Consciência ecológica
Pedro J. Bondaczuk
A preservação do meio ambiente é tarefa de todos e não apenas de meia dúzia dos que se autodenominam (ou são denominados) de “ambientalistas”. Compete, pois, também aos escritores tratarem do tema, pondo a força de seu talento comunicativo a serviço de uma causa que se faz a cada dia mais premente, mais urgente, mais momentânea face às dramáticas (e nocivas) mudanças climáticas que já se observam em várias partes da Terra. Sei que na maior parte do tempo isso é o mesmo que malhar em ferro frio. Poucos, ou raros, lhes darão ouvidos. Mas nossa obrigação é a de tentar, tentar e tentar até que, quem sabe, haja um surto coletivo de lucidez.
Hendrick Willelm Von Loon nos fornece excelente justificativa para assumir essa tarefa de “arautos do preservacionismo”. Escreveu, certa ocasião: “Somos todos companheiros de viagem no mesmo planeta, e somos todos igualmente responsáveis pela felicidade e bem-estar no mundo em que vivemos”. E estava errado? Obviamente que não! Aliás, o significado da palavra “planeta” é exatamente “viajante”. Ou, para ser mais específico, é o de uma espécie de nave espacial que singra o imenso (infinito?) oceano do espaço, composto não de água, mas de vácuo, ou, de acordo com nova teoria dos físicos, de “matéria negra”.
Não me peçam explicações a respeito. Não saberei dar! Não passo de mero “escrevinhador”, ou de rabiscador de idéias, posto que curioso por todos os assuntos, tanto dos que entendo, quanto dos que tento entender. Meu papel é o de provocar a inteligência e a imaginação alheias e de induzir as pessoas a pensarem. Não lido com certezas, mas com dúvidas e com possibilidades.
Mas, a propósito da depredação do meio ambiente por parte do homem, constato, ou concluo, que ninguém faz isso de forma deliberada, com a intenção específica de destruir em minutos o que a natureza levou milhões, bilhões de anos para criar. Age assim de forma inconsciente, achando que a mata que derrubou, por exemplo, para criar um pasto, não fará falta ao Planeta. Claro que fará! Ou que a queimada que fez não trará nenhum prejuízo ao solo e que até pode torná-lo mais fértil. Quem pensa assim está enganado, obviamente, mas não convencido do engano.
Monteiro Lobato escreveu um artigo a propósito, intitulado “Uma velha praga”, publicado no jornal “O Estado de São Paulo”, em 12 de novembro de 1944. Em determinado trecho do seu arguto texto opinativo, o genial escritor acentua: “Preocupa a toda gente o conhecer em quanto fica, em francos e cêntimos, um soldado em guerra e por dia; mas quem cuida de calcular os prejuízos de toda a ordem, provindos de uma queima destas? – em velhas camadas de humus destruídas; em sais preciosos que, em breve, as enxurradas deitarão fora, rio abaixo, vai ao oceano; no rejuvenescimento florestal da terra paralisado e retrogradado; na destruição das aves silvestres e possível advento conseqüente de pragas insetiformes; na alteração para pior do clima, pela agravação crescente das secas; em vedos, cercas e aramados perdidos; em gado morto ou depreciado pela falta de pastos; em mil e uma particularidades que dizem respeito a esta ou àquela zona, e, dentro dela, a esta ou aquela situação agrícola”.
Monteiro Lobato referia-se à “praga” das queimadas, procedimento, aliás, ainda muito comum Brasil afora (e provavelmente em outras tantas partes do mundo), a despeito do que se conhece hoje e das campanhas e alertas para que as pessoas não recorram a esse procedimento. Além dos prejuízos citados pelo escritor, há a poluição da atmosfera, causada pela fumaça da queima de madeira, de capim verde ou, o que é muito mais comum, notadamente em vastas áreas do Nordeste brasileiro e do Estado de São Paulo, de cana, antes do início do seu corte.
