Ainda sobre perguntas
Pedro J. Bondaczuk
Tratei, recentemente, do tema que se refere a questionamentos. Ou seja, do método socrático de se chegar à verdade, de se aprender qualquer coisa e de se resolver problemas, aparentemente complexos, mas que após solucionados mostram que “o bicho não era tão feio” quanto pensávamos, mediante perguntas. Minha abordagem na ocasião foi genérica. Não se centrou em nenhuma atividade específica, embora eu tenha enfatizado a importância do ato de perguntar em especial para nós, jornalistas e, mais especificamente, para os repórteres, e por razões óbvias.
De passagem, todavia, mencionei que o método socrático é, também, sumamente útil (se não indispensável) no planejamento e concretização de um livro. Nesse aspecto, contudo, fui questionado por um leitor, o que me deixou bastante satisfeito. Primeiro, por me comprovar que, ao contrário do que chego a pensar em alguns dias, não estou “pregando no deserto”. Há quem leia estas reflexões diárias e com a devida atenção que espero. A segunda é que, para esclarecer suas dúvidas, se utilizou exatamente do método que propus em meu texto. Ou seja, o de perguntar.
Antes de demonstrar quanto os questionamentos importam, são úteis e são essenciais, peço licença para fazer três citações a propósito, pinçadas do excelente livro “Pense melhor”, de Tim Hurson (DVS Editora) – que torno a recomendar e sobre o qual tive oportunidade de tecer comentários – pela relevância do seu conteúdo. A primeira é do filósofo inglês, Francis Bacon, que escreveu: “Uma pergunta prudente é metade da sabedoria”. A razão dessa constatação é óbvia. Até porque, salvo em raras ocasiões, a prudência é e sempre será muito bem vinda.
A segunda citação que reproduzo é do dramaturgo Eugene Ionesco (sobre o qual também tive a oportunidade de escrever), que afirmou: “Não é a resposta que ilumina, mas a pergunta”. E ele sabe o que diz. Essa afirmação aproxima-se mais um pouco do assunto que vou tratar, ou seja, o da importância do questionamento no planejamento e produção de um livro.
Finalmente, a terceira citação é até mais específica ao leitor que me questionou. Ele iniciou seu e-mail da seguinte forma: “Desculpe-me se minha pergunta for tola...”. Fique tranqüilo, não é. Contudo, mesmo que fosse, seria válida. Aliás, teria a validade até multiplicada. Isso, pelo menos a julgar pela declaração de Alfred North Whitehead. Ele defendeu que “a pergunta tola é o primeiro indício de algum avanço totalmente novo”. No seu entender (e também no meu) o questionamento aparentemente (ou de fato) despropositado, enseja a busca e a solução inusitados de determinado problema.
Um escritor, tão logo tem aquele lampejo, eufemisticamente conhecido como “inspiração”, ou seja, quando conclui que determinado tema, se bem explorado, pode gerar um livro, quem sabe um best-seller, se questiona: “Isso dá um romance ou uma novela? Quem sabe, seja apropriado a um poema. Ou, talvez, seja melhor tratado num ensaio”. Ou seja, pergunta-se: “Como escrever?”. O “o que” adveio da inspiração.
Decidido o gênero, surgem outros tantos questionamentos essenciais. Um deles é: “o que eu conheço do assunto?”. Mas a pergunta mais importante é: “o que desconheço?”. A resposta suscita outras tantas indagações, como “onde posso obter informações a respeito? Com quem? O que fazer para ter sucesso na pesquisa?”, e vai por aí afora.
Durante a redação, muitas outras perguntas, certamente, irão surgir, e serão as respostas a elas que irão dar alguma forma à matéria original, a tal da inspiração, que é como uma pedra de granito em bruto para um escultor, que se pergunta o que poderia esculpir naquele material.
