Erros e acertos sandinistas
Pedro J. Bondaczuk
A Nicarágua inicia hoje, com a posse de Violeta Chamorro na Presidência, uma nova fase de sua história, toda ela marcada por violência e pelo caudilhismo. O presidente que deixa o poder, Daniel Ortega, pode ter frustrado as esperanças da maioria dos nicaragüenses em relação à revolução sandinista, que derrubou a longa ditadura do clã dos Somozas. Mas é indispensável que a sua gestão seja avaliada por um enfoque absolutamente isento, sem tolos e primários maniqueísmos. Tem-se que considerar que durante a totalidade de sua gestão, ele permaneceu acossado por um severíssimo embargo econômico norte-americano, aliado a um permanente estado de guerra com a guerrilha dos "contras" (treinada e financiada pelos Estados Unidos), e tendo ainda como uma "sombra" sempre presente a ameaça implícita de uma invasão dos "marines" de Tio Sam.
Com tudo isso, Ortega cometeu de fato alguns "arranhões" nas liberdades democráticas em seu país (e a maioria dos seus críticos faria o mesmo, senão pior, em circunstâncias idênticas). Por exemplo, censurou a imprensa, fechando emissoras de rádio e mantendo o jornal "La Prensa", órgão da nova presidenta nicaragüense, por muito tempo fora de circulação. Limitou a atuação dos partidos e andou determinando algumas prisões de opositores por razões puramente políticas. No entanto, o regime sandinista tem um saldo bastante positivo a seu favor, no que diz respeito à educação, por exemplo, reduzindo praticamente pela metade a taxa de analfabetismo no país. Obteve algumas conquistas igualmente expressivas na área de saúde. E tudo isso sem contar praticamente com qualquer recurso financeiro.
Mas, no nosso entender, o principal legado de Ortega foi a redemocratização da Nicarágua. Foi o fato de ter respeitado a "voz das urnas", quando todos esperavam que ele fosse fraudar as eleições de fevereiro passado, para se conservar no poder. No entanto, ao invés de realizar uma pantomima eleitoral, promoveu um dos pleitos mais fiscalizados da história contemporânea da América Central (e talvez do mundo) e submeteu-se à vontade popular.
A responsabilidade de Chamorro fica agora multiplicada. Sua vitória, por exemplo, retira o principal obstáculo que Ortega teve que enfrentar para administrar o país: o embargo econômico norte-americano. Além disso, ela começará seu governo com uma alentada injeção financeira, da ordem de cerca de US$ 300 milhões, determinada pela Casa Branca. No plano político, terá que agir com muito tato, para evitar que ressentimentos de uma guerra civil de dez anos venham à tona, explodindo em violência. Estaria, esta dona de casa, sem grande experiência administrativa, preparada para tanto? Oxalá que sim, para o bem de todos os nicaragüenses.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 25 de abril de 1990)
Pedro J. Bondaczuk
A Nicarágua inicia hoje, com a posse de Violeta Chamorro na Presidência, uma nova fase de sua história, toda ela marcada por violência e pelo caudilhismo. O presidente que deixa o poder, Daniel Ortega, pode ter frustrado as esperanças da maioria dos nicaragüenses em relação à revolução sandinista, que derrubou a longa ditadura do clã dos Somozas. Mas é indispensável que a sua gestão seja avaliada por um enfoque absolutamente isento, sem tolos e primários maniqueísmos. Tem-se que considerar que durante a totalidade de sua gestão, ele permaneceu acossado por um severíssimo embargo econômico norte-americano, aliado a um permanente estado de guerra com a guerrilha dos "contras" (treinada e financiada pelos Estados Unidos), e tendo ainda como uma "sombra" sempre presente a ameaça implícita de uma invasão dos "marines" de Tio Sam.
Com tudo isso, Ortega cometeu de fato alguns "arranhões" nas liberdades democráticas em seu país (e a maioria dos seus críticos faria o mesmo, senão pior, em circunstâncias idênticas). Por exemplo, censurou a imprensa, fechando emissoras de rádio e mantendo o jornal "La Prensa", órgão da nova presidenta nicaragüense, por muito tempo fora de circulação. Limitou a atuação dos partidos e andou determinando algumas prisões de opositores por razões puramente políticas. No entanto, o regime sandinista tem um saldo bastante positivo a seu favor, no que diz respeito à educação, por exemplo, reduzindo praticamente pela metade a taxa de analfabetismo no país. Obteve algumas conquistas igualmente expressivas na área de saúde. E tudo isso sem contar praticamente com qualquer recurso financeiro.
Mas, no nosso entender, o principal legado de Ortega foi a redemocratização da Nicarágua. Foi o fato de ter respeitado a "voz das urnas", quando todos esperavam que ele fosse fraudar as eleições de fevereiro passado, para se conservar no poder. No entanto, ao invés de realizar uma pantomima eleitoral, promoveu um dos pleitos mais fiscalizados da história contemporânea da América Central (e talvez do mundo) e submeteu-se à vontade popular.
A responsabilidade de Chamorro fica agora multiplicada. Sua vitória, por exemplo, retira o principal obstáculo que Ortega teve que enfrentar para administrar o país: o embargo econômico norte-americano. Além disso, ela começará seu governo com uma alentada injeção financeira, da ordem de cerca de US$ 300 milhões, determinada pela Casa Branca. No plano político, terá que agir com muito tato, para evitar que ressentimentos de uma guerra civil de dez anos venham à tona, explodindo em violência. Estaria, esta dona de casa, sem grande experiência administrativa, preparada para tanto? Oxalá que sim, para o bem de todos os nicaragüenses.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 25 de abril de 1990)
No comments:
Post a Comment