Ocidente frustra ilusões
Pedro J. Bondaczuk
A fuga em massa de albaneses para a Itália, ocorrida na semana passada, propiciou a que fossem mostradas cenas dramáticas, chocantes, patéticas pela televisão para o mundo todo, registradas no porto italiano de Brindisi, quando refugiados desesperados brigavam por um pouco de comida, em meio a acampamentos improvisados e anti-higiênicos, após uma penosa viagem de barco pelas águas do Mar Adriático.
O êxodo foi uma reprise do que já havia ocorrido em setembro de 1990 e se repetido em dezembro, embora não nessas proporções e nem com tamanha dramaticidade. Foi, igualmente, uma repetição do que se verificou na Alemanha Oriental, hoje incorporada à Ocidental, em setembro de 1989, que conduziu à histórica derrubada do Muro de Berlim e do próprio regime que o construiu.
Todavia, os milhares de fugitivos que escaparam de seus respectivos países, do Leste europeu, arriscando suas vidas, em desespero, à procura, na maioria das vezes, de simples miragem, quase sempre se decepcionaram com o que encontraram no Ocidente.
Enquanto suas fugas interessavam para fins propagandísticos – o espírito de "guerra fria" continua mais vivo do que se deseja admitir – seus passos foram acompanhados pela imprensa; pessoas e entidades expressaram solidariedade enviando donativos e empregos foram arranjados em pouco tempo. Tão logo, contudo, o interesse por sua odisséia esfriou, eles acabaram entregues à própria sorte. Ou à sua tragédia pessoal.
Tivemos esse fenômeno não apenas no Leste europeu, mas em alguns lugares da Ásia, em especial no Vietnã, como é o caso dos "boats peoples", que superlotam campos de refugiados em Hong Kong. Essas pessoas estão simplesmente despreparadas para a vida no Ocidente, ou, como se convencionou chamar, no mundo capitalista.
Não são competitivas. Nos regimes em que viveram, jamais tiveram que disputar empregos, pois estes eram providenciados automaticamente pelo Estado. Não precisavam competir por vagas nas universidades e nem lutar por um melhor "status" social, numa sociedade pretensamente sem classes.
Os alemães orientais, por exemplo, estão experimentando na própria carne agora a desilusão da reunificação, após o quase delírio de que foram tomados quando essa velha aspiração popular se concretizou em 3 de outubro do ano passado.
Não tardou muito para perceberem que não tinham qualquer condição para competir com os alemães ocidentais, eles sim educados desde o berço para uma sociedade competitiva. Fica, portanto, cada vez mais clara a tragédia humana que significou, não tanto a falência do comunismo – pois a própria lógica indicava que mais cedo ou mais tarde essa utopia teria o fim que está tendo – mas a sua própria ascensão.
Quantos sonhos, quantos ideais, quantas esperanças não se perderam em sete décadas, de forma irreversível! E tudo porque, em determinado instante, um "iluminado" cismou ter descoberto a pedra filosofal que transformava qualquer reles metal em ouro e teve ingênuos a apoiar suas idéias. O fanatismo impediu-os de perceber a realidade. O mundo, certamente, ainda irá assistir a muitas cenas de desespero e angústia, como as ocorridas em Brindisi na semana passada.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 13 de março de 1991).
Pedro J. Bondaczuk
A fuga em massa de albaneses para a Itália, ocorrida na semana passada, propiciou a que fossem mostradas cenas dramáticas, chocantes, patéticas pela televisão para o mundo todo, registradas no porto italiano de Brindisi, quando refugiados desesperados brigavam por um pouco de comida, em meio a acampamentos improvisados e anti-higiênicos, após uma penosa viagem de barco pelas águas do Mar Adriático.
O êxodo foi uma reprise do que já havia ocorrido em setembro de 1990 e se repetido em dezembro, embora não nessas proporções e nem com tamanha dramaticidade. Foi, igualmente, uma repetição do que se verificou na Alemanha Oriental, hoje incorporada à Ocidental, em setembro de 1989, que conduziu à histórica derrubada do Muro de Berlim e do próprio regime que o construiu.
Todavia, os milhares de fugitivos que escaparam de seus respectivos países, do Leste europeu, arriscando suas vidas, em desespero, à procura, na maioria das vezes, de simples miragem, quase sempre se decepcionaram com o que encontraram no Ocidente.
Enquanto suas fugas interessavam para fins propagandísticos – o espírito de "guerra fria" continua mais vivo do que se deseja admitir – seus passos foram acompanhados pela imprensa; pessoas e entidades expressaram solidariedade enviando donativos e empregos foram arranjados em pouco tempo. Tão logo, contudo, o interesse por sua odisséia esfriou, eles acabaram entregues à própria sorte. Ou à sua tragédia pessoal.
Tivemos esse fenômeno não apenas no Leste europeu, mas em alguns lugares da Ásia, em especial no Vietnã, como é o caso dos "boats peoples", que superlotam campos de refugiados em Hong Kong. Essas pessoas estão simplesmente despreparadas para a vida no Ocidente, ou, como se convencionou chamar, no mundo capitalista.
Não são competitivas. Nos regimes em que viveram, jamais tiveram que disputar empregos, pois estes eram providenciados automaticamente pelo Estado. Não precisavam competir por vagas nas universidades e nem lutar por um melhor "status" social, numa sociedade pretensamente sem classes.
Os alemães orientais, por exemplo, estão experimentando na própria carne agora a desilusão da reunificação, após o quase delírio de que foram tomados quando essa velha aspiração popular se concretizou em 3 de outubro do ano passado.
Não tardou muito para perceberem que não tinham qualquer condição para competir com os alemães ocidentais, eles sim educados desde o berço para uma sociedade competitiva. Fica, portanto, cada vez mais clara a tragédia humana que significou, não tanto a falência do comunismo – pois a própria lógica indicava que mais cedo ou mais tarde essa utopia teria o fim que está tendo – mas a sua própria ascensão.
Quantos sonhos, quantos ideais, quantas esperanças não se perderam em sete décadas, de forma irreversível! E tudo porque, em determinado instante, um "iluminado" cismou ter descoberto a pedra filosofal que transformava qualquer reles metal em ouro e teve ingênuos a apoiar suas idéias. O fanatismo impediu-os de perceber a realidade. O mundo, certamente, ainda irá assistir a muitas cenas de desespero e angústia, como as ocorridas em Brindisi na semana passada.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 13 de março de 1991).
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