Thursday, August 31, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Há ocasiões em que estamos com o espírito tão predisposto à alegria, à beleza e ao amor, que uma simples lembrança de um momento de tranqüilidade e de descontração é suficiente para nos tornar felizes. E nem precisa ser uma recordação, basta darmos asas à imaginação e pensarmos em um lugar e/ou situação que gostaríamos de conhecer. É o que Mário Quintana retrata no poema “Feliz”: “Deitado no alto do carro de feno.../com os braços e as pernas abertos em x.../e as nuvens, os vôos passando por cima.../Por que estradas de abril viajei assim um dia?/De que tempos, de que terras guardei/essa antiga lembrança, que talvez seria/a mais feliz das minhas falsas recordações?”. Felicidade é predisposição de espírito. Basta “querermos” ser felizes e o seremos. Mas é preciso que identifiquemos a felicidade, que está nas pequenas coisas: nos gestos de carinho que recebemos, no brilho do sol, na beleza das flores, no sorriso das crianças etc.

Grassmann: o mago de São Simão - Final


Pedro J. Bondaczuk

HOMEM DO SEU TEMPO

A carreira de Marcelo Grassmann foi fulminante, a atestar o seu talento. Sete anos depois do início de seu aprendizado da técnica de xilogravura, conquistou, em 1950, a medalha de prata na divisão moderna do Salão de Belas Artes do Rio de Janeiro. Um ano depois, ganhou a medalha de ouro na mesma mostra.

Em 1952, foi agraciado com o prêmio mais importante da carreira de gravador. Ganhou uma viagem ao Exterior, no 1º Salão de Arte Moderna, o que lhe permitiu freqüentar a Academia Albertina de Viena. Provavelmente, vem daí sua influência dos grandes mestres alemães, dos quais o mais importante, do período do Renascimento, foi, sem dúvida, Albrecht Dürer.

Entre as gravuras do artista germânico, há uma série com temas fantásticos, misturando cavaleiros medievais, monstros imaginários e imagens torturadas. Teria vindo de Dürer, portanto, a elegância que Grassmann reflete em suas xilogravuras. A mesma elegância que não lhe permite cometer excessos, mesmo quando retrata as cenas mais terríveis e assustadoras.

Sobre a “medievalidade” dos temas do artista de São Simão, o crítico Olívio Tavares de Araújo faz esta judiciosa observação, em artigo publicado na revista “Ícaro”, de número 9, distribuída a bordo dos aviões da Varig: “É uma metáfora, e não uma aproximação tecnicamente adequada. O medieval, em Grassmann, se insinua no temático, e não no estilístico – e mesmo assim num temático puramente idealizado, imaginário. Visualmente, sua obra não se parece em nada com a arte medieval. Suas verdadeiras fontes são, antes de tudo, a imaginação inesgotável, borbulhante, que em outros tempos quase mergulhava no delírio; e o repertório de imagens com que conviveu na infância e na adolescência”.

Ressalte-se que a obra de Marcelo Grassmann não consistiu apenas em desenhos e xilogravuras. Aliás, seus trabalhos mais expressivos foram gravados em metal, técnica mais sofisticada (e complicada), que apresenta mais opções, como o talho a buril, a ponta seca, o “mezzotinto”, a água-forte e a água-tinta.

A obra de Grassmann, posto que reconhecidamente moderna, é, na verdade, atemporal. Mesmo reproduzindo fantasmas de um passado muito remoto, cria uma ponte, no tempo e no espaço, entre diversas eras. Projeta imagens –, quem sabe até transmitidas geneticamente, por algum processo ainda desconhecido – de períodos que ficaram há muito para trás, para o século XX.

O objetivo do artista é o de simbolizar, com elas, as angústias e contradições de hoje, desta vida moderna neurotizante e repleta de riscos, de encontros e desencontros, de uma imensa solidão e do terror nuclear. Afinal, ele é, sobretudo, homem de seu tempo, com suas marcas inconfundíveis e que, com signos apropriados procura transmitir, em imagens, a mesma perplexidade que Albert Einstein expressou ao dizer: “O mais extraordinário é que o mundo tem certamente um sentido”.

PRÊMIOS E EXPOSIÇÕES

1950 – Medalha de prata na divisão moderna do Salão de Belas Artes do Rio de Janeiro.
1951 – Participação na 1ª Bienal de São Paulo; medalha de ouro na divisão moderna do Salão Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
1952 – Prêmio Viagem ao Exterior (na ocasião o maior prêmio do País) no 1º Salão Nacional de Arte Moderna; Prêmio de Aquisição no 2º Salão Paulista de Arte Moderna; Salão de Maio de Paris (coletiva); 26ª Bienal de Veneza.
1953 – 2ª Bienal de São Paulo.
1955 – 3ª Bienal de São Paulo, onde recebeu o prêmio de “Melhor Gravador Nacional”.
1957 – Grande medalha de ouro e 1º prêmio Governado do Estado no Salão Paulista de Arte Moderna; Arte Moderna no Brasil, exposição realizada em Buenos Aires e Rosário, na Argentina; Santiago do Chile e Lima, no Peru (coletiva).
1958 – 29ª Bienal de Veneza.
1959 – 5ª Bienal de São Paulo, onde recebeu o prêmio de “Melhor Desenhista Nacional”; Exposição 47 Artistas na Galeria de Arte da Folha de S. Paulo (coletiva); 1ª Bienal de Artistas Jovens de Paris (coletiva).
1961 – 6ª Bienal de São Paulo, onde recebeu o prêmio de “Melhor Desenhista Nacional”; 6ª Bienal Internacional de Tóquio.
1962 – Prêmio de Gravura na 29ª Bienal de Veneza.
1963 – Exposição 1º Resumo de Arte do Jornal do Brasil (coletiva).
1965 – Exposição Arte Brasileira Atual apresentada em Londres, no Royal College of Arts e em Viena (coletiva).
1966 – Exposições coletivas: Gravadores Brasileiros Contemporâneos, Universidade Cornell, Nova York; Arte da América Latina desde a Independência, museus de várias cidades norte-americanas: O Artista e a Máquina, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro; 21º Salão Municipal de Belas Artes de Belo Horizonte e 2ª Exposição da Jovem Gravura Nacional, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.

(Matéria publicada na página 29, Especial, do Correio Popular, em 28 de novembro de 1985).

Wednesday, August 30, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Há pessoas que praticamente abdicam da vida, mesmo que continuem vivas. Nada querem, nada fazem, nada sonham e se limitam a vegetar, sem nenhuma ação ou reação realmente dignas de um ser humano. Cometem, pois, uma espécie de “suicídio”. Matam as suas potencialidades e se anulam. Claro que são dignas de piedade e não de reprovação. Requerem ajuda, carinho, amizade e compreensão e não reprimendas, abandono e pouco-caso. Creio que é a essas pessoas que Mário Quintana se refere, no poema “A companheira”, que diz: “A lua parte com quem/partiu e fica com quem ficou./E, pacientemente,/consoladoramente,/aguarda os suicidas/no fundo do poço”. E não somente a lua aguarda, pacientemente, a reação dessas pessoas. Toda a natureza, em sua perfeição e grandeza, faz isso.

Grassmann: o mago de São Simão - III



Pedro J. Bondaczuk

PAIXÃO PELA XILOGRAVURA

A pretensão inicial de Marcelo Grassmann, ainda adolescente, lá pelos fins da década de 30, era ser escultor. Fez, inclusive, algumas incursões pela escultura, mas não deixou nenhum trabalho do tipo. Desistiu logo. Percebeu que não tinha vocação para isso. Em 1943, aos 18 anos de idade, descobriu a xilogravura, cuja origem se perde no tempo.

Até a invenção da imprensa, em 1454, por Johann Gutenberg, essa técnica era utilizada para a impressão de livros e iluminuras. O texto era manualmente entalhado num único bloco de madeira, que fazia a vez de um “carimbo” e daí transposto para o papel. Era um trabalho que requeria muita habilidade e, sobretudo, paciência.

Os primeiros tipos móveis foram uma variação da técnica de xilogravura. Mas deram enorme agilidade à arte de impressão e transformaram todos os conceitos sobre comunicação. Permitiram, sobretudo, o advento da indústria gráfica e da popularização do livro, expandindo a cultura, o conhecimento e a civilização.

A xilogravura, a grosso modo, funciona assim: primeiro, o tema é desenhado pelo artista sobre um bloco de madeira (nogueira, pereira ou buxo). O fundo do desenho é elaborado desbastando-se, com a goiva – instrumento que todo marceneiro está familiarizado – a placa. As figuras ficam em relevo. Depois, é só aplicar tinta sobre o bloco e imprimir o que foi desenhado.

Existem duas técnicas principais de xilogravura. A primeira é conhecida como “Madeira de Fio”. É a utilizada, por exemplo, pelos gravadores alemães do século XVI. Cranach e Albrecht Dürer foram os artistas mais célebres que utilizaram esse método, que consiste em utilizar a goiva para fazer o fundo do desenho, aproveitando o sentido das fibras da madeira.

A segunda técnica, utilizada no século XIX para reprodução, é chamada de “Madeira de Topo”. Nela, o bloco é talhado perpendicularmente às fibras. Trata-se de uma variação do método anterior. A diferença está em detalhes. Mas os efeitos são, praticamente, os mesmos.

A impressão da xilogravura é feita em prensa tipográfica manual. Trata-se, praticamente, da mesma madeira que era usada para imprimir as iluminuras dos livros na Idade Média. O gravador tem que ser, além de muito seguro, hábil artesão, tanto na elaboração da matriz, quanto na aplicação da tinta. Depois de impressa, a gravura não comporta retoques.

A primeira exposição de trabalhos de xilogravura de Marcelo Grassmann foi em 1946. A partir de então, o artista vem colecionando êxitos, prêmios e críticas elogiosas. Manteve-se, no entanto, fiel, não somente aos temas iniciais, mas sobretudo à técnica empregada. Numa época em que a arte abstrata era a grande moda, o artista conservou a linguagem expressionista. Mas de uma forma pessoal, deixando de lado deformações e angulosidades, que jamais o seduziram.


(Matéria publicada na página 29, Especial, do Correio Popular, em 28 de novembro de 1985).

Tuesday, August 29, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos de Christiano Mazzola para o site www.pontepretaesportes.com.br)

EMPATE COM GOSTO DE DERROTA

O empate da Ponte Preta com o Palmeiras, domingo, no Majestoso, por 1 a 1, pode ser considerado um bom resultado, se for levada em conta a campanha do adversário, que ainda está invicto desde a retomada do Campeonato Brasileiro da Série A, após a Copa do Mundo. Todavia, para os jogadores e torcedores da Macaca teve um sabor muito amargo, considerando-se a boa atuação do time e o fato do gol alviverde ter acontecido a menos de três minutos do final. Discordo dos que disseram que houve falha da defesa no lance. Os zagueiros e o goleiro Jean nada poderiam fazer na jogada. Méritos, isto sim, para o atraque palmeirense. A Ponte mostrou, nesse jogo, mais do que nunca, outra de suas grandes deficiências na competição: a falta de banco. A equipe caiu de ponta-cabeça após as substituições de Fábio Baiano, Luís Mário e, principalmente, Welber (que vinha sendo um dos melhores em campo, mas que não suportou o ritmo de jogo). Num campeonato complicado, como este, é importantíssimo de se contar com um plantel de boa qualidade. E é, convenhamos, o que a Macaca não tem.

DESPERTAR DE ILUSÕES

A imprensa da cidade, salvo raras exceções, sem que sequer se dê conta, ao mesmo tempo que se mostra demasiadamente severa em relação à Ponte Preta, é extremamente condescendente com o Guarani. Até parece que é o Bugre que está na série A e a Macaca na série B. Isso ficou mais claro do que nunca na sexta-feira, na sofrida vitória bugrina sobre o fraco Vila Nova, no Brinco de Ouro, por 2 a 1. Parecia que o time campineiro havia vencido o Barcelona, tamanha foi a euforia de locutores e comentaristas cá da cidade. E, em relação ao empate da Ponte Preta com o Palmeiras, a tônica foi de tragédia e de críticas mil à Macaca, que no entanto jogou com raça, coração e alma. Me engana que eu gosto! Essa falta de equilíbrio de determinados colegas jornalistas, em relação ao Guarani, apenas mascara a fragilidade do time. O gol bugrino saiu, como tem acontecido o campeonato inteiro, apenas nos minutos finais da partida, na bacia das almas. E, repito, o Bugre não derrotou nenhum Barcelona, mas um time de razoável para ruim, que faz uma campanha no máximo discreta na competição.

