Quantidade com qualidade
Pedro J. Bondaczuk
O organismo humano, e creio que de todos os animais, foi projetado pela mãe natureza para ser dinâmico. Ou seja, para o exercício, para a ação, para se movimentar. Claro, respeitados os limites de cada um. A experiência comprova que a utilização dos vários órgãos do nosso corpo os desenvolve e a falta de uso, os atrofia. Isto vale para músculos, ossos, pulmões etc. E, logicamente, para o mais nobre dos órgãos, sede daquilo que nos distingue dos demais viventes, o cérebro, que abriga a razão e a inteligência.
E por que menciono, mais uma vez, este assunto, que já tive oportunidade de tratar em “n” ocasiões? Para responder a uma consulta de um leitor que me indaga se é possível a um escritor reunir, simultaneamente, quantidade de produção literária à qualidade. Possível é, e até desejável, mas há condições para viabilizar tão copiosa atividade. Uma delas – a principal, por sinal – é que a pessoa tenha muito que escrever. Ou seja, que suas idéias sejam fartas, originais, criativas e, sobretudo claras. Para tanto, é indispensável que tenha grande cultura. É necessário que seus conhecimentos sejam superiores à média.
Escrever, simplesmente, por escrever, sem que haja conteúdo nessa escrita, por mais apurada que seja sua forma de expressão, no meu entender, é perda de tempo e de recursos (papel, ou energia elétrica que move o computador, etc. etc. etc.). Nem sempre uma obra copiosa caracteriza bons escritores. Há os que publicam dezenas, quiçá centenas de livros e que, se você espremer todos eles para apurar o conteúdo não obterá nada. Em contrapartida, há os que se consagram com uma única e solitária obra, que prima pela fartura de idéias criativas, pela clareza, pela originalidade e pelo tanto de verdade com que conta.
Caso, portanto, o sujeito preencha a primeira condição que mencionei, ou seja, que tenha muito que dizer e saiba fazê-lo bem, quanto mais escrever, melhor será. Deixará um legado muito maior à posteridade do que quem escreve pouco e contribuirá, portanto, de maneira mais decisiva, para a evolução das artes e da cultura e, por consequência, da própria civilização.
Tomo como parâmetro o caso de escritores que contam com colunas diárias, de crônicas, em jornais. Hoje em dia, poucos assumem esse tipo de compromisso, que exige muito de quem tem tamanha ousadia. Tempos atrás, nos anos 50, 60 e 70, por exemplo, o campineiro Guilherme de Almeida assinava uma coluna diária no jornal “O Estado de São Paulo” intitulada “Eco ao longo dos meus passos”!. Colecionei, voluptuosamente, esses maravilhosos e instigantes textos, coleção esta que mantenho até hoje, como preciosidade da qual não abro mão por razão alguma. Volta e meia releio essas crônicas e o que me chama a atenção, além da indiscutível qualidade, é sua atualidade, tanto dos temas literários tratados, quanto da linguagem empregada.
Está aí, pois, um caso concreto que confirma minha opinião de que é possível escrever muito, e bem, desde que se tenha talento, paciência, conhecimento e disposição para tal. A grande maioria dessas crônicas não consta em livro algum do “poeta soldado”, que, com justiça, foi apelidado de “príncipe dos poetas brasileiros”. Sua obra só consolida sua majestade e nobreza. Quem teve o capricho de recortar do jornal essas crônicas e arquivá-las (hábito dos mais saudáveis e recomendáveis), tem um acervo muito mais rico do que os bibliófilos que não tenham esse costume.
Recomendo aos que lidam com literatura (e que tenham, claro, o que transmitir), que o façam, na maior quantidade possível. Como no caso do organismo humano, aqui, também, o exercício desenvolve e a falta dele atrofia. É certo que nem todos os textos lhe parecerão (ou, o que é mais importante, parecerão ao leitor), geniais, obras-primas basilares (embora não descarte essa possibilidade). A probabilidade, no entanto, é de contínua evolução na qualidade. Sua escrita se tornará crescentemente, mais solta, mais espontânea, mais fluente e mais natural, em decorrência do exercício.
