Pedro J. Bondaczuk
A editora Cultrix lançou, no Brasil, há um certo tempo, um importsnte livro do mestre espiritual Jiddu Krishnamurti, um dos pensadores mais iluminados e lúcidos do século passado, intitulado "Sobre a Liberdade". A trajetória desse espiritualista, pouco conhecido fora dos círculos místicos, mas com considerável e valiosíssima obra educativa, é das mais relevantes e espetaculares.
Nascido em 1895, na localidade de Adyar, norte da Índia, em uma família da alta casta Brahmin, desde criança destacou-se pelos exemplos de generosidade, disciplina, altruísmo e amor ao próximo. Por volta de 1889, Helena Blavatsky, fundadora da Sociedade Teosófica, revelou aos seus discípulos que o propósito da Teosofia era o de preparar a humanidade para a vinda de Maitreya, o mestre mundial, que iria conduzir os homens à luminosa era de Aquário.
Após sua morte, Annie Besant e C. W. Leadbeater deram seqüência à sua obra e saíram em busca de um guru, de um ser iluminado, responsável por essa tarefa de preparação. Encontraram-no, em 1909, na pequena localidade de Adyar, norte da Índia. Era Jiddu Krishnamurti, então adolescente de 13 anos, cuja aura deixava entrever "um espírito completamente livre e dotado de absoluto autodomínio".
Besant e Leadbeater "adotaram" o garoto. Levaram-no para a Grã-Bretanha, onde foi educado nas melhores escolas. Durante dez anos, ele recebeu intensivo treinamento espiritual. Além, é claro, de esmerada formação acadêmica. Com 27 anos, em 1922, Krishnamurti teve uma visão, que o convenceu que era, de fato, o escolhido para ser o precursor de Maitreya.
Essa experiência mística ocorreu na cidade de Ojai, onde viria a falecer em 1986, aos 90 anos de idade, mas em plena atividade, fazendo palestras, conferências e escrevendo livros e mais livros. Começava a sua peregrinação pelos quatro cantos do mundo, em busca de novos discípulos. Krishnamurti foi, sobretudo, lúcido educador.
Em uma de suas inúmeras obras, estabeleceu o ponto que, provavelmente, é a chave, o resumo, a síntese dos seus ensinamentos: "As escolas existem principalmente para conseguir uma transformação profunda nos seres humanos, e a responsabilidade do educador é tremenda. Há muita diferença entre aprender e acumular conhecimentos. Aprender eleva a inteligência, acumular conhecimento apenas embota a mente e não pode solucionar nossos problemas espirituais".
Décadas antes do advento da informática e da era da comunicação total, o mestre propunha, portanto, nova visão educacional. Distinguia essa tarefa educativa do mero adestramento do indivíduo para servir de "instrumental", de mão-de-obra especializada em um sistema escravizante que o reduz a peça de uma gigantesca engrenagem. O homem, na sua visão, não é isto. Não é um número. Não é o mero "trabalhador", o "eleitor", o "pagador de impostos" etc. É muito mais do que isso. É um ser transcendental. É um universo, complexo e deslumbrante.
O que Krishnamurti apregoava, ainda na década dos 30, é visto como "revolucionário" hoje, o que dá a exata medida da sua sabedoria e visão. É apontado como o rumo, o parâmetro, o fundamento da "educação do futuro", destinada a desenvolver no aluno a capacidade e o gosto pelo raciocínio. Hoje ela não passa de um exercício enfadonho (e inútil) de transmissão de informações, de "conhecimentos enciclopédicos", a maioria dispensável, obtidos em qualquer site da Internet com o simples comprimir de uma tecla de computador.
O livro, lançado pela Editora Cultrix, é uma coletânea das melhores entrevistas e palestras do mestre. Compõe praticamente um tratado sobre o tema da liberdade, o cerne dos seus ensinamentos. Ninguém mais do que Krishnamurti enfatizou tanto a necessidade do homem ser livre e educado para tal. Contudo, em toda a sua extensa obra, são reiterados os limites dessa liberdade e o perigo advindo da sua superação. Aborda a questão dos direitos humanos, a realização dos desejos, a ambição e a cobiça. Enfatiza os comportamentos que desviam a atenção do indivíduo daquele que deveria ser seu verdadeiro objetivo: a conquista do autoconhecimento, do autodomínio, da autodisciplina.
Krishnamurti defende que a má utilização da liberdade pode ser nociva, como na superpopulação do Planeta, fenômeno que provoca desequilíbrios e catástrofes, dada a limitação dos recursos terrestres.
O mestre apregoa que "existe apenas uma revolução fundamental. Não é uma revolução de idéias nem é baseada num determinado padrão de ação. Ela começa a manifestar-se quando a necessidade de usar os outros termina. É algo que surge espontaneamente quando começamos a entender a natureza profunda dos nossos relacionamentos. Essa revolução pode ser chamada de Amor". Ou seja, dois mil anos depois, Krishnamurti apregoa a mesma mensagem eterna que Jesus Cristo pregou nos vilarejos da Galiléia (a do "ama ao próximo como a ti mesmo"), a uma humanidade obtusa, violenta, egoísta e sem metas espirituais. É o óbvio tornado revolucionário
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