Monday, May 29, 2006

É preciso humanizar o homem


O filósofo Jiddu Krishnamurti, num dos seus livros, destaca que “existe apenas uma revolução fundamental. Nem é uma revolução de idéias nem é baseada num determinado padrão de ação. Ela começa a manifestar-se quando a necessidade de usar os outros termina. É algo que surge espontaneamente quando começamos a entender a natureza profunda dos relacionamentos. Essa revolução pode ser chamada de Amor”. As rápidas e dramáticas transformações deste final de milênio, ideológicas, políticas e sociais, mantêm intocados os verdadeiros problemas que tornam este mundo um lugar tão perigoso para viver.
A ignorância, a prepotência, a cobiça e a exploração do homem pelo homem, permanecem mais presentes do que nunca a atestar que, a despeito do progresso tecnológico, a racionalidade humana não evoluiu um único milímetro nos últimos dois ou três milênios e, ao contrário, pode até ter sofrido uma regressão. Relatórios divulgados amiúde, por diferentes organizações internacionais, mostram que podemos falar de tudo, menos de evolução do espírito.
Os informes dão conta de torturas, assassinatos, “desaparecimentos” de pessoas, privações ilegais da liberdade, truculências e outros crimes hediondos, muitos dos quais praticados por governos ou por regimes políticos. Ou seja, tais delitos são cometidos em nome de princípios nobres – e cada vez mais utópicos – como liberdade, democracia e solidariedade.
O relatório anual da Anistia Internacional referente ao ano de 1992, por exemplo, ao qual tivemos acesso, denuncia e fundamenta em farta documentação violações de direitos humanos em 111 países. E não são apenas as sociedades retrógradas, fartamente conhecidas, que torturam, executam, roubam, estupram e maltratam seus próprios cidadãos. Tais delitos ocorrem, indistintamente, na Europa, nos Estados Unidos e em praticamente todas as partes do mundo. Onde, pois, está a apregoada “nova era”, tão decantada após o fim da Guerra Fria?
Os campos de concentração, ao estilo nazista, que todos julgavam coisa do passado, se espalham por grande parte do território da antiga Iugoslávia, sob os olhares complacentes e atarantados da comunidade internacional. Extermínio de pessoas, por causa dessa estupidez que se convencionou chamar de “raça” – como se no essencial todos os seres humanos não fossem iguais – ocorrem diariamente na Bósnia-Herzegovina, sem que se faça nada para impedir, a não ser utilizar a imprensa para inócuas ameaças e vazias condenações.
Nesse festival de desrespeito aos direitos fundamentais do homem, os mais afetados são, pela ordem, as mulheres, os idosos e as crianças. Ou seja, os desequilibrados da atual geração, que não têm tirocínio para entender que são mortais e vão passar e cair na vala do esquecimento, buscam comprometer o futuro do mundo. E ninguém faz nada para evitar.
A Organização Internacional do Trabalho, por exemplo, lançou, em 1993, um livro sobre a exploração de menores como mão-de-obra escrava ou semi-escrava. Cerca de 200 milhões de meninos e meninas, em todas as partes, estão tendo a sua dignidade desrespeitada, seu desenvolvimento físico e mental mutilado e suas expectativas frustradas. Mas quem se importa? A verdadeira revolução, a da “humanização” do homem, ainda está longe de começar. Tememo-la. Impõe-se, pois, a questão formulada por Max Frish: “Quando se tem mais medo da mudança do que da desgraça, o que é que se faz para evitar a desgraça?”.

(Capítulo do livro “Por uma nova utopia”, Pedro J. Bondaczuk, páginas 101 e 103, 1ª edição – 5 mil exemplares – fevereiro de 1998 – Editora M – São Paulo).

1 comment:

Anonymous said...

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