Tuesday, June 14, 2011







Educação na TV


Pedro J. Bondaczuk


O Brasil prepara-se para iniciar, no próximo ano, um dos projetos educativos mais arrojados do mundo, com o lançamento de dois satélites domésticos para comunicações. Um dos objetivos desse enorme investimento é utilizar a televisão, veículo com maior penetração em todo o território nacional, para desenvolver programas de alfabetização e de ensino em geral.

Muito se tem falado a respeito do uso da TV para educar o nosso povo, tão carente de educação, e as emissoras (empresas particulares, que obtêm os canais a título de concessão, passiva de cassação a qualquer momento) são acusadas de não tomarem iniciativas nesse sentido.

Há vários aspectos a considerar nessa questão e procuraremos enumerar apenas alguns deles. Em primeiro lugar, a função de educar cabe ao Estado, que conta com um ministério, criado para esse fim, com destinação de verbas no orçamento da União. Tem a obrigatoriedade de construir escolas, provê-las de condições materiais, estabelecer uma política educacional e cobrar a sua exata execução.

As emissoras podem, eventualmente, através de convênios, ser utilizadas como suportes em programas educativos, mas teriam que ser remuneradas para isso, pois sendo empresas com fins lucrativos, contando com enormes despesas e um mercado publicitário contraído, além de uma grande competição (afinal, são sete redes existentes, com uma tropeçando na outra, na luta pela indispensável publicidade que lhe garanta o faturamento), arcam com custos proibitivos, que têm de cobrir.

Mas o aspecto principal para a criação dessa utopia, defendida por muitos que vivem fora da realidade, que é a "escola permanente em casa", é outro. Por exemplo, a eficácia. Pergunto a você, leitor esclarecido: por maior que seja a sua vontade de aprender, você manteria o seu receptor ligado o tempo todo, se a programação de todos os canais do País fosse inteiramente constituída de aulas de português, de matemática, de física, etc? Claro que não!

Aliás, no circuito comercial das TVs nós já temos programas educativos utilíssimos. Os Telecursos de 1º e 2º Grau, apresentados pela Rede Globo e pela Rádio e Televisão Cultura, já deram chances a milhares de pessoas para obter ascensão cultural, profissional e, por conseqüência, social. Algumas delas, inclusive, após concluírem esses cursos, já estão em universidades, com novos e promissores horizontes descortinados à sua frente.

Digamos que fosse viável, por exemplo, a "utopia" de muitos sonhadores, para a criação de uma grande "universidade doméstica". Ela, fatalmente, formaria grande leva de profissionais, mormente na área das Ciências Humanas, que é a mais apropriada para a utilização da TV. Essa socialização do ensino criaria novo, e grande, problema para os formandos: onde encontrar mercado para o exercício da profissão, se os que se formam por meios convencionais, nos vários cursos superiores do País, já não conseguem colocação, tendo, na maior parte das vezes, que exercer funções muito aquém daquelas para as quais se prepararam com tamanho afinco e sacrifícios, para poder arrancar a própria subsistência e a de suas famílias?

Concordamos, plenamente, com a criação de um grande projeto educacional de âmbito nacional com o uso da televisão, mas desde que dimensionado para faixa especial, criada exclusivamente para esse fim de que não interfira com os canais comerciais que, a rigor, já vêm dando sua parcela de contribuição para ajudar a levar instrução aos mais distantes rincões deste País de dimensões continentais.

Por exemplo, apenas na programação de hoje, temos os seguintes horários dedicados a algum tipo de programa educativo:

a) Na Rede Globo, às 6h25, o Telecurso 2º Grau e às 6h40, o Telecurso 1º Grau;

b) Na Record, às 7h30, a TV Educativa:

c) Na TVS, às 7h, Ginástica;

d) Na TV Manchete, às 12h05, a Programação Educativa;

e) Na Rádio e Televisão Cultura, às 9h45, o Telecurso 2º Grau e às 10h, o Telecurso 1º Grau;

f) Na TV Gazeta, canal 11, às 10h50, Tempo de Atualização.

Isso, apenas hoje. Sem contar com programas não especificamente culturais, mas que veiculam informações indispensáveis ao bom relacionamento entre as pessoas.

Aos sábados, por exemplo, a Rede Globo tem todo um projeto educativo ao dispor do telespectador, que vai desde as 7 horas até quase às 11h, começando com os dois Telecursos, seguindo com o Jornal do Telecurso, completando com o novo Brasil, Corpo e Alma e encerrando com o altamente útil Globo Shell Profissões.

Aos domingos, a emissora apresenta o Globo Rural e o Concertos para a Juventude, enquanto a Rede Bandeirantes exibe os excelentes "Jornal da Terra" e "O Indicador Rural". Tudo isso implica em grandes investimentos para essas empresas, em salários (para equipes de produtores, redatores, apresentadores, técnicos de som, etc.), deslocamentos e centenas de outras despesas, difíceis de serem lembradas por quem não tem a obrigação de arcar com elas.

Vimos, neste espaço, criticando, até com certa aspereza, os erros cometidos na programação das emissoras comerciais. Mas para que as críticas tenham o sentido que devem ter (o de contribuir, posto que com ínfima parcela) para uma televisão de melhor qualidade no País, é necessário que se mencionem, também, seus acertos. E que se valorize o esforço dos que, mesmo errando muitas vezes, estão imbuídos dos melhores propósitos.

Muitos, talvez, questionem as causas dessa obsessiva preocupação dos críticos com nossas TVs, que afinal, são empresas particulares. Para estes, respondemos com uma observação de Marshall McLuhan, considerado o "papa das comunicações" da atualidade: "Não há passageiros na espaçonave Terra. Somos todos tripulação!" Tudo é importante! E tudo é responsabilidade de todos!!

(Comentário publicado na página 16, editoria Artes, do Correio Popular, em 3 de fevereiro de 1984).

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: