Pedro J. Bondaczuk
O otimismo – e mais do que isso, a euforia – foi o clima dominante, entre médicos e pesquisadores de diversos países, na XI Conferência Internacional sobre Aids, realizada, em julho de 1997, em Vancouver, no Canadá. Os delegados – salvo algumas exceções, entre as quais os brasileiros – deixaram a prudência de lado e não esconderam a satisfação pelos avanços científicos apresentados no encontro para controlar a doença.
Experiências realizadas com associação de drogas comprovaram ser possível deter, quase que por completo, a multiplicação do vírus no interior das células. Embora isto não signifique a cura, seria uma forma de controle capaz de dar uma sobrevida indefinida aos pacientes. A Aids poderia se tornar moléstia crônica, como outra qualquer, tipo diabetes, bronquite etc. Certo? Errado!
Há vários aspectos a ponderar, que mostram que a euforia, embora explicável, é prematura e pode ser até irresponsável. Primeiro: os mais desavisados ou desinformados (a grande maioria), ou as duas coisas, vão achar que não existe mais perigo de contração da doença e vão deixar de lado as medidas preventivas para evitar a contaminação pelo HIV. Se isso ocorrer, será uma tragédia.
O número de infectados no mundo, na ocasião, em torno de 25 milhões, saltará facilmente para 50 milhões, 100 milhões ou mais. Segundo: o preço dos medicamentos é inacessível para os bolsos da grande maioria dos doentes, mesmo que contem com subsídios do governo (o que não é confiável). E as pessoas que têm a doença continuarão morrendo, embora existam os meios para evitar a morte.
Terceiro: as pesquisas com associação de drogas ainda estão no início. O HIV tem se revelado perverso por sua "astúcia". Tanto que vários medicamentos de primeira geração, que eram eficazes há dois ou três anos, hoje já não o são. O vírus é mutante. Não é nada difícil, portanto, que sofra novas mutações e anule os efeitos positivos da tão decantada associação de drogas.
Claro que se deve dar o devido valor ao incrível avanço conseguido pelos pesquisadores. O que se espera é que os resultados sirvam de estímulo para novas pesquisas, para investimentos de grande monta nesses estudos – o que sempre faltou, em se levando em conta as proporções da atual pandemia – e que a produção possa ser feita em grande escala, para baratear os custos a ponto deles se tornarem equivalentes aos de uma aspirina, por exemplo, ou de qualquer anti-ácido.
A euforia somente será justificável (e aí sim sem nenhum perigo) quando for descoberta uma vacina cem por cento eficaz, aplicada gratuitamente pelos serviços de imunização do Estado, e que não apresente qualquer efeito colateral. Até lá...
(Artigo publicado na página 3, Opinião, do Correio Popular, em 12 de julho de 1997)
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