SURPRESA E CONFIRMAÇÃO

No jogo de domingo, da Ponte Preta com o Palmeiras, no Majestoso, a torcida teve uma surpresa (agradável) e uma confirmação, igualmente positiva. Surpreendente, no caso, foi a ótima atuação do meia Welber, não porque alguém duvidasse da sua capacidade técnica, mas por causa da sua falta de entrosamento com os companheiros, pois vem sendo aproveitado há pouco tempo. Até parecia que o atleta já era titular da Macaca há um ano ou mais, tamanha foi a sua desenvoltura em campo. Caso não se acomode, o jogador tem tudo para se transformar no destaque pontepretano da temporada. A confirmação, por seu turno, é a do futebol do coringa Nei. O garoto é a grande revelação da Ponte Preta no ano e sua performance melhora, de partida a partida, quer como ala, quer como meiocampista e quer, até, como terceiro zagueiro, onde se mostra firme na marcação e sumamente eficiente no desarme. Como se vê, nem tudo é tragédia, como alguns jornalistas buscam dar a entender, pelos lados do Majestoso.

TESTE DAS POSSIBILIDADES

O Guarani terá, hoje, em Maceió, na abertura do Segundo Turno, um bom teste para medir suas reais possibilidades na competição. O adversário, o CRB, que começou mal esse campeonato, se recuperou nas últimas rodadas e terminou o turno na quinta colocação, surpreendendo até mesmo seus mais apaixonados torcedores. Já o Bugre venceu, é verdade, o seu último compromisso, frente ao Vila Nova, no Brinco de Ouro, mas não convenceu. O time oscila bons e maus momentos durante as partidas e não inspira confiança à torcida. Este é o momento da arrancada para quem tem aspirações maiores do que a mera luta para fugir do rebaixamento. Uma vitória, hoje, em Maceió, pode encher o Bugre de moral, além de não permitir que os ponteiros se desgarrem na tabela. E uma eventual derrota não será, convenhamos, nenhuma tragédia, mas serão três pontos perdidos que, certamente, farão muita falta mais adiante.

AINDA O “AFFAIRE” TEVEZ

No Corinthians – que fez uma partida horrorosa, no domingo, quando perdeu para o Grêmio, no Pacaembu, por 2 a 0 e que pega uma pedreira, amanhã, no Estádio Anacleto Campanella, ou seja, o para ele fatídico São Caetano – o assunto dominante se refere à permanência ou não de Carlitos Tevez no clube. O jogador, que está há dias em Buenos Aires e que vai enfrentar o Brasil, neste domingo, em Londres, vestindo a camisa da Seleção Argentina, tornou a dizer que não volta mais para o Parque São Jorge. Quinta-feira, encerra-se o prazo das transações de jogadores em âmbito internacional. Se até lá o atleta não for contratado por nenhum clube (e parece que não há nenhuma oferta concreta pelo seu passe), corre o risco de ficar sem jogar o restante deste ano. Se isso ocorrer, todas as partes sairão perdendo. Tevez verá seu passe ser desvalorizado e, certamente, perderá o condicionamento técnico. A MSI deixará de recuperar o investimento que fez no jogador. E o Corinthians continuará privado de um ídolo, descendo ladeira abaixo. É uma pena!

INEQUÍVOCA COMPETÊNCIA

Não me canso de elogiar a competência de Wanderley Luxemburgo, o único técnico do futebol brasileiro capaz de levar um time limitado a um título. Aliás, fez isso recentemente, quando levou o atual Santos – que, convenhamos, não tem nenhum craque em seu plantel – a conquistar o Campeonato Paulista de 2006. No atual Brasileirão, sua equipe continua “comendo pelas beiradas”, quietinha, quietinha, mas conservando, ao término do Primeiro Turno, a segunda colocação na tabela, à frente de clubes tecnicamente muito melhores, mas que não apresentaram a mesma performance até aqui. Arrisco-me a dizer que Luxemburgo é melhor do que Felipão, cujo mérito maior é o de ser um grande motivador. O treinador santista, todavia, é um estrategista insuperável e, a contragosto dos que não gostam dele, é uma das grandes atrações deste Campeonato Brasileiro de tão pouco brilho.

RESPINGOS...

· Antonio Lopes estreou mal no comando técnico do Fluminense. No sábado, seu novo time foi derrotado pelo Atlético Paranaense, por 2 a 1, em pleno Maracanã.
· Outro time que vem fazendo bonito é o Vasco da Gama, comandado por Renato Gaúcho. Domingo, surpreendeu o Internacional, campeão da Libertadores da América, derrotando-o por 2 a 1, em pleno Beira-Rio.
· Nesta quinta-feira, encerra-se o prazo de compra e venda de jogadores do e para o exterior. Doravante, os clubes terão que buscar reforços em times das séries B e C do Brasileirão. Será que vale a pena?
· Esta coluna é exclusivamente de futebol. Não posso deixar, todavia, de destacar a conquista do hexa-campeonato da Liga Mundial de Vôlei masculino, por parte dos comandados de Bernardinho, com uma vitória na raça, de virada, sobre a França por 3 a 2.
· E já que abri uma exceção, registro, também, a primeira vitória do piloto Felipe Massa, na Fórmula 1, que conquistou, de ponta a ponta, o Grande Prêmio da Turquia, neste domingo, pilotando uma Ferrari.

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


Os poetas têm a sublime prerrogativa de enxergar mundos de encantamento e beleza em paisagens (e coisas) aparentemente comuns. Vislumbra, através dos filtros da imaginação, paraísos encantados de luz e de sombras, onde a maioria dos mortais só vê, por exemplo, um campo com mato alto, uma rua suja e cinzenta ou uma praça maltratada e sombria sem nada de especial. É o que se deduz deste poema de Mário Quintana, intitulado “Paisagem de após-chuva”, que diz: “A relva, os cavalos, as reses,/as folhas, tudo/envernizadinho,/como no dia inolvidável/da inauguração do Paraíso...”. Onde as pessoas comuns vêem, por exemplo, um mero jardineiro queimando galhos e folhas secos, o poeta enxerga com nitidez “Deus se mostrando a Moisés em meio à sarça ardente”.

Grassmann: o mago de São Simão - II


Pedro J. Bondaczuk

COMPONENTE PSICOLÓGICA

A temática de Marcelo Grassmann é uma visão do seu mundo mental e de sua experiência estética. Seus imponentes cavaleiros da Idade Média, bem como os monstros que imagina, inspirados (conforme confidenciou em determinada ocasião) em histórias em quadrinhos, nos filmes de horror e na iconografia da arte erudita, são uma espécie de catarse do artista.

Através dessas imagens torturadas, algumas assustadoras, põe para fora os demônios interiores que o atormentam, a maior parte inconsciente ou subconsciente, nascidos das contradições do mundo moderno, do ritmo neurotizante da nossa época e dos perigos escondidos nos acontecimentos cotidianos.

Em certa ocasião, Grassmann revelou: “De fato eu tenho meus demônios e eles vêm à tona. Mas eu, pelo menos, me dispo em público. Fico imaginando como serão os demônios dos concretistas, dos abstratos geométricos, dos que só pintam linhas. Será que eles têm pesadelos?”

Oswald Spengler, o furimbundo profeta da decadência da civilização ocidental disse isso de maneira mais direta e contundente, abrangendo todas as artes. Atacou, duramente, a temática cifrada dos pintores modernistas e contestou até mesmo o “modernismo”.

Escreveu: “Que é que hoje chamamos de arte? Uma música mendaz, artificioso estrondo de massas instrumentais; uma pintura mendaz, cheia de efetismos idiotas e exóticos, mais próprios dos cartazes de anúncios; uma arquitetura mendaz, que cada dez anos saqueia o tesouro das formas pretéritas, para ‘fundar’ um novo estilo, ao qual cada um faz o que lhe dá vontade de fazer; uma plástica mendaz, feita dos roubos perpetrados na Assíria, no Egito, no México. E, contudo, o gosto dos mundanos considera isso como a expressão do tempo atual. Ademais, o que permanece adito aos velhos ideais é lúbrica ocupação provinciana. Em lugar de se pôr a serviço de seu simbolismo, os artistas utilizam o cadáver, a múmia da arte, o caudal das formas já usadas, trocando-se por uma forma totalmente inorgânica. Toda a modernidade confunde variação com evolução”.

Alguém já disse que, à medida em que o tempo passa, fica cada vez mais difícil, senão impossível, sermos originais. Tudo o que pensarmos, sentirmos ou fizermos, alguém já pensou, sentiu ou fez, em algum tempo e algum lugar, desde a criação do homem. Vivemos, na verdade, elocubrando e executando nada mais do que monótonas e cansativas variações em torno de mesmos temas. Ou não?!

Konrad Fiedle, todavia, faz uma espécie de defesa do artista moderno: “O conhecimento no campo das artes plásticas só pode ser aperfeiçoado por aqueles que vêem o que permanece oculto aos demais”. O crítico traça uma linha de separação entre o talento e o gênio. Garante que este último é o que “abre ante os olhos assombrados dos poucos entendidos, campos novos que audazmente descobriu”.

Marcelo Grassmann, mesmo sendo um dos maiores desenhistas e gravadores contemporâneos, não perde a noção de perspectiva e nem permite que o sucesso lhe suba à cabeça. Por exemplo, nunca classificou seu talento como algo raro ou dádiva divina. Aliás, nem mesmo admitiu que fosse talentoso. Atribui os resultados obtidos em mais de 40 anos de carreira não a algum eventual “dom especial”, mas a muito trabalho e a paciente, constante e rígida autodisciplina.

“Não tive facilidade para o desenho. Tive uma grande paixão, o que é bastante diferente”, admitiu. Ao referir-se ao tempo em que começou a ensaiar os primeiros passos nas artes plásticas, Grassmann afirmou, meio na base da brincadeira, mas refletindo uma intenção séria: “Ah, se eu tivesse naquele tempo a habilidade manual que tenho hoje! Poderia ter sido um grande encanador! Sou um encanador razoável, sabe?”


(Matéria publicada na página 29, Especial, do Correio Popular, em 28 de novembro de 1985).

Monday, August 28, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Todos os sons, agradáveis ou não, constituem, em conjunto, a música da vida. Já imaginaram que tortura seria viver num mundo absolutamente silencioso? É verdade que às vezes até sonhamos com isso, diante da barulheira das grandes cidades. Mas são momentos passageiros, já que os ruídos, que às vezes abominamos (quando exagerados, claro) são os indicadores de que há vida ao nosso redor. Mário Quintana aborda a questão, com certa ironia, neste poema “Meu trecho predileto”, que diz: “O que mais me comove, em música,/são essas notas soltas/--- pobres notas únicas –/que do teclado arranca/o afinador de pianos...”. Essas mesmas notas isoladas, contudo, que isoladas soam exóticas e não raro desagradáveis, ordenadas e produzidas pelos dedos ágeis, disciplinados e competentes de um virtuose, se transformam em sublimes sonatas, em maravilhosas composições, em marcantes e inesquecíveis canções, que nos embevecem e maravilham.

Grassmann: o mago de São Simão - I


Pedro J. Bondaczuk


As artes plásticas, em todo o mundo, encontram-se num ponto de encruzilhada, principalmente quanto à temática adotada e às múltiplas formas de expressão. As várias bienais, realizadas nos principais centros culturais da Europa e dos Estados Unidos (e também a de São Paulo, que já firmou tradição) exibem trabalhos que vão do genial ao ridículo, das telas tradicionais aos anárquicos “happenings”, agitando críticos e freqüentadores de museus e galerias.

Enquanto em alguns círculos, a linguagem, na maior parte das vezes cifrada e acessível apenas para uma minoria de iniciados, é combatida e contestada, em outros, é defendida com paixão, expandida às últimas conseqüências e incentivada por mestres da pintura.

Embora esse tipo de arte, primeira manifestação estética do homem primitivo, elitize-se e se distancie do povo, em raras ocasiões apareceram tantos pintores, desenhistas, gravadores e escultores novos, com pretensões ao estrelato, brandindo novas propostas temáticas e lançando novas técnicas, cada vez mais acuradas e revolucionárias.

