Sunday, October 16, 2011







Vitória com sabor de derrota


Pedro J. Bondaczuk


As eleições presidenciais mexicanas de quarta-feira passada foram, em quase todos os aspectos, iguais às realizadas no país nos últimos 60 anos. Por exemplo, no dia seguinte ao pleito, quando as apurações ainda estavam extremamente retardadas, o candidato oficial do governo, Carlos Salinas de Gortari, veio a público anunciar, triunfalmente, que havia obtido uma “vitória esmagadora”.
Nas horas subseqüentes a esse anúncio, todavia, ele percebeu que as coisas não haviam sido bem assim. Na sexta-feira, teve que se retratar, admitindo que, embora tivesse vencido, a oposição havia tido um importante avanço e acabado com o sistema de partido único que vigorava nessa República nas últimas seis décadas.
Mas os líderes oposicionistas, desta vez, foram ainda mais longe. Asseguraram, através de nota conjunta, que a vitória eleitoral havia sido de um deles, no caso o esquerdista Cuauthemoc Cárdenas. No sábado, o México foi dominado por esses boatos. E por outros, tão comuns nesse país em tais ocasiões.
As denúncias de fraudes eleitorais, tão rotineiras em eleições mexicanas, começaram a se avolumar, como que numa incontrolável avalanche. Por isso, as autoridades tiveram que divulgar, precocemente, alguns resultados da votação. Os finais e oficiais estavam previstos para ser anunciados somente no domingo. Acabaram retardados, todavia, para ontem. Mas a sua divulgação não aplacou a ira da oposição, que está inconformada com o que aconteceu.
Tanto o candidato da esquerda, quanto o conservador Manuel Clouthier, entendem que o retardamento do anúncio da apuração teve uma razão “pragmática”, por parte dos dirigentes do todo-poderoso Partido Revolucionário Institucional: foi para dar tempo para que votos fossem adulterados, distorcendo, mais uma vez, a voz das urnas.
Se houve ou não fraude, é impossível de se afirmar com segurança. Só podemos declarar o mesmo que dissemos quando da eleição presidencial sul-coreana, em dezembro de 1987: “Em geral, onde há fumaça, existe fogo”.
Outro detalhe que chamou a atenção do crítico foi o alto índice de abstenções registrado. No dia da votação, as agências noticiosas internacionais informaram sobre uma grande afluência de eleitores às urnas. Havia mais de 38 milhões deles habilitados a votar.
Para surpresa geral, os resultados divulgados ontem mostraram que o comparecimento não chegou sequer à metade dos inscritos. Foi de inexpressivos 46,99%. Ou seja, não houve quorum. Gortari, portanto (admitindo-se que tenha vencido uma eleição não viciada) foi o preferido de uma porcentagem muito baixa dos que dispunham do direito a voto. Ou seja, de 52,89% dos 46,99% dos que se dispuseram a ir votar.
Isto dá bem a conta das dificuldades que ele irá enfrentar nos próximos seis anos de gestão, tendo a maioria do país contra si. Se governar com respaldo popular o segundo Estado mais endividado do Terceiro Mundo já é uma magnífica façanha, imaginem o que não pode ser sem ele!

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 12 de julho de 1988).

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