Monday, March 23, 2009

A maior descoberta


Pedro J. Bondaczuk


A vida pode ser comparada a uma escola, na qual jamais nos graduamos. Quanto mais aprendemos, mais temos a aprender, num aprendizado que nunca tem fim, vivamos o quanto vivermos: vinte, cinqüenta, oitenta ou cem anos. Nossas primeiras lições – aparentemente triviais, mas indispensáveis à sobrevivência – consistem em aprendermos a nos alimentar, sugando, corretamente, o seio da mãe; a erguer sozinhos a cabeça; a sentar; a engatinhar e, finalmente, a andar.
Às vezes, esse aprendizado é traumático e doloroso. Outras tantas, é envolvido em estimulantes prazeres. Mas sempre aprendemos, queiramos ou não, do berço à tumba. E quando morremos, deixamos infinitas lições para trás que, caso continuássemos vivendo, certamente aprenderíamos. Somos, pois, perpétuos estudantes nessa escola informal.
Todavia, o mais importante acontecimento da nossa vida é quando nos conscientizamos do nosso “eu”. É somente a partir daí que começamos a exercitar, de fato, nossa racionalidade. Claro que as conseqüências dessa lição fundamental nunca são iguais para todos. Alguns, ficam felizes por adquirirem a capacidade de entender e usufruir da beleza que os cerca. Outros, porém, decepcionam-se com a descoberta de que não passam de animais, posto que racionais e que o mundo não é o paraíso que esperavam.
Uns, descobrem talentos que jamais supunham que tinham e os exercitam, para deleite pessoal e engrandecimento do mundo. Outros, conscientizam-se de deficiências, de taras congênitas e de segredos sobre si próprios que melhor seria que permanecessem interditos.
São, pois, lições e mais lições aprendidas, algumas (como vimos) de forma dolorosa e traumática, representada pelas conseqüências de erros cometidos; outras sublimes e magníficas, decorrentes da convivência com pessoas nobres e construtivas ou de experiências inesquecíveis que as circunstâncias colocam em seus caminhos.
Além desse permanente aprendizado, dessa sucessão de descobertas (ou em decorrência delas) colecionamos, vida afora, imagens, sons, idéias, conceitos, valores etc. Essa coleção é feita, em geral, de forma inconsciente, à nossa revelia. Daí a necessidade de nos brindarmos o tempo todo com paisagens magníficas, com a convivência com pessoas nobres, bonitas e exemplares; com conversas sadias e leituras edificantes, entre outras tantas experiências ao nosso alcance.
Claro que nem sempre temos como fugir do oposto. Ou seja, de cenários sombrios e apavorantes, de gente horrorosa e perversa, de diálogos chulos, tensos ou banais e de livros que melhor seria que jamais houvessem sido escritos. Isso também se fixa em algum lugar do subconsciente e pode emergir, quando menos esperarmos, para nos atormentar ou aterrorizar.
Reitero que há cenas bucólicas, aparentemente banais, em geral bastante simples, que sem que nos apercebamos, ficam gravadas para sempre em nossa memória e que, quando as lembramos, o fazemos com deleite e satisfação. Essas paisagens; essas pessoas bonitas e bondosas; esses atos de nobreza e solidariedade; esses acontecimentos marcantes dos quais participamos – como personagens, ou meros espectadores – formam uma espécie de álbum de imagens, como esses tantos de fotografias que costumamos guardar e, de vez em quando, exibir para os filhos e para os netos.
São lembranças que se juntam, uma a uma, sem cessar, ao longo dos dias, semanas, meses e anos, ao nosso acervo espiritual e nos inspiram, enternecem e consolam notadamente em momentos de tristeza e solidão.
É um privilégio podermos ler, por exemplo, versos singelos, de uma beleza que chega a doer de tão intensa, como estes dois tercetos do soneto “Recreio”, do poeta português Alberto de Serpa: “Na claridade da manhã primaveril,/ao lado da brancura lavada da escola,/as crianças confraternizam-se com a alegria das aves.//E o sol abre-lhes rosas nas faces saudáveis/a mão doce do vento afaga-lhes os cabelos,/- um sol discreto que se esconde às vezes entre nuvens brancas”.
Concordo, pois, com Leon Tolstoi (escritor que tem lugar cativo no meu “álbum de lembranças” pessoal) quando afirma: “O mais importante acontecimento da vida de um homem é o momento em que se torna consciente do seu eu. As conseqüências disto podem ser as mais benéficas ou as mais terríveis”. Os riscos, desta transcendental descoberta, porém, valem, sempre, a pena correr.

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