Galerias e exposições multiplicam-se. Marchands surgem em profusão. Escolas de pintura preparam novas levas de talentosos artistas. Artistas plásticos de razoável potencial aparecem, têm o seu “brilhareco” e logo desaparecem. Alguns não passam de modismos, logo deixados de lado. Outros, mais raros, fixam-se no gosto dos colecionadores de arte, sobem ao Olimpo dos consagrados e conquistam seu espaço na História das Artes.

Entre os vencedores, aqueles que não precisam provar mais nada para ninguém, cujos trabalhos “falam” por eles, está Marcelo Grassmann, oriundo de São Simão, pequena cidade do interior paulista, distante cerca de 400 quilômetros da Capital, na região de Ribeirão Preto. Destaca-se não somente pela técnica, elaborada e precisa. Nem pelos temas, originais e fantasmagóricos, visões fantásticas e inquietadoras de pesadelos, mistos de cavaleiros medievais e demônios mitológicos.

O que caracteriza, sobretudo, a obra de Marcelo Grassmann é sua postura face à vida. É a recusa de rótulos e definições. É a determinação de não se dispor a representar apenas um “papel” de artista, mas de fato “ser” esse criador de sonhos e de pesadelos. Seus desenhos e gravuras, por exemplo, são inteligíveis e assimiláveis. O público não precisa fazer nenhuma ginástica mental para entendê-los e apreciá-los.

Mas ganham grandeza e profundidade quando o parâmetro de apreciação é o da sensibilidade e não tanto o da lógica e da razão. Daí seu inegável sucesso, representado pelos convites que recebe para expor. Milhares de pessoas já puderam apreciar os trabalhos de Marcelo Grassmann, em pelo menos três continentes. Além disso, o artista ostenta em seu currículo importantes prêmios no Brasil e no Exterior.

Seus desenhos e gravuras ocupam lugar de realce nas principais galerias de arte e nos mais famosos museus brasileiros, além de integrarem o acervo de colecionadores e instituições em várias partes do mundo, como o da União Pan-Americana em Washington, por exemplo, entre outras entidades artísticas e culturais.

Com uma capacidade de trabalho notável, um talento à prova de contestações e a criatividade ímpar dos gênios, Grassmann inseriu a pequena São Simão “nos mapas” de arte nacionais. Criou, por exemplo, na cidade, um bem organizado museu particular, instalado na antiga residência da família.

Além disso, a semana que leva o seu nome (em todos os meses de outubro), se inscreveu no calendário de cultura do País. Antes, já havia conquistado os maiores prêmios que um artista pode aspirar no Brasil: o de melhor gravador brasileiro, na Bienal de São Paulo de 1955, e de melhor desenhista, nas bienais de 1959 e 1961.

(Texto publicado na página 29, Especial, do Correio Popular, em 28 de novembro de 1985).

Sunday, August 27, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Em nossos julgamentos, tomamos o que somos, fazemos e pensamos como parâmetro. Tudo e todos que forem como nós, são normais. Os que diferem, consideramos, no mínimo, exóticos, quando não risíveis. Ocorre que o inverso também é verdadeiro. Nossa aparência, comportamento e costumes provavelmente causam pasmo e risos nos que são diferentes de nós. É a constatação de Mário Quintana, no poema intitulado “Do inédito”, que diz: “E quando, morto de mesmice,/te vier a nostalgia de climas/e costumes exóticos,/de jornais impressos em/misteriosos caracteres,/de curiosas beberagens,/de roupas de estranho corte/e colorido, lembra-te que/para alguém nós somos/os antípodas: um remoto,/inacreditável povo do/outro lado do mundo,/quase do outro lado da/vida – uma gente de se/ficar olhando, olhando, pasmado.../Nós, os antípodas, somos assim”. No entanto, é possível, desejável e necessária a pacífica convivência dos contrários!

Contradições capitalistas


Pedro J. Bondaczuk


O fracasso do comunismo, pelo menos na forma como foi colocado em prática na União Soviética e Leste europeu, e como vem sendo exercido na China, em Cuba, no Vietnã e Coréia do Norte, alguns de seus derradeiros redutos; e as gritantes distorções do capitalismo, como a manipulação dos consumidores, a existência de cartéis, monopólios e oligopólios e sua inaptidão para o atendimento de necessidades sociais mínimas, remetem o homem ao ponto zero na sua busca por um sistema ideal de Estado.

Os que foram testados até aqui se revelaram inadequados, com conseqüências dramáticas para milhões de pessoas. Foram os responsáveis pela perversa divisão entre grupos mínimos, que compõem minúsculas ilhas de prosperidade, e vastíssimos continentes de miséria. Causaram tensões que redundaram por excelência das explosões demográficas e desembocaram nas guerras.

Por isso, não se deve encarar como mera brincadeira a afirmação do escritor John Le Carré, conhecidíssimo por seus livros sobre espionagem, best-sellers mundiais, quando concluiu, recentemente, numa entrevista: "Agora que derrotamos o comunismo, vamos ter que nos voltar para a derrota do capitalismo".

É evidente que o sistema que aí está é aberrativo e, caso não venha a se reciclar, tende a provocar convulsões sociais potencialmente incontroláveis. Cabe, mais uma vez, rediscutir a essência do conceito de Estado para redimensionar seu papel.

Parece que as noções básicas a esse respeito se perderam no tempo. Foram ofuscadas pelas distorções e contradições dos que assumiram o papel de estadistas, mas sem muito talento para isso. Convém refletir sobre sua definição e uma das melhores é a do filósofo Thomas Hobbes: "Estado é uma multidão de homens unidos como uma pessoa por um poder comum, para a paz, defesa e vantagens comuns dos mesmos".

Ou seja, conceitualmente, não se trata de um senhor, mas de servo de uma vontade consensual. Existe para servir, nunca para ser servido. Qual o Estado contemporâneo, todavia, que cumpre esse objetivo?

O tema é extremamente vasto e merece verdadeiros tratados, não somente um artigo. O que fica claro, todavia, é que, conforme constatação do filósofo grego, naturalizado francês, Cornelius Castoriadis, um dos mais ácidos críticos do comunismo, "o capitalismo não resolveu os problemas mais básicos da humanidade".

É possível, até, que os tenha complicado, colocado num beco sem saída. Teoricamente, o sistema é regido pelo mercado livre e por sua lei natural de oferta e procura. O "Anuário Demográfico" das Nações Unidas, em sua edição de 1989, constatou que um terço da população mundial atual é constituído por jovens de até 15 anos. Portanto, há uma necessidade premente de se arranjar ocupação para vários milhões desses indivíduos que anualmente atingem a idade de trabalhar.

Há um desequilíbrio nesse mercado, com mais oferta de mão de obra do que procura; do que a capacidade de absorção dela. Claro que, nestas circunstâncias, os salários baixam. Como eles constituem a renda da maior parte da humanidade, o poder aquisitivo despenca, reduzindo o consumo. Em conseqüência, para que os preços não se aviltem, a produção é igualmente diminuída. Com isso, o que cresce é apenas a miséria e a concentração de riquezas em poucas mãos e nada mais.

Esta é apenas uma das tantas distorções do sistema que se quer vitorioso. Castoriadis propõe, em seu lugar, uma sociedade autônoma e soberana, que determine tanto o nível de consumo, quanto o de produção. Em entrevista recente que concedeu ao jornal "Folha de S. Paulo", destacou: "O mercado capitalista não é nem transparente, nem racional. Uma sociedade autônoma e soberana exige um mercado e uma moeda que não assumam a função de instrumentos de acumulação como ocorre hoje. O mercado, no entanto, também tem seus limites. Os gastos públicos e os investimentos do Estado não podem ser determinados pelo mercado, ao contrário do que prega a mistificação neoliberal dos 'Chicago Boys'".

(Artigo publicado na página 17, Internacional, do Correio Popular, em 13 de setembro de 1991).

Saturday, August 26, 2006

REFLEXÃO DO DIA


A vida, seja qual for (animal ou vegetal), é constituída por ciclos, comparáveis às estações do ano. A primavera, seria a infância florida e agradável. O verão, o período quente, de energias, momento em que nos sentimos fortes e produtivos. Já o outono seria a fase que prenuncia a chegada do inverno (a época do nosso fim) com o início da decadência física que, no reino vegetal, é representado pelo envelhecimento e posterior queda das folhas. São ciclos inexoráveis, que devem ser vividos com naturalidade, sem traumas e sem temores. Assim é a vida. Mário Quintana trata do tema neste poema “Chão de outono”, que diz: “Ao longo das pedras irregulares do calçamento/passam ventando umas pobres folhas amarelas/em pânico, perseguidas de perto/por um convite de enterro,/sinistro, tatalando aos pulos,/cada vez mais perto,/as duas asas tarjadas de negro!”. Belo poema do mestre! Um tanto lúgubre, é verdade, mas mesmo assim belo.

E o mundo parou


E o mundo parou

Pedro J. Bondaczuk

Minha vida é composta de muitas vidas.
Transformações, encontros,
desencontros e uma
enorme perplexidade
em face do Tempo.

O encantamento da infância,
pessoas que amei
e que já não mais são...
Sonhos cristalizados
em algum meandro do cerebelo.

Amores que pareciam eternos,
mortos pelas circunstâncias.
Sua imagem, Nair, fixada
na retina, tão jovem,
tão bela, preservada
pela memória, do desgaste
da velhice.

Em algum lugar do passado
você está à minha espera,
para me redimir
dos erros, do pecado e da insensatez,
anjo guardião do Santo Graal,
em um jardim de acácias
e magnólias e hortênsias lilases.

Depois, os apelos da carne,
confundidos com amor,
fabricaram um calidoscópio
de males-entendidos.
de desgostos e traições,
deixando na boca
um travo amargo de derrota.

Depois, vieram sucessos efêmeros
que o Tempo desestruturou,
destruiu, apagou...
Ambições pueris, miragens
de areia e carvão no
deserto assustador da rotina.

Mas o mundo parou numa
tarde de domingo, num
bosque encantado de ipês
floridos, cristalizado
pelo seu sorriso de diva,
sua voz sensualmente rouca
sussurrando tentações,
seu perfume inebriante de mulher,
no limite entre a infância
de sonhos descomprometidos
e a velhice povoada
de pesadelos e de fantasmas...

(Poema composto em São Caetano do Sul, em 2 de outubro de 1962).

Friday, August 25, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Há momentos na vida em que, mesmo sem nenhum motivo, um pensamento ruim nos atravessa, de súbito, a mente, como uma tentação. O antídoto contra esses instantes de “envenenamento” do espírito, porém, é o otimismo. É o riso espontâneo, mesmo que imotivado. São as lembranças boas, que existem, justamente, para nos servirem de consolo e nos encherem de ânimo para que lutemos para que se repitam indefinidamente. É, mais ou menos, o tema que Mário Quintana aborda, neste poema “Momento”, que diz: “O homem parou, cheio de dedos,/para procurar os fósforos nos bolsos./A insidiosa frescura do mar/lhe mandou um pensamento suicida.//E veio um riso límpido e irresistível/ - em I, em A, em O -/ no fundo de um peito da infância./Um riso... Senão quando o homem/achou os fósforos e a vida recomeçou./Apressada, implacável, urgente./A vida é cheia de pacotes...”. Eu acrescentaria, também, que é repleta de perspectivas felizes.

Somos todos estrangeiros...


