Pedro J. Bondaczuk
As aparências, de fato, enganam. Por isso, nunca devemos julgar quem quer que seja pelo que aparenta ser. Invariavelmente, damos vexame, quando deixamos de ter esse tipo de cautela. Aliás, a bem da verdade, jamais devemos julgar ninguém.
Quem somos nós, pobres mortais, para condenar ou absolver nossos companheiros de jornada, esquecidos dos nossos defeitos, vulnerabilidades e contradições? Todavia, julgamos. E, às vezes, o fazemos até de forma inconsciente, inocentemente, sem nenhuma malícia. Essa mania de julgamento já está definitivamente incorporada ao nosso comportamento. Infelizmente! E quem mais nega que a tenha, é o que mais julga os outros.
Já que é assim, já que é um vício que parece irremediável, tenhamos, pelo menos, algum critério. Busquemos, prudentemente, conhecer razoavelmente as pessoas antes de formarmos juízo sobre elas. Nós, escritores, temos a mania de bisbilhotar a vida alheia, até por razões, digamos, práticas. Não contentes com a mera bisbilhotice, transformamos nossas vítimas em personagens de romances, contos ou novelas que escrevemos. Com uma agravante: sem nenhum escrúpulo, damos asas à imaginação e emprestamos-lhes um caráter a nosso gosto.
Se for conveniente para o enredo, transformamos santos em demônios, Messalinas em santas, poltrões em heróis e assim por diante. Mas não é a esse tipo de julgamento que me refiro. Nós escritores, pelo menos, temos o cuidado de camuflar a verdadeira identidade dos que escolhemos para serem nossos personagens. Se forem altos, por exemplo, fazemo-los baixinhos, se obesos, transformamo-los em palitos ambulantes, se louros, viram mulatos etc. Nenhuma dessas nossas vítimas, portanto, se reconhece em nossos textos.
Contudo, a totalidade dos personagens que supostamente criamos existe de fato. Mesmo que inconscientemente, nos inspiramos em alguém na sua criação. Ademais, não saímos alardeando por aí os defeitos daqueles aos quais julgamos. Já os fofoqueiros de plantão... Esses são árbitros implacáveis, sumamente injustos e altamente perigosos.
Conheço, por exemplo, pessoas doutas, de imensa cultura e sagacidade, com capacidade mental muito superior à média e que, no entanto, no convívio cotidiano, são encaradas com menosprezo pelo vulgo, dada sua ternura, ingenuidade e inocência.
São desprovidas de malícia e não raro, vítimas de chacotas de imbecis arrogantes, tão desprovidos de inteligência a ponto de serem incapazes de enxergar méritos em quem ostensivamente os têm (embora nunca façam alarde deles). Os verdadeiros sábios, os guias de povos, os gênios, os propulsores do progresso científico, tecnológico, artístico e espiritual, são, via de regra, humildes. Deixam a empáfia e a arrogância para os estúpidos e ignorantes que, convenhamos, abundam.
Esse tipo de erro de julgamento, creio, nunca cometi (ufa!). Mas perpetrei outros que haverão de me envergonhar até a eternidade. Um deles, por sinal, quase me conduz a um desastre. Conheci, certa feita, determinada moça que posava de santa. Era bonitinha, por sinal. Não era, a bem da verdade, dessas belezas exuberantes, que nos inibem por concluirmos que “não são para o nosso bico”. Era, contudo, dessas mulheres que não podemos deixar de notar quando cruzamos com elas nas ruas, no metrô ou num shopping.
Jovem, na ocasião, e com a testosterona fervendo no sangue, decidi conquistá-la. A figura era das tais com manias de conversão. Só falava em Bíblia, em igreja, em pecado, esses papos de religião. Sexo, para ela?! Era uma imundície! À simples insinuação, ela deitava falação sobre moral, pecado e danação. Não chegamos a firmar compromisso formal de namoro. Para a sorte minha, nosso relacionamento estava naquela fase do “chove e não molha”.
