Um País doente
Pedro J. Bondaczuk
A área de saúde nunca mereceu de nossas autoridades governamentais a devida atenção que um setor de tamanha importância deveria ter. O próprio ministro Alceni Guerra admitiu isso, embora garanta que a partir de março de 1991 conseguirá mudar esse quadro negativo.
No fim de semana, dois episódios diferentes mostraram como o cidadão é tratado com descaso por profissionais que vêem na Medicina não aquele sacerdócio que ela deveria ser, e que juraram exercer em nome de Hipócrates, mas somente uma fonte de lucros. O ser humano acaba sendo encarado não na sua real condição, mas somente como um "caso", que pode interessar ou não os mercadores do atendimento médico.
Um dos incidentes foi o do bebê nascido prematuramente numa maternidade de Brasília, filho de um funcionário da embaixada saudita, que recebeu uma conta astronômica, em torno de Cr$ 7 milhões, visivelmente exorbitante.
O outro foi o da esposa do jornalista Celso Russomano, que perdeu a vida por não ter sido atendida a tempo, mesmo tendo passado quatro horas no hospital. Coisas desse tipo precisam acabar. Sequer acreditamos que elas ocorram como frutos de má fé.
Não é segredo para ninguém que o setor de saúde do País, público ou privado, luta com sérias dificuldades, com imensas carências, frutos do descaso e da má gestão dos recursos existentes em governos anteriores. Mas quem lida com vidas humanas precisa tem em mente quais são as prioridades em sua atividade.
Os dois episódios, lamentáveis, não são os únicos e nem os dois hospitais estão sozinhos no descaso com que tratam os pacientes. O ministro Alceni fez visitas, por exemplo, a vários estabelecimentos hospitalares no Rio de Janeiro, recentemente, e presenciou, com o testemunho da imprensa, cenas dantescas.
Viu pessoas doentes esquecidas em macas nos corredores, por falta de leitos. Constatou ambulatórios superlotados, com gente que precisava de atendimento de emergência tendo que esperar horas, sofrendo dores, passando pelo terror que um problema de saúde causa em todos nós, agravando, com isso, o seu estado. Isto precisa acabar.
Até aqui, o brasileiro --- tão injustiçado por algumas análises sociológicas apressadas, quando não mal intencionadas, que vêem nele um típico "Macunaíma" --- tem se mostrado um herói. Faminto, desnutrido, desdentado, ainda assim reúne, não se sabe de onde, forças para trabalhar, ser produtivo, gerar riquezas.
Já é hora do imposto que o cidadão paga com tamanho sacrifício reverter a seu favor na forma do benefício que dinheiro algum do mundo pode pagar: a sua saúde. Nenhum país consegue ser forte e poderoso se tiver um povo fraco e doente.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 30 de outubro de 1990).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
A área de saúde nunca mereceu de nossas autoridades governamentais a devida atenção que um setor de tamanha importância deveria ter. O próprio ministro Alceni Guerra admitiu isso, embora garanta que a partir de março de 1991 conseguirá mudar esse quadro negativo.
No fim de semana, dois episódios diferentes mostraram como o cidadão é tratado com descaso por profissionais que vêem na Medicina não aquele sacerdócio que ela deveria ser, e que juraram exercer em nome de Hipócrates, mas somente uma fonte de lucros. O ser humano acaba sendo encarado não na sua real condição, mas somente como um "caso", que pode interessar ou não os mercadores do atendimento médico.
Um dos incidentes foi o do bebê nascido prematuramente numa maternidade de Brasília, filho de um funcionário da embaixada saudita, que recebeu uma conta astronômica, em torno de Cr$ 7 milhões, visivelmente exorbitante.
O outro foi o da esposa do jornalista Celso Russomano, que perdeu a vida por não ter sido atendida a tempo, mesmo tendo passado quatro horas no hospital. Coisas desse tipo precisam acabar. Sequer acreditamos que elas ocorram como frutos de má fé.
Não é segredo para ninguém que o setor de saúde do País, público ou privado, luta com sérias dificuldades, com imensas carências, frutos do descaso e da má gestão dos recursos existentes em governos anteriores. Mas quem lida com vidas humanas precisa tem em mente quais são as prioridades em sua atividade.
Os dois episódios, lamentáveis, não são os únicos e nem os dois hospitais estão sozinhos no descaso com que tratam os pacientes. O ministro Alceni fez visitas, por exemplo, a vários estabelecimentos hospitalares no Rio de Janeiro, recentemente, e presenciou, com o testemunho da imprensa, cenas dantescas.
Viu pessoas doentes esquecidas em macas nos corredores, por falta de leitos. Constatou ambulatórios superlotados, com gente que precisava de atendimento de emergência tendo que esperar horas, sofrendo dores, passando pelo terror que um problema de saúde causa em todos nós, agravando, com isso, o seu estado. Isto precisa acabar.
Até aqui, o brasileiro --- tão injustiçado por algumas análises sociológicas apressadas, quando não mal intencionadas, que vêem nele um típico "Macunaíma" --- tem se mostrado um herói. Faminto, desnutrido, desdentado, ainda assim reúne, não se sabe de onde, forças para trabalhar, ser produtivo, gerar riquezas.
Já é hora do imposto que o cidadão paga com tamanho sacrifício reverter a seu favor na forma do benefício que dinheiro algum do mundo pode pagar: a sua saúde. Nenhum país consegue ser forte e poderoso se tiver um povo fraco e doente.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 30 de outubro de 1990).
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