Monday, March 16, 2009

A importância do "outro"


Pedro J. Bondaczuk

As grandes obras humanas – quer materiais, quer espirituais – são sempre, de alguma maneira, de caráter coletivo. Ninguém nunca fez, faz ou fará o que quer que seja absolutamente sozinho. Dependemos, do nascimento à morte, de uma forma ou de outra, do “outro”. A própria vida só nos é transmitida da conjunção de um par – dos gametas masculino e feminino, do macho e da fêmea – e essa dependência se estende pelo tempo que vivermos.
Já escrevi inúmeras vezes e reitero que o homem, ao nascer, é um dos animais mais frágeis e desprotegidos da natureza (se não for o mais). O cavalo, o boi, o cão, o gato etc., por exemplo, minutos depois de paridos, já conseguem se pôr de pé e caminhar sozinhos, posto que trôpegos e vacilantes. Um bebê humano, contudo... Leva semanas apenas para sustentar a cabeça, meses para sentar, outro tanto para engatinhar e por volta de um ano para dar os primeiros passos. Requer cuidado, atenção e ajuda nos mínimos atos, ao longo do seu processo de desenvolvimento físico e mental, sob risco de sequer sobreviver.
Contudo, a despeito dessa perpétua dependência, raramente valorizamos, de verdade, o “outro”. Mesmo em obras do espírito, nas mais requintadas idéias que elaboramos, há constante contribuição alheia. A totalidade do nosso conhecimento, por exemplo, é fruto da experiência de gerações e mais gerações que nos antecederam e nos é transmitida pelos pais, pelos mestres, pelos filósofos, pelos escritores etc. etc. etc. Ou seja, por algum “outro”
Tudo o que pensamos fundamenta-se em pensamentos anteriores de alguém. E nenhuma elaboração mental nossa faria o menor sentido se não pudesse, ou se não viesse a ser compartilhada com alguém. Ou seja, com o “outro”.
O filósofo Emmanuel Kant, num dos seus textos, indagou a propósito: “Para onde iriam nossos pensamentos e qual seria sua justeza se não pudéssemos pensar de algum modo em comunidade com os outros; a quem comunicaríamos nossas reflexões, assim como eles informariam de suas idéias?”. A resposta é óbvia. Seriam inúteis, sem nenhum sentido e valor, mera perda de tempo.
Há, todavia, determinadas ações que nos competem com exclusividade: as escolhas. Dependendo do que, como e quando escolhermos, iremos arcar com as respectivas conseqüências. Se escolhermos o positivo, o construtivo e o útil (para nós e para quem dependa do nosso cuidado), teremos, como contrapartida, a evolução material e/ou espiritual. Em caso contrário...
Costumamos pedir, amiúde, aos outros (pais, mestres, amigos, sacerdotes, conselheiros matrimoniais etc.) que nos apontem os caminhos que devemos seguir. Esta, todavia, reitero, é uma escolha que nos cabe com exclusividade. Podemos (e devemos) ouvir sugestões, é verdade, mas estas devem ser encaradas, apenas, como tal. A escolha sempre será somente nossa.
Pior quando pedimos a um poeta, que não costuma ser prático nas suas atitudes e enxerga o mundo sob uma ótica diferente da maioria, que nos aponte um caminho a seguir. Aí é que as coisas podem se complicar de vez (ou não, se estivermos dispostos a arcar com as conseqüências).
Nós, e apenas nós e mais ninguém, somos os únicos com condições de conhecer, por minimamente que seja, o que mais nos convém, de acordo com nossa personalidade, anseios e talentos. É certo que há conselhos que salvam, no entanto, estes são bastante raros. Na maioria das vezes, quem nos aconselha está mais sem rumo do que nós, perdido em contradições, baseado em informações furadas, sem exatidão ou conteúdo.
O que temos que fazer com maior constância é darmos ouvidos ao nosso coração, estabelecermos metas factíveis, atentarmos para a intuição e seguirmos em frente. Adolfo Casais Monteiro, no poema “Permanência”, faz este alerta nestes versos: “Não peçam aos poetas um caminho. O poeta/anda aos encontrões da realidade/sem acertar o tempo com o espaço”.
Da minha parte, não pedi conselhos a nenhum poeta. Ponto para mim! Todavia, para complicar, sou um deles. Sou alimentado por sonhos e grandiosos ideais. Mas estou consciente da minha fragilidade individual, por isso busco firmar alianças. Amiúde me dou mal. Contudo não considero nenhum dos sonhos que me embalaram a juventude morto. Adormecidos, talvez, muitos (quem sabe a maioria) estejam.
Sigo batalhando por eles e não apenas por alguns, mas por todos. Tenho a prudência, contudo, de acumpliciar uma infinidade de pessoas nessa empreitada. É dessa soma de vontades que extraio a minha força. Estou absolutamente consciente da importância do “outro” e quanto mais gente puder arrebanhar para as minhas causas, melhor será.
É certo que os sonhos que aparentam possibilidades mais fáceis de concretização, recebem maior atenção da minha parte, até por questão de organização de prioridades. Porém, sigo imbuído de fé. Tenho infinitas esperanças. E, sobretudo, amo! Sou feliz à minha maneira, embora não o tempo todo (porquanto isso é impossível).
Procuro espalhar alegria e otimismo por onde passo; busco ser o “outro” indispensável na vida de quem as circunstâncias colocam em meu caminho e sou infinitamente grato aos amigos, aos parentes e até aos inimigos, que apontam minhas deficiências e erros, me permitindo sanar as primeiras e corrigir os segundos.
Minha mente e meu espírito estão repletos de vida e sou grato a Deus por tudo o que me acontece, até mesmo pelas coisas ruins, das quais aprendi a extrair lições. Faço minhas, portanto, as palavras do poeta português Adolfo Casais Monteiro, que citei acima, e que afirmou, num dos seus versos: “Não tenho lugar para nenhum cemitério dentro de mim”. Destaco: ele é mais um dos meus tantos “outros”.

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