequer supunha, mesmo em seus mais delirantes sonhos, que viria a se tornar, algum dia, uma das mais requisitadas e bem sucedidas escritoras de histórias policiais, tida e havida, por muitos, como sucessora da inglesa Agatha Christie. Claro que para isso terá que percorrer, ainda, um longo caminho. Mas pelo que já fez, está no rumo certo.
Por exemplo, terá que escrever muito para chegar aos 80 livros que a chamada “duquesa do crime” produziu. Quando Agatha morreu, em 12 de janeiro de 1976, Faye tinha apenas catorze anos e, a julgar por suas próprias palavras, não lhe passava, nem remotamente, pela cabeça em se tornar escritora. E muito menos de histórias de crimes e respectivas investigações e soluções.
Em 1974, a norte-americana formou-se em matemática pela Universidade da Califórnia Los Angeles (UCLA). Com o diploma nas mãos, todavia, concluiu que aquela não era sua praia, que não era o que queria. Quatro anos após, regressou aos bancos escolares, desta vez para cursar odontologia.
Formou-se como cirurgiã dentista e estava entusiasmada com as perspectivas de uma brilhante carreira. Excelente profissão, sobretudo rentável. Embora gostasse dela, porém, Faye jamais a exerceu. Por que? Por várias razões. Por exemplo, casou-se – com o renomado escritor e psiquiatra Jonathan Kellerman – e contentou-se, pelo menos por um bom tempo, com o prosaico papel de dona de casa. Questão de opção.
Observando o marido, todavia, ao qual auxiliava, revisando e ordenando seus textos, subitamente fez-se luz em sua cabeça. Descobriu que tinha talento para escrever. E que talento! Essa descoberta findou, como seria de se esperar, por mudar toda a sua vida.
Nascida em Saint Louis, Estado do Missouri, em 1952, Faye reside, atualmente, com o marido e filhos, na Califórnia. E escreve, escreve e escreve constante e compulsivamente. Produz histórias e mais histórias policiais. E seus livros esgotam edições após edições. Há quem ache (e eu sou um deles), que ela é melhor escritora do que o marido. Claro que se trata de opinião apenas subjetiva, baseada em gosto pessoal.
Em um ensaio, publicado em 1997, Faye explicou que sua metamorfose de promissora cirurgiã dentista para prolífica e consagrada romancista se deu espontaneamente, sem forçar a barra, como diríamos coloquialmente, e por vários fatores. Entre estes destacou “um desejo de justiça, uma natureza desconfiada, uma imaginação fértil e uma propensão para o bizarro”. Será que apenas isso basta para uma pessoa se tornar escritora de histórias policiais? Acho que não. Talvez por modéstia, Faye tenha omitido o principal motivo dessa mudança de rumo, tão radical, em sua vida: um talento imenso, e inato, para a narrativa.
Acabo de reler um dos seus primeiros romances, “O preço do desejo” – lançado no Brasil em 1997 pela Editora Mandarim – que havia lido em 1998 e permaneço, como na ocasião da primeira leitura, sem fôlego diante do ritmo frenético e fluente com que a história que urdiu, sumamente original e ainda hoje muito atual, foi narrada. É dinâmica como um filme de ação que se desenrole em nossa imaginação.
Os personagens, as cenas e os “acontecimentos” são tão bem “desenhados”, que ao longo da leitura “vemos” a trama se desenvolver diante dos olhos, do início até o surpreendente clímax, como compete aos grandes escritores de enredos do tipo. Não por acaso, Faye Kellerman é, hoje, também roteirista de cinema. O pessoal de Hollywood tem faro aguçado para essas coisas. E como tem!! Fareja talentos à distância.
“O preço do desejo” – assim como outros sete de seus romances – tem como protagonistas o casal Peter Decker, chefe policial em Los Angeles, e sua esposa Rina Lazarus. Entre suas obras, há uma escrita a “quatro mãos”. Juntou seu talento ao do marido Jonathan Kellerman para produzir o livro “Duplo homicídio”, lançado também no Brasil, com relativo sucesso. Ambos mostraram raro entrosamento literário, pois o romance mantém uma unidade irrepreensível, como se houvesse sido escrito por uma única pessoa.
Fica, aqui, uma sugestão de programa para um final de semana em que você não queira, ou não possa sair de casa. Para um sábado e domingo, por exemplo, daqueles frios e chuvosos, propícios para atividades intelectuais, que não exijam o menor esforço físico, programem a leitura dos livros de Faye Kellerman. E não somente “O preço do desejo”, ou “Duplo homicídio”, mas outros lançados no Brasil, como “A lua do deserto”, “Mercedes Coffin” e mais um punhado deles, cujos títulos fogem-me à memória neste instante.
Se você prefere uma obra, digamos, “mais séria” e sóbria, baseada em fatos reais, posto que escrita de forma ficcional, e se o seu inglês der, pelo menos, para o gasto, poderá ler o livro “The quality of mercy”, de Faye Kellerman.
É certo, admito, que cometo certo exagero ao compará-la a Agatha Christie. Por enquanto, a dama inglesa leva uma vantagem quilométrica, pelo menos em quantidade de obras escritas. Todavia, em qualidade, a distância entre ambas não é tão extensa que não possa vir ser igualada e, quem sabe, superada. De qualquer forma, Faye Kellerman é excelente escritora de histórias policiais. Se houver dúvida a respeito, basta conferir.

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