Saturday, July 30, 2011







Sonhos que não envelhecem

Pedro J. Bondaczuk

Os sonhos não envelhecem”. Essa afirmação é excelente para título de um livro, porém, nem sempre é verdadeira. Não, pelo menos, por completo. Alguns envelhecem, sim. E, pior, não raro até morrem. Mas não é desse lado negativo que vou tratar. Aliás, sequer voltarei ao tema “sonhos”, que já abordei em inúmeras ocasiões. O mote, hoje, é outro, e até mais prático.
“Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina” é o título de um livro, escrito por Márcio Borges, irmão do cantor e compositor Lô Borges, publicado em 1996 e que está sendo relançado agora, 15 anos depois, com uma tiragem relativamente baixa, de 5 mil exemplares. Estou certo que irá se esgotar em meses, se não em semanas, embora eu saiba, de experiência própria, o quanto o mercado editorial é frustrante e traiçoeiro. As vendas, convenhamos, sequer dependem da qualidade do livro e do interesse do tema. Este lançamento específico, porém, está fadado ao sucesso.
Afinal, em 1996 vendeu 30 mil exemplares. Se está sendo relançado, é porque se detectou um potencial muito grande de pelo menos repetir o que ocorreu há 15 anos. Não há porque não vender, agora, no mínimo a mesma quantidade. Ou esgotar a tiragem de 5 mil e forçar a Editora Geração a rodar mais, e mais e mais volumes.
Esta é a 6ª edição da obra (acompanhada de CD com 10 canções geradas no Clube da Esquina) e, provavelmente, virão na sequência a 7ª, 8ª, 9ª e sabe-se lá mais quantas. Por que tamanha certeza? Por haver muitos e muitos e muitos interessados nos vários aspectos da rica história da Música Popular Brasileira, uma das melhores e mais requisitadas do mundo.
Mas é preciso pôr ordem nestas considerações. Antes de tudo, é indispensável que se informe, aos que não conhecem, o que vem a ser o tal do “Clube da Esquina”. Há quem ache que o “boom” da MPB, de fins dos anos 50 ao início dos 80, se deu, notadamente, no eixo Rio-São Paulo. Em termos de divulgação e consumo, sim. Foi o que de fato aconteceu. Todavia, em termos de produção, não.
Fora desse círculo restrito havia muito jovem talentoso, produzindo obras marcantes, que um dia, finalmente, ganharam seu espaço no mercado fonográfico e estouraram em âmbito nacional. Uma dessas cidades que congregavam compositores, músicos, cantores etc. de muita competência e criatividade, e fora do eixo Rio-São Paulo, era Belo Horizonte.
Para não errar fatos e datas, recorro à enciclopédia eletrônica Wikipédia, que informa que o “Clube da Esquina foi um movimento musical nascido na década de 60 em Minas Gerais”. Até aí, tudo bem. Eu já havia mencionado antes essa vertente mineira, centralizada em Belo Horizonte.
O que se deseja saber é o quê era e como surgiu esse tal clube, que tem tamanha importância a ponto de ganhar um livro contando suas histórias. Reproduzo a referência do Wikipédia a propósito: “O Clube da Esquina surgiu da grande amizade entre Milton Nascimento e os irmãos Borges (Marilton, Márcio e Lô)”. Bem, as coisas começam a ficar mais claras. Pelo menos, já sabemos quais foram os principais personagens do grupo.
Mas... eram somente os quatro? Claro que não! Podemos citar, entre os que se tornaram, com o tempo, célebres e se consagraram na MPB (houve quem não se destacasse e cujos nomes não despertassem tanto interesse), Tavinho Moura, Wagner Tiso, Beto Guedes, Flávio Venturini, Toninho Horta, Fernando Brant e Ronaldo Bastos, entre tantos outros. E, logicamente, os artistas que constituíram o núcleo do Clube da Esquina, ou seja, Milton Nascimento e os irmãos Borges.
E por que essa denominação do movimento? A Wikipédia explica, de forma bastante objetiva: “O nome do grupo foi idéia de Márcio (o autor do livro), que ao ouvir a mãe perguntar dos filhos, ouvia a mesma resposta: ‘Estão lá na esquina cantando e tocando violão”.
Num país, acusado amiúde de falta de memória (e em muitos casos ela falta mesmo), os registros deste movimento desmentem o tal chavão, nem sempre verdadeiro e que, por generalizar, é acima de tudo burro. Afinal, é difícil não se concordar com Nelson Rodrigues quando afirmou que “toda generalização é burra”. O Clube da Esquina foi imortalizado não somente no livro de Márcio Borges, como, até mesmo, ganhou um museu e conta com um site bastante acessado na internet. Oxalá outros movimentos culturais, inclusive literários fossem, ou principalmente sejam, tratados com o mesmo respeito e idêntico capricho.
É até desnecessário ressaltar a importância dessa vertente musical mineira, numa época em que só se falava de Bossa Nova, de Tropicalismo, de Jovem Guarda e de outras tantas, menos famosas, posto que mais divulgadas. Seria fácil, facílimo aos excelentes músicos de Minas Gerais simplesmente aderir a essas ondas, sem tentar inovar ainda mais. Tudo conspirava contra eles e levava a crer que fracassariam, por falta de divulgação e até de espaço no mercado fonográfico. Quem pensou isso, porém, errou de forma contundente. Ainda bem!
Nesse aspecto, o título do livro de Márcio Borges cai como uma luva. “Os sonhos não envelhecem...” Não pelo menos este, que acabou brilhantemente concretizado. Hoje, os integrantes do Clube da Esquina são justamente reconhecidos como magníficos músicos, compositores, cantores etc. e estão definitivamente incorporados à história da MPB.
Há uma outra particularidade interessante (entre tantas) a propósito do grupo. Uma das suas freqüentadoras mais assíduas era, na oportunidade, uma jovem estudante, de apenas 17 anos. O tempo passou, a mocinha inteligente e idealista aderiu à luta contra a ditadura, foi presa, torturada, mas sobreviveu. Completou os estudos, entrou na vida pública e... pasmem, chegou à Presidência da República, tornando-se a primeira mulher na nossa história a conseguir essa façanha. Vocês já adivinharam de quem estou falando. É, sim, de Dilma Roussef, que até hoje é amiga dos músicos do Clube da Esquina. Se quiserem saber, todavia, mais sobre esse movimento musical só resta uma alternativa: comprem o livro. E ganharão, de lambuja, preciosíssimo CD. Não vale a pena? Claro que sim!

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

1 comment:

Mara Narciso said...

Pedro, nós de Montes Claros acompanhamos a história do Clube da Esquina pelo motivo de Beto Guedes ser montes-clarense. Para nós ele é um ícone das artes junto com Darcy Ribeiro. Fez bem em falar no retorno desse livro. Deu-me vontade de comprá-lo.