Ideais que ainda são retórica
Pedro J. Bondaczuk
Os ideais da Revolução Francesa (cujo ápice das comemorações de seu bicentenário ocorre nesta semana em Paris) ainda estão para ser concretizados em alguma parte do mundo, qualquer que ela seja, embora não se possa, em circunstância nenhuma, negar a sua importância. O lema dos revolucionários, !liberdade, igualdade e fraternidade”, é mais retórico do que nunca nos dias atuais, em que dois terços da humanidade lutam desesperadamente para sobreviver, para que o um terço restante goze das benesses do trabalho da imensa maioria.
Nem mesmo nas sociedades mais evoluídas do Planeta, como a dos Estados Unidos ou dos países industrializados da Europa Ocidental, há algo que sequer pareça com este dístico. Por toda a parte em que se olhe, em maior ou menor grau, o egoísmo, a prepotência e a injustiça campeiam. Daí o clima de desesperança, de ceticismo e até de um cínico conformismo caracterizarem a nossa era.
Caso os ideais dos revolucionários franceses pudessem ser implantados, não somente na França, mas em todo o mundo, certamente não teríamos, por exemplo, um bilhão de seres humanos carecendo de um teto sobre suas cabeças. Nem 750 milhões de analfabetos, sem perspectivas que não sejam a de serem reduzidos a meras bestas de carga por parte dos demais. Nem cerca de 50 milhões de desabrigados, das diversas guerras civis, movimentos de libertação e “revoluções salvadoras”. Nem haveria quarenta crianças morrendo de fome, a cada minuto, planeta afora, enquanto há tanto desperdício dessa dádiva generosa da terra (os alimentos que ela produz, desde que devidamente cultivada).
Caso os ideais da Revolução que empolgou a França, há 200 anos, e que lançou os fundamentos da Declaração Universal dos Direitos Humanos – endossada nas Nações Unidas por quase todos os países do mundo, mas rigorosamente não respeitada por nenhum – estivessem vigorando, não teríamos tanta gente encerrada em calabouços, por causa de convicções políticas ou religiosas ou por serem etnicamente discriminadas.
Não haveria nenhuma forma de tortura. Não existiria a pena de morte, um instrumento de crueldade e de vingança, e nunca uma estratégia para a reeducação dos que infringem as leis, muitas vezes criadas por homens iníquos e corruptos, que legislam em causa própria.
Não se dividiria o Planeta em Primeiro, Segundo e Terceiro Mundos e nem haveria barreiras nacionais, que ao contrário de atuarem no sentido da promoção do homem, fazem dele meras peças de diabólicas engrenagens que o reduzem à servidão.
As sementes para uma existência melhor foram lançadas, mas não caíram em terreno fértil. O caminho para o Paraíso está balizado, mas enormes abismos abriram-se sob os pés dos que o desejam trilhar. A grande “Revolução do Amor” ainda está por ser feita. Isto, se a demência não levar a humanidade ao temido, e previsível, “doomsday” nuclear.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 11 de julho de 1989)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
Os ideais da Revolução Francesa (cujo ápice das comemorações de seu bicentenário ocorre nesta semana em Paris) ainda estão para ser concretizados em alguma parte do mundo, qualquer que ela seja, embora não se possa, em circunstância nenhuma, negar a sua importância. O lema dos revolucionários, !liberdade, igualdade e fraternidade”, é mais retórico do que nunca nos dias atuais, em que dois terços da humanidade lutam desesperadamente para sobreviver, para que o um terço restante goze das benesses do trabalho da imensa maioria.
Nem mesmo nas sociedades mais evoluídas do Planeta, como a dos Estados Unidos ou dos países industrializados da Europa Ocidental, há algo que sequer pareça com este dístico. Por toda a parte em que se olhe, em maior ou menor grau, o egoísmo, a prepotência e a injustiça campeiam. Daí o clima de desesperança, de ceticismo e até de um cínico conformismo caracterizarem a nossa era.
Caso os ideais dos revolucionários franceses pudessem ser implantados, não somente na França, mas em todo o mundo, certamente não teríamos, por exemplo, um bilhão de seres humanos carecendo de um teto sobre suas cabeças. Nem 750 milhões de analfabetos, sem perspectivas que não sejam a de serem reduzidos a meras bestas de carga por parte dos demais. Nem cerca de 50 milhões de desabrigados, das diversas guerras civis, movimentos de libertação e “revoluções salvadoras”. Nem haveria quarenta crianças morrendo de fome, a cada minuto, planeta afora, enquanto há tanto desperdício dessa dádiva generosa da terra (os alimentos que ela produz, desde que devidamente cultivada).
Caso os ideais da Revolução que empolgou a França, há 200 anos, e que lançou os fundamentos da Declaração Universal dos Direitos Humanos – endossada nas Nações Unidas por quase todos os países do mundo, mas rigorosamente não respeitada por nenhum – estivessem vigorando, não teríamos tanta gente encerrada em calabouços, por causa de convicções políticas ou religiosas ou por serem etnicamente discriminadas.
Não haveria nenhuma forma de tortura. Não existiria a pena de morte, um instrumento de crueldade e de vingança, e nunca uma estratégia para a reeducação dos que infringem as leis, muitas vezes criadas por homens iníquos e corruptos, que legislam em causa própria.
Não se dividiria o Planeta em Primeiro, Segundo e Terceiro Mundos e nem haveria barreiras nacionais, que ao contrário de atuarem no sentido da promoção do homem, fazem dele meras peças de diabólicas engrenagens que o reduzem à servidão.
As sementes para uma existência melhor foram lançadas, mas não caíram em terreno fértil. O caminho para o Paraíso está balizado, mas enormes abismos abriram-se sob os pés dos que o desejam trilhar. A grande “Revolução do Amor” ainda está por ser feita. Isto, se a demência não levar a humanidade ao temido, e previsível, “doomsday” nuclear.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 11 de julho de 1989)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment