Pedro J. Bondaczuk
A maneira de escrever uma crônica, um conto, uma reportagem que seja, muda, assim como mudam os costumes, ao sabor do tempo. Não me refiro, claro, aos textos dos mestres da língua, de estilo enxuto, objetivo e ainda assim altamente artístico, que são, virtualmente, eternos. Permanecem como parâmetros de qualidade a desafiar novos escritores e jornalistas a, senão os igualar, pelo menos se aproximar do seu padrão de qualidade. Por isso, recebem o rótulo genérico de “clássicos”.
Tenho o hábito de ler velhos recortes de jornais, que coleciono compulsivamente ao longo dos anos, alguns até do século retrasado, o XIX, e comparo a maneira como os jornalistas, notadamente os cronistas, de então escreviam com a dos atuais. Entre tantas coisas que me chamam a atenção, uma se destaca: a profusão de adjetivos qualificativos. Hoje, eles praticamente foram extintos, em nome da objetividade.
Os repórteres de então, por exemplo, ao se referirem a um juiz, invariavelmente precediam seu nome da palavra “douto”, mesmo que se tratasse de rematada toupeira. Ou o de algum delegado, com a expressão “intrépido”, fosse ou não, na verdade, notório poltrão. E assim por diante. Os textos ficavam gordos, massudos, pomposos e era preciso o leitor lê-los com uma lupa, para encontrar onde estava a notícia.
Outra mania, esta por influência dos cursos de Direito, muito em voga então (como, ademais, ainda o são hoje em dia), era a profusão de citações em latim, muitas vezes fora de contexto e sem a devida tradução, como se o leitor fosse perito nessa língua morta, embora matriz do português, espanhol, italiano e romeno, entre outras.
Hoje, esse procedimento persiste, mas com o inglês, que muitos consideram seu segundo idioma (quando não o primeiro). Largo, incontinenti, os textos que tenham essa característica, por mais interesse que me despertem, por causa da falta de respeito do autor. Afinal, como leitor, conto com essa prerrogativa. Posso decidir o que ler e o que deixar de ler, sem precisar dar explicações a quem quer que seja. Como, ademais, muitos fazem em relação aos meus textos também.
“Então hoje se escreve melhor?”, perguntará, certamente, o arguto leitor, face a essa observação. Não necessariamente. Diria, quase nunca. Escreve-se, apenas, de forma “diferente”. Leio, diariamente, na imprensa, textos que me provocam arrepios e inúmeras outras reações, raras das quais de satisfação (como em tudo na vida, aqui, também, há diversas e honrosas exceções). Não sei se choro, se rio com ironia, se xingo o repórter ou se tenho qualquer outra manifestação de desagrado, tão chulas, vazias, capciosas e idiotas são algumas reportagens. E isso quando não estão eivadas (parecendo cachorro pulguento que não pára de se coçar) de erros e mais erros gramaticais e até (heresia das heresias) de grafia das palavras.
Em textos supostamente literários, então... É uma tragédia. Uma das suas impropriedades mais comuns (posto que das menos graves) é a mistura dos tratamentos “tu” e “você”, usados indiscriminadamente, não raro na mesma oração, como se fosse a coisa mais normal possível e não tola e desnecessária agressão ao idioma, que de fato é. Chego à conclusão que, ou as pessoas, hoje em dia, não lêem, ou, se o fazem, têm a infelicidade de ler textos eivados dessas impropriedades que replicam no que escrevem.
O pior são os modismos! Esses são uma desgraça! Por mais de uma década, meu cérebro (cansado de absorver na marra tanta estupidez) e meus ouvidos (que chegavam a doer ao ouvirem essas baboseiras), tiveram que conviver com o desgraçado “a nível de”, escrito e dito a todo o momento, com empáfia e ares de sabedoria (quando não de arrogância), por supostos “experts” em determinadas matérias, notadamente da área econômica. Para minha infelicidade, fui, por vários anos, editor de Economia.