Moço, como eu era, com a testosterona fervendo no sangue (reitero), fui, numa determinada noite de sábado, a um bordel famoso aqui na cidade. E quem eu encontro lá? Exatamente a santarrona! Fiz questão de um programa com ela. E nunca mais quis vê-la e nem saber notícias de sua existência. Ah, a propósito, fiz dela (e sem mudar a mínima característica, a não ser o nome) personagem de um dos meus contos. Foi a minha vingança por ter feito papel de bobo.
Quanto a pessoas de real valor, será difícil cometer esse tipo de julgamento. Nesses casos, deixo, sempre, qualquer juízo a cargo da intuição. Até hoje, ela jamais me falhou. Tive a felicidade de privar da companhia de pessoas que me deram orgulho de ser da minha espécie e que me marcaram para sempre.
Lima Barreto, aliás, escreveu a respeito de gente assim, no romance “Triste fim de Policarpo Quaresma” (livro que recomendo sem pestanejar). Constatou: “...A candura e a pureza d’alma...vão habitar esses homens de uma idéia fixa, os grandes estudiosos, os sábios e os inventores, gente que fica mais terna, mais ingênua, mais inocente que as donzelas das poesias de outras épocas. É raro encontrar homens assim, mas os há e, quando se os encontra, mesmo tocados de um grão de loucura, a gente sente mais simpatia pela nossa espécie, mais orgulho de ser homem e mais esperança na felicidade da raça”.
Eu me sinto assim face a esse tipo de pessoas. O engraçado é que elas nunca aparentam ser o que são. Quando conversam conosco, manifestam modéstia que se percebe ser genuína. Não ostentam seus títulos de doutorado, raramente têm um carrão do ano, quase nunca se importam com a aparência e não assumem ares pedantes, de mestres face a alunos, digamos, tapados. De fato, Lima Barreto foi bastante feliz ao pintá-los como “mais inocentes que as donzelas das poesias de outras épocas”. As aparências, portanto, enganam ou não?! E como!!!!
As aparências, de fato, enganam. Por isso, nunca devemos julgar quem quer que seja pelo que aparenta ser. Invariavelmente, damos vexame, quando deixamos de ter esse tipo de cautela. Aliás, a bem da verdade, jamais devemos julgar ninguém.
Quem somos nós, pobres mortais, para condenar ou absolver nossos companheiros de jornada, esquecidos dos nossos defeitos, vulnerabilidades e contradições? Todavia, julgamos. E, às vezes, o fazemos até de forma inconsciente, inocentemente, sem nenhuma malícia. Essa mania de julgamento já está definitivamente incorporada ao nosso comportamento. Infelizmente! E quem mais nega que a tenha, é o que mais julga os outros.
Já que é assim, já que é um vício que parece irremediável, tenhamos, pelo menos, algum critério. Busquemos, prudentemente, conhecer razoavelmente as pessoas antes de formarmos juízo sobre elas. Nós, escritores, temos a mania de bisbilhotar a vida alheia, até por razões, digamos, práticas. Não contentes com a mera bisbilhotice, transformamos nossas vítimas em personagens de romances, contos ou novelas que escrevemos. Com uma agravante: sem nenhum escrúpulo, damos asas à imaginação e emprestamos-lhes um caráter a nosso gosto.
Se for conveniente para o enredo, transformamos santos em demônios, Messalinas em santas, poltrões em heróis e assim por diante. Mas não é a esse tipo de julgamento que me refiro. Nós escritores, pelo menos, temos o cuidado de camuflar a verdadeira identidade dos que escolhemos para serem nossos personagens. Se forem altos, por exemplo, fazemo-los baixinhos, se obesos, transformamo-los em palitos ambulantes, se louros, viram mulatos etc. Nenhuma dessas nossas vítimas, portanto, se reconhece em nossos textos.
