Ética e política
Pedro J. Bondaczuk
A palavra ética, nestes tempos em que o brasileiro mostra estar cansado de tantas mazelas, de tanta irresponsabilidade e de tanta ausência de senso de coletividade por parte de alguns homens públicos, tem circulado muito na boca das pessoas supostamente esclarecidas e nos textos dos que se arrogam em ser formadores de opinião pública. Muitos deles (temo que a imensa maioria), no entanto, usam essa palavra de forma imprópria, inadequada, distorcida, demonstrando que ou não têm noção exata (alguns, sequer aproximada) do conceito, ou que pretendem induzir, deliberadamente (no que não acredito), seus interlocutores ao erro. Vários confundem-na com moral. Outros, tantos, interpretam-na na esfera do Direito. Outros, ainda, partem para uma conceituação comportamental, própria do campo da sociologia.
A ética, no entanto, é o exercício pleno do livre-arbítrio do homem. Ao contrário da moral, nada impõe, mesmo que de forma sutil. Nem sanciona, como acontece no Direito. Explico melhor, para o que recorro a um artigo que o escritor Guilherme Figueiredo publicou, no jornal O Globo, em 16 de julho de 1993, intitulado "Por falar em ética...", em que afirma, em determinado trecho: "A ética é a observação de todo o caldo de cultura da tribo humana. Pode variar em latitudes, em temperaturas, em paisagens, em tudo: as éticas estão lá, registrando a uns que não se deve andar com o sexo à mostra, a outros que a sociedade condena o furto, a outros que é proibido comer carne humana".
Estes registros, porém, estão (ou deveriam estar) na consciência de cada um. Não há imposição externa, quando se fala em ética. Ao contrário da esfera moral, na qual andar com o sexo à mostra é condenado, pela Igreja, pela Família ou por qualquer outra instituição social. Quem transgride essa norma – que sequer precisa ser escrita – acaba sendo segregado pelos seus pares. O mesmo ocorre em relação aos que se apropriam de bens alheios e aos que comem carne humana. Já no campo do Direito, esses mesmos casos constituem-se em delitos e são punidos com sanções, em geral representadas pela privação da liberdade.
O sujeito que andar com o sexo à mostra, por exemplo, será preso por atentado ao pudor. Os que furtam, vão para a cadeia, caso haja provas do furto e após competente julgamento. O canibalismo, igualmente, constitui-se em crime, e hediondo. Nestes três casos hipotéticos, citados como exemplo, Direito e Moral se entrelaçam. Todavia, nem tudo o que é imoral é ilegal e vice-versa. Portanto, para alterar o procedimento ético dos políticos (ou de qualquer outra pessoa), como é freqüentemente apregoado, seria necessário que, “em seu íntimo”, eles próprios tivessem plena consciência da inadequação de seu comportamento e estivessem dispostos a agir de forma diversa da que alguns agem. Mas sempre por vontade própria, sem pressões e nem imposições (o que não parece muito provável ou lógico de ocorrer).
Claro que não se pode generalizar. Há os que agem eticamente e procuram dar bons exemplos, infelizmente quase nunca seguidos ou sequer identificados pela imprensa. É difícil de acreditar que a mentalidade de receber dinheiro indevido e achar que isto é correto será modificada, pelo menos em curto prazo. Ou que não tenhamos nunca mais sonegadores de impostos no País. Ou que jamais haverá escamoteação de aviões e de merendas escolares, ou uso de caixa 2 em campanhas políticas, ou perfuração de poços para beber a água alheia etc. Para que esse milagre acontecesse, seria necessária uma súbita conscientização da maioria, o que me parece, apenas, utopia.
A ética, portanto, é um comportamento pessoal, intransferível, de cada indivíduo. Se um deles (ou vários, sei lá) age de forma contrária a ela, não se pode e nem se deve generalizar e afirmar que o partido a que está vinculado ou a organização (seja qual for sua natureza) a que pertença ajam, também, de forma aética (ou anti-ética). E os que se apregoam seus guardiões, por paradoxal e irônico que pareça, são, via de regra, exatamente os que mais a violam e a agridem, conforme a experiência demonstra.
