Monday, November 06, 2006

Lembranças da várzea - 3


Pedro J. Bondaczuk


O Flamenguinho manteve-se em permanente atividade, com jogos em todos os domingos e feriados, sem falhar um só, no tempo em que permaneci no seu comando. Que eu me lembre, as únicas exceções foram os natais e anos novos.
Filiamo-nos, por sugestão minha, à Liga Sancaetanense de Futebol em abril de 1961 e de agosto a dezembro desse mesmo ano, disputamos a Segunda Divisão. Terminamos na terceira colocação, mas no ano seguinte, fomos campeões e ascendemos à elite amadora de São Caetano do Sul. E fizemos história. Pois somente dois anos depois, em 1964, chegamos ao título máximo da cidade, para surpresa geral. Voltarei, oportunamente, ao assunto.
E o que fazíamos nos intervalos dos campeonatos da Liga? Jogávamos, e muito! Não posso dizer que se tratassem de amistosos, pois não era essa a designação que se dava aos jogos (muitos dos quais verdadeiras “guerras” entre bairros) na época. Eles eram chamados de “desafios”. Esse era o nome de uma seção famosa do jornal “A Gazeta Esportiva”, através da qual os times varzeanos acertavam seus tira-teimas. Eram, em média, duas páginas inteiras, em corpo miudinho, com anúncios de no máximo duas linhas cada um, em que as equipes se desafiavam. Sem exagero algum, esses desafios chegavam a cinco mil, ou mais, por semana.
Na ocasião, eu trabalhava na Rádio ABC de Santo André. Dispunha, portanto, de um precioso canal de divulgação das atividades do Flamenguinho. Além da função de técnico, cabia-me a incumbência de relações públicas do time e de seu estatístico (o que me permite, hoje, recuperar sua memória, com precisão de dados, que ainda disponho, devidamente catalogados).
Para que o leitor tenha uma idéia de como funcionavam esses desafios, reproduzo um anúncio que fiz, na referida seção de “A Gazeta Esportiva”, na edição da segunda-feira de 9 de julho de 1962: “O Flamengo da Vila Camila desafia o Cambuci Futebol Clube para um confronto, dos 1º e 2º quadros, no dia 15 de julho, no campo do adversário. Arbitragem a combinar. Ofícios aos cuidados deste jornal”.
Se o desafiado aceitasse jogar, respondia de imediato. Raros recusavam. Os que já tinham compromisso para a data citada, propunham uma outra e o jogo era realizado. A partir de 1962, porém, raramente precisávamos desafiar alguém. Éramos, todas as segundas-feiras, desafiados pelos adversários, quer de São Caetano, quer de São Paulo, Santo André, São Bernardo, Mauá etc. Bastava aceitarmos esses desafios e pronto, já tínhamos compromisso para a semana. Em geral, tínhamos uma programação fechada para, no mínimo, três meses, que mantínhamos atualizada e exposta nos vários bares do bairro. Isso, claro, nos inícios de ano, quando os campeonatos da Liga ainda não estavam em andamento.
Havia, também, os chamados “Festivais”, que merecem um capítulo a parte e que abordarei com mais detalhes em ocasião oportuna. Eram torneios envolvendo, em geral, 20 times, quando disputados apenas pelos primeiros quadros, ou 10, quando tinham a participação dos segundos quadros, realizados num só dia. Os jogos eram eliminatórios, de quinze minutos em cada tempo e, em caso de empate, eram decididos na cobrança de penalidades máximas. Somente a decisão tinha duração normal de 90 minutos. As partidas, em geral, começavam às 8 horas da manhã e terminavam, não raro, praticamente no escuro, por volta das seis ou seis e meia da tarde. Saía mal quem tinha que jogar entre o meio-dia e as três da tarde, principalmente no verão.
Eu gostava muito desse tipo de competição. O Flamenguinho, por muito tempo, foi considerado o “rei dos festivais” da várzea, daí receber tantos convites, principalmente da Capital, para participar deles. A grande maioria das centenas de taças e troféus que ornavam nossa improvisada sede foi conquistada nessa espécie de disputa.
Sobre as atividades no período de agosto a dezembro de cada ano, desde que nos filiamos à Liga Sancaetanense de Futebol, sequer é necessário falar. Estávamos envolvidos nos campeonatos da cidade, embora nas raras folgas da tabela, nos mantivéssemos igualmente em atividade, de preferência jogando fora de São Caetano e, até mesmo, do Estado de São Paulo. Embora as viagens fossem bastante desconfortáveis, demoradas e cansativas, quando os adversários eram de cidades muito distantes da nossa, os jogadores apreciavam muito esses compromissos, que encaravam como inesquecíveis aventuras.
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1 comment:

Anonymous said...

MUITO BOM AMIGO , ADOREI TE CONHECER MELHOR, PASSEI A TE ADMIRAR AINDA MAIS!
BJS TERE