Universo rico de sugestões
Pedro J. Bondaczuk
A escola, não importa se pública ou privada, se de cursos básicos ou se de universitários, é um universo rico de sugestões para os escritores. Tem potencial (e imenso, quase infinito) de inspirar excelentes romances. Afinal, é nela em que passamos parte considerável de nossas vidas e nos preparamos (uns muito bem, outros, nem tanto) para encarar os desafios pessoais e profissionais e as batalhas que aparecerem (e que certamente aparecerão) em nossos caminhos.
Trata-se de riquíssimo filão, já habilmente explorado por muitos escritores (e roteiristas de filmes, óbvio). Li, é verdade, romances excelentes, tendo escolas por cenários, mas... também li muita bobagem, muitos enredos-clichês, muitos lugares-comuns a esse propósito.
Claro que a qualidade de uma obra literária não depende do lugar que a inspirou ou que lhe serve de cenário, mas de quem a escreve. O bom escritor opera maravilhas descrevendo e situando enredos em qualquer tipo de ambiente, mesmo o aparentemente mais trivial, mais banal e menos inspirador. Todavia, alguns são mais propícios do que outros para inspirar bons romances. E a escola é um deles.
Estas considerações vêm a propósito de dois episódios diferentes, que me proporcionaram um “gancho” ideal para tocar no assunto. Aliás, um deles findou por sugerir o outro. A idéia de escrever a respeito veio da notícia, amplamente divulgada pela imprensa, do trágico acontecimento ocorrido por estes dias numa escola de São Caetano do Sul.
Por razões ainda não bem esclarecidas, um menino, de apenas dez anos de idade, que não manifestava nenhum sinal, pelo menos aparente, de qualquer tipo de anormalidade, atirou, com uma arma de seu pai, contra sua professora, ferindo-a com relativa gravidade e, na sequência, cometeu suicídio, disparando contra a própria cabeça. Não é minha intenção fazer nenhum juízo de valor a propósito e nem me alongar no assunto. Nunca fui dado a sensacionalismos e nem este espaço se presta a tal.
O episódio fez com que eu refletisse a respeito, mas sob um prisma, digamos, literário. Pode parecer insensibilidade da minha parte, mas não é. Muito pelo contrário... Convenhamos, uma história, como essa, se saída da cabeça de um escritor, ou seja, se fosse ficção, seria considerada um dramalhão daqueles e mereceria críticas de toda a sorte, sob a alegação de ser inverossímil. Principalmente, levando em conta a idade do garotinho. No entanto... aconteceu.
Vasculhando as estantes da minha caótica biblioteca, à cata de alguma obra de ficção que tivesse escolas, com sua rotina, seus tipos característicos, suas comédias e/ou suas tragédias, dei de cara com um romance da Biblioteca de Seleções, que havia lido há uns vinte anos, intitulado “Professor de humanidade”. E reli-o, avidamente, neste final de semana.
O título original que o autor, E. R. Braithwaite, lhe deu, é “To Sir, with Love”. Foi lançado, no Brasil, por outras editoras (não me lembro, agora, quais), sob o nome de “Ao mestre, com carinho”, o mesmo do filme rodado em 1967, quando o livro já era um best-seller internacional – estrelado por Sidney Poitier. Creio que muitos de vocês, se não todos, tiveram a oportunidade de ver essa versão cinematográfica. Foi estrondoso sucesso. Teve, até, versão para a TV. O roteiro foi adaptado e escrito pelo próprio diretor, James Clavell, que acertou na mosca ao se propor a transportar para a tela essa história, aparentemente banal. E se consagrou.
É difícil dizer o que fez mais sucesso, se o livro de Braithwaite (que originalmente não era nem escritor e nem professor e que “abraçou” ambas atividades por causa das circunstâncias) ou o filme, que ocupou a posição de número 27 na seletíssima relação das 50 melhores películas enfocando escolas e vida escolar. Para que vocês tenham uma idéia do êxito da filmagem, lembro que a canção tema de “Ao mestre, com carinho”, interpretada pela atriz e cantora Lulu, liderou as paradas musicais norte-americanas em 1967 e pelo ano todo.
Da minha parte, prefiro o título da Biblioteca de Seleções, “Professor de humanidade” que, no meu entender, é o mais apropriado. A versão do romance que li (e agora reli) contou com a tradução de Francis Marshall. O enredo narra como Braithwaite, negro, procedente da Guiana Inglesa, conquistou corações e mentes de uma classe de alunos, todos oriundos de famílias muito pobres, em uma decadente escola dos arrabaldes de Londres.
Para tanto, teve que lançar mão não de pedagogia ou treinamento, o que, absolutamente, não tinha, mas da intuição e dos seus magníficos dotes pessoais. O livro foi baseado em fatos reais. Originou-se de um diário do autor sobre essa sua experiência, que para ele se tornou inesquecível, no magistério. Braithwaite, reitero, nunca havia sido professor antes e nem fora treinado para a função. Aceitou o desafio de lecionar, e para uma classe tão rebelde, turbulenta e complicada, por força das circunstâncias, porque precisava trabalhar, para assegurar seu sustento.
Após informar-me sobre o autor e sobre como nasceu esse romance, fico sem saber o que é mais interessante e exemplar: se seu enredo – verídico, em que um homem sensível e inteligente, vence o preconceito latente na sociedade inglesa (mal que, ademais, prospera, infelizmente, em todas as partes do mundo) e a rebeldia de adolescentes, tidos e havidos como sem futuro, e extrai deles o que têm de melhor, os encaminhando na vida – ou se a origem do próprio livro. Concluo, para ser justo: ambos.