Se um jornalista, por exemplo, receber propina para escrever e publicar uma determinada reportagem, ou artigo, ou editorial com informações propositalmente distorcidas, mentirosas ou eivadas de meias-verdades (que são piores do que mentiras explícitas, dada sua verossimilhança), não será o jornalismo, enquanto profissão, que cometerá esse delito, mas o profissional (e, por extensão, o jornal em que trabalha). O mesmo raciocínio vale, claro, para políticos e seus partidos.
Se determinados membros do PT, ou do PSDB, ou do PTB, ou do PFL, ou seja de que sigla for, cometeram crimes, que estes lhes sejam imputados – após a competente comprovação e o legítimo direito de defesa – e que, depois de julgados e condenados, paguem pelos erros que cometeram. Mas que a punição seja individual, a quem errou e que a pecha não seja estendida aos demais integrantes da respectiva agremiação, que têm que ser encarados como inocentes, até que se prove o contrário. É o princípio mais comezinho e elementar do Direito! Estendê-la aos que não infringiram nem a ética, nem a moral e muito menos a lei, apenas por presunção, não somente é injusto, mas, sobretudo, é imensa burrice! Afinal, já dizia, com toda a sua verve, o saudoso jornalista Nelson Rodrigues: “Toda generalização é burra”. E, de fato, é. E, agir deliberadamente dessa forma é gritante falta de ética.
Não há, pois, partido mais ético ou menos ético do que outro – bobagem dita, escrita ou insinuada amiúde na imprensa. Há, sim, indivíduos ligados a ele que agem ou deixam de agir com a correção que se espera deles. Parem, portanto, pseudo-formadores de opinião, com essa estultice de colar rótulos negativos ou positivos nas agremiações políticas que repudiam ou que sejam de sua preferência (que sequer têm a hombridade de esclarecer o leitor quais sejam). Informem-se antes de escrever, seja lá o que for, e escrevam com honestidade e isenção, conscientes do que escrevem. Só assim irão contribuir para educar a próxima geração de homens públicos (a que aí está, salvo exceções, parece perdida) para que promovam a revolução ética de que tanto precisamos. Mas isso só será possível com verdade e, sobretudo, com pleno conhecimento de causa.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
A palavra ética, nestes tempos em que o brasileiro mostra estar cansado de tantas mazelas, de tanta irresponsabilidade e de tanta ausência de senso de coletividade por parte de alguns homens públicos, tem circulado muito na boca das pessoas supostamente esclarecidas e nos textos dos que se arrogam em ser formadores de opinião pública. Muitos deles (temo que a imensa maioria), no entanto, usam essa palavra de forma imprópria, inadequada, distorcida, demonstrando que ou não têm noção exata (alguns, sequer aproximada) do conceito, ou que pretendem induzir, deliberadamente (no que não acredito), seus interlocutores ao erro. Vários confundem-na com moral. Outros, tantos, interpretam-na na esfera do Direito. Outros, ainda, partem para uma conceituação comportamental, própria do campo da sociologia.
A ética, no entanto, é o exercício pleno do livre-arbítrio do homem. Ao contrário da moral, nada impõe, mesmo que de forma sutil. Nem sanciona, como acontece no Direito. Explico melhor, para o que recorro a um artigo que o escritor Guilherme Figueiredo publicou, no jornal O Globo, em 16 de julho de 1993, intitulado "Por falar em ética...", em que afirma, em determinado trecho: "A ética é a observação de todo o caldo de cultura da tribo humana. Pode variar em latitudes, em temperaturas, em paisagens, em tudo: as éticas estão lá, registrando a uns que não se deve andar com o sexo à mostra, a outros que a sociedade condena o furto, a outros que é proibido comer carne humana".
Estes registros, porém, estão (ou deveriam estar) na consciência de cada um. Não há imposição externa, quando se fala em ética. Ao contrário da esfera moral, na qual andar com o sexo à mostra é condenado, pela Igreja, pela Família ou por qualquer outra instituição social. Quem transgride essa norma – que sequer precisa ser escrita – acaba sendo segregado pelos seus pares. O mesmo ocorre em relação aos que se apropriam de bens alheios e aos que comem carne humana. Já no campo do Direito, esses mesmos casos constituem-se em delitos e são punidos com sanções, em geral representadas pela privação da liberdade.