Pedro J. Bondaczuk


O poeta Pablo Neruda, no livro "Confesso que vivi", escreve: "Não posso viver senão em minha própria terra. Não posso viver sem pôr os pés, as mãos e o ouvido nela, sem sentir a circulação de suas águas e de suas sombras, sem sentir como minhas raízes buscam em seu barro pegajoso as substâncias maternas".
Somos educados, instruídos e principalmente condicionados a valorizar, defender e amar o país em que nascemos. Por razões puramente sentimentais, veneramos nossa “pátria”, e tanto (ou mais) que aos nossos pais. E, no entanto, como assinala Mário de Andrade, pátria nunca é fruto de escolha. “É acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der”, destaca, no poema “O poeta come amendoim”.
Nascemos em determinado país, e não em outro, só porque nossos pais escolheram esse lugar para viver. No caso do Brasil, no que diz respeito às origens, somos, portanto, todos “estrangeiros”. Ou descendemos dos primitivos “descobridores” portugueses, que se apossaram a força deste vasto território e impuseram seus costumes e cultura. Ou nossos antepassados vieram da África, como escravos (claro que à sua revelia). Ou nossos ascendentes são imigrantes dos mais diversos países e continentes, já que o Brasil conta com pessoas originárias de virtualmente todas as partes do mundo.
Portanto, a menos que sejamos indígenas, não podemos nunca afirmar que somos “brasileiros legítimos”, do ponto de vista étnico. Ou seja, que tenhamos a mais remota possibilidade de contar com “pureza racial” (o que torna ainda mais estúpida qualquer forma de preconceito de raça e/ou de cor). Mesmo os descendentes dos habitantes primitivos do País não têm nenhuma garantia de que em sua linhagem não haja ocorrido mistura. Devem ter lá (não importa em que geração), sua dosezinha de miscigenação com o europeu ou o africano (ou ambos).
A natureza é sábia nesse aspecto. Favorece a variedade genética. Em contrapartida, “pune” tentativas de união dentro de uma mesma família, mesmo nos seus ramos mais distantes, o que, quando ocorre, produz indivíduos geneticamente fracos, não raro com tendências ao retardamento mental.
Ademais, não escolhemos nossos pais. Somos continuidade, elos de uma cadeia genética cujas origens desconhecemos, por se perderem no tempo. Quando muito, sabemos uma coisa ou outra (no máximo) dos nossos bisavós. E olhem lá! A maioria nem isso sabe! Alguns (raríssimos) conhecem sua genealogia até determinada geração, digamos até cinco séculos (quando muito). Mas têm só registro do nome ou de um ou outro feito lendário do antepassado que se destacou e que mereceu ser perpetuado. Desconhecem, porém, características elementares que os identifiquem, como fisionomia, gostos, idéias etc.
Por isso, nossa identificação com a pátria nunca pode ser genética, só sentimental. É, como ressalta Mário de Andrade, nestes magníficos versos, subjetiva. “Brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventuroso,/o gosto dos meus descansos,/o balanço das minhas cantigas, amores e danças./Brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,/porque é o meu sentimento pachorrento,/porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir”. O resto...Bem, o resto é mera (e inútil) divagação...

Thursday, August 24, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos de Christiano Mazzola para o site www.pontepretaesportes.com.br)

DEFESA, SEMPRE A DEFESA

Vários fatores contribuíram para a nova derrota da Ponte Preta, ontem, na Kyocera Arena de Curitiba, para o Atlético Paranaense, por 3 a 0. O principal motivo, porém, foram as falhas (de novo) da defesa, que levou três gols bestas, frutos de pura falta de atenção. E não foi somente a zaga que falhou. O goleiro Aranha também deu a sua contribuição negativa, engolindo um gordo e glorioso peru, com pena e tudo. É verdade que o time foi prejudicado pela arbitragem, que anulou um gol legítimo do zagueiro Régis, assinalando um impedimento inexistente. Esse erro, tenham certeza, mudou por completo o panorama da partida. A Ponte jogou bem, embora seus avantes tenham pecado em demasia nos arremates. A sorte também não ajudou, principalmente na bola na trave chutada por Welber, em cobrança de falta. E o goleiro do time paranaense, Kleber, fez defesas importantes no jogo, o que atesta que a Macaca criou oportunidades, todas, infelizmente, desperdiçadas. A maior delas esteve nos pés do lateral Iran que, com o gol aberto, chutou com displiscência (o que é inconcebível) e perdeu a maior chance do jogo. Se quando a Ponte joga bem, perde de 3 a 0, fico imaginando o que pode acontecer quando jogar mal.

DESPEDIDA COM DIGNIDADE

O Guarani encerra sua participação no Primeiro Turno do Campeonato Brasileiro da Série B, amanhã, no Brinco de Ouro, contra o limitado Vila Nova de Goiânia. Estou curioso sobre como o time vai se comportar depois da vexatória goleada que sofreu, sábado passado, quando foi humilhado pelo Sport Recife e voltou para Campinas com um contundente placar de 8 a 1. A partida marca a estréia de Luís Carlos Barbieri no comando técnico do Bugre, o que sempre é motivação a mais, pois os jogadores vão querer mostrar ao novo treinador que têm condições de vestir a camisa titular alviverde (pelo menos é o que se presume). Outra curiosidade minha é quanto à reação da torcida, indignada com o vexame ocorrido em Pernambuco. Várias pichações de protesto foram feitas no Brinco de Ouro, o que mostra que o torcedor não vai perdoar tão cedo essa mancada da equipe. Mas Barbieri merece um voto de confiança. E o Bugre tem obrigação de vencer esse jogo.

CADÊ O CENTROAVANTE?

A Ponte Preta continua à procura de um centroavante, que o técnico Marco Aurélio Moreira tanto necessita para encarar o Segundo Turno deste Brasileirão. Todavia, trata-se de peça rara no mercado e todos os clubes, sem exceção, estão com dificuldades para encontrar essa “avis rara”, da qual o futebol brasileiro, em plano doméstico, tanto carece. Isso ocorre com o Corinthians, o Palmeiras, o Santos, o Botafogo, o Cruzeiro e vai por aí afora. Quem tem, pode não ter por muito tempo, face às investidas dos clubes do Exterior. Quem não tem, improvisa, o que nem sempre (ou quase nunca) dá certo. Na segunda-feira, chegou do exterior o centroavante Jurandir, para um período de testes no Majestoso. Qual não foi minha surpresa, porém, quando Sebastião Lapola anunciou, ontem, a dispensa do atleta, por ter sido reprovado pela comissão técnica. E a busca continua, sem muita esperança de sucesso. Por que, então, não investir em Wanderley, prata da casa, que pintou tão bem no início do ano? Essa é uma pergunta que até aqui ninguém na Ponte Preta ainda respondeu.

DINHEIRO, CADÊ DINHEIRO?

A situação do Guarani é complicada dentro e fora de campo. No início da semana, quando foi apresentado à imprensa, o novo treinador do Bugre, Luís Carlos Barbieri, anunciou que havia pedido à diretoria a contratação urgente de um zagueiro experiente e indicou o nome de Luciano, com quem já trabalhou no Criciúma. Os diretores entraram em contato com o atleta e não tardou para que descartassem sua vinda para Campinas. O empecilho foi o salário. E olhem que Luciano não pediu nenhum absurdo. Aceitou vir para o Guarani, desde que o clube pagasse o mesmo que estava ganhando em Santa Catarina, o que faz sentido. Afinal, trata-se de um profissional. Mas a diretoria bugrina descartou essa possibilidade, alegando que o salário atual do jogador está “muito acima do teto” estipulado pelo Bugre. Onde chegou o futebol de Campinas! Times muito inferiores aos nossos conseguem pagar bem mais aos seus atletas do que os dois de Campinas. Assim não há como montar equipes pelo menos competitivas. É o fim da picada!

NÍVEL TÉCNICO BAIXÍSSIMO

É baixíssimo o nível técnico do Campeonato Brasileiro da Série A deste ano (o da Série B, nem se diga!) e tende a ficar ainda pior no Segundo Turno, com a debandada para o exterior dos poucos jogadores razoáveis que ainda atuam no País. O jogo de ontem, em Caxias do Sul, entre o Juventude e o Corinthians, foi um dos piores que assisti nos últimos tempos. E o placar não poderia ser diferente do que foi: 0 a 0. Os dois times “espancaram” a bola, que deve ter saído de campo quadrada. Foi um festival de passes errados, de botinadas e de chutes equivocados para os dois gols. Com esse time, o Corinthians não vai muito longe. Não será, evidentemente, rebaixado para a Série B (duvido que os cartolas deixem), mas não deve terminar a competição muito acima da 10ª colocação, se tanto. Pelo que vi, ontem, na televisão, concluo que Leão até que fez milagre, nesta pouco mais de uma semana que está no clube.

VAI COMEÇAR O DESMONTE

Depois do afastamento de Carlito Tevez, que, provavelmente, não vestirá mais a camisa do Corinthians, outro argentino, Mascherano, estaria de saída do clube, com destino ao futebol europeu. Pelo menos é o que se propala e que a própria lógica indica. Emerson Leão não escondeu de ninguém que não gosta de trabalhar com jogadores estrangeiros. Não duvido nada que o treinador vai lançar mão da excelente categoria de base do time e se livrar o mais rápido possível dos medalhões, que só trazem complicações. Com isso, ocorreria o esperado desmonte do plantel que conquistou o título nacional do ano passado, mas que neste, está jogando pedrinha. Roger, por exemplo, contratado a peso de ouro pela MSI, há tempos que não vem jogando nada. Aliás, nenhuma das “estrelas da companhia” está tendo atuações pelo menos decentes. Gustavo Nery, por exemplo, praticamente sumiu. E, para complicar, Nilmar está no estaleiro e prestes a deixar o clube. Triste fim para um projeto mirabolante, porém irreal!

RESPINGOS...

· A dança dos técnicos continua. Ontem, José Teixeira foi demitido pelo Fluminense, após a lavada que o time tomou do Palmeiras, no Parque Antártica, por 3 a 0. A diretoria tricolor não dormiu no ponto e anunciou, ontem mesmo, a contratação de Antonio Lopes, que recentemente deixou o Goiás.
· O Flamengo foi operado sem anestesia, ontem, no ABC, pelo péssimo Wilson Souza de Mendonça. No primeiro gol do Azulão, o centroavante Gustavo ajeitou a bola com a mão, antes de mandá-la para as redes. Todo mundo viu, menos o horrível soprador de apito.
· Melou a transferência de Iranildo para o futebol árabe. Dessa forma, o baixinho retorna ao Brasiliense, onde é o bam-bam-bam e manda prender e soltar.
· O Cruzeiro, que recentemente havia negociado o ex-corintiano Gil com o exterior, agora ficou sem seu matador. Alecsandro, ex-Ponte Preta, foi vendido para o futebol europeu.
· Ronaldinho Gaúcho só faltou fazer chover na goleada do Barcelona, anteontem, sobre o Bayern de Munique, por 4 a 0. Por que esse mágico da bola não joga tudo isso na Seleção Brasileira? Mistério!.

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


Os poetas, eternos boêmios, que não raro se embriagam não de álcool, mas de luz, de magia e de beleza, têm uma fome e sede insaciáveis. E estas não são físicas, mas espirituais, cerebrais, estéticas É o que Mário Quintana dá a entender, neste bem-humorado e delicioso poema, intitulado “Os vira-luas”, que diz: “Todos lhes dão,/com uma disfarçada ternura,/o nome, tão apropriado, de vira-latas./Mas e os vira-luas?//Ah! Ninguém se lembra/desses outros vagabundos/noturnos, que vivem/farejando a Lua,/fuçando a Lua,/insaciavelmente,/para aplacar uma outra fome,/uma outra miséria,/que não é do corpo!”. Da minha parte, confesso, sem nenhum pudor, que sou um constante, um perpétuo, um incorrigível “vira-luas”, com fome e sede insaciável de beleza.

