Falcão que buscou a paz
Pedro J. Bondaczuk
O general Chaim Herzog, no livro "A Guerra do Yom Kippur", publicado em 1975, escreveu no prefácio uma espécie de profecia do que iria ocorrer no último sábado, em Tel Aviv, quando do assassinato do primeiro-ministro israelense, Yitzhak Rabin. Afirmou: "Nenhum povo no mundo anseia mais pela paz do que o povo de Israel, e, no entanto, nenhum se mostra mais preparado para o auto-sacrifício, caso haja necessidade". E ninguém ilustra melhor essa capacidade de sacrificar-se por uma causa do que o chefe de governo morto.
Rabin, tido como "falcão" em Israel e no Exterior por sua trajetória militar, como um dos oficiais que venceram a Guerra dos Seis Dias de 1967, (justamente quando os territórios que agora se tornam autônomos foram ocupados) transformou-se no líder que colocou em prática o processo de desmonte do "barril de pólvora" do Oriente Médio, que todos admitiam que era necessário, mas ninguém se dispunha a realizar. Há duas décadas, nem o mais otimista dos analistas ousaria afirmar que esse "sabra" (nascido em Israel) iria assumir tal tarefa. Seu retrospecto guerreiro não o credenciava a isso. Pois foi justamente ele que a assumiu, a partir do acordo secreto, firmado em Oslo, na Noruega, em 1993, com a OLP, que deflagrou o processo.
Mesmo quando Rabin, Shimon Peres e Yasser Arafat assinaram, em Washington, em 13 de setembro de 1994, o protocolo de intenções estabelecendo as diretrizes da autonomia, poucos acreditavam que esta saísse do papel. Havia quase meio século de ódio a ser superado. A sucessão de atentados terroristas praticados por fundamentalistas, parecia dar razão aos cépticos. O massacre de 29 muçulmanos, que oravam na mesquita da Tumba do Patriarca, em 25 de fevereiro de 1994, por parte do colono judeu Baruch Goldstein, confirmava a impossibilidade. Mas as negociações prosseguiram. Mais do que isso: deram resultado concreto, com o primeiro acordo prático, firmado no Cairo em 4 de maio de 1994, concedendo autonomia à Faixa de Gaza e à cidade de Jericó.
Em outubro de 1994, nova vitória da racionalidade. Israel e Jordânia encerraram 47 anos de hostilidades, firmando um histórico pacto de paz e cooperação. Mas o desafio maior estava por vir. Era a devolução de pelo menos parte da Cisjordânia ao controle palestino. Novas e penosas conversações foram realizadas. Avanços e recuos se verificaram. E os radicais dos dois lados, opositores do entendimento, sucederam-se em atentados. Só aumentaram a dimensão dos obstáculos e prometeram outros maiores, mais loucos, mais sangrentos, mais carregados de ódio. Em vão. Em 28 de setembro passado, em Washington, assinou-se outro acordo, ainda mais ousado do que o de maio de 1994. O que vai redundar da morte de Rabin? Para muitos, será o fim do processo. Para outros, a sua consolidação. Caso a racionalidade prevaleça, a paz na região será irreversível. E consolidada pelo "sacrifício" da vida desse ex-falcão, que o pragmatismo converteu em "pomba".
(Artigo publicado em 4 de junho de 1995, no suplemento especial sobre o assassinato de Yitzhak Rabin, no Correio Popular)
Pedro J. Bondaczuk
O general Chaim Herzog, no livro "A Guerra do Yom Kippur", publicado em 1975, escreveu no prefácio uma espécie de profecia do que iria ocorrer no último sábado, em Tel Aviv, quando do assassinato do primeiro-ministro israelense, Yitzhak Rabin. Afirmou: "Nenhum povo no mundo anseia mais pela paz do que o povo de Israel, e, no entanto, nenhum se mostra mais preparado para o auto-sacrifício, caso haja necessidade". E ninguém ilustra melhor essa capacidade de sacrificar-se por uma causa do que o chefe de governo morto.
Rabin, tido como "falcão" em Israel e no Exterior por sua trajetória militar, como um dos oficiais que venceram a Guerra dos Seis Dias de 1967, (justamente quando os territórios que agora se tornam autônomos foram ocupados) transformou-se no líder que colocou em prática o processo de desmonte do "barril de pólvora" do Oriente Médio, que todos admitiam que era necessário, mas ninguém se dispunha a realizar. Há duas décadas, nem o mais otimista dos analistas ousaria afirmar que esse "sabra" (nascido em Israel) iria assumir tal tarefa. Seu retrospecto guerreiro não o credenciava a isso. Pois foi justamente ele que a assumiu, a partir do acordo secreto, firmado em Oslo, na Noruega, em 1993, com a OLP, que deflagrou o processo.
Mesmo quando Rabin, Shimon Peres e Yasser Arafat assinaram, em Washington, em 13 de setembro de 1994, o protocolo de intenções estabelecendo as diretrizes da autonomia, poucos acreditavam que esta saísse do papel. Havia quase meio século de ódio a ser superado. A sucessão de atentados terroristas praticados por fundamentalistas, parecia dar razão aos cépticos. O massacre de 29 muçulmanos, que oravam na mesquita da Tumba do Patriarca, em 25 de fevereiro de 1994, por parte do colono judeu Baruch Goldstein, confirmava a impossibilidade. Mas as negociações prosseguiram. Mais do que isso: deram resultado concreto, com o primeiro acordo prático, firmado no Cairo em 4 de maio de 1994, concedendo autonomia à Faixa de Gaza e à cidade de Jericó.
Em outubro de 1994, nova vitória da racionalidade. Israel e Jordânia encerraram 47 anos de hostilidades, firmando um histórico pacto de paz e cooperação. Mas o desafio maior estava por vir. Era a devolução de pelo menos parte da Cisjordânia ao controle palestino. Novas e penosas conversações foram realizadas. Avanços e recuos se verificaram. E os radicais dos dois lados, opositores do entendimento, sucederam-se em atentados. Só aumentaram a dimensão dos obstáculos e prometeram outros maiores, mais loucos, mais sangrentos, mais carregados de ódio. Em vão. Em 28 de setembro passado, em Washington, assinou-se outro acordo, ainda mais ousado do que o de maio de 1994. O que vai redundar da morte de Rabin? Para muitos, será o fim do processo. Para outros, a sua consolidação. Caso a racionalidade prevaleça, a paz na região será irreversível. E consolidada pelo "sacrifício" da vida desse ex-falcão, que o pragmatismo converteu em "pomba".
(Artigo publicado em 4 de junho de 1995, no suplemento especial sobre o assassinato de Yitzhak Rabin, no Correio Popular)
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