Em 1º de janeiro de 1974, a Rede Globo exibiu um “Globo Repórter” especial – e então o programa já era tradicional e um dos campeões de audiência na telinha – em que foram entrevistadas personalidades de diversas áreas de conhecimento, cientistas, sociólogos, filósofos, historiadores etc.. Elas foram instadas para que fizessem um diagnóstico o mais realista possível da situação mundial na ocasião. E que extrapolassem, tentando prever o que poderia acontecer caso as coisas não mudassem para melhor e, dessa forma, sugerissem as providências que deveriam ser adotadas.
Tive o capricho de gravar esse programa (em áudio, pois então o videotape não era acessível ao público). E mais, vislumbrando o caráter histórico das entrevistas, decalquei-as, todas, em textos, que tenho ainda hoje arquivados na memória do meu computador. Não me enganei quanto à sua importância. Entre essas entrevistas, por exemplo, consta, entre umas dez ou doze outras, a do historiador britânico Arnold Toynbee. Mas não é a dele que trago à baila hoje. É a de Marshall McLuhan. E o badalado e controvertido pensador canadense disse, em determinado momento, textualmente, o seguinte:
“Um velho ditado afirma que a fonte de esperança é eterna em nosso peito. O homem nunca é abençoado, mas sempre espera ser. A esperança parece estar sempre à frente. E o homem tem o mau hábito de estar constantemente olhando pelo retrovisor. E o que ele vê é o que está vindo por trás, como um enorme caminhão na estrada. Talvez não seja a imagem perfeita da esperança, porque eu, pessoalmente, como religioso que sou, acho que a minha não está neste mundo”.
E prosseguiu: “Sob o efeito da eletricidade, o homem transforma-se numa espécie de espírito sem corpo. Estamos no ar. Através do telefone, por exemplo, estamos, ao mesmo tempo, em Nova York, Tóquio e aqui (Toronto). Na era da eletricidade, o homem tornou-se uma espécie de espírito etéreo. Passou a ser informação e está em todos os lugares. Ele é parte do novo ambiente. E este novo ambiente da informação inclui a gente que habita o mundo”.
E concluiu o seguinte, nesta parte de tão preciosa entrevista: “Quando no dia 17 de outubro de 1957 o Sputnik foi colocado em órbita da Terra, isto pôs o Planeta dentro de um ambiente conquistado pelo homem. Naquele momento, a Terra tornou-se uma responsabilidade humana programada, tornando-se "ecológica". Com a chegada do Sputnik, o simples planeta deixou de existir. Tornou-se o Planeta Terra. Uma espécie de Terra espacial. Uma nave espacial onde toda a humanidade é a tripulação”. McLuhan já havia expressado o mesmo raciocínio, com outras palavras, em seus livros. Mas este depoimento foi feito de viva voz.
Questiono: o homem tem capacidade para zelar pelo seu “lar cósmico”? Entendo que sim! Sua capacidade, queiram ou não, está muito além da imaginação. No prefácio de um livro de astronomia que li há algum tempo, o astrônomo espanhol, Antonio Paluzie Burrel, escreveu (com o que concordo plenamente, por expressar a caráter o que penso a propósito): “Maravilhoso e singular contraste. No homem que povoa a Terra, nesse pigmeu de absurda e incompreensível pequenez, vibra um espírito gigantesco, capaz de igualar-se à imensidade do universo real, posto que tem sido capaz de descobri-lo e compreendê-lo. E outro contraste, revelador, é entre a pequenez física da matéria que forma o homem e a grandeza espiritual de sua alma, inteligente, soberana e imensa”.
Essas palavras complementam uma constatação do escritor francês, André Malraux, em um artigo (ou ensaio, não me lembro bem), em que afirmou: “O maior mistério não é que estejamos jogados ao acaso entre a profusão da matéria e a dos astros: é que, nessa prisão, tiremos de nós mesmos imagens bastante poderosas para negar o nosso nada”. E não é?!