A maldição de Midas


Pedro J. Bondaczuk


Os apólogos, fábulas e parábolas são formas didáticas (e poéticas) que os grandes mestres do passado desenvolveram para transmitir lições de comportamento e de vida, sobretudo às pessoas incultas e com dificuldades de entendimento. Alguns são tão antigos, que se torna impossível determinar seus autores. Atravessaram séculos, milênios até, transmitidos que foram oralmente, geração após geração.
Uma dessas histórias exemplares é a que trata da maldição de Midas, aquele rei que transformava em ouro tudo o que tocava. Ela foi lembrada, dia desses, por um leitor, que me enviou e-mail a propósito da minha crônica “Self-made man”, em que faço algumas considerações sobre os detentores de grandes fortunas.
Para quem não conhece essa lenda (ou mito, ou apólogo, ou fábula, ou parábola, sei lá como caracterizar essa narrativa), recomendo a leitura do livro “A Grécia. Mitos e lendas”, de Alain Quesnel (com tradução de Ana Maria Machado), da Editora Ática. Mas não vou frustrá-lo, caro e paciente leitor. Para sua comodidade, resumo, abaixo (embora de forma um tanto canhestra), quer para o seu conhecimento, quer para sua lembrança, a referida história.
Em Bromionte, na Macedônia, norte da Grécia, vivia um rei muito ganancioso e, sobretudo avaro, chamado Midas. Seu grande sonho na vida era possuir toda a riqueza do mundo, mesmo que não usufruísse dela. Sua cobiça era enorme, imensa, desmedida, sem limites. Em certo dia, passeando pelos suntuosos jardins do seu palácio, deu de cara com o fauno Sileno, escondido atrás de um arbusto, que se havia extraviado da morada de Dionísio.
Querendo fazer uma gentileza ao deus da alegria e do prazer, conduziu o trânsfuga à sua presença. A seu favor, deve-se dizer que Midas não pensou, nesse momento, em nenhuma recompensa pelo seu gesto. A iniciativa de premiar o monarca partiu de Dionísio, que estava grato por sua atitude, já que tinha grande consideração por Sileno. Para premiá-lo, o deus concedeu-lhe o atendimento de um, um único desejo, qualquer que fosse. E o rei não titubeou. Indagado sobre o que queria, pediu: “Quero que tudo aquilo que eu tocar, se transforme em ouro!”. “Concedido”– respondeu-lhe Dionísio, embora ciente da insensatez de Midas.
E assim foi. O rei voltou ao seu palácio radiante. Tocou no trinco da porta, e este, imediatamente, se transformou em ouro. Segurou seu cetro real, e o fato se repetiu. Para se divertir, começou a tocar tudo o que havia ao seu redor. E tudo ficava, num piscar de olhos, reluzente e dourado. Midas não cabia em si de contentamento.
Não tardou, porém, em perceber as inconveniências desse dom. Foi quando precisou realizar algumas tarefas básicas da vida, como comer, beber etc. Ao tocar um pedaço de pão, por exemplo, este imediatamente se transformou num rígido pedaço do precioso metal. O mesmo aconteceu com o copo de vinho. O rei começou a se apavorar. Mas o auge do seu desespero se verificou ao tentar acariciar sua filha caçula, uma bela criança de nove anos de idade, a quem tanto amava. Ao seu simples toque no rosto da princesinha, incontinenti, esta se transformou numa estátua de ouro.
Fora de si, Midas correu para a morada de Dionísio, que, às gargalhadas se divertia com as desventuras do rei, que, aos prantos, implorou que o deus desfizesse o encanto, que na verdade era maldição. Depois de rir muito da situação, este resolveu atender aos rogos aflitos do monarca. Recomendou-lhe que tomasse banho na nascente do Páctolo, próximo ao Monte Tmolo, para voltar à condição normal. Desde então, as águas desse rio carregam uma porção de pepitas de ouro, para alegria dos cobiçosos e dos avarentos.
Há pessoas que parecem ter esse mesmo encanto de Midas, mas ao contrário deste, não admitem se tratar de grande maldição. Tudo o que tocam parece virar ouro, que juntam, juntam e juntam, sem saber o que fazer com ele. Não sabem usufruir a fortuna que têm. Desconhecem que os verdadeiros bens da vida são imateriais. Esses insensatos, cuja ambição desmedida se concentra exclusivamente na fortuna, nunca têm certeza, por exemplo, de serem, de fato, amados. Não sabem se o “amor” que lhe juram devotar é genuíno ou se é mero fruto de interesses. O mesmo vale para as amizades, na verdade quase todas interesseiras mesmo.
Ressalte-se que nem todos os milionários são dotados da extrema insensibilidade de Midas. Há (posto que raros) os que fazem da sua fortuna fontes de amparo a artistas, a desportistas, a instituições voltadas ao socorro social (que fundam e mantêm) e a tantas outras obras de benemerência. Os que não agem assim, convivem com o intenso desespero do insensato rei da fábula. Mas, ao contrário deste, não têm como desfazer o encanto que, na verdade, é maldição. Como se vê, tudo no mundo é relativo...

Wednesday, August 23, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O mundo vive tão imerso em problemas e injustiças, com guerras, crimes e toda a sorte de violências, das mais ostensivas às mais sutis, que quando temos um dia só de boas notícias, chegamos a considerar o fato autêntico milagre. Claro que eles existem, embora sejam raros. E nossa felicidade independe, muitas vezes, do que ocorre ao nosso redor. É uma questão de postura, de mentalidade e de predisposição espiritual. Mário Quintana escreveu um belo poema a respeito, intitulado “O milagre”, que diz: “Dias maravilhosos em que os jornais/vêm cheios de poesia.../e do lábio do amigo/brotam palavras de eterno encanto...//Dias mágicos.../em que os burgueses espiam,/através das vidraças dos escritórios,/a graça gratuita das nuvens...”. Aliás, “do lábio do amigo” sempre “brotam palavras de eterno encanto”. Daí eu valorizar tanto as amizades, que considero bênçãos, privilégios, dádivas de Deus.

Self-made man


Pedro J. Bondaczuk


O caminho para o sucesso é estreito e acidentado e poucas, pouquíssimas pessoas conseguem atingir os objetivos que traçaram para suas vidas. As que conseguem a façanha de chegar “ao cume da montanha”, todavia, não raro se decepcionam com o fato da realidade ser muito aquém das suas delirantes fantasias.
E qual é a meta suprema da maioria dos mortais? Quem respondeu a fortuna, ganhou, de prêmio, uma viagem para o Iraque, com escala no Líbano e um bônus para o Afeganistão. Brincadeiras a parte, podemos constatar, com facilidade, sem qualquer esforço, que desde o mais abastado dos indivíduos, proprietário de bilhões de dólares e de riquezas sem fim, ao indigente que, oprimido pela fome e pela desnutrição, delira e elabora fantasias mirabolantes em torno, por exemplo, de um imaginário prêmio de loteria, todos querem a mesma coisa: ter, ter e ter, o máximo que puderem.
Não vem ao caso, aqui, considerar se esse objetivo é correto ou equivocado e muito menos as razões do acerto ou do erro. O aspecto que trago hoje à reflexão do paciente leitor não é este. Ouço, a todo o momento, por aí, a afirmação de que, através do trabalho, ninguém consegue chegar à fortuna. Discordo.
Admito que seja uma ocorrência raríssima, mas conheço diversos casos em que isso ocorreu. Igual a mim pensa, por exemplo, boa parte dos norte-americanos. A quantidade dos chamados “self-made men” nos Estados Unidos, de onde procede a maioria dos milionários da atualidade, é, provavelmente, a maior do mundo. E esses “bafejados pela fortuna”, que arrancaram o que têm graças ao seu talento, à sua autodisciplina, à sua persistência e ao seu trabalho, sentem imenso orgulho em declarar, sempre que têm oportunidade, a origem das suas riquezas.
Tanto que biografias e mais biografias a seu respeito são produzidas com fartura, muitas das quais se transformam em best-sellers que, por conseqüência, engordam ainda mais suas quilométricas contas bancárias. Manuais e mais manuais de auto-ajuda, que se propõem a ensinar o caminho das pedras, ou seja, como se deve fazer para alcançar o sucesso e a fortuna, esgotam edições e mais edições e são traduzidos para várias línguas.
Ninguém gosta da miséria, nem o mais despojado dos ermitões, embora muitos a citem como virtude. Não vejo porque! Da minha parte, embora a riqueza não seja exatamente o valor que mais preze e que me mova, nada tenho, pessoalmente, contra ela. Nem contra os ricos. O que condeno neles são os comportamentos que, via de regra, acompanham suas fortunas, como a arrogância, a prepotência, a avareza, o egoísmo, a ostentação, o desperdício e tantas e tantas e tantas outras maneiras de afronta aos desafortunados.
Tornou-se célebre a afirmação do carnavalesco paraense, que se consagrou, por sua criatividade, no Carnaval do Rio de Janeiro, Joãozinho Trinta, que disse: “Quem gosta de miséria é intelectual. Pobre aprecia a suntuosidade e a ostentação”. Claro que ele está certo. Isto faz parte da própria natureza humana.
É óbvio que a fortuna não deve ser o único ideal de qualquer pessoa, por pior que seja o seu caráter e por mais curta que seja a sua inteligência. E já nem cito a principal razão, qual seja, a de que, como mortais, deixaremos este mundo da mesma forma como entramos nele: nus, sem absolutamente nada do que, em vida, consideramos que seja nosso.
Quem coloca a riqueza como meta exclusiva de vida é candidato infalível a monumentais frustrações. Se não conseguir seu intento (o que é quase certo de acontecer), os motivos de decepção são evidentes. Se tiver sucesso, mas não souber o que fazer com o que tenha amealhado, logo haverá de perceber que apenas a riqueza não é capaz de satisfazer seus desejos mais profundos, que não sejam os de caráter meramente material. Refiro-me aos espirituais, muitos tão sutis e secretos, que nem a própria pessoa sabe, com certeza, quais são.
Criticados ou endeusados, porém, o fato é que esses seres bafejados pela fortuna – os Bill Gates, os Paul Gettys, os Rothschilds, os Schlumbergers, os Rockfellers, os Guggenheims, os Carneggies etc.etc.etc. da vida – são imitados, invejados e despertam profundo fascínio nas multidões. Principalmente os considerados “self-made men”, que desbravaram seus caminhos com ousadia e competência (não raro, com esperteza) e chegaram ao topo da montanha dos seus sonhos. Prova disso é o sucesso das publicações voltadas para a divulgação das suas festas magnificentes, das suas mansões, dos seus iates, das suas amantes, dos escândalos (verdadeiros ou inventados) em que se envolvem e de tudo, enfim, o que lhes diga respeito.
Não há, convenhamos, quem não se coloque no lugar desses afortunados, pelo menos uma vez na vida, em suas mais secretas fantasias. Mesmo (ou principalmente) os que negam isso com maior ênfase que, provavelmente, são os que mais ambicionam a fortuna e a conseqüente notoriedade. Raros, raríssimos não agem como o Fausto, de Johann Wolfgang Göethe. A maioria, como esse personagem, vende a alma ao demônio e se esquece que um dia o comprador irá reclamar aquilo que adquiriu. Mas então...

Tuesday, August 22, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Vemos, com a maior facilidade, os defeitos alheios. Principalmente quando estes são satirizados, em verso ou prosa. Determinadas sátiras são tão precisas (ou tão ferinas?), que sequer é necessário citar o nome da pessoa de quem se referem. Isto, quando se trata, obviamente, dos “outros”. Quando os satirizados somos nós... raramente nos identificamos com o que está escrito. Mário Quintana fez essa constatação nestes deliciosos versos, que intitulou “Da sátira”, que dizem: “A sátira é um espelho: em sua face nua,/fielmente refletidas,/descobres, de uma em uma, as caras conhecidas,/e nunca vês a tua...”. Por isso, em vez de atentarmos para os defeitos alheios, devemos verificar (e, quando possível, corrigir) os nossos. É um princípio não somente de humanidade, mas, sobretudo, de sabedoria.