Outro cronista do qual guardo centenas de crônicas em minha hemeroteca (para os que não se lembram, trata-se de coleção de recortes de jornal), é Luís Martins. Dele, ao contrário de Guilherme de Almeida, não tenho livro algum. Não que ele não tenha publicado, mas eu é que não tive oportunidade de adquirir nenhum dos que escreveu. Todavia, com tantos textos dele recortados do jornal (também publicava suas crônicas no “O Estado de São Paulo”), essa minha omissão, ditada pela falta de oportunidade de adquirir suas obras, não me traz o prejuízo que traria se eu não contasse com esse precioso acervo.
Luís Martins assinava seus textos, apenas, com as iniciais L. M. Era um baita cronista! Sua coluna era simples, despojada, intitulada, simplesmente, de “Crônicas”. Mas o conteúdo... uma maravilha! Sinto-me privilegiado por ter colecionado seus textos. Eram publicados, em geral, no lado esquerdo da página, costumeiramente a 7 ou a 8, de alto abaixo, em uma única coluna. Daí, provavelmente, passar despercebida aos desavisados.
Em suma: se você é escritor, tem fartura de idéias e tanta necessidade tão premente de escrever como tem de se alimentar, de repousar e de respirar, escreva. Escreva, escreva e escreva o máximo que puder. Se for cronista diário de algum jornal, o próprio compromisso assumido o induzirá a fazê-lo, e diariamente. Se não for, crie um blog e abasteça-o de textos todos os dias, sem nenhuma exceção. Haverá dias em que não terá a menor vontade de escrever. Isso é normal. Seja, contudo, autodisciplinado. Force-se. Sente-se à frente da telinha do computador, que a vontade logo virá.
Escreva sem pensar sequer em resultados. Não planeje reunir esses textos em um livro. Não sonhe no quanto pode vir a ganhar escrevendo. Simplesmente escreva. O tempo irá determinar o que você pode fazer com esses textos descompromissados.
Se você não for escritor, mas ainda assim tiver fartura de idéias e gostar desse nobre exercício de comunicação, escreva também. Se possível, todos os dias. Se o fizer, é até possível que descobrirá o que em princípio jamais havia lhe passado pela cabeça: que você tem talento inato, tem alma de, e é de fato, escritor. Publique ou não algum livro algum dia.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
O organismo humano, e creio que de todos os animais, foi projetado pela mãe natureza para ser dinâmico. Ou seja, para o exercício, para a ação, para se movimentar. Claro, respeitados os limites de cada um. A experiência comprova que a utilização dos vários órgãos do nosso corpo os desenvolve e a falta de uso, os atrofia. Isto vale para músculos, ossos, pulmões etc. E, logicamente, para o mais nobre dos órgãos, sede daquilo que nos distingue dos demais viventes, o cérebro, que abriga a razão e a inteligência.
E por que menciono, mais uma vez, este assunto, que já tive oportunidade de tratar em “n” ocasiões? Para responder a uma consulta de um leitor que me indaga se é possível a um escritor reunir, simultaneamente, quantidade de produção literária à qualidade. Possível é, e até desejável, mas há condições para viabilizar tão copiosa atividade. Uma delas – a principal, por sinal – é que a pessoa tenha muito que escrever. Ou seja, que suas idéias sejam fartas, originais, criativas e, sobretudo claras. Para tanto, é indispensável que tenha grande cultura. É necessário que seus conhecimentos sejam superiores à média.
Escrever, simplesmente, por escrever, sem que haja conteúdo nessa escrita, por mais apurada que seja sua forma de expressão, no meu entender, é perda de tempo e de recursos (papel, ou energia elétrica que move o computador, etc. etc. etc.). Nem sempre uma obra copiosa caracteriza bons escritores. Há os que publicam dezenas, quiçá centenas de livros e que, se você espremer todos eles para apurar o conteúdo não obterá nada. Em contrapartida, há os que se consagram com uma única e solitária obra, que prima pela fartura de idéias criativas, pela clareza, pela originalidade e pelo tanto de verdade com que conta.
Caso, portanto, o sujeito preencha a primeira condição que mencionei, ou seja, que tenha muito que dizer e saiba fazê-lo bem, quanto mais escrever, melhor será. Deixará um legado muito maior à posteridade do que quem escreve pouco e contribuirá, portanto, de maneira mais decisiva, para a evolução das artes e da cultura e, por consequência, da própria civilização.
