Tecnologia ameaça o livro?
Pedro J. Bondaczuk
“Os livros correm o risco de serem arrastados pela enxurrada das novas tecnologias e do audiovisual e devem levar a pior na briga pela atenção das crianças“. Quem fez essa (para mim) sombria previsão foi o badalado dramaturgo, nascido na antiga Checoslováquia, atual República Checa, mas naturalizado inglês, Tom Stoppard. Aliás, não obteve apenas a naturalidade britânica, mas foi sagrado, há já bom tempo, pela rainha Elizabeth II, com o honroso título de “sir”. Isso dá conta da sua importância como intelectual e produtor de arte e de cultura. Trata-se, pois, de alguém que merece ser levado a sério.
A previsão do dramaturgo foi feita há já certo tempo, mais especificamente, em 21 de junho de 2010, em discurso que pronunciou numa escola da Grã-Bretanha, em um evento de caridade do Príncipe de Gales. Seu alerta foi destinado a um público específico: professores de diversos níveis de ensino desse país. Sua mensagem teve o objetivo claro e direto de encorajar os docentes sobre o que e de que forma devem ensinar.
Cá para nós, existe mesmo esse risco? Não seria mera retórica do dramaturgo, afeito a dramatizar as coisas? No médio prazo, talvez não haja esse perigo. Notem bem, afirmei “talvez”. Mas se as coisas continuarem, como estão... Não quero nem pensar!
Stoppard ressaltou, em determinado trecho do seu discurso: “Não há mais tanta demanda pela escrita como quando eu tinha idade para ser aluno, ou mesmo a idade de seus professores”. No seu entender (e no meu), “as crianças vivem em um mundo dominado pela tecnologia, onde a imagem em movimento é mais importante que o impresso”. Exagero de Stoppard? Claro que não! Basta observar o que ocorre ao nosso redor para concluir que o alerta é não apenas válido, mas impõe.
Não sou um sujeito conservador, no significado pejorativo do termo, que sinta comichão face a tudo o que signifique avanço. Não apenas aceito a “modernidade”, no seu melhor aspecto, como batalho por ela. Mas entendo que para aceitá-la e lutar para que se imponha não significa abrir mão da tradição. Creio que o mais sábio é usufruir de ambos. Ou seja, ser moderno, sim, mas sem jogar na lata de lixo idéias, conceitos, comportamentos e ações tradicionais, que ainda sejam válidos e úteis. Uma coisa não exclui a outra. Não se trata, pois, de “excluir”, mas de somar.
Sou, pois, favorabilíssimo às novas tecnologias, as que tornam, em t6odos os aspectos, a nossa vida mais fácil e melhor. Como poderia não ser? Como poderia abrir mão do computador, do IPad, do celular e de tantos outros equipamentos que já se incorporaram à minha rotina diária?! Não poderia!
O que condeno, todavia, é o apressado (e para mim estúpido) processo de “substituição”, sem nem ao menos se atentar se o que está sendo substituído é útil, prático e necessário ou não. Que o livro se modernize, ganhe plataforma eletrônica, seja acessível no computador, nos tablets e em outros aparelhos cada vez mais avançados, considero um progresso e torço para que isso se acelere cada vez mais. Mas que os textos, as idéias e emoções expressados por palavras sejam substituídos por audiovisuais, é algo a que me oponho e me oporei de todas as formas.
Não é, pois, a “modernização” do livro que incomoda Stoppard (e a mim). É a sua supressão, pura e simples, como se ameaça fazer, posto que não deliberadamente. O que pode, à primeira vista, parecer “modernidade”, tende a se transformar, se não forem coibidos exageros do tipo, em terrível atraso.
Já que citei um dos dramaturgos mais badalados da atualidade, convém dar uma palhinha sobre quem ele é. Tom Stoppard, além de escritor de peças teatrais premiadíssimas e encenadas nos melhores palcos, mundo afora, já escreveu roteiros para o cinema, a televisão e o rádio. Provavelmente, é mais conhecido no Brasil pela co-autoria (junto com Mark Norman), de “Shakespeare apaixonado”. Esse filme, rodado em 1998, fez “furor” no mundo todo e conquistou sete estatuetas do Oscar. Entre elas, incluem-se as de melhor filme e melhor roteiro.