Parlamentares, ministros, economistas e quejandos, quando diante de câmeras e microfones, em algum momento de suas vazias e repetitivas entrevistas, sapecavam, invariavelmente, a tal da expressão maldita, como se fosse o máximo dos máximos de erudição. Atualmente, essa febre diminuiu bastante e se tornou, digamos, mera febrícola. Todavia... não foi curada por completo. Com o tempo será.
Hoje grassa, como incontrolável epidemia de peste bubônica (ou de ebola, para sermos mais atuais) o maldito gerundismo. Expressões como “estaremos retornando a ligação”, “estaremos efetuando a entrega” e outras tantas idiotices do gênero (que me recuso até de repetir), num interminável festival de “besteirol”, ouço, amiúde, todos os dias, várias vezes ao dia, em especial ao telefone. Tanto que até já fiquei com ódio deste tão útil aparelhinho, em especial o celular e agora só mantenho contatos pessoais e profissionais por e-mail. Claro que não me livro, nem assim, dessa peste. Contudo... preservo, pelo menos, meus delicados ouvidos.
Não vou nem entrar na questão da nova língua criada em função dos inúmeros chats que pululam internet afora. É uma coisa tão idiota, que sequer merece comentários. Acessei uns quatro ou cinco deles, para saber como eram, e os diálogos pareciam coisas de seres de outros planetas (se é que existe vida inteligente fora da Terra) e não lembravam, nem de longe, esta “última flor do Láscio, inculta e bela” que, a exemplo de Fernando Pessoa, considero minha verdadeira pátria.
Entre a profusão de adjetivos, de alguns jornalistas e escritores do passado, e o excesso de citações em latim (numa certa época foi de francês) e a enxurrada de bobagens, clichês, chavões e modismos dos de hoje, minha preferência é óbvia. Alguém se arrisca a dizer qual é? Daí meu fanático apego aos clássicos, que nas circunstâncias, me são imprescindíveis, por me livrarem de tamanha poluição do idioma e me impedirem de, à minha revelia, “emburrecer” (com o perdão do neologismo que periga virar modismo).
A maneira de escrever uma crônica, um conto, uma reportagem que seja, muda, assim como mudam os costumes, ao sabor do tempo. Não me refiro, claro, aos textos dos mestres da língua, de estilo enxuto, objetivo e ainda assim altamente artístico, que são, virtualmente, eternos. Permanecem como parâmetros de qualidade a desafiar novos escritores e jornalistas a, senão os igualar, pelo menos se aproximar do seu padrão de qualidade. Por isso, recebem o rótulo genérico de “clássicos”.
Tenho o hábito de ler velhos recortes de jornais, que coleciono compulsivamente ao longo dos anos, alguns até do século retrasado, o XIX, e comparo a maneira como os jornalistas, notadamente os cronistas, de então escreviam com a dos atuais. Entre tantas coisas que me chamam a atenção, uma se destaca: a profusão de adjetivos qualificativos. Hoje, eles praticamente foram extintos, em nome da objetividade.
Os repórteres de então, por exemplo, ao se referirem a um juiz, invariavelmente precediam seu nome da palavra “douto”, mesmo que se tratasse de rematada toupeira. Ou o de algum delegado, com a expressão “intrépido”, fosse ou não, na verdade, notório poltrão. E assim por diante. Os textos ficavam gordos, massudos, pomposos e era preciso o leitor lê-los com uma lupa, para encontrar onde estava a notícia.
Outra mania, esta por influência dos cursos de Direito, muito em voga então (como, ademais, ainda o são hoje em dia), era a profusão de citações em latim, muitas vezes fora de contexto e sem a devida tradução, como se o leitor fosse perito nessa língua morta, embora matriz do português, espanhol, italiano e romeno, entre outras.
Hoje, esse procedimento persiste, mas com o inglês, que muitos consideram seu segundo idioma (quando não o primeiro). Largo, incontinenti, os textos que tenham essa característica, por mais interesse que me despertem, por causa da falta de respeito do autor. Afinal, como leitor, conto com essa prerrogativa. Posso decidir o que ler e o que deixar de ler, sem precisar dar explicações a quem quer que seja. Como, ademais, muitos fazem em relação aos meus textos também.