Vanitas vanitatum


Pedro J. Bondaczuk


Os nossos desejos (salvo raras e honrosas exceções), são sumamente ocos, pueris e sem sentido. Desperdiçamos a vida correndo atrás de miragens, de fantasias, de ilusões e de sombras e não conseguimos atentar para o concreto, o real, o palpável, a substância: ou seja, para o que realmente tem valor. Esta é a essência do que debatemos, dia desses, eu e meus amigos mais chegados, em nossos descomprometidos e descontraídos bate-papos de fim de tarde, num bar da cidade, sobre os quais já me reportei em inúmeras ocasiões.
Embora tenha apresentado, em crônicas anteriores, os participantes cativos desse grupo, nunca é demais repetir a apresentação, notadamente para os que me lêem pela primeira vez (e espero que não pela última). Compõem este círculo de palpiteiros, além deste cronista (que faz as vezes de seu “escriba”), o Marcelo, estudante de História; o Marcão, que é advogado; o Nelson, psicólogo e o Zito, que é sociólogo, mas que trabalha como gerente de banco.
Recentemente, o professor João, que é filósofo, mas que leciona Matemática num conhecido colégio particular da cidade, de tanto dar pitacos em nossas conversas, acabou incorporado, como membro pleno, ao nosso cenáculo. Vez por outra, quando as discussões esquentam (o que, por sinal, não é nada raro de acontecer), surge algum sapo de fora para dar palpites, que aceitamos. Com reservas, é verdade, mas com alguma condescendência. Afinal, nosso grupo é bastante democrático.
Tudo começou quando o Zito queixou-se das dificuldades financeiras que vinha enfrentando. “Justo eu, que lido com tanto dinheiro dos outros!”, desabafou. “Qualquer dia ganho na Mega Sena e mando tudo às favas”, acrescentou. Marcão, por sua vez, disse que seu maior desejo não era o de ser milionário. “O que eu queria, mesmo, era ser poderoso, se possível, com poder absoluto. Acabaria, em três tempos, com a violência, a corrupção e com essa roubalheira que campeia por aí”, disse, quase aos gritos.
“Pois eu não desejo nada disso. Meu sonho é deixar alguma obra que marque pra sempre minha passagem no mundo. Mas, claro, gostaria de colher os resultados ainda em vida, de ser famoso, respeitado e até adulado por minhas idéias. Pelé disse, certa vez, que se quisessem lhe render homenagens, o fizessem enquanto estava vivo. Depois que morresse, nada disso lhe interessaria. Comigo, também quero que seja assim”, afirmou o Marcelo, que vivia pondo banca de escritor, mas que não publicou, até agora, um único livro sequer.
“Vanitas vanitatum!”, desabafei, com enfado. “Ué, Pedrão, não é você que vive criticando os eruditos, dizendo que são todos uns pedantes!”, disse o Zito, em tom de provocação, olhando-me ironicamente. “E agora vem com latim pra cima da gente! Sai dessa, amigo!”, acrescentou, dando um murro na mesa.
Não me abalei. “Calma”, respondi. “Não quero deitar erudição pra cima de ninguém. Só acho que o desejo de vocês é pequeno demais, é mesquinho e medíocre, é muito comum, não tem nenhuma originalidade e imaginação. Em resumo, é fortuna, poder e glória, coisas que bilhões de pessoas sempre desejaram (e desejam), não necessariamente nesta ordem, desde os tempos da era da pedra lascada”, acrescentei, em resposta à provocação do Zito.
“Isto me lembra o Eclesiastes, o livro da Bíblia que mais claramente acentua o vazio das coisas humanas. No capítulo 5, versículo 15, o pregador bíblico destacou a burrice dos que gastam o melhor de suas energias em busca de riquezas, ao dizer: ‘Assim como saiu nu do ventre da sua mãe, do mesmo modo sairá desta vida, sem levar consigo nada do que adquiriu’”, acentuei.
Todos me olharam como se eu houvesse dito o maior dos disparates. Justo eu, que todos tinham como cínico empedernido, fazendo citações bíblicas! Qual, porém, a fonte de sabedoria maior do que a Bíblia?! Certamente nenhuma!. Portanto, eu não disse qualquer disparate, evidentemente, apesar da estranheza dos meus amigos.
“Quanto aos ideais de glória e poder, são tão mesquinhos, que sequer merecem observação”, prossegui. “A propósito, sobre os bens materiais, tenho anotada aqui uma citação do Padre Antonio Vieira, de um sermão que ele fez em 1652, na Capela Real de Lisboa, que li ainda ontem, no livro que a minha filha me deu no Dia dos Pais”, disse, enfiando a mão no bolso da camisa e de lá tirando um papel, no qual havia anotado as palavras do douto pregador.
“Notem a lucidez desse sacerdote que, sem dúvida, foi um dos maiores comunicadores de todos os tempos. Afinal, esse sermão foi feito há 354 anos e consegue sensibilizar, ainda, o cético e empedernido homem do século XXI. As palavras de Vieira foram, literalmente: ‘Perguntai a essas casas, a essas quintas, a essas herdades prezadas; perguntai a essas salas e galerias douradas; a esses jardins, a essas estátuas, a essas fontes, a essas alamedas e bosques artificiais, cujos frutos são somente a sombra: perguntai-lhes de quem foram, e de quem são, e de quem hão de ser? Isto é o que sucede aos que acabam o seu mundo antes que o mundo se acabe. Sabem o que deixam, mas não sabem para quem’”.
E, entre vaias generalizadas ao meu arroubo de erudição, com todos se levantando para ir embora, sem mais argumentos para rebater minhas colocações, arrematei a conversa com o versículo 2, do capítulo 1 de Eclesiastes: “Vanitas vanitatum et omnia vanitas (Vaidade das vaidades, tudo é vaidade)”. Inclusive, obviamente, a minha, de haver vencido essa discussão...

Monday, August 21, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Foto do Rogério Ceni: Cassiano Whitaker/VIPCOMM)

DE NOVO, NA RAÇA

A Ponte Preta, sem jogar um futebol brilhante ou ao menos convincente no aspecto técnico, arrancou uma vitória suada, dramática, sofrida, na pura raça, sábado, frente ao Goiás, no Majestoso, por 3 a 2. O time repetiu o principal defeito que vem mostrando há uns dois ou três anos. Ou seja, oscila demais ao longo das partidas. Em determinado momento do jogo, sem nenhuma lógica ou explicação, recua inteiro para as imediações da grande área e começa a se limitar a rebater as bolas. Parece até jogo de tênis. A defesa rebate e o adversário, invariavelmente, retoma a bola e volta a assediar a meta pontepretana o tempo todo. Nestas circunstâncias, por melhor que seja a zaga (que não é o caso), não há como não tomar gols. Na verdade, os toma aos montes. Outro defeito grave da Ponte Preta é de fundamento: o passe. Erra demais! Além disso, o ataque não sabe segurar a bola no campo adversário. Conclui as jogadas com muita rapidez, realimentando, dessa forma, o assédio adversário. Apesar de tudo isso, a raça dos jogadores vem compensando essas deficiências do time. Mas...até quando?!!!

VEXAME DOS VEXAMES

O Guarani foi protagonista, no sábado, do maior vexame da história do clube e um dos maiores do futebol paulista, ao ser goleado, na Ilha do Retiro, pelo modesto time do Sport Recife, por 8 a 1. E seus jogadores têm que erguer as mãos para os céus pelo placar não ter sido mais elástico. Os pernambucanos desperdiçaram inúmeras oportunidades para fazer, sem nenhum exagero, 10, 12 ou 14 gols. O que se viu foi um Bugre apático, sem vibração, perdido em campo. Impossível que essa partida horrorosa tenha sido, apenas, fruto de uma jornada infeliz da equipe, sem nenhum outro fator extra-campo. Claro que não posso afirmar uma coisa dessas, sem provas, mas o time não é tão ruim assim para levar oito gols de um adversário que ao longo do campeonato vem mostrando imensas limitações. Se os jogadores queriam derrubar o treinador Carlos Gainete, conseguiram. Mas a que preço? Às custas do maior vexame da história do clube?! Lamentável!!!

CAMPANHA DE MARCO AURÉLIO

Marco Aurélio tem sido alvo de muitas críticas por parte da imprensa e de parcela expressiva da torcida da Ponte Preta. Os números, porém, estão a seu favor. Além de promover uma saudável, posto que arriscada, e necessária renovação no time, obteve resultados bem mais expressivos do que seu antecessor, Oswaldo Alvarez. Senão, vejamos. Sob o comando do atual treinador, a Macaca conseguiu quatro vitórias (Juventude, Figueirense, Fluminense e Goiás), dois empates, ambos fora de casa (São Caetano e Flamengo) e quatro derrotas, sendo duas no Majestoso (Internacional, Botafogo, São Paulo e Fortaleza). Seu ataque fez 14 gols e a defesa levou 15, com saldo negativo de um. Já sob o comando técnico de Vadão, a Ponte Preta venceu 2 jogos (Palmeiras e Corinthians), empatou dois (Grêmio e Santa Cruz) e perdeu quatro (Paraná, Cruzeiro, Vasco e Santos). Como se vê, contra fatos não há argumentos. Ora, ora, ora, corneteiros, deixem o Marco Aurélio trabalhar em paz!!!

TÉCNICO VAI PEGAR “RABO DE FOGUETE”

O novo treinador do Guarani, Luís Carlos Barbieri, assume um verdadeiro “rabo de foguete”. Pega um time limitado, desmotivado e vivendo a ressaca de uma goleada vexatória, sabendo que a torcida vai cobrar bastante dos atletas, para que estes, pelo menos, tentem apagar essa página lamentável da história do clube. Vai precisar ter os pés no chão e ser realista para tirar o time das últimas colocações da tabela. Acesso para a Série A do Campeonato Brasileiro? Nem pensar! Pelo menos não neste ano e muito menos com este time. Claro que matematicamente isto ainda é possível, em se sabendo que o Guarani terá vinte jogos pela frente. Mas estamos falando de futebol, não de Matemática. Não adianta tentar iludir a torcida. Eu, se fosse o Barbieri, promoveria metade ou mais dos jogadores das categorias de base, que ainda é o que de melhor o Bugre tem. Como não sou...

PARTIDA ANTOLÓGICA DE ROGÉRIO CENI

O goleiro Rogério Ceni, do São Paulo, disputou, ontem, no Mineirão, uma partida antológica, no empate do seu time com o Cruzeiro, por 2 a 2. Foi dessas atuações de encher os olhos, que ficam pra sempre na história e que, com o passar do tempo, viram lendas, que se tornam inacreditáveis para as novas gerações que não viram o jogo. Além de defender um pênalti, num momento decisivo da partida, quando seu time perdia por 2 a 0, fez os dois gols que garantiram o heróico empate do tricolor. E não foi apenas isso (o que já seria mais do que suficiente para consagrar qualquer um). Fez defesas importantíssimas e comandou seus companheiros, na qualidade de capitão, orientando-os e dando-lhes moral. Foi impecável! E, para culminar, tornou-se o goleiro que mais gols fez na história do futebol (64), superando o falastrão paraguaio, Chilavert. Se falhou na quarta-feira, no primeiro gol do Internacional, no Beira-Rio, na decisão da Copa Libertadores da América, ontem se redimiu por completo, e com juros. Este, quando parar de jogar futebol, vai deixar imensa saudade até nos adversários.

TEVEZ ESTARIA “BATENDO ASAS”

Tudo indica que o argentino Carlito Tevez fez, ontem, seu último jogo com a camisa do Corinthians. Notícias (ainda não confirmadas), dão conta que o jogador estaria se transferindo para o Arsenal, da Inglaterra. O pretexto que deu, ontem, após a magra vitória corintiana sobre o Botafogo, no Pacaembu, por 1 a 0, é que foi pueril. O meia estaria descontente com o técnico Emerson Leão que, sem lhe dar nenhuma satisfação (aliás, prerrogativa de qualquer treinador), lhe retirou a braçadeira de capitão do time e a passou para o zagueiro Betão. Acho essa desculpa bastante esfarrapada. Se for verdadeira, que “vaya com Dios”, pois é inconcebível em qualquer clube um ataque de estrelismo desse porte de algum atleta do plantel, por mais famoso que seja. Poucos acreditavam que, após a Copa do Mundo, Tevez voltasse a vestir a camisa corintiana. Voltou! Mas ninguém é ingênuo de achar que um jogador dessa qualidade fique por muito tempo no falido futebol brasileiro, quando inúmeros cabeças-de-bagre se mandam daqui em busca dos euros e dos dólares do exterior.

RESPINGOS...

· Desde o início do Campeonato venho falando que se deve ficar de olho no Paraná. Com a vitória de ontem, sobre o São Caetano, o modesto time paranaense já é o segundo colocado do Campeonato Brasileiro. E, se bobearem...papa o título deste ano.
· O Santos fez uma partida horrorosa, ontem, diante do Vasco e perdeu, não somente a partida, por 2 a 0, como uma invencibilidade de dez meses na Vila Belmiro.
· O ataque do Fortaleza, que vinha sendo um dos piores do campeonato, desencantou e fez sete gols em apenas dois jogos: 3 na Ponte Preta, na quarta-feira, e quatro no Juventude, ontem.
· A grande decepção da rodada foi o Fluminense, que não passou de um empate, por 1 a 1, com o Santa Cruz, em pleno Maracanã.
· E Dunga, finalmente, vai dar uma chance para Rafael Sobis, na Seleção Brasileira, justo agora que o atacante está se transferindo para o Milan, da Itália.

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


A poesia de Mário Quintana caracteriza-se, entre outras tantas virtudes, pelo bom-humor. Brincando, o poeta expressa as grandes verdades, mesmo em assuntos, digamos, um tanto lúgubres. Um exemplo disso é este poema “Da viuvez”, publicado em seu livro “Sapatos floridos”, que diz: “Ele está morto. Ela, aos ais./Mas, neste lúgubre assunto,/quem fica viúvo é o defunto...”. E não é verdade? Para quem fica, por mais saudades que sinta do companheiro, sempre haverá a possibilidade de um novo (e feliz, por que não?) relacionamento. Mas, para quem morre...Este, de fato, é quem deve ser considerado o viúvo.

