Pedro J. Bondaczuk
O personagem Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, é um dos mais fascinantes da literatura mundial de todos os tempos. Tornou-se uma espécie de paradigma dos idealistas que, não raro, despendem seus maiores esforços e melhores talentos em busca de sonhos aparentemente irrealizáveis, de fantasias que (infelizmente) só existem em suas cabeças e de situações que se confrontam com a horrenda realidade que nos rodeia e se mostram anos-luz distantes dela..
Jorge Luís Borges era fascinado por essa caricata figura ficcional. Evidentemente, também sou. Nesse aspecto, portanto – como em tantos e tantos outros – não sou nada original. Como ser nesse caso? Ademais, prefiro trocar uma possível originalidade, que admito e confesso não ter, por essa ilustre companhia, no caso a de Borges (que igualmente me fascina, tanto quanto Dom Quixote).
Cervantes, ao criar esse emblemático personagem, certamente não pretendeu lhe emprestar o significado que ganhou ao longo do tempo. Sua intenção foi a de satirizar a figura dos cavaleiros andantes de então, que incendiavam a imaginação dos moços, pela coragem, hombridade, cortesia e um vasto elenco de outras virtudes que, parece, estão cada vez mais escassas nos tempos atuais. E claro que conseguiu. Na verdade, foi além: criou um símbolo, um paradigma ou, quem sabe, um estereótipo de quem nutre algum ideal. Tanto que já existem palavras derivadas de Quixote, como “quixotear”, “quixotesco” e vai por aí afora.
Todo moço saudável, com boa formação ética e intelectual, nascido em lar que merece esse nome e que não seja (como infelizmente é a maioria no mundo) autêntica sucursal do inferno, tende a ser idealista, antes de se confrontar com a realidade. Sonha, por exemplo, com as três virtudes mais raras e escassas na sociedade: igualdade, solidariedade e fraternidade. Abraça causas que, aparentemente, têm essas bandeiras (nem sempre têm) e muitos jovens pagam com a vida por tamanha ousadia.
Todavia, o tempo se encarrega de, em princípio, atenuar esse fogo interior e, finalmente, de apagá-lo. À medida que amadurecem, esses moços ousados e que se sentem invulneráveis, réplicas do Dom Quixote, cedem à realidade. Enquadram-se no “sistema”, assumem o “status quo” reinante e muitos deles chegam, até mesmo, ao extremo de combater com maior vigor aquilo que um dia os mobilizou à luta.
Há, é claro, os que persistem quixoteando vida afora. Acabam marginalizados, Suas idéias e atitudes são tidas e havidas como ridículas e tornam-se objeto de mofa e zombaria dos omissos, dos acovardados, dos invertebrados e dos “descerebrados”. Uma pena.
São, como Dom Quixote foi, tidos como loucos. Não são sequer levados a sério, nem pelos adversários. E quando o são, terminam em cárceres imundos, vítimas de asquerosos tiranos, presos e torturados por suas idéias por torturadores que, não raro, assumem até a postura de “democratas” (que, evidentemente, não são), sem que nenhuma voz se erga em sua defesa.
Admiro, porém, esses “cavaleiros andantes” contemporâneos (e, em certa medida, sou um deles). O que combatem, evidentemente, não são moinhos de vento, com feições de gigantes maldosos, como fazia Dom Quixote, mas os próprios monstruosos inimigos.
Ou seja, denunciam sucessivas violações dos mais sagrados direitos humanos, a vergonhosa exploração do homem pelo homem, o egoísmo exacerbado que leva pessoas a acumularem fortunas monumentais em detrimento de multidões de famintos e deserdados e as tantas e tantas outras mazelas, que todos conhecemos, mas que comodamente observamos à distância, por não nos afetarem diretamente. Ou, pelo menos, por acharmos que não nos afetem.
Quando se comete alguma injustiça com alguma pessoa humilde, não importa qual, é toda a espécie humana que é agredida em sua humanidade. Quando alguém é segregado –, por sua condição econômica, pela cor da sua pele, por suas convicções ideológicas, políticas ou religiosas etc. – todos nós somos marginalizados, nos tornamos vítimas de hediondo “apartheid”, por permitirmos o avanço do erro e do mal, que mais dia menos dia findam por nos atingir também (embora achemos que não). Pior do que a audácia dos maus é a passividade dos bons que a permitem e viabilizam.
O pintor Pablo Picasso disse, em uma entrevista há algum tempo, o que deveria ser o lema de todo idealista (e todos nós deveríamos nos mobilizar, de fato, pelo ideal de igualdade, fraternidade e solidariedade): “Concordo com Dom Quixote: o meu repouso é a batalha”. Ou seja, deveríamos fazer da ação, concreta e positiva, uma rotina e jamais fortuita exceção.