O sujeito que andar com o sexo à mostra, por exemplo, será preso por atentado ao pudor. Os que furtam, vão para a cadeia, caso haja provas do furto e após competente julgamento. O canibalismo, igualmente, constitui-se em crime, e hediondo. Nestes três casos hipotéticos, citados como exemplo, Direito e Moral se entrelaçam. Todavia, nem tudo o que é imoral é ilegal e vice-versa. Portanto, para alterar o procedimento ético dos políticos (ou de qualquer outra pessoa), como é freqüentemente apregoado, seria necessário que, “em seu íntimo”, eles próprios tivessem plena consciência da inadequação de seu comportamento e estivessem dispostos a agir de forma diversa da que alguns agem. Mas sempre por vontade própria, sem pressões e nem imposições (o que não parece muito provável ou lógico de ocorrer).
Claro que não se pode generalizar. Há os que agem eticamente e procuram dar bons exemplos, infelizmente quase nunca seguidos ou sequer identificados pela imprensa. É difícil de acreditar que a mentalidade de receber dinheiro indevido e achar que isto é correto será modificada, pelo menos em curto prazo. Ou que não tenhamos nunca mais sonegadores de impostos no País. Ou que jamais haverá escamoteação de aviões e de merendas escolares, ou uso de caixa 2 em campanhas políticas, ou perfuração de poços para beber a água alheia etc. Para que esse milagre acontecesse, seria necessária uma súbita conscientização da maioria, o que me parece, apenas, utopia.
A ética, portanto, é um comportamento pessoal, intransferível, de cada indivíduo. Se um deles (ou vários, sei lá) age de forma contrária a ela, não se pode e nem se deve generalizar e afirmar que o partido a que está vinculado ou a organização (seja qual for sua natureza) a que pertença ajam, também, de forma aética (ou anti-ética). E os que se apregoam seus guardiões, por paradoxal e irônico que pareça, são, via de regra, exatamente os que mais a violam e a agridem, conforme a experiência demonstra.
Se um jornalista, por exemplo, receber propina para escrever e publicar uma determinada reportagem, ou artigo, ou editorial com informações propositalmente distorcidas, mentirosas ou eivadas de meias-verdades (que são piores do que mentiras explícitas, dada sua verossimilhança), não será o jornalismo, enquanto profissão, que cometerá esse delito, mas o profissional (e, por extensão, o jornal em que trabalha). O mesmo raciocínio vale, claro, para políticos e seus partidos.
Se determinados membros do PT, ou do PSDB, ou do PTB, ou do PFL, ou seja de que sigla for, cometeram crimes, que estes lhes sejam imputados – após a competente comprovação e o legítimo direito de defesa – e que, depois de julgados e condenados, paguem pelos erros que cometeram. Mas que a punição seja individual, a quem errou e que a pecha não seja estendida aos demais integrantes da respectiva agremiação, que têm que ser encarados como inocentes, até que se prove o contrário. É o princípio mais comezinho e elementar do Direito! Estendê-la aos que não infringiram nem a ética, nem a moral e muito menos a lei, apenas por presunção, não somente é injusto, mas, sobretudo, é imensa burrice! Afinal, já dizia, com toda a sua verve, o saudoso jornalista Nelson Rodrigues: “Toda generalização é burra”. E, de fato, é. E, agir deliberadamente dessa forma é gritante falta de ética.
Não há, pois, partido mais ético ou menos ético do que outro – bobagem dita, escrita ou insinuada amiúde na imprensa. Há, sim, indivíduos ligados a ele que agem ou deixam de agir com a correção que se espera deles. Parem, portanto, pseudo-formadores de opinião, com essa estultice de colar rótulos negativos ou positivos nas agremiações políticas que repudiam ou que sejam de sua preferência (que sequer têm a hombridade de esclarecer o leitor quais sejam). Informem-se antes de escrever, seja lá o que for, e escrevam com honestidade e isenção, conscientes do que escrevem. Só assim irão contribuir para educar a próxima geração de homens públicos (a que aí está, salvo exceções, parece perdida) para que promovam a revolução ética de que tanto precisamos. Mas isso só será possível com verdade e, sobretudo, com pleno conhecimento de causa.
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