Mas os questionamentos não param por aí. Chega a fase da revisão, do acabamento final, da forma definitiva que aquela vaga idéia inicial terá, ou seja, como, finalmente, chegará às mãos do leitor, seu legítimo e essencial destinatário. Revisar, quase sempre, é um processo de corte. E a primeira pergunta que surge é: o que cortar? E o que melhorar? O que está obscuro? O que é supérfluo no texto? E assim as coisas vão.
Sei que muito escritor dirá que não faz nada disso. Será capaz de jurar sobre a Bíblia que escreve diretamente, num só sopro e que, mesmo quando corta algumas palavras, ou parágrafos, ou trechos, ou até mesmo capítulos inteiros, o faz sem recorrer a esses e a nenhum outro questionamento. Mas se questiona. Pode ser que não verbalize essas perguntas. Pode até ser que nem tenha consciência desse auto-interrogatório. Contudo, até subconscientemente, faz, sim, estas (e outras tantas) perguntas. Não há como não fazê-las.
Concluído o livro, lá vem outro extenso rol de dúvidas. Por exemplo, como publicar o que se escreveu. Um escritor, afinal de contas, não escreve para si ou só para a sua família ou, no máximo, para um punhado de amigos. Fá-lo para o público e quanto mais amplo e numeroso este for, melhor. Portanto, a primeira pergunta que se impõe é: “Como publicar?”. Essa suscita uma outra: “Em que editora?” E os questionamentos sucedem-se e se multiplicam “ad náusea”, referentes à distribuição, à divulgação (entre as quais se faz ou não noite ou tarde de autógrafos), não raro à crítica etc.etc.etc.
Espero, com estas canhestras considerações, não ter frustrado o amável leitor que me questionou. Se não consegui convencê-lo (e espero tê-lo convencido), esteja certo que a falha não está na sua pergunta. Não, amigo, ela está longe de ser tola. O erro (se houver) está, obviamente, na resposta que lhe dei. Se achar oportuno, torne a me questionar, e quantas vezes quiser. Porquanto, é de exercícios dialéticos, como este, que emerge o conhecimento, a sabedoria e a verdade.
Pedro J. Bondaczuk
Tratei, recentemente, do tema que se refere a questionamentos. Ou seja, do método socrático de se chegar à verdade, de se aprender qualquer coisa e de se resolver problemas, aparentemente complexos, mas que após solucionados mostram que “o bicho não era tão feio” quanto pensávamos, mediante perguntas. Minha abordagem na ocasião foi genérica. Não se centrou em nenhuma atividade específica, embora eu tenha enfatizado a importância do ato de perguntar em especial para nós, jornalistas e, mais especificamente, para os repórteres, e por razões óbvias.
De passagem, todavia, mencionei que o método socrático é, também, sumamente útil (se não indispensável) no planejamento e concretização de um livro. Nesse aspecto, contudo, fui questionado por um leitor, o que me deixou bastante satisfeito. Primeiro, por me comprovar que, ao contrário do que chego a pensar em alguns dias, não estou “pregando no deserto”. Há quem leia estas reflexões diárias e com a devida atenção que espero. A segunda é que, para esclarecer suas dúvidas, se utilizou exatamente do método que propus em meu texto. Ou seja, o de perguntar.
Antes de demonstrar quanto os questionamentos importam, são úteis e são essenciais, peço licença para fazer três citações a propósito, pinçadas do excelente livro “Pense melhor”, de Tim Hurson (DVS Editora) – que torno a recomendar e sobre o qual tive oportunidade de tecer comentários – pela relevância do seu conteúdo. A primeira é do filósofo inglês, Francis Bacon, que escreveu: “Uma pergunta prudente é metade da sabedoria”. A razão dessa constatação é óbvia. Até porque, salvo em raras ocasiões, a prudência é e sempre será muito bem vinda.
A segunda citação que reproduzo é do dramaturgo Eugene Ionesco (sobre o qual também tive a oportunidade de escrever), que afirmou: “Não é a resposta que ilumina, mas a pergunta”. E ele sabe o que diz. Essa afirmação aproxima-se mais um pouco do assunto que vou tratar, ou seja, o da importância do questionamento no planejamento e produção de um livro.
