Wednesday, August 15, 2007

Escritor que é sinônimo de "absurdo" - II


Pedro J. Bondaczuk

(CONTINUAÇÃO)

SOLITÁRIO INCONFORMADO

Franz Kafka, embora pessoa de fino trato e que, na aparência, denotasse estar de bem com a vida, era um homem amargo e solitário. Não conseguia (ou achava isso) ser compreendido por parentes, amigos e conhecidos, embora fizesse de tudo para agradar. Ao contrário da maioria que se sente desse modo, todavia, o escritor jamais se conformou com esse isolamento.
Buscou, através dos canais da sua arte de escrever, emitir um grito desesperado de socorro ao mundo, numa súplica velada por atenção, afeição e respeito. Basta que a sua obra seja lida como deve ser, isto é, não apenas com o intelecto, mas com sensibilidade, para que isso fique evidenciado. Kafka antecipou, em seus textos, portanto, um clima psicológico que mais tarde iria caracterizar o nosso tempo.
Afinal, não é assim que nos sentimos na cidade grande: isolados, incompreendidos e injustiçados? Não somos vítimas de aterrorizante solidão, paradoxalmente em meio a multidões que se multiplicam de forma vertiginosa? Contudo, quanto mais gente nos rodeia, mais sós nos sentimos.
Não vivemos à procura, mesmo que de forma inconsciente, de romper as barreiras da incompreensão que nos cercam e nos angustiam? Não nos sentimos massacrados por um sistema (político, econômico e social) com o qual não concordamos, contra o qual nos indispomos e nos insurgimos, mas que, por covardia ou comodismo, ajudamos a se manter intacto?
Bem que Kafka procurou romper seu isolamento, ditado não por sua estrutura psicológica, mas pelas condições externas do seu tempo, da sociedade a que pertencia e do lugar em que vivia. Tanto é que se ligou afetivamente a três mulheres: Felícia Bauer, Milena e Dora Dyamant.
Mas sempre que estava prestes a quebrar as cadeias da solidão que o torturava, mediante absoluta e incondicional auto-entrega, acabava vítima de tormento ainda pior: o da dúvida. Sentia-se forçado a escolher entre dois caminhos excludentes e inconciliáveis: deixar de ser só, partilhando a vida com uma mulher. Mas, para tanto, tendo que abrir mão da autonomia pessoal, da liberdade, que tanto prezava.
Terminou por não ter uma coisa e nem outra. Ou seja, nem companhia e nem liberdade. Jamais deixou de se sentir solitário, mesmo quando acompanhado. E no fim da vida – ele que morreu precocemente, aos 41 anos –, foi forçado, pelas circunstâncias, a se submeter a uma humilhante dependência, quase que completa, a uma mulher, Dora Dyamant, após ser acometido de tuberculose e exigir, por isso, cuidados constantes e especiais.

(CONTINUA)

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