Monday, August 28, 2006

Grassmann: o mago de São Simão - I


Pedro J. Bondaczuk


As artes plásticas, em todo o mundo, encontram-se num ponto de encruzilhada, principalmente quanto à temática adotada e às múltiplas formas de expressão. As várias bienais, realizadas nos principais centros culturais da Europa e dos Estados Unidos (e também a de São Paulo, que já firmou tradição) exibem trabalhos que vão do genial ao ridículo, das telas tradicionais aos anárquicos “happenings”, agitando críticos e freqüentadores de museus e galerias.

Enquanto em alguns círculos, a linguagem, na maior parte das vezes cifrada e acessível apenas para uma minoria de iniciados, é combatida e contestada, em outros, é defendida com paixão, expandida às últimas conseqüências e incentivada por mestres da pintura.

Embora esse tipo de arte, primeira manifestação estética do homem primitivo, elitize-se e se distancie do povo, em raras ocasiões apareceram tantos pintores, desenhistas, gravadores e escultores novos, com pretensões ao estrelato, brandindo novas propostas temáticas e lançando novas técnicas, cada vez mais acuradas e revolucionárias.

Galerias e exposições multiplicam-se. Marchands surgem em profusão. Escolas de pintura preparam novas levas de talentosos artistas. Artistas plásticos de razoável potencial aparecem, têm o seu “brilhareco” e logo desaparecem. Alguns não passam de modismos, logo deixados de lado. Outros, mais raros, fixam-se no gosto dos colecionadores de arte, sobem ao Olimpo dos consagrados e conquistam seu espaço na História das Artes.

Entre os vencedores, aqueles que não precisam provar mais nada para ninguém, cujos trabalhos “falam” por eles, está Marcelo Grassmann, oriundo de São Simão, pequena cidade do interior paulista, distante cerca de 400 quilômetros da Capital, na região de Ribeirão Preto. Destaca-se não somente pela técnica, elaborada e precisa. Nem pelos temas, originais e fantasmagóricos, visões fantásticas e inquietadoras de pesadelos, mistos de cavaleiros medievais e demônios mitológicos.

O que caracteriza, sobretudo, a obra de Marcelo Grassmann é sua postura face à vida. É a recusa de rótulos e definições. É a determinação de não se dispor a representar apenas um “papel” de artista, mas de fato “ser” esse criador de sonhos e de pesadelos. Seus desenhos e gravuras, por exemplo, são inteligíveis e assimiláveis. O público não precisa fazer nenhuma ginástica mental para entendê-los e apreciá-los.

Mas ganham grandeza e profundidade quando o parâmetro de apreciação é o da sensibilidade e não tanto o da lógica e da razão. Daí seu inegável sucesso, representado pelos convites que recebe para expor. Milhares de pessoas já puderam apreciar os trabalhos de Marcelo Grassmann, em pelo menos três continentes. Além disso, o artista ostenta em seu currículo importantes prêmios no Brasil e no Exterior.

Seus desenhos e gravuras ocupam lugar de realce nas principais galerias de arte e nos mais famosos museus brasileiros, além de integrarem o acervo de colecionadores e instituições em várias partes do mundo, como o da União Pan-Americana em Washington, por exemplo, entre outras entidades artísticas e culturais.

Com uma capacidade de trabalho notável, um talento à prova de contestações e a criatividade ímpar dos gênios, Grassmann inseriu a pequena São Simão “nos mapas” de arte nacionais. Criou, por exemplo, na cidade, um bem organizado museu particular, instalado na antiga residência da família.

Além disso, a semana que leva o seu nome (em todos os meses de outubro), se inscreveu no calendário de cultura do País. Antes, já havia conquistado os maiores prêmios que um artista pode aspirar no Brasil: o de melhor gravador brasileiro, na Bienal de São Paulo de 1955, e de melhor desenhista, nas bienais de 1959 e 1961.

(Texto publicado na página 29, Especial, do Correio Popular, em 28 de novembro de 1985).

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