O personagem Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, é um dos mais fascinantes da literatura mundial de todos os tempos. Tornou-se uma espécie de paradigma dos idealistas que, não raro, despendem seus maiores esforços e melhores talentos em busca de sonhos aparentemente irrealizáveis, de fantasias que (infelizmente) só existem em suas cabeças e de situações que se confrontam com a horrenda realidade que nos rodeia e se mostram anos-luz distantes dela..
Jorge Luís Borges era fascinado por essa caricata figura ficcional. Evidentemente, também sou. Nesse aspecto, portanto – como em tantos e tantos outros – não sou nada original. Como ser nesse caso? Ademais, prefiro trocar uma possível originalidade, que admito e confesso não ter, por essa ilustre companhia, no caso a de Borges (que igualmente me fascina, tanto quanto Dom Quixote).
Cervantes, ao criar esse emblemático personagem, certamente não pretendeu lhe emprestar o significado que ganhou ao longo do tempo. Sua intenção foi a de satirizar a figura dos cavaleiros andantes de então, que incendiavam a imaginação dos moços, pela coragem, hombridade, cortesia e um vasto elenco de outras virtudes que, parece, estão cada vez mais escassas nos tempos atuais. E claro que conseguiu. Na verdade, foi além: criou um símbolo, um paradigma ou, quem sabe, um estereótipo de quem nutre algum ideal. Tanto que já existem palavras derivadas de Quixote, como “quixotear”, “quixotesco” e vai por aí afora.
Todo moço saudável, com boa formação ética e intelectual, nascido em lar que merece esse nome e que não seja (como infelizmente é a maioria no mundo) autêntica sucursal do inferno, tende a ser idealista, antes de se confrontar com a realidade. Sonha, por exemplo, com as três virtudes mais raras e escassas na sociedade: igualdade, solidariedade e fraternidade. Abraça causas que, aparentemente, têm essas bandeiras (nem sempre têm) e muitos jovens pagam com a vida por tamanha ousadia.
Todavia, o tempo se encarrega de, em princípio, atenuar esse fogo interior e, finalmente, de apagá-lo. À medida que amadurecem, esses moços ousados e que se sentem invulneráveis, réplicas do Dom Quixote, cedem à realidade. Enquadram-se no “sistema”, assumem o “status quo” reinante e muitos deles chegam, até mesmo, ao extremo de combater com maior vigor aquilo que um dia os mobilizou à luta.
Há, é claro, os que persistem quixoteando vida afora. Acabam marginalizados, Suas idéias e atitudes são tidas e havidas como ridículas e tornam-se objeto de mofa e zombaria dos omissos, dos acovardados, dos invertebrados e dos “descerebrados”. Uma pena.
São, como Dom Quixote foi, tidos como loucos. Não são sequer levados a sério, nem pelos adversários. E quando o são, terminam em cárceres imundos, vítimas de asquerosos tiranos, presos e torturados por suas idéias por torturadores que, não raro, assumem até a postura de “democratas” (que, evidentemente, não são), sem que nenhuma voz se erga em sua defesa.
Admiro, porém, esses “cavaleiros andantes” contemporâneos (e, em certa medida, sou um deles). O que combatem, evidentemente, não são moinhos de vento, com feições de gigantes maldosos, como fazia Dom Quixote, mas os próprios monstruosos inimigos.
Ou seja, denunciam sucessivas violações dos mais sagrados direitos humanos, a vergonhosa exploração do homem pelo homem, o egoísmo exacerbado que leva pessoas a acumularem fortunas monumentais em detrimento de multidões de famintos e deserdados e as tantas e tantas outras mazelas, que todos conhecemos, mas que comodamente observamos à distância, por não nos afetarem diretamente. Ou, pelo menos, por acharmos que não nos afetem.
Quando se comete alguma injustiça com alguma pessoa humilde, não importa qual, é toda a espécie humana que é agredida em sua humanidade. Quando alguém é segregado –, por sua condição econômica, pela cor da sua pele, por suas convicções ideológicas, políticas ou religiosas etc. – todos nós somos marginalizados, nos tornamos vítimas de hediondo “apartheid”, por permitirmos o avanço do erro e do mal, que mais dia menos dia findam por nos atingir também (embora achemos que não). Pior do que a audácia dos maus é a passividade dos bons que a permitem e viabilizam.
O pintor Pablo Picasso disse, em uma entrevista há algum tempo, o que deveria ser o lema de todo idealista (e todos nós deveríamos nos mobilizar, de fato, pelo ideal de igualdade, fraternidade e solidariedade): “Concordo com Dom Quixote: o meu repouso é a batalha”. Ou seja, deveríamos fazer da ação, concreta e positiva, uma rotina e jamais fortuita exceção.
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