Pedro J. Bondaczuk
A escola, não importa se pública ou privada, se de cursos básicos ou se de universitários, é um universo rico de sugestões para os escritores. Tem potencial (e imenso, quase infinito) de inspirar excelentes romances. Afinal, é nela em que passamos parte considerável de nossas vidas e nos preparamos (uns muito bem, outros, nem tanto) para encarar os desafios pessoais e profissionais e as batalhas que aparecerem (e que certamente aparecerão) em nossos caminhos.
Trata-se de riquíssimo filão, já habilmente explorado por muitos escritores (e roteiristas de filmes, óbvio). Li, é verdade, romances excelentes, tendo escolas por cenários, mas... também li muita bobagem, muitos enredos-clichês, muitos lugares-comuns a esse propósito.
Claro que a qualidade de uma obra literária não depende do lugar que a inspirou ou que lhe serve de cenário, mas de quem a escreve. O bom escritor opera maravilhas descrevendo e situando enredos em qualquer tipo de ambiente, mesmo o aparentemente mais trivial, mais banal e menos inspirador. Todavia, alguns são mais propícios do que outros para inspirar bons romances. E a escola é um deles.
Estas considerações vêm a propósito de dois episódios diferentes, que me proporcionaram um “gancho” ideal para tocar no assunto. Aliás, um deles findou por sugerir o outro. A idéia de escrever a respeito veio da notícia, amplamente divulgada pela imprensa, do trágico acontecimento ocorrido por estes dias numa escola de São Caetano do Sul.
Por razões ainda não bem esclarecidas, um menino, de apenas dez anos de idade, que não manifestava nenhum sinal, pelo menos aparente, de qualquer tipo de anormalidade, atirou, com uma arma de seu pai, contra sua professora, ferindo-a com relativa gravidade e, na sequência, cometeu suicídio, disparando contra a própria cabeça. Não é minha intenção fazer nenhum juízo de valor a propósito e nem me alongar no assunto. Nunca fui dado a sensacionalismos e nem este espaço se presta a tal.
O episódio fez com que eu refletisse a respeito, mas sob um prisma, digamos, literário. Pode parecer insensibilidade da minha parte, mas não é. Muito pelo contrário... Convenhamos, uma história, como essa, se saída da cabeça de um escritor, ou seja, se fosse ficção, seria considerada um dramalhão daqueles e mereceria críticas de toda a sorte, sob a alegação de ser inverossímil. Principalmente, levando em conta a idade do garotinho. No entanto... aconteceu.
Vasculhando as estantes da minha caótica biblioteca, à cata de alguma obra de ficção que tivesse escolas, com sua rotina, seus tipos característicos, suas comédias e/ou suas tragédias, dei de cara com um romance da Biblioteca de Seleções, que havia lido há uns vinte anos, intitulado “Professor de humanidade”. E reli-o, avidamente, neste final de semana.
O título original que o autor, E. R. Braithwaite, lhe deu, é “To Sir, with Love”. Foi lançado, no Brasil, por outras editoras (não me lembro, agora, quais), sob o nome de “Ao mestre, com carinho”, o mesmo do filme rodado em 1967, quando o livro já era um best-seller internacional – estrelado por Sidney Poitier. Creio que muitos de vocês, se não todos, tiveram a oportunidade de ver essa versão cinematográfica. Foi estrondoso sucesso. Teve, até, versão para a TV. O roteiro foi adaptado e escrito pelo próprio diretor, James Clavell, que acertou na mosca ao se propor a transportar para a tela essa história, aparentemente banal. E se consagrou.
É difícil dizer o que fez mais sucesso, se o livro de Braithwaite (que originalmente não era nem escritor e nem professor e que “abraçou” ambas atividades por causa das circunstâncias) ou o filme, que ocupou a posição de número 27 na seletíssima relação das 50 melhores películas enfocando escolas e vida escolar. Para que vocês tenham uma idéia do êxito da filmagem, lembro que a canção tema de “Ao mestre, com carinho”, interpretada pela atriz e cantora Lulu, liderou as paradas musicais norte-americanas em 1967 e pelo ano todo.
Da minha parte, prefiro o título da Biblioteca de Seleções, “Professor de humanidade” que, no meu entender, é o mais apropriado. A versão do romance que li (e agora reli) contou com a tradução de Francis Marshall. O enredo narra como Braithwaite, negro, procedente da Guiana Inglesa, conquistou corações e mentes de uma classe de alunos, todos oriundos de famílias muito pobres, em uma decadente escola dos arrabaldes de Londres.
Para tanto, teve que lançar mão não de pedagogia ou treinamento, o que, absolutamente, não tinha, mas da intuição e dos seus magníficos dotes pessoais. O livro foi baseado em fatos reais. Originou-se de um diário do autor sobre essa sua experiência, que para ele se tornou inesquecível, no magistério. Braithwaite, reitero, nunca havia sido professor antes e nem fora treinado para a função. Aceitou o desafio de lecionar, e para uma classe tão rebelde, turbulenta e complicada, por força das circunstâncias, porque precisava trabalhar, para assegurar seu sustento.
Após informar-me sobre o autor e sobre como nasceu esse romance, fico sem saber o que é mais interessante e exemplar: se seu enredo – verídico, em que um homem sensível e inteligente, vence o preconceito latente na sociedade inglesa (mal que, ademais, prospera, infelizmente, em todas as partes do mundo) e a rebeldia de adolescentes, tidos e havidos como sem futuro, e extrai deles o que têm de melhor, os encaminhando na vida – ou se a origem do próprio livro. Concluo, para ser justo: ambos.
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