Tom Stoppard nasceu em 3 de julho de 1937 na então Checoslováquia. Quando tinha, apenas, um ano, sua pátria foi invadida por tropas nazistas. Um ano depois, sua família mudou-se para Singapura, na vã ilusão de voltar a levar uma vida pacata e pacífica. Naquele período turbulento da sua infância, porém, isso era impossível. Não tardou para esse minúsculo país asiático também ser invadido, mas pelos japoneses. Por conta desse fato, foi parar na Índia, então colônia britânica. Ali, recebeu educação nos mais rígidos padrões ingleses. Mas não completou os estudos. Aos 17 anos, largou a escola e foi trabalhar como jornalista. E findou por envolver-se com as artes, notadamente com o teatro, o que viria a determinar sua vida, seu rumo e sua maneira de pensar e de agir.
É autor de pelo menos 25 peças teatrais, a última das quais é “Rock’n roll”, recentemente, há questão de meses, lançada no Brasil. É tido e havido como um dos melhores e mais celebrados dramaturgos vivos, continuando a ser requisitado e bastante ativo, a despeito de já contar com 74 anos de idade. Ademais, não foi por acaso que, sendo estrangeiro, embora naturalizado, e vivendo em um país com rígidas tradições, como a Grã-Bretanha, foi sagrado “sir” pela rainha Elizabeth II.
Esse título é dado somente a quem domine determinado conhecimento ou tenha certa aptidão em que seja considerado “excelente”. Entre os que receberam esse selo oficial de qualidade pode-se citar casos extremos como o do físico Isaac Newton e do criador do imortal Carlitos, Charles Chaplin.
Cabe-nos a tarefa de preservação dessa fundamental ferramenta de instrução e de difusão de arte e de cultura, que é o livro. Como? Estimulando notadamente as crianças a lerem, para que formem esse saudabilíssimo hábito e o transmitam aos seus filhos. E que estes façam o mesmo com sua descendência e assim, sucessivamente, numa corrente sem fim. Acabar com o livro?! Deus que me livre! Seria o colapso da civilização!
Pedro J. Bondaczuk
“Os livros correm o risco de serem arrastados pela enxurrada das novas tecnologias e do audiovisual e devem levar a pior na briga pela atenção das crianças“. Quem fez essa (para mim) sombria previsão foi o badalado dramaturgo, nascido na antiga Checoslováquia, atual República Checa, mas naturalizado inglês, Tom Stoppard. Aliás, não obteve apenas a naturalidade britânica, mas foi sagrado, há já bom tempo, pela rainha Elizabeth II, com o honroso título de “sir”. Isso dá conta da sua importância como intelectual e produtor de arte e de cultura. Trata-se, pois, de alguém que merece ser levado a sério.
A previsão do dramaturgo foi feita há já certo tempo, mais especificamente, em 21 de junho de 2010, em discurso que pronunciou numa escola da Grã-Bretanha, em um evento de caridade do Príncipe de Gales. Seu alerta foi destinado a um público específico: professores de diversos níveis de ensino desse país. Sua mensagem teve o objetivo claro e direto de encorajar os docentes sobre o que e de que forma devem ensinar.
Cá para nós, existe mesmo esse risco? Não seria mera retórica do dramaturgo, afeito a dramatizar as coisas? No médio prazo, talvez não haja esse perigo. Notem bem, afirmei “talvez”. Mas se as coisas continuarem, como estão... Não quero nem pensar!
Stoppard ressaltou, em determinado trecho do seu discurso: “Não há mais tanta demanda pela escrita como quando eu tinha idade para ser aluno, ou mesmo a idade de seus professores”. No seu entender (e no meu), “as crianças vivem em um mundo dominado pela tecnologia, onde a imagem em movimento é mais importante que o impresso”. Exagero de Stoppard? Claro que não! Basta observar o que ocorre ao nosso redor para concluir que o alerta é não apenas válido, mas impõe.
