Thursday, November 23, 2006

Lembranças da várzea - 7


Pedro J. Bondaczuk


O Flamenguinho começou de forma arrasadora o campeonato da segunda divisão da Liga Sancaetanense de Futebol de 1962. Nosso jogo de estréia marcou, também, a inauguração oficial do nosso novo campo (o que foi cuidadosamente planejado pela diretoria), embora na véspera, no sábado, tivesse sido promovida uma grande festa, com direito a muito choppe e churrasco, que culminou com a realização de um festival, em que fomos representados pelo nosso segundo quadro. E os meninos não decepcionaram. Derrotaram o Águia Negra, da Barra Funda, na final, por 4 a 1 e conquistaram o troféu, o primeiro em nossos domínios.
Mas a partida oficial, a que valia de fato alguma coisa, no caso os dois pontos, ocorreu no domingo, 7 de julho, com cerca de três mil torcedores presentes (nosso diretor social, o Neuclair Silvestrini, jura que havia muito mais). E o adversário não poderia ter sido outro. Foi um dos nossos maiores rivais até então – talvez só menos do que o Universal – o Piratininga, cujo campo havíamos compartilhado no ano anterior e cuja torcida, invariavelmente, torcia contra nós.
O jogo foi violento, difícil, disputado e a arbitragem não ajudou muito. Mas o resultado compensou tudo. Vencemos por 3 a 0, com uma atuação fantástica do Celso, municiado com enorme competência pelo Chicão. E o placar poderia ter sido até mais elástico, se o árbitro tivesse marcado um pênalti claríssimo sobre o nosso ponta-esquerda, o Vicentinho, no que preferiu fazer vistas grossas.
A partir daí, assumimos a liderança do campeonato, que não largamos mais até o final da competição, embora sempre tivéssemos na nossa cola o forte time do Universal. Tornamo-nos, claro, “a bola da vez”, que todos sonhavam em derrotar. A maioria, contudo, ficou só no sonho. Perdemos, apenas, três partidas o campeonato inteiro, todas na casa dos adversários. Em nossos domínios, cantamos de galo do início ao fim do campeonato.
Os participantes foram praticamente os mesmos do ano anterior, com exceção do time dos Autonomistas, que havia ascendido à primeira divisão, e do Mamoré, do bairro Cerâmica, rebaixado em 1961. Os novos filiados da Liga ficaram na espera de alguma desistência. Mas ninguém desistiu. Como o regulamento previa apenas vinte participantes, tiveram que se contentar em disputar “desafios”, que nesse período do ano eram mais escassos, e de nível técnico inferior, já que os principais times da cidade estavam empenhados na disputa dos campeonatos das duas divisões.
Além do Flamengo, do Universal, do Piratininga e do Mamoré, disputaram a competição: Vila Paula, Vila Santa Maria, Moinho São Jorge, Palmeirinha, Santos da Vila Barcelona, Corintinha da Vila Gerte, Estudantes, Maravilha, Brasil, São-paulinho da Vila Califórnia, Vila Califórnia, Flor de Lis da Cerâmica, São Caetano, Clube dos Feirantes, Levante e Espanha Futebol Clube.
O Tatinho superou o Celso em dois gols na artilharia do campeonato, fazendo 28, contra os 26 do grande craque da Liga. Como se vê, ofensivamente, fizemos “barba e cabelo”. Nosso ataque foi arrasador e a defesa, com a nova zaga, composta pelos irmãos Orestes e Cali, parou de levar os gols bobos que havia levado na temporada anterior. O resultado só poderia ser o que foi: Flamenguinho campeão da segunda divisão da Liga Sancaetanense de Futebol de 1962.
O título foi decidido (a nosso favor) nos dois jogos contra o Universal. O do primeiro turno ocorreu logo na terceira rodada e foi disputado no campo do Vila Santa Maria, onde nosso adversário mandava os jogos – já que a Liga havia vetado a “ladeira”, a que já me referi, que eles diziam ser o seu “campo”. A partida, com três expulsões, sendo que duas de jogadores nossos, terminou empatada em 1 a 1. Saímos, portanto, no lucro.
Já o jogo do segundo turno foi um massacre. Também foi violento, mas os dois times terminaram essa partida com todos os jogadores em campo. O resultado é que foi consagrador (e decisivo para a conquista do campeonato). Goleamos o Universal, sem dó e nem piedade, por 4 a 1. E só não foi mais, porque o goleiro deles foi o melhor jogador em campo, pegando bolas impossíveis.
Nossas três derrotas, nesse ano, foram, respectivamente, para o Mamoré (2 a 1), para o Corintinha da Vila Gerte (1 a 0) e, surpreendentemente, para o Maravilha (1 a 0), que terminou a competição em último lugar. No caso, fizemos o papel de Robin Hood: roubamos pontos dos fortes para dá-los aos fracos. Por causa desse jogo, aliás, tivemos que aturar, durante meses, as gozações dos nossos adversários. Afinal, havíamos perdido para o “saco de pancadas” do campeonato. Respondemos, porém, como sempre, dentro de campo. Goleamos nossos três grandes rivais do bairro (Vila Paula, Piratininga e Universal), os dois primeiros em nosso campo e no deles. Foi mais do que suficiente para calar a boca dos nossos críticos.

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