Crise habitacional
Pedro J. Bondaczuk
A questão da moradia, no Brasil, ao lado das deficiências da saúde pública (setor virtualmente falido), da inadequação do sistema de ensino e da insegurança dos cidadãos face à violência urbana, entre outros, é um dos principais problemas que o novo presidente, Fernando Henrique Cardoso, terá que enfrentar em sua gestão, se pretender cumprir sua promessa de campanha, de promover o resgate da dívida social. O déficit de casas, somente para a população de baixa renda, já anda pelos 10 milhões de unidades. Cada vez mais, milhões de pessoas ficam sem nenhuma opção e passam a ter, como derradeiro e desesperado recurso, apenas as ruas das grandes e médias cidades brasileiras para viver. Ou vegetar?
Na falta de uma residência própria, por tosca e simples que fosse, para se abrigar, a opção sempre foi o aluguel. Foi. Não é mais. Alugar um imóvel torna-se, crescentemente, algo vedado à maioria dos brasileiros. E não apenas por falta de unidades habitacionais, mas também, e principalmente, por causa dos preços. Na verdade, salvo exceções, estes não são caros. As pessoas é que ganham pouco. Hoje, alugar uma casa de padrão razoável consome mais da metade da renda dos que ganham vinte salários mínimos e estes são menos de 4% da população. É, portanto, cada vez mais inacessível não somente para a faixa de baixa renda, mas até para a classe média.
O jornal "O Estado de São Paulo" publicou, no dia 29 de dezembro de 1994, matéria a este respeito em que revela, mediante dados fornecidos pelo presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci), Roberto Capuano, que o aluguel de um barraco, numa favela paulistana, oscila entre R$ 30 (de madeira, no Jardim Pereira) e R$ 170 (na Vila Liviero). A média é de um salário mínimo (R$ 85,em janeiro, com o abono de R$ 15 concedido pelo governo, depois de muitas negociações e grande oposição de alguns setores). Ou seja, se algo não for feito, e com urgência, o brasileiro não conseguirá ser sequer um favelado. Será um "homeless" (sem-teto) mesmo, sem um endereço para fornecer e um telhado para lhe cobrir a cabeça.
Capuano faz, na referida matéria, um alerta, que parece alarmista, mas não é. Basta que se raciocine dentro da lógica. Diz: "Pode parecer uma previsão exagerada, mas continuando assim, a classe média vai começar a disputar as favelas, porque os preços dos aluguéis estão proibitivos e essas pessoas continuarão sem poder comprar a casa própria". O Censo de 1991, recém-divulgado, mostrou que a população brasileira se multiplicou por oito, em 91 anos, mas o número de moradias mal triplicou. Daí esse déficit monumental. Para complicar, as estatísticas comprovam que, em apenas uma década, o rendimento médio dos chefes de família teve queda de 24%.
Somados os dois fatores, só podia dar no que está dando. O problema é muito mais grave e urgente do que as autoridades ousam admitir. O Creci elaborou um projeto que tende a minorar essa crise. Encaminhou, a Fernando Henrique Cardoso, uma proposta de aluguel subsidiado, inspirada num plano de locação social adotado na França. Pela medida, o locatário despende um máximo de 25% de sua renda para alugar um imóvel e ainda assim o locador recebe o valor de mercado, de 0,5% do que foi investido na construção. A diferença é arcada pelo governo, com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, da poupança e dos fundos de pensão. Está aí uma proposta digna de análise. Só que a decisão não pode tardar. O projeto não pode ficar perdido na gaveta de algum burocrata, diante da gravidade da atual situação.
(Artigo publicado na página 2, de Opinião, do Correio Popular em 3 de janeiro de 1995)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
A questão da moradia, no Brasil, ao lado das deficiências da saúde pública (setor virtualmente falido), da inadequação do sistema de ensino e da insegurança dos cidadãos face à violência urbana, entre outros, é um dos principais problemas que o novo presidente, Fernando Henrique Cardoso, terá que enfrentar em sua gestão, se pretender cumprir sua promessa de campanha, de promover o resgate da dívida social. O déficit de casas, somente para a população de baixa renda, já anda pelos 10 milhões de unidades. Cada vez mais, milhões de pessoas ficam sem nenhuma opção e passam a ter, como derradeiro e desesperado recurso, apenas as ruas das grandes e médias cidades brasileiras para viver. Ou vegetar?
Na falta de uma residência própria, por tosca e simples que fosse, para se abrigar, a opção sempre foi o aluguel. Foi. Não é mais. Alugar um imóvel torna-se, crescentemente, algo vedado à maioria dos brasileiros. E não apenas por falta de unidades habitacionais, mas também, e principalmente, por causa dos preços. Na verdade, salvo exceções, estes não são caros. As pessoas é que ganham pouco. Hoje, alugar uma casa de padrão razoável consome mais da metade da renda dos que ganham vinte salários mínimos e estes são menos de 4% da população. É, portanto, cada vez mais inacessível não somente para a faixa de baixa renda, mas até para a classe média.
O jornal "O Estado de São Paulo" publicou, no dia 29 de dezembro de 1994, matéria a este respeito em que revela, mediante dados fornecidos pelo presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci), Roberto Capuano, que o aluguel de um barraco, numa favela paulistana, oscila entre R$ 30 (de madeira, no Jardim Pereira) e R$ 170 (na Vila Liviero). A média é de um salário mínimo (R$ 85,em janeiro, com o abono de R$ 15 concedido pelo governo, depois de muitas negociações e grande oposição de alguns setores). Ou seja, se algo não for feito, e com urgência, o brasileiro não conseguirá ser sequer um favelado. Será um "homeless" (sem-teto) mesmo, sem um endereço para fornecer e um telhado para lhe cobrir a cabeça.
Capuano faz, na referida matéria, um alerta, que parece alarmista, mas não é. Basta que se raciocine dentro da lógica. Diz: "Pode parecer uma previsão exagerada, mas continuando assim, a classe média vai começar a disputar as favelas, porque os preços dos aluguéis estão proibitivos e essas pessoas continuarão sem poder comprar a casa própria". O Censo de 1991, recém-divulgado, mostrou que a população brasileira se multiplicou por oito, em 91 anos, mas o número de moradias mal triplicou. Daí esse déficit monumental. Para complicar, as estatísticas comprovam que, em apenas uma década, o rendimento médio dos chefes de família teve queda de 24%.
Somados os dois fatores, só podia dar no que está dando. O problema é muito mais grave e urgente do que as autoridades ousam admitir. O Creci elaborou um projeto que tende a minorar essa crise. Encaminhou, a Fernando Henrique Cardoso, uma proposta de aluguel subsidiado, inspirada num plano de locação social adotado na França. Pela medida, o locatário despende um máximo de 25% de sua renda para alugar um imóvel e ainda assim o locador recebe o valor de mercado, de 0,5% do que foi investido na construção. A diferença é arcada pelo governo, com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, da poupança e dos fundos de pensão. Está aí uma proposta digna de análise. Só que a decisão não pode tardar. O projeto não pode ficar perdido na gaveta de algum burocrata, diante da gravidade da atual situação.
(Artigo publicado na página 2, de Opinião, do Correio Popular em 3 de janeiro de 1995)
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