Wednesday, August 02, 2006

Velocidade para cima


Pedro J. Bondaczuk



O homem, neste século, e mais especificamente neste final de milênio, parece ter perdido a sua velocidade para cima. Não, evidentemente, no aspecto literal. Afinal, foi nesse período de 96 anos que desenvolveu um veículo mais pesado do que o ar, hoje um meio de transporte corriqueiro, que lhe possibilitou voar como os pássaros. Também foi nele que ultrapassou os limites do Planeta e passeou na Lua, deixando impressas no solo lunar as marcas de sua pegada. E que, de quebra, enviou sondas aos confins do Sistema Solar. Nesse aspecto, não há como negar, evoluiu miraculosamente. Obrou maravilhas nunca antes sonhadas.

O que de fato perdeu foi a noção de ideal. Abriu mão de um sentido mais grandioso para a vida e da tentativa de encontrar uma explicação para a sua origem e destino. Tornou-se ferozmente materialista, escravo da alta tecnologia, em detrimento do desenvolvimento espiritual. Amesquinhou-se. Robotizou-se. Perdeu a rota do seu destino.

Desenvolveu meios para resolver todos os problemas que afetaram a humanidade ao longo de sua acidentada história, mas nunca os utilizou. Contando com uma agricultura de alta produtividade, é incapaz de repartir os frutos da terra com os que precisam e permite que um terço da população terrestre se veja às voltas com a fome. Tendo uma medicina que opera milagres, deixa multidões morrerem de doenças simples, que já poderiam estar erradicadas com um pouco mais de esforço e de boa vontade. Dispondo de máquinas para realizar os trabalhos mais penosos e insalubres, não previu uma ocupação para os milhões de pais de família que tais robôs desempregaram.

E não é só nesse aspecto que a subida para o alto foi freada. Também nos campos moral, filosófico e artístico é possível se observar uma indisfarçável estagnação, senão um retrocesso. E frise-se que isso ocorre não por falta de recursos. É só uma questão de mentalidade. Ou seja, de formação. Jorge de Lima, em suas "Obras Completas", já observava: "O homem perdeu sua velocidade para cima: exauriu-se numa agitação de movimentos que se medem em vôos curtos". Daí eu ter defendido, no livro que acabo de lançar, a necessidade de uma "nova utopia", para substituir as que deixamos precocemente de lado. Ou seja, precisamos de nova meta, novo rumo, novo ideal de grandeza e de solidariedade.

Paul Auster, no romance "Mr. Vertigo", afirma, pela boca de um dos seus personagens: "O que sei é que não se ganha nada sem se dar algo e, quanto maior aquilo que queremos, mais alto é o preço". Precisamos é de ousadia para promover uma revolução silenciosa e pacífica, que mude os parâmetros das nossas expectativas. Devemos sonhar alto, querer muito, aspirar chegar às estrelas, em vez de nos limitarmos a rastejar. Mas nunca em termos de acúmulo de bens materiais. Passados tantos séculos de civilização, já era tempo dos homens terem consciência da inutilidade de juntar coisas. Somos mortais. Não somos donos de nada. Devemos estar dispostos a pagar o preço que for necessário por essa mudança de meta, por esse objetivo sublime, por esse pináculo da montanha.

Cabe ao intelectual, ao artista, especialmente ao escritor, um papel destacado nessa reaceleração da subida para o alto. Compete-lhe mostrar aos seus leitores que a vida tem coisas muito mais valiosas pelas quais lutar do que essa estéril e estúpida luta pelo poder que se desenvolve em todos os níveis sociais e até no âmbito da família, instituição milenar que corre o risco de desagregação. É da sua responsabilidade resgatar as grandes metas (aquelas pelas quais gerações passadas sacrificaram suas vidas), reavivar esperanças, apontar alternativas. Mas é preciso, simultaneamente, ser prático. Estabelecidos os sonhos, manda a sabedoria que se saia em busca da sua concretização.

O ensaísta Henry David Thoreau diz, em um dos seus ensaios: "Se você construiu castelos no ar, não terá desperdiçado seu trabalho, pois no alto é onde devem estar. Agora, coloque fundações embaixo deles". Tente concretizar os sonhos, se achar, no íntimo, que valem a pena. É certo que o preço a ser pago não será baixo. Implicará em abrir mão de determinados gozos e regalias, aos quais você está acostumado. Mas ouse. Tenha coragem. Doe-se. No final das contas, com certeza, irá concluir que valeu a pena. "Tudo vale", ressalta Fernando Pessoa, "se a alma não for pequena..." O estadista inglês do século passado, David Lloyd George, aconselhou: "Não tema dar um grande passo, se for o indicado. Não se pode saltar sobre um abismo com dois pulos pequenos".

1 comment:

Anonymous said...

Pedro. Não sou nenhuma escrevinhadora, mas tenho uma paginazinha...Passa lá e deixa seu precioso comentãrio.
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