Ópera bufa
Pedro J. Bondaczuk
O Equador acaba de representar uma "ópera bufa", com a destituição do seu polêmico presidente, o populista Abdala Bucaram, que em apenas seis meses no poder, ganhou espaço na imprensa internacional não por ações competentes de governo, mas por sua postura irreverente fora dele.
Tomou atitudes incompatíveis com o cargo, agindo como um adolescente inconseqüente, apresentando-se em shows de rock, gravando um "compact disk", assumindo a presidência do clube de futebol Barcelona, de Guayaquil, etc.etc.etc.
Para completar, cometeu a "heresia das heresias" para os equatorianos, que foi a visita, no mês passado, ao Peru, país com o qual o Equador tem pendência territorial em torno da Cordilheira do Condor e que os levou à confrontação armada em três ocasiões.
Bucaram esteve em Lima, jurou "eterna amizade" a Alberto Fujimori e chegou a marcar uma partida amistosa de futebol entre o seu clube, reforçado pelo jogador argentino Diego Maradona --- que receberia US$ 2 milhões só por esse jogo ---, contra o time peruano Alianza.
O próprio político populista sentia-se gratificado quando era chamado de "El Loco" ("O Louco"), designação que para ele era elogiosa e não pejorativa. Tanto que assumiu o apelido publicamente.
Ocorre que nada disso é motivo para a destituição de um presidente, legitimamente eleito nas urnas, com 54% dos votos do eleitorado. O que aconteceu no Equador foi um golpe de Estado, dado não pelos militares, mas pelo Congresso unicameral. A justificação para o impeachment não convenceu ninguém com um mínimo de bom senso.
Bucaram foi destituído por "incompetência mental" para governar. Quer dizer que o Legislativo do Equador é integrado por psiquiatras de renome! Ou por psicanalistas de reconhecida competência! Ou por psicólogos de nomeada! Note-se que o presidente deposto não foi submetido a nenhum exame, sequer de médicos principiantes. E o veredito não foi de "incapacidade", mas de "incompetência mental". Deve ser caso único na história!
Por isso, não se pode deixar de dar razão ao jornal "The Washington Post", em seu editorial de quarta-feira, quando afirma: "A crise no Equador seria divertida se não fosse tão triste". Quando no ano passado o general paraguaio Lino Oviedo insubordinou-se contra o presidente Juan Carlos Wasmosy, todos os governos sul-americanos hipotecaram solidariedade ao mandatário, em defesa da democracia. E agora, o que ocorreu? Todos silenciaram.
O impeachment de Bucaram não pode ser comparado ao de Carlos Andres Perez, na Venezuela, em 1992, destituído por desvio de US$ 17 milhões dos cofres públicos e posteriormente processado e condenado pela Suprema Corte por corrupção. O dele foi por "incompetência mental". Mas de quem? Certamente dos congressistas, em detrimento da democracia.
(Artigo publicado na página 3, Opinião, do Correio Popular, em 13 de fevereiro de 1997).
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