Contudo, a totalidade dos personagens que supostamente criamos existe de fato. Mesmo que inconscientemente, nos inspiramos em alguém na sua criação. Ademais, não saímos alardeando por aí os defeitos daqueles aos quais julgamos. Já os fofoqueiros de plantão... Esses são árbitros implacáveis, sumamente injustos e altamente perigosos.
Conheço, por exemplo, pessoas doutas, de imensa cultura e sagacidade, com capacidade mental muito superior à média e que, no entanto, no convívio cotidiano, são encaradas com menosprezo pelo vulgo, dada sua ternura, ingenuidade e inocência.
São desprovidas de malícia e não raro, vítimas de chacotas de imbecis arrogantes, tão desprovidos de inteligência a ponto de serem incapazes de enxergar méritos em quem ostensivamente os têm (embora nunca façam alarde deles). Os verdadeiros sábios, os guias de povos, os gênios, os propulsores do progresso científico, tecnológico, artístico e espiritual, são, via de regra, humildes. Deixam a empáfia e a arrogância para os estúpidos e ignorantes que, convenhamos, abundam.
Esse tipo de erro de julgamento, creio, nunca cometi (ufa!). Mas perpetrei outros que haverão de me envergonhar até a eternidade. Um deles, por sinal, quase me conduz a um desastre. Conheci, certa feita, determinada moça que posava de santa. Era bonitinha, por sinal. Não era, a bem da verdade, dessas belezas exuberantes, que nos inibem por concluirmos que “não são para o nosso bico”. Era, contudo, dessas mulheres que não podemos deixar de notar quando cruzamos com elas nas ruas, no metrô ou num shopping.
Jovem, na ocasião, e com a testosterona fervendo no sangue, decidi conquistá-la. A figura era das tais com manias de conversão. Só falava em Bíblia, em igreja, em pecado, esses papos de religião. Sexo, para ela?! Era uma imundície! À simples insinuação, ela deitava falação sobre moral, pecado e danação. Não chegamos a firmar compromisso formal de namoro. Para a sorte minha, nosso relacionamento estava naquela fase do “chove e não molha”.
Moço, como eu era, com a testosterona fervendo no sangue (reitero), fui, numa determinada noite de sábado, a um bordel famoso aqui na cidade. E quem eu encontro lá? Exatamente a santarrona! Fiz questão de um programa com ela. E nunca mais quis vê-la e nem saber notícias de sua existência. Ah, a propósito, fiz dela (e sem mudar a mínima característica, a não ser o nome) personagem de um dos meus contos. Foi a minha vingança por ter feito papel de bobo.
Quanto a pessoas de real valor, será difícil cometer esse tipo de julgamento. Nesses casos, deixo, sempre, qualquer juízo a cargo da intuição. Até hoje, ela jamais me falhou. Tive a felicidade de privar da companhia de pessoas que me deram orgulho de ser da minha espécie e que me marcaram para sempre.
Lima Barreto, aliás, escreveu a respeito de gente assim, no romance “Triste fim de Policarpo Quaresma” (livro que recomendo sem pestanejar). Constatou: “...A candura e a pureza d’alma...vão habitar esses homens de uma idéia fixa, os grandes estudiosos, os sábios e os inventores, gente que fica mais terna, mais ingênua, mais inocente que as donzelas das poesias de outras épocas. É raro encontrar homens assim, mas os há e, quando se os encontra, mesmo tocados de um grão de loucura, a gente sente mais simpatia pela nossa espécie, mais orgulho de ser homem e mais esperança na felicidade da raça”.
Eu me sinto assim face a esse tipo de pessoas. O engraçado é que elas nunca aparentam ser o que são. Quando conversam conosco, manifestam modéstia que se percebe ser genuína. Não ostentam seus títulos de doutorado, raramente têm um carrão do ano, quase nunca se importam com a aparência e não assumem ares pedantes, de mestres face a alunos, digamos, tapados. De fato, Lima Barreto foi bastante feliz ao pintá-los como “mais inocentes que as donzelas das poesias de outras épocas”. As aparências, portanto, enganam ou não?! E como!!!!
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