Por isso, apesar de parecer que pregamos no deserto, ao chamarmos as pessoas à racionalidade e bom-senso e ao pedir-lhes (na verdade, exigir-lhes) cuidados extremos com o meio ambiente, temos, sim, possibilidades de sucesso. Pequenas? Talvez. Mas reais. Entendo que “ainda” há esperança. Porque, como o próprio Malraux observou: “Alguma coisa de eterno permanece no homem...alguma coisa que chamarei sua parte divina”.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
A preservação do meio ambiente é tarefa de todos e não apenas de meia dúzia dos que se autodenominam (ou são denominados) de “ambientalistas”. Compete, pois, também aos escritores tratarem do tema, pondo a força de seu talento comunicativo a serviço de uma causa que se faz a cada dia mais premente, mais urgente, mais momentânea face às dramáticas (e nocivas) mudanças climáticas que já se observam em várias partes da Terra. Sei que na maior parte do tempo isso é o mesmo que malhar em ferro frio. Poucos, ou raros, lhes darão ouvidos. Mas nossa obrigação é a de tentar, tentar e tentar até que, quem sabe, haja um surto coletivo de lucidez.
Hendrick Willelm Von Loon nos fornece excelente justificativa para assumir essa tarefa de “arautos do preservacionismo”. Escreveu, certa ocasião: “Somos todos companheiros de viagem no mesmo planeta, e somos todos igualmente responsáveis pela felicidade e bem-estar no mundo em que vivemos”. E estava errado? Obviamente que não! Aliás, o significado da palavra “planeta” é exatamente “viajante”. Ou, para ser mais específico, é o de uma espécie de nave espacial que singra o imenso (infinito?) oceano do espaço, composto não de água, mas de vácuo, ou, de acordo com nova teoria dos físicos, de “matéria negra”.
Não me peçam explicações a respeito. Não saberei dar! Não passo de mero “escrevinhador”, ou de rabiscador de idéias, posto que curioso por todos os assuntos, tanto dos que entendo, quanto dos que tento entender. Meu papel é o de provocar a inteligência e a imaginação alheias e de induzir as pessoas a pensarem. Não lido com certezas, mas com dúvidas e com possibilidades.
Mas, a propósito da depredação do meio ambiente por parte do homem, constato, ou concluo, que ninguém faz isso de forma deliberada, com a intenção específica de destruir em minutos o que a natureza levou milhões, bilhões de anos para criar. Age assim de forma inconsciente, achando que a mata que derrubou, por exemplo, para criar um pasto, não fará falta ao Planeta. Claro que fará! Ou que a queimada que fez não trará nenhum prejuízo ao solo e que até pode torná-lo mais fértil. Quem pensa assim está enganado, obviamente, mas não convencido do engano.
Monteiro Lobato escreveu um artigo a propósito, intitulado “Uma velha praga”, publicado no jornal “O Estado de São Paulo”, em 12 de novembro de 1944. Em determinado trecho do seu arguto texto opinativo, o genial escritor acentua: “Preocupa a toda gente o conhecer em quanto fica, em francos e cêntimos, um soldado em guerra e por dia; mas quem cuida de calcular os prejuízos de toda a ordem, provindos de uma queima destas? – em velhas camadas de humus destruídas; em sais preciosos que, em breve, as enxurradas deitarão fora, rio abaixo, vai ao oceano; no rejuvenescimento florestal da terra paralisado e retrogradado; na destruição das aves silvestres e possível advento conseqüente de pragas insetiformes; na alteração para pior do clima, pela agravação crescente das secas; em vedos, cercas e aramados perdidos; em gado morto ou depreciado pela falta de pastos; em mil e uma particularidades que dizem respeito a esta ou àquela zona, e, dentro dela, a esta ou aquela situação agrícola”.
Monteiro Lobato referia-se à “praga” das queimadas, procedimento, aliás, ainda muito comum Brasil afora (e provavelmente em outras tantas partes do mundo), a despeito do que se conhece hoje e das campanhas e alertas para que as pessoas não recorram a esse procedimento. Além dos prejuízos citados pelo escritor, há a poluição da atmosfera, causada pela fumaça da queima de madeira, de capim verde ou, o que é muito mais comum, notadamente em vastas áreas do Nordeste brasileiro e do Estado de São Paulo, de cana, antes do início do seu corte.