Finalmente, a terceira citação é até mais específica ao leitor que me questionou. Ele iniciou seu e-mail da seguinte forma: “Desculpe-me se minha pergunta for tola...”. Fique tranqüilo, não é. Contudo, mesmo que fosse, seria válida. Aliás, teria a validade até multiplicada. Isso, pelo menos a julgar pela declaração de Alfred North Whitehead. Ele defendeu que “a pergunta tola é o primeiro indício de algum avanço totalmente novo”. No seu entender (e também no meu) o questionamento aparentemente (ou de fato) despropositado, enseja a busca e a solução inusitados de determinado problema.
Um escritor, tão logo tem aquele lampejo, eufemisticamente conhecido como “inspiração”, ou seja, quando conclui que determinado tema, se bem explorado, pode gerar um livro, quem sabe um best-seller, se questiona: “Isso dá um romance ou uma novela? Quem sabe, seja apropriado a um poema. Ou, talvez, seja melhor tratado num ensaio”. Ou seja, pergunta-se: “Como escrever?”. O “o que” adveio da inspiração.
Decidido o gênero, surgem outros tantos questionamentos essenciais. Um deles é: “o que eu conheço do assunto?”. Mas a pergunta mais importante é: “o que desconheço?”. A resposta suscita outras tantas indagações, como “onde posso obter informações a respeito? Com quem? O que fazer para ter sucesso na pesquisa?”, e vai por aí afora.
Durante a redação, muitas outras perguntas, certamente, irão surgir, e serão as respostas a elas que irão dar alguma forma à matéria original, a tal da inspiração, que é como uma pedra de granito em bruto para um escultor, que se pergunta o que poderia esculpir naquele material.
Mas os questionamentos não param por aí. Chega a fase da revisão, do acabamento final, da forma definitiva que aquela vaga idéia inicial terá, ou seja, como, finalmente, chegará às mãos do leitor, seu legítimo e essencial destinatário. Revisar, quase sempre, é um processo de corte. E a primeira pergunta que surge é: o que cortar? E o que melhorar? O que está obscuro? O que é supérfluo no texto? E assim as coisas vão.
Sei que muito escritor dirá que não faz nada disso. Será capaz de jurar sobre a Bíblia que escreve diretamente, num só sopro e que, mesmo quando corta algumas palavras, ou parágrafos, ou trechos, ou até mesmo capítulos inteiros, o faz sem recorrer a esses e a nenhum outro questionamento. Mas se questiona. Pode ser que não verbalize essas perguntas. Pode até ser que nem tenha consciência desse auto-interrogatório. Contudo, até subconscientemente, faz, sim, estas (e outras tantas) perguntas. Não há como não fazê-las.
Concluído o livro, lá vem outro extenso rol de dúvidas. Por exemplo, como publicar o que se escreveu. Um escritor, afinal de contas, não escreve para si ou só para a sua família ou, no máximo, para um punhado de amigos. Fá-lo para o público e quanto mais amplo e numeroso este for, melhor. Portanto, a primeira pergunta que se impõe é: “Como publicar?”. Essa suscita uma outra: “Em que editora?” E os questionamentos sucedem-se e se multiplicam “ad náusea”, referentes à distribuição, à divulgação (entre as quais se faz ou não noite ou tarde de autógrafos), não raro à crítica etc.etc.etc.
Espero, com estas canhestras considerações, não ter frustrado o amável leitor que me questionou. Se não consegui convencê-lo (e espero tê-lo convencido), esteja certo que a falha não está na sua pergunta. Não, amigo, ela está longe de ser tola. O erro (se houver) está, obviamente, na resposta que lhe dei. Se achar oportuno, torne a me questionar, e quantas vezes quiser. Porquanto, é de exercícios dialéticos, como este, que emerge o conhecimento, a sabedoria e a verdade.
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