Friday, June 05, 2009

Um grande "talvez"


Pedro J. Bondaczuk

As certezas que adquirimos ao longo da vida, aquelas constatações e convicções imutáveis, que nada e ninguém conseguem mudar, são escassas, escassíssimas, embora não venhamos a nos dar conta. Tudo é um imenso e virtualmente infinito “talvez”, que os parcos anos da nossa trajetória por esta aventura perigosa (mas fascinante) não nos permitem esclarecer.
Da minha parte, estou absolutamente certo de poucas coisas. A primeira, seguindo o princípio de Descartes (“Cogito! Ergo sum!”), é a de que existo. Afinal, penso! A segunda, ditada pela mais elementar das lógicas, é a da existência de Deus. Não tenho a mais remota e pálida idéia de como Ele é. Ademais, ninguém jamais teve, tem ou terá (a despeito das tantas e tantas afirmações a respeito). Mas tenho a total convicção da Sua existência, poder e glória. Basta olhar para o céu, numa noite estrelada, e ter em mente que essa infinidade de mundos foi criada por Ele. É o que me basta.
No mais... minhas convicções (como ademais, as de todas as outras pessoas) não passam de hipóteses, possibilidades e suposições. Mesmo a ciência humana restringe-se a somente isso. Por exemplo, vemos, amiúde, “leis” da Física, Química e Biologia, tidas e havidas como certezas, como princípios testados e comprovados por infinitas experiências e, portanto, supostamente imutáveis, serem refeitas, face a novas descobertas.
Detesto escrever sobre a morte, a terceira das grandes certezas que tenho. Sei que um dia deixarei o palco deste mundo, de forma suave ou traumática, sei lá (não há como saber) e que terá fim esta aventura fascinante e maravilhosa, que tenho o privilégio de encarar, que é a vida.
Isso, por mais que queira ou tente evitar, por mais prudentes que sejam os meus passos e mais saudáveis que sejam os meus hábitos, nunca terei como evitar. Esta, sim, é uma regra imutável, não mera hipótese, passiva de contestação. Ou seja, a de que todo o organismo vivo, esgotado seu ciclo vital (que varia de um ser para outro e ninguém jamais soube de quanto tempo que é), morre. E seu corpo físico se “transforma”. No caso, torna-se pó!
Todavia, até essa certeza é revestida de profunda, de possivelmente infinita, quiçá de absoluta incerteza, de monumental “talvez”. Refiro-me ao depois. Tão logo completamos o ciclo imposto pela natureza, o que ocorre? Tudo finda nesse momento? Perdemos de vez a consciência e nosso cérebro, nosso raciocínio, nosso “eu” se apagam, simplesmente, como um aparelho elétrico ao ser desligado da tomada, como este computador em que rabisco estas reflexões?
O que, de fato, ocorre? Existe, mesmo, essa essência imaterial no homem que se disperse no éter, mas permaneça com consciência, lembranças