Adaptando-se ao mundo


O dramaturgo irlandês, George Bernard Shaw, tido e havido como o rei das tiradas irônicas e, sobretudo, inteligentes, observou que “o homem razoável persiste tentando adaptar o mundo a si mesmo”. De uns tempos para cá, firmou-se uma espécie de convicção mórbida de que, se uma pessoa não for pessimista, se não viver permanentemente tensa, à espera de uma catástrofe, ela é tola ou alienada. Raras são as conversas que não acabam direcionadas no sentido de desgraças, de maledicências, de acentuado rancor. O homem moderno, que se diz tão bem-informado, se esquece da história da humanidade, quase toda ela composta de tragédias, e acha que estes tempos são os piores que o ser humano já viveu.
Não haveria mais espaço para a alegria no mundo? Ninguém nega a existência de problemas gravíssimos, que de uma maneira ou de outra nos afetam a todos. A violência, a desigualdade social, a ausência de solidariedade, o desamor e o egoísmo são alguns deles. Mas há alguma novidade nisso? Pelo que se conhece das crônicas do passado, houve alguma época que fosse perfeita, caracterizada pelo amor, pela fraternidade, pela absoluta justiça e pelo altruísmo?
O poeta e psicanalista Hélio Pellegrino escreveu, anos atrás, um artigo no “Jornal do Brasil” intitulado “A construção da alegria”, que merece ser lido por todos, pelo seu equilíbrio e pelo tanto de verdade que contém. Principalmente, precisaria ser analisado pelas pessoas que fizeram da angústia um estilo de vida. E há tantos nessa situação! Em princípio, somos os senhores do nosso destino. A natureza dotou-nos de cérebro e a divindade nos deu o livre-arbítrio para que escolhêssemos nosso próprio caminho. É muito cômodo culpar os outros pela infelicidade que nos atinge. Mas boa parte dela é culpa apenas da nossa maneira de proceder.
Diz Hélio Pellegrino, no referido artigo: “Toda alegria, longa e autêntica, é severa. O que não impede que a alegria seja leve e tenha gosto de vinho. Constrói-se a própria alegria como quem constrói um barco: com ferramentas difíceis. No começo, há o machado do lenhador, derrubando o tronco. Depois a abrasão do relento e do sol sobre suas fibras, curtindo-as. Em seguida, o sal do suor, o aço de entalhar, de escavar, os dentes cravados no coração da madeira – sua serragem sangrando”.
E prossegue o poeta: “Um barco se constrói devagar, com fiel austeridade. Os gestos precisos – navegar é preciso – se sucedem, trabalhando a matéria, dia após dia. À noite se conversa, se ama ou se dorme – semeadura de possíveis. O dia é o tempo da construção do barco, sua forma emerge aos poucos, como uma asa que irrompe. Assim é a alegria – como uma asa que irrompe”.
O erro das pessoas é achar que as coisas caem do céu. Ou seja, querem que o mundo se adapte a elas, mas isso nunca ocorre. A alegria não surge por acaso. Constrói-se diariamente, pacientemente, com sabedoria e com afinco. É perfeitamente possível ser alegre, mesmo diante de todos os males que nos afetam ou nos rodeiam. A maneira de conseguir isso é o desafio que se impõe para os realizadores, que não ficam à espera de milagres.

(Capítulo do livro “Por uma nova utopia”, Pedro J. Bondaczuk, páginas 133 a 135, 1ª edição – 5 mil exemplares – fevereiro de 1998 – Editora M – São Paulo).

Sunday, August 20, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Por estranho que possa parecer, as pessoas que mais reclamam da vida, se julgando injustiçadas, são as que mais motivos têm para agradecer, mas não o fazem. São felizes, todavia não sabem disso. Só se dão conta da sua ventura quando, de fato, alguma desgraça se abate sobre elas e perdem tudo o que não souberam valorizar. Têm, por exemplo, boa saúde, relativas posses, uma família unida e que as ama e amigos que as confortam e orientam. Não sabem, porém, que isso é felicidade. Mário Quintana tem um poema conhecidíssimo, intitulado “Da felicidade”, que trata desse comportamento e que diz: “Quantas vezes a gente, em busca da ventura,/procede tal e qual o avozinho infeliz:/em vão, por toda parte, os óculos procura,/tendo-os na ponta do nariz!”. A felicidade, ao contrário do que muitos pensam (erroneamente), não é uma condição, mas um estado de espírito, um comportamento, uma predisposição.

Complexo de culpa


Obs.: A exemplo do que aconteceu em julho passado, em junho de 1982 o exército de Israel promoveu uma grande invasão ao território do Líbano, com intensa destruição e muitas mortes de civis. O pretexto, naquela oportunidade, eram os ataques da OLP, então mero grupo guerrilheiro, ao Norte do território israelense. Fiz, na oportunidade, no espaço diário que tinha então, de comentário de política internacional na Rádio Educadora de Campinas, as observações abaixo, que reproduzo aqui, 24 anos após, dada a similaridade das intervenções.


Pedro J. Bondaczuk



Num pronunciamento dramático e incisivo, feito, ontem, em Estrasburgo, perante o Parlamento da Comunidade Européia, o patriarca da Igreja Ortodoxa de Jerusalém definiu, com precisão, os sentimentos do Ocidente em relação a Israel.

O monsenhor Hilarion Capucci afirmou que os países ocidentais têm excessivo complexo de culpa em relação ao povo judeu, por não ter feito nada para impedir o Holocausto, planejado e executado pelos nazistas, durante a Segunda Guerra Mundial.

Com isso, como um pai que tenha sido muito severo com um filho traquinas no passado, ou que tenha sido absolutamente omisso e irresponsável, faz vistas grossas a certas molecagens que ele comete, agora que se tornou adolescente.

Acontece que essas traquinagens são, não apenas perigosas, como trágicas. Estão redundando em milhares de mortes e prejuízos incalculáveis no dilacerado Líbano. São vidas inocentes na maioria, de pessoas alheias às tortuosas manobras da política, que vêm sendo ceifadas inutilmente.

O arcebispo ortodoxo disse, comovido, em seu pronunciamento: “É preciso que o Ocidente supere seu complexo de holocausto em relação ao povo judeu. E que pense em salvar os palestinos de um novo holocausto, prestes a se consumar”.

Hilarion Capucci pediu atitudes práticas da Europa Ocidental neste momento dramático. Exigiu muita ação e nenhuma conversa. Rogou aos países europeus que intervenham no conflito, ou melhor diríamos, na agressão absurda e irresponsável que se comete contra o Líbano. Que pressionem Israel por vias diplomáticas ou mediante a imposição de sanções econômicas, para que retire suas tropas de solo libanês.

Nos últimos dias, a até agora débil voz do bom-senso vem sendo engrossada, no mundo todo, por várias personalidades, que se recusam a se omitir e que exigem mais ação, de quem tem condições de agir. Mas os clamores têm se mostrado inúteis.

Enquanto os apelos se sucedem, as reclamações aumentam e as advertências se multiplicam, o setor ocidental de Beirute, que abriga meio milhão de moradores, está em chamas. Bombas de fósforo, de acordo com denúncias feitas pela rádio da capital libanesa, caíram durante esta noite toda nessa zona conflagrada, fazendo lavrar inúmeros e devastadores incêndios.

Como se observa, a área em questão recebeu o último ingrediente que faltava para se transformar, literalmente, em um inferno: o fogo. Enquanto isso, os Estados Unidos seguem apresentando planos e mais planos, frágeis e provisórios, vazios e por isso inexeqüíveis, solenemente ignorados pelo truculento agressor.

O último deles foi apresentado, ontem, e resumido pelo chanceler israelense, Yitzhak Shamir, ao Parlamento, e, como os anteriores, foi rejeitado. Os principais tópicos dessa proposta eram os seguintes:

1º.) As tropas israelenses retiram-se a alguns quilômetros de Beirute. 2º.) As forças palestinas são retiradas do setor Oeste da cidade, com suas armas pessoais de defesa. 3º.) Uma unidade naval norte-americana assegura a proteção da retirada dos guerrilheiros da OLP. 4º.) Embarque dos palestinos para o porto egípcio de Lataquia, de onde seguem para diversos países árabes. 5º.) Uma força internacional, franco-norte-americana, toma posição em Beirute Oeste. 6º.) O exército regular libanês assume o controle desse setor da cidade. 7º.) Estabelece-se um governo estável e soberano no Líbano. 8º.) A OLP é autorizada a manter uma representação política no Líbano. 9º.) Duas pequenas unidades militares da OLP serão integradas ao exército regular libanês, retirando-se do país posteriormente, quando outras forças estrangeiras também se retirarem.

O plano, como se vê, não é de todo mau. Mas por que Israel deveria aceitar essas imposições, se pode obter tudo o que quiser, sem precisar fazer nenhuma concessão? Quem vai obrigar Begin, Sharon e o comandante das Forças Armadas, Rafael Eitan, a ceder no que quer que seja?

Quem poderia fazê-lo desde o princípio, o presidente norte-americano Ronald Reagan, não teve grandeza suficiente para isso. Ou não teve visão política ou, então, quem sabe, vontade. E os europeus, por seu turno, continuam com seu complexo de culpa, em relação ao filho travesso, com o qual foram covardes demais em passado relativamente recente. Por isso, ficam inibidos em coibir suas macabras traquinagens, mesmo que elas possam, a longo prazo, incendiar a casa toda. Isto é, o mundo inteiro...

(Comentário apresentado na Rádio Educadora de Campinas, em 8 de julho de 1982).

Saturday, August 19, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O homem, num determinado instante da sua trajetória pelo Planeta (que não se sabe quando foi) adquiriu, surpreso, a consciência de que existia. Foi quando começou a exercitar uma faculdade que o distinguia dos outros animais: a de pensar. As três primeiras indagações que lhe vieram, então, à mente, embora certamente não colocadas com tanta clareza, foram: O que sou? Onde estou? Para onde vou? Da tentativa de resposta a estas três questões surgiram as ciências, as artes, as filosofias e as religiões. Milhões de hipóteses foram levantadas, uma quantidade incontável de textos foi escrita em torno desse primitivo tema. Ninguém, todavia, respondeu, de forma incontestável: O que sou? Onde estou? Para onde vou? São questões que permanecem em aberto, ainda.

Refratário ao entendimento


Pedro J. Bondaczuk

Duro, duríssimo diamante,
refratário ao entendimento,
é o âmago deste instante
que se esvai, veloz, como o vento.

Recursos tenho, tenho vários,
não somente um: tenho sete!
E a ousadia dos corsários
ao navegar na internet.

Pirata, singro os sete mares
na predadora nau Lutécia,
voraz, sob mágicos luares,
como os sete sábios da Grécia.

Busco, tento, no dia-a-dia,
apesar de certa desídia,
chegar à fonte da poesia:
Sou poeta da multimídia!

Não interpreto o cotidiano
e nem os sentimentos gris,
não domino o desejo insano
e não consigo ser feliz.

Tateio no escuro (em vão)
e esmero-me, no meu labor,
para escapar da solidão:
Ainda acredito no amor!

É jogo de cartas marcadas.
São retalhos de fantasias,
impressões estereotipadas,
fantasmas de melhores dias.

Pois o âmago deste instante
que se esvai, veloz, como o vento,
é duríssimo diamante
refratário ao entendimento.


(Poema composto em Campinas, em 2 de março de 1981).

Friday, August 18, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O envolvimento, tanto com pessoas, quanto com causas, implica em riscos. Isto é óbvio. O escritor Michael Drury escreve a respeito: "Ninguém pode negar que se envolver em coisas significa arriscar-se. A pessoa de que nos enamoramos pode magoar-nos terrivelmente; os amigos que discutem e que tentamos reconciliar poderão voltar-se contra nós com a sua cólera conjugada; o homem que se afoga e tentamos salvar pode arrastar-nos consigo para o fundo. Contudo, evitando dissabores e desapontamentos, tornamo-nos frios, desumanos". O estranho é ver intelectuais comprometidos com o acúmulo de riquezas pessoais, empenhando o que de melhor possuem em um objetivo tão pífio. Ninguém mais do que eles tem capacidade para perceber o quanto essa meta é vazia e até absurda. Sequer é necessário mencionar a razão. Tais pessoas sabem. Conhecem-nas de sobejo.

