Sunday, May 01, 2011







O poder cobra pesado tributo

Pedro J. Bondaczuk

O presidente norte-americano, Ronald Reagan, está vivendo momentos de aflição e, diríamos, até de perplexidade. Isso tanto em sua carreira política, que até novembro de 1986 era considerada brilhante, quanto na vida pessoal. Neste último aspecto, além de não estar no melhor da sua forma física, a despeito das reiteradas afirmações em contrário de seus médicos, teve o dissabor de ver sua companheira de todas as horas, Nancy, ser submetida a uma mastectomia, sábado, para se livrar de um câncer na mama que estava começando a se desenvolver.

Tudo pareceu desmoronar de uma só vez, nesta semana, portanto, sobre a sua cabeça. A cirurgia da mulher, a necessidade de dar uma resposta aos iranianos, pelo seu ataque no Golfo Pérsico, de sexta-feira, e finalmente o inexplicado fenômeno da vertiginosa queda livre da Bolsa de Valores de Nova York, que ficou muito próxima de repetir o "crack" acionário de 1929.

Os analistas políticos e econômicos, embora não abertamente, insinuam que os problemas da Casa Branca se relacionam diretamente com o escândalo "Irã-contras", cujo relatório final ainda não foi divulgado, mas que, inegavelmente, deixou manchas na reputação do mandatário norte-americano. E da forma mais cruel possível. Ele não corre risco algum de "impeachment", como aconteceu, em 1974, com Richard Nixon. Não vai precisar deixar o poder, portanto, execrado por ter agido mal.

Mas será punido por algo muito mais sutil e venenoso: pela suspeita de que tramou uma rede de mentiras ao seu redor, para esconder sua participação nesse "affaire", o que não deixa de ser injusto e cruel. A opinião pública está usando com Reagan o inverso do axioma legal que diz que "todo cidadão é inocente até que se prove o contrário". Está impondo a ele que demonstre cabalmente a sua inocência. E o presidente sequer tem como evitar isso.

As suspeitas contra ele raramente vêm à imprensa e quando isso acontece, é de forma cifrada. Ele não pode entrar na cabeça das pessoas e modificar seus conceitos. Mas os efeitos de seu desprestígio são visíveis. O Congresso hostiliza-o, os meios financeiros não acreditam naquilo que diz e seus adversários procuram destruir, subrepticiamente, toda a excelente obra que realizou.

Seu sentimento, diante de tudo isso, deve ser o de uma profunda amargura, que sequer pode compartilhar com os outros. Ele está conhecendo na carne, agora que não pode concorrer a outra reeleição, o que é, de fato, a "solidão do poder". E certamente nem em seus piores pesadelos Reagan poderia imaginar que iria terminar de forma tão melancólica a sua passagem pela Casa Branca. Agora, só a reunião de cúpula com Gorbachev talvez possa salvar a sua imagem para a História.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 21 de outubro de 1987).

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