Em 1º de janeiro de 1974, a Rede Globo exibiu um “Globo Repórter” especial – e então o programa já era tradicional e um dos campeões de audiência na telinha – em que foram entrevistadas personalidades de diversas áreas de conhecimento, cientistas, sociólogos, filósofos, historiadores etc.. Elas foram instadas para que fizessem um diagnóstico o mais realista possível da situação mundial na ocasião. E que extrapolassem, tentando prever o que poderia acontecer caso as coisas não mudassem para melhor e, dessa forma, sugerissem as providências que deveriam ser adotadas.
Tive o capricho de gravar esse programa (em áudio, pois então o videotape não era acessível ao público). E mais, vislumbrando o caráter histórico das entrevistas, decalquei-as, todas, em textos, que tenho ainda hoje arquivados na memória do meu computador. Não me enganei quanto à sua importância. Entre essas entrevistas, por exemplo, consta, entre umas dez ou doze outras, a do historiador britânico Arnold Toynbee. Mas não é a dele que trago à baila hoje. É a de Marshall McLuhan. E o badalado e controvertido pensador canadense disse, em determinado momento, textualmente, o seguinte:
“Um velho ditado afirma que a fonte de esperança é eterna em nosso peito. O homem nunca é abençoado, mas sempre espera ser. A esperança parece estar sempre à frente. E o homem tem o mau hábito de estar constantemente olhando pelo retrovisor. E o que ele vê é o que está vindo por trás, como um enorme caminhão na estrada. Talvez não seja a imagem perfeita da esperança, porque eu, pessoalmente, como religioso que sou, acho que a minha não está neste mundo”.
E prosseguiu: “Sob o efeito da eletricidade, o homem transforma-se numa espécie de espírito sem corpo. Estamos no ar. Através do telefone, por exemplo, estamos, ao mesmo tempo, em Nova York, Tóquio e aqui (Toronto). Na era da eletricidade, o homem tornou-se uma espécie de espírito etéreo. Passou a ser informação e está em todos os lugares. Ele é parte do novo ambiente. E este novo ambiente da informação inclui a gente que habita o mundo”.
E concluiu o seguinte, nesta parte de tão preciosa entrevista: “Quando no dia 17 de outubro de 1957 o Sputnik foi colocado em órbita da Terra, isto pôs o Planeta dentro de um ambiente conquistado pelo homem. Naquele momento, a Terra tornou-se uma responsabilidade humana programada, tornando-se "ecológica". Com a chegada do Sputnik, o simples planeta deixou de existir. Tornou-se o Planeta Terra. Uma espécie de Terra espacial. Uma nave espacial onde toda a humanidade é a tripulação”. McLuhan já havia expressado o mesmo raciocínio, com outras palavras, em seus livros. Mas este depoimento foi feito de viva voz.
Questiono: o homem tem capacidade para zelar pelo seu “lar cósmico”? Entendo que sim! Sua capacidade, queiram ou não, está muito além da imaginação. No prefácio de um livro de astronomia que li há algum tempo, o astrônomo espanhol, Antonio Paluzie Burrel, escreveu (com o que concordo plenamente, por expressar a caráter o que penso a propósito): “Maravilhoso e singular contraste. No homem que povoa a Terra, nesse pigmeu de absurda e incompreensível pequenez, vibra um espírito gigantesco, capaz de igualar-se à imensidade do universo real, posto que tem sido capaz de descobri-lo e compreendê-lo. E outro contraste, revelador, é entre a pequenez física da matéria que forma o homem e a grandeza espiritual de sua alma, inteligente, soberana e imensa”.
Essas palavras complementam uma constatação do escritor francês, André Malraux, em um artigo (ou ensaio, não me lembro bem), em que afirmou: “O maior mistério não é que estejamos jogados ao acaso entre a profusão da matéria e a dos astros: é que, nessa prisão, tiremos de nós mesmos imagens bastante poderosas para negar o nosso nada”. E não é?!
Por isso, apesar de parecer que pregamos no deserto, ao chamarmos as pessoas à racionalidade e bom-senso e ao pedir-lhes (na verdade, exigir-lhes) cuidados extremos com o meio ambiente, temos, sim, possibilidades de sucesso. Pequenas? Talvez. Mas reais. Entendo que “ainda” há esperança. Porque, como o próprio Malraux observou: “Alguma coisa de eterno permanece no homem...alguma coisa que chamarei sua parte divina”.
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