Impunidade e desconfiança


Pedro J. Bondaczuk


Uma das características marcantes da interminável e crônica crise que o País atravessa, que é, sobretudo, moral, é a acentuada tendência que as pessoas têm para fazer prejulgamentos. Não raro, a mera suspeita, sem provas e sem a devida fundamentação nos fatos, é suficiente, entre outras coisas, para a imprensa rotular uma pessoa de corrupta, ou de caloteira, ou de incompetente, ou de criminosa etc.
Há casos e mais casos desse tipo de ocorrência, tão conhecidos que se torna até desnecessária sua menção, com conseqüências danosas, não raro irreparáveis, para a honra e a credibilidade dos atingidos. Basta citar, apenas, o mais emblemático deles: o dos proprietários da Escola de Base, de São Paulo, crucificados, vilipendiados, enxovalhados e humilhados pelos meios de comunicação, por alegado abuso sexual cometido contra um garotinho de 4 anos de idade e que, ao cabo das investigações, se comprovou que eram absolutamente inocentes. Até hoje, porém, os irresponsáveis que mancharam a reputação desses educadores, promovendo um absurdo e criminoso linchamento público do casal, permanecem impunes. Sequer se retrataram do crime de calúnia que cometeram.
Apesar disso, a lógica que prevalece em nossa sociedade, infelizmente, é a de que o suspeito é que tem que provar sua inocência, quando o bom-senso e os fundamentos do Direito prevêem exatamente o contrário. Conhecido axioma jurídico preceitua que “o ônus da prova cabe a quem acusa”. Entre nós, porém, o acusado é que precisa provar a falsidade das acusações levantadas contra ele.
Muita reputação já foi irremediavelmente manchada dessa forma. Basta que algum desafeto espalhe rumores minimamente verossímeis sobre o comportamento de alguém, para que esses boatos ganhem foros de verdade. Há tempos prevalece um clima de generalizada desconfiança de tudo e de todos, sobretudo de figuras públicas. É a maldita mania das generalizações. Como muitos políticos são pilhados em atos de corrupção – e, estranhamente, são os que saem, invariavelmente, impunes – passa-se, até inconscientemente, a se considerar que “todos” os políticos são corruptos. Isso, no final das contas, chancela e justifica os delitos dos verdadeiros infratores. E os honestos são tratados com ironia e menosprezo, encarados como “ingênuos”, “trouxas” e “Caxias”, e vai por aí afora.
Passa-se, por conseqüência, a se considerar as negociatas de todos os tipos e calibres, de que o País é farto, meros atos de “esperteza”. Daí para a imitação é um pulo. É esse comportamento que leva as pessoas a desconfiarem de tudo e de todos. Já vão muito distantes os tempos em que a palavra empenhada ou um simples fio de barba eram garantias suficientes (e aceitas por todos) para assegurar o cumprimento de qualquer compromisso assumido, sobretudo financeiro.
Hoje, mesmo documentos fartamente detalhados, meticulosamente redigidos por experientes advogados, assinados, com duas ou três testemunhas, com um ou mais fiador, com firmas reconhecidas e com registro em cartório, são tratados com suspeição. A decadência moral da sociedade é tão grande que, como disse Ruy Barbosa em célebre discurso, o cidadão “tem vergonha de ser honesto”. A culpa cabe à impunidade dos que, comprovadamente, cometem delitos de toda a sorte, desrespeitando as normas legais e os direitos alheios.
A Justiça, entre nós, tem se mostrado de fato “cega”, mas somente quando os crimes são cometidos pelos poderosos e abastados, que podem contratar os melhores advogados. Em contrapartida, enxerga até demais e é de um rigor extremo com quem não conta com recursos sequer para se manter, quanto mais para custear a defesa. São muitos, por exemplo, os casos de pessoas humildes, muitas vezes famintas, punidas com pesadas penas de prisão por causa de pequenos furtos, como um tubo de desodorante num supermercado, ou uma maçã em uma quitanda ou um pacote de biscoitos em uma mercearia. O princípio constitucional da igualdade de todos os cidadãos perante a lei, há muito, está desmoralizado pela prática.
Li, não me lembro onde, uma declaração do escritor Autran Dourado, que resume o que a maioria dos brasileiros pensa do seu país: “Tenho um amigo que gosta de dizer que o Brasil é um país culposo, pois tudo o que aqui acontece de ruim se deve a uma das três características de crime culposo: negligência, imperícia e imprudência”. E não é o que pensamos, infelizmente não sem uma certa dose de razão, do País? Mas esse sentimento de desconfiança e de desalento não vem de hoje. Já é bastante antigo. E, de tanto acreditar nisso, a sociedade acaba por, de fato, agir sempre assim: com negligência, imperícia e imprudência.

Thursday, August 17, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos Jefferson Bernardes/VIPCOMM)

DECEPÇÃO. FRUSTRAÇÃO. IRRITAÇÃO

Decepção, frustração e irritação: foram estes os sentimentos deixados pelo time da Ponte Preta, em sua torcida, na derrota de ontem, em pleno Majestoso, para o fraco time do Fortaleza, por 3 a 1. Foi uma atuação medíocre, sem criatividade, que o torcedor quer esquecer, mas exige, sobretudo, que nunca mais se repita. A única coisa boa do jogo foi outra soberba atuação do volante Ricardo Conceição (e não somente pelo belo gol que fez, seu terceiro no campeonato), lúcido, aguerrido e competente. Há tempos que venho comentando com os amigos a subida de produção desse menino, que tem tudo para seguir os passos de Mineiro, hoje brilhando no São Paulo. Mais uma vez, ficou claríssima a necessidade de um centro-avante matador, que saiba prender a bola no ataque e dê folga à defesa que, não por acaso, é a mais vazada da competição. Enfim...Que decepção que você me deu, querida macaquinha!!!

LIMITAÇÕES OSTENSIVAS

Ficaram mais evidentes do que nunca as limitações técnicas do atual time do Guarani, na derrota que o Bugre sofreu nesta terça-feira, em Natal, diante do América, por 3 a 1. O pior de tudo, é que o Bugre saiu na frente, mas não soube segurar o resultado. O adversário, com dez jogadores, não somente buscou o empate, como virou o placar e criou chances para que o vexame bugrino fosse ainda maior. E para o desespero do Guarani, os quatro ponteiros da tabela começam o pôr folgada distância em relação aos demais competidores, inclusive, claro, o Bugre. Mais uma vez, portanto, o sonho do retorno à elite do futebol brasileiro, ao que tudo indica, terá que ser adiado. Claro que ainda há dois jogos a serem disputados no Primeiro Turno, e o Segundo inteiro, porém com esse futebolzinho que o Bugre está jogando, não pode aspirar a nada além de uma colocação intermediária, lá pelo 10º ou 12º lugar. Que ano, este, para a coletividade bugrina!!!

MENINO DE FUTURO

Há rumores de que a Ponte Preta estaria negociando com o ex-bugrino Heverton, de regresso da Turquia, e que sua contratação seria apenas questão de horas. Tomara que a notícia seja verdadeira e que a negociação chegue, de fato, a bom termo. Sempre gostei do futebol do menino procedente de Brasília, que deixou saudades no Brinco de Ouro, de onde saiu prematuramente. É verdade que a Ponte tem uma infinidade de meias, mas nenhum com as suas características. Seu futebol lembra muito o de Harison, que foi ídolo no Majestoso, antes de se transferir para Portugal. Além do que, Heverton é, também, um goleador, o que não é de se desprezar. E bastante jovem, com um futuro bastante promissor pela frente. Seria, pois, caso se concretize, excelente contratação. E que ficaria melhor ainda caso a diretoria da Ponte finalmente encontre aquele centroavante eficiente, matador e de grande presença de área, que há tanto tempo precisa. Não custa sonhar.

GRUPO AMIGOS DO GUARANI

É uma idéia das mais felizes a criação, na cidade, de uma organização chamada “Amigos do Guarani”, cuja finalidade é arrecadar recursos para suprir as combalidas finanças do Bugre. Por menos que esses abnegados arrecadem, ainda será mais do que entra atualmente nos cofres bugrinos, ou seja, nada. Esse tipo de entidade é mais importante e eficaz do que qualquer parceria. O clube, neste caso, não arca com nenhum ônus, tem, apenas, bônus. Vejo neste tipo de iniciativa a salvação do futebol brasileiro, à beira da falência por causa das distorções (diria, aberrações) da chamada “Lei Pelé”. Sempre fui contrário às parcerias, tipo Parmalat, MSI etc., que podem até funcionar por certo tempo, mas quando acabam...É aquela tragédia! Nenhum delas deu totalmente certo. Ajudam, quando muito, o time que as faz, a conquistar um ou dois títulos. Mas quando se desfaz... é uma desgraça!. Parabéns, pois, aos “Amigos do Guarani”.

VENCEU O MAIS EFICIENTE

A decisão da Copa Libertadores da América, ontem, no Estádio Beira-Rio de Porto Alegre, entre o Internacional e o São Paulo, foi das mais sensacionais que já tive a oportunidade de assistir. Não que o jogo fosse um primor de técnica, longe disso. Mas foi um festival de emoções do primeiro ao último minuto. O São Paulo vendeu caro, muito caro, a perda do título com que sua torcida tanto sonhava. Tanto que até o último segundo do jogo, já nos descontos, o time criou chances de levar a partida pelo menos para prorrogação. Não deu. O empate, por 2 a 2, garantiu a conquista da equipe que mostrou mais regularidade e eficiência. O Inter, aliás, começou a pôr a mão na taça na semana passada, no Morumbi, quando teve uma performance impecável e venceu por 2 a 1. E que ninguém culpe o goleiro Rogério Ceni pela infelicidade que teve no primeiro gol colorado. Faltou eficiência ao ataque tricolor, que ficou enfraquecido com a impossibilidade de Ricardo Oliveira disputar essa partida, participação vetada pelo clube espanhol detentor dos seus direitos federativos, o Betis. O título ficou em ótimas mãos, sem dúvida.

BELO GESTO DO ABELÃO

O técnico Abel Braga, creio, conquistou definitivamente não apenas o coração da torcida colorada, pelo feito inédito que conseguiu ontem, como, sobretudo, o da coletividade pontepretana. Findo o jogo diante do São Paulo, com a conquista do título da Copa Libertadores da América por parte do Internacional, o treinador declarou, para todo o mundo ouvir, que se sentia muito grato à Ponte Preta, que praticamente o recuperou para o futebol brasileiro. O torcedor da Macaca lembra bem as circunstâncias em que o Abelão salvou o clube do rebaixamento, em 2003, oportunidade em que muitos “ratos” abandonaram o navio, quando tudo indicava que iria afundar. Não afundou, porém, graças à ousadia e determinação do “comandante”, de um profissional honesto, aplicado e cumpridor dos compromissos que assume e que, por isso, conquistou, definitivamente, o respeito e a admiração dos que amam, de fato, a Ponte Preta. As declarações de ontem, do Abelão, são a confirmação de se trata de uma pessoa especial que, acima de tudo, sabe ser grata a quem lhe dá a mão. Parabéns, portanto, multiplicados por um milhão, a esse vitorioso treinador.

RESPINGOS...

· Apesar de alguns críticos terem torcido o nariz, gostei da atuação da Seleção Brasileira ontem, diante da Noruega, em Oslo, no empate por 1 a 1, dando início ao que se convencionou chamar de “Era Dunga”. Foi um time rápido, ousado, e, sobretudo brigador, no melhor sentido da palavra.
· Paulo César Gusmão é o novo treinador do São Caetano, em substituição a Emerson Leão, que estreou ontem no comando do Corinthians.
· Emerson Leão estreou, ontem, com o pé direito no Corinthians. O time arrancou uma vitória na raça, diante do Fluminense, em pleno Maracanã, por 2 a 1. E ninguém fez corpo mole.
· Portuguesa e Candinho parece, mesmo, ser um casamento perfeito. Na terça-feira, o treinador estreou com o pé direito na Lusa e o time obteve importante vitória, em Fortaleza, diante do Ceará, por 2 a 1.
· Nem bem conquistou a Copa Libertadores da América, e o Internacional começa uma “operação desmanche”. Bolívar, Tinga e Rafael Sobis, ao que tudo indica, estão de saída do clube, rumo ao futebol europeu. E o torcedor que se f...

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