Não sou um sujeito conservador, no significado pejorativo do termo, que sinta comichão face a tudo o que signifique avanço. Não apenas aceito a “modernidade”, no seu melhor aspecto, como batalho por ela. Mas entendo que para aceitá-la e lutar para que se imponha não significa abrir mão da tradição. Creio que o mais sábio é usufruir de ambos. Ou seja, ser moderno, sim, mas sem jogar na lata de lixo idéias, conceitos, comportamentos e ações tradicionais, que ainda sejam válidos e úteis. Uma coisa não exclui a outra. Não se trata, pois, de “excluir”, mas de somar.
Sou, pois, favorabilíssimo às novas tecnologias, as que tornam, em t6odos os aspectos, a nossa vida mais fácil e melhor. Como poderia não ser? Como poderia abrir mão do computador, do IPad, do celular e de tantos outros equipamentos que já se incorporaram à minha rotina diária?! Não poderia!
O que condeno, todavia, é o apressado (e para mim estúpido) processo de “substituição”, sem nem ao menos se atentar se o que está sendo substituído é útil, prático e necessário ou não. Que o livro se modernize, ganhe plataforma eletrônica, seja acessível no computador, nos tablets e em outros aparelhos cada vez mais avançados, considero um progresso e torço para que isso se acelere cada vez mais. Mas que os textos, as idéias e emoções expressados por palavras sejam substituídos por audiovisuais, é algo a que me oponho e me oporei de todas as formas.
Não é, pois, a “modernização” do livro que incomoda Stoppard (e a mim). É a sua supressão, pura e simples, como se ameaça fazer, posto que não deliberadamente. O que pode, à primeira vista, parecer “modernidade”, tende a se transformar, se não forem coibidos exageros do tipo, em terrível atraso.
Já que citei um dos dramaturgos mais badalados da atualidade, convém dar uma palhinha sobre quem ele é. Tom Stoppard, além de escritor de peças teatrais premiadíssimas e encenadas nos melhores palcos, mundo afora, já escreveu roteiros para o cinema, a televisão e o rádio. Provavelmente, é mais conhecido no Brasil pela co-autoria (junto com Mark Norman), de “Shakespeare apaixonado”. Esse filme, rodado em 1998, fez “furor” no mundo todo e conquistou sete estatuetas do Oscar. Entre elas, incluem-se as de melhor filme e melhor roteiro.
Tom Stoppard nasceu em 3 de julho de 1937 na então Checoslováquia. Quando tinha, apenas, um ano, sua pátria foi invadida por tropas nazistas. Um ano depois, sua família mudou-se para Singapura, na vã ilusão de voltar a levar uma vida pacata e pacífica. Naquele período turbulento da sua infância, porém, isso era impossível. Não tardou para esse minúsculo país asiático também ser invadido, mas pelos japoneses. Por conta desse fato, foi parar na Índia, então colônia britânica. Ali, recebeu educação nos mais rígidos padrões ingleses. Mas não completou os estudos. Aos 17 anos, largou a escola e foi trabalhar como jornalista. E findou por envolver-se com as artes, notadamente com o teatro, o que viria a determinar sua vida, seu rumo e sua maneira de pensar e de agir.
É autor de pelo menos 25 peças teatrais, a última das quais é “Rock’n roll”, recentemente, há questão de meses, lançada no Brasil. É tido e havido como um dos melhores e mais celebrados dramaturgos vivos, continuando a ser requisitado e bastante ativo, a despeito de já contar com 74 anos de idade. Ademais, não foi por acaso que, sendo estrangeiro, embora naturalizado, e vivendo em um país com rígidas tradições, como a Grã-Bretanha, foi sagrado “sir” pela rainha Elizabeth II.
Esse título é dado somente a quem domine determinado conhecimento ou tenha certa aptidão em que seja considerado “excelente”. Entre os que receberam esse selo oficial de qualidade pode-se citar casos extremos como o do físico Isaac Newton e do criador do imortal Carlitos, Charles Chaplin.
Cabe-nos a tarefa de preservação dessa fundamental ferramenta de instrução e de difusão de arte e de cultura, que é o livro. Como? Estimulando notadamente as crianças a lerem, para que formem esse saudabilíssimo hábito e o transmitam aos seus filhos. E que estes façam o mesmo com sua descendência e assim, sucessivamente, numa corrente sem fim. Acabar com o livro?! Deus que me livre! Seria o colapso da civilização!
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