Tomo como parâmetro o caso de escritores que contam com colunas diárias, de crônicas, em jornais. Hoje em dia, poucos assumem esse tipo de compromisso, que exige muito de quem tem tamanha ousadia. Tempos atrás, nos anos 50, 60 e 70, por exemplo, o campineiro Guilherme de Almeida assinava uma coluna diária no jornal “O Estado de São Paulo” intitulada “Eco ao longo dos meus passos”!. Colecionei, voluptuosamente, esses maravilhosos e instigantes textos, coleção esta que mantenho até hoje, como preciosidade da qual não abro mão por razão alguma. Volta e meia releio essas crônicas e o que me chama a atenção, além da indiscutível qualidade, é sua atualidade, tanto dos temas literários tratados, quanto da linguagem empregada.
Está aí, pois, um caso concreto que confirma minha opinião de que é possível escrever muito, e bem, desde que se tenha talento, paciência, conhecimento e disposição para tal. A grande maioria dessas crônicas não consta em livro algum do “poeta soldado”, que, com justiça, foi apelidado de “príncipe dos poetas brasileiros”. Sua obra só consolida sua majestade e nobreza. Quem teve o capricho de recortar do jornal essas crônicas e arquivá-las (hábito dos mais saudáveis e recomendáveis), tem um acervo muito mais rico do que os bibliófilos que não tenham esse costume.
Recomendo aos que lidam com literatura (e que tenham, claro, o que transmitir), que o façam, na maior quantidade possível. Como no caso do organismo humano, aqui, também, o exercício desenvolve e a falta dele atrofia. É certo que nem todos os textos lhe parecerão (ou, o que é mais importante, parecerão ao leitor), geniais, obras-primas basilares (embora não descarte essa possibilidade). A probabilidade, no entanto, é de contínua evolução na qualidade. Sua escrita se tornará crescentemente, mais solta, mais espontânea, mais fluente e mais natural, em decorrência do exercício.
Outro cronista do qual guardo centenas de crônicas em minha hemeroteca (para os que não se lembram, trata-se de coleção de recortes de jornal), é Luís Martins. Dele, ao contrário de Guilherme de Almeida, não tenho livro algum. Não que ele não tenha publicado, mas eu é que não tive oportunidade de adquirir nenhum dos que escreveu. Todavia, com tantos textos dele recortados do jornal (também publicava suas crônicas no “O Estado de São Paulo”), essa minha omissão, ditada pela falta de oportunidade de adquirir suas obras, não me traz o prejuízo que traria se eu não contasse com esse precioso acervo.
Luís Martins assinava seus textos, apenas, com as iniciais L. M. Era um baita cronista! Sua coluna era simples, despojada, intitulada, simplesmente, de “Crônicas”. Mas o conteúdo... uma maravilha! Sinto-me privilegiado por ter colecionado seus textos. Eram publicados, em geral, no lado esquerdo da página, costumeiramente a 7 ou a 8, de alto abaixo, em uma única coluna. Daí, provavelmente, passar despercebida aos desavisados.
Em suma: se você é escritor, tem fartura de idéias e tanta necessidade tão premente de escrever como tem de se alimentar, de repousar e de respirar, escreva. Escreva, escreva e escreva o máximo que puder. Se for cronista diário de algum jornal, o próprio compromisso assumido o induzirá a fazê-lo, e diariamente. Se não for, crie um blog e abasteça-o de textos todos os dias, sem nenhuma exceção. Haverá dias em que não terá a menor vontade de escrever. Isso é normal. Seja, contudo, autodisciplinado. Force-se. Sente-se à frente da telinha do computador, que a vontade logo virá.
Escreva sem pensar sequer em resultados. Não planeje reunir esses textos em um livro. Não sonhe no quanto pode vir a ganhar escrevendo. Simplesmente escreva. O tempo irá determinar o que você pode fazer com esses textos descompromissados.
Se você não for escritor, mas ainda assim tiver fartura de idéias e gostar desse nobre exercício de comunicação, escreva também. Se possível, todos os dias. Se o fizer, é até possível que descobrirá o que em princípio jamais havia lhe passado pela cabeça: que você tem talento inato, tem alma de, e é de fato, escritor. Publique ou não algum livro algum dia.
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