Hipótese de sabotagem parece leviana
Pedro J. Bondaczuk
As reações iniciais do novo presidente paquistanês, Ghulam Ishaq Khan, ao acidente que matou, na quarta-feira, o seu antecessor, o general Mohammed Zia Ul-Haq, podem ser consideradas, no mínimo, precipitadas. Mal a aeronave tocava o solo e explodia, matando as 30 pessoas a bordo, a emissora oficial de Islamabad divulgava uma versão levantando a hipótese de uma sabotagem como causa dessa tragédia nacional.
Só que não apresentou qualquer prova concreta, a mínima evidência de que o desastre tenha sido provocado ou quem o teria causado. No mesmo dia, o Departamento de Estado dos Estados Unidos divulgava nota, em Washington, dizendo não acreditar na hipótese de atentado.
Passados três dias, embora a imprensa paquistanesa ainda especule à vontade sobre o que poderia ter acontecido ao Hércules C-130, não apareceu a mais simples das provas de que tudo não tenha passado de um lamentável (é verdade) acidente aeronáutico.
A teoria de que o avião teria sido atingido por um míssil ruiu por terra, diante do depoimento de testemunhas que garantem que a explosão aconteceu somente depois que a aeronave se chocou contra o solo. O observador fica, portanto, curioso sobre o que teria levado as autoridades de Islamabad a fazer uma acusação tão grave, se nenhuma (mas absolutamente nenhuma) evidência surgiu até agora que possa vir a apoiar essa hipótese.
Quem poderia desejar sabotar o avião em que viajava o general Zia? O governo marxista do Afeganistão, do presidente Mohammed Najibullah? Dificilmente! Até porque, agora sem a proteção tão eficaz dos soviéticos, que só estão preocupados em completar, em segurança, a sua retirada, ele tem “diversão” suficiente com a guerrilha muçulmana para pensar em cometer atos de terrorismo em outro país.
Ademais, é inconcebível que o presidente paquistanês, tão cioso com a sua própria pessoa e que sempre demonstrou tanta astúcia (senão não conseguiria sobreviver por tanto tempo num país com tamanhas tensões como o seu) fosse deixar vazar a informação de que iria para uma região tão remota e naquele determinado avião.
Seriam os indianos, então, os hipotéticos sabotadores? É totalmente improvável que fossem, dada a tradição de legalidade e respeito às normas internacionais que esse povo sempre teve, Seria a oposição interna do Paquistão? Ou seria tudo fruto da fantasia de um presidente interino inseguro, temeroso da responsabilidade que estava assumindo, de substituir um governante que nunca dividiu responsabilidades com ninguém? De um dirigente que se acostumou a considerar o Estado como extensão de sua própria pessoa, numa paródia do rei francês Luís XIV?
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 20 de agosto de 1988).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
As reações iniciais do novo presidente paquistanês, Ghulam Ishaq Khan, ao acidente que matou, na quarta-feira, o seu antecessor, o general Mohammed Zia Ul-Haq, podem ser consideradas, no mínimo, precipitadas. Mal a aeronave tocava o solo e explodia, matando as 30 pessoas a bordo, a emissora oficial de Islamabad divulgava uma versão levantando a hipótese de uma sabotagem como causa dessa tragédia nacional.
Só que não apresentou qualquer prova concreta, a mínima evidência de que o desastre tenha sido provocado ou quem o teria causado. No mesmo dia, o Departamento de Estado dos Estados Unidos divulgava nota, em Washington, dizendo não acreditar na hipótese de atentado.
Passados três dias, embora a imprensa paquistanesa ainda especule à vontade sobre o que poderia ter acontecido ao Hércules C-130, não apareceu a mais simples das provas de que tudo não tenha passado de um lamentável (é verdade) acidente aeronáutico.
A teoria de que o avião teria sido atingido por um míssil ruiu por terra, diante do depoimento de testemunhas que garantem que a explosão aconteceu somente depois que a aeronave se chocou contra o solo. O observador fica, portanto, curioso sobre o que teria levado as autoridades de Islamabad a fazer uma acusação tão grave, se nenhuma (mas absolutamente nenhuma) evidência surgiu até agora que possa vir a apoiar essa hipótese.
Quem poderia desejar sabotar o avião em que viajava o general Zia? O governo marxista do Afeganistão, do presidente Mohammed Najibullah? Dificilmente! Até porque, agora sem a proteção tão eficaz dos soviéticos, que só estão preocupados em completar, em segurança, a sua retirada, ele tem “diversão” suficiente com a guerrilha muçulmana para pensar em cometer atos de terrorismo em outro país.
Ademais, é inconcebível que o presidente paquistanês, tão cioso com a sua própria pessoa e que sempre demonstrou tanta astúcia (senão não conseguiria sobreviver por tanto tempo num país com tamanhas tensões como o seu) fosse deixar vazar a informação de que iria para uma região tão remota e naquele determinado avião.
Seriam os indianos, então, os hipotéticos sabotadores? É totalmente improvável que fossem, dada a tradição de legalidade e respeito às normas internacionais que esse povo sempre teve, Seria a oposição interna do Paquistão? Ou seria tudo fruto da fantasia de um presidente interino inseguro, temeroso da responsabilidade que estava assumindo, de substituir um governante que nunca dividiu responsabilidades com ninguém? De um dirigente que se acostumou a considerar o Estado como extensão de sua própria pessoa, numa paródia do rei francês Luís XIV?
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 20 de agosto de 1988).
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