“Então hoje se escreve melhor?”, perguntará, certamente, o arguto leitor, face a essa observação. Não necessariamente. Diria, quase nunca. Escreve-se, apenas, de forma “diferente”. Leio, diariamente, na imprensa, textos que me provocam arrepios e inúmeras outras reações, raras das quais de satisfação (como em tudo na vida, aqui, também, há diversas e honrosas exceções). Não sei se choro, se rio com ironia, se xingo o repórter ou se tenho qualquer outra manifestação de desagrado, tão chulas, vazias, capciosas e idiotas são algumas reportagens. E isso quando não estão eivadas (parecendo cachorro pulguento que não pára de se coçar) de erros e mais erros gramaticais e até (heresia das heresias) de grafia das palavras.
Em textos supostamente literários, então... É uma tragédia. Uma das suas impropriedades mais comuns (posto que das menos graves) é a mistura dos tratamentos “tu” e “você”, usados indiscriminadamente, não raro na mesma oração, como se fosse a coisa mais normal possível e não tola e desnecessária agressão ao idioma, que de fato é. Chego à conclusão que, ou as pessoas, hoje em dia, não lêem, ou, se o fazem, têm a infelicidade de ler textos eivados dessas impropriedades que replicam no que escrevem.
O pior são os modismos! Esses são uma desgraça! Por mais de uma década, meu cérebro (cansado de absorver na marra tanta estupidez) e meus ouvidos (que chegavam a doer ao ouvirem essas baboseiras), tiveram que conviver com o desgraçado “a nível de”, escrito e dito a todo o momento, com empáfia e ares de sabedoria (quando não de arrogância), por supostos “experts” em determinadas matérias, notadamente da área econômica. Para minha infelicidade, fui, por vários anos, editor de Economia.
Parlamentares, ministros, economistas e quejandos, quando diante de câmeras e microfones, em algum momento de suas vazias e repetitivas entrevistas, sapecavam, invariavelmente, a tal da expressão maldita, como se fosse o máximo dos máximos de erudição. Atualmente, essa febre diminuiu bastante e se tornou, digamos, mera febrícola. Todavia... não foi curada por completo. Com o tempo será.
Hoje grassa, como incontrolável epidemia de peste bubônica (ou de ebola, para sermos mais atuais) o maldito gerundismo. Expressões como “estaremos retornando a ligação”, “estaremos efetuando a entrega” e outras tantas idiotices do gênero (que me recuso até de repetir), num interminável festival de “besteirol”, ouço, amiúde, todos os dias, várias vezes ao dia, em especial ao telefone. Tanto que até já fiquei com ódio deste tão útil aparelhinho, em especial o celular e agora só mantenho contatos pessoais e profissionais por e-mail. Claro que não me livro, nem assim, dessa peste. Contudo... preservo, pelo menos, meus delicados ouvidos.
Não vou nem entrar na questão da nova língua criada em função dos inúmeros chats que pululam internet afora. É uma coisa tão idiota, que sequer merece comentários. Acessei uns quatro ou cinco deles, para saber como eram, e os diálogos pareciam coisas de seres de outros planetas (se é que existe vida inteligente fora da Terra) e não lembravam, nem de longe, esta “última flor do Láscio, inculta e bela” que, a exemplo de Fernando Pessoa, considero minha verdadeira pátria.
Entre a profusão de adjetivos, de alguns jornalistas e escritores do passado, e o excesso de citações em latim (numa certa época foi de francês) e a enxurrada de bobagens, clichês, chavões e modismos dos de hoje, minha preferência é óbvia. Alguém se arrisca a dizer qual é? Daí meu fanático apego aos clássicos, que nas circunstâncias, me são imprescindíveis, por me livrarem de tamanha poluição do idioma e me impedirem de, à minha revelia, “emburrecer” (com o perdão do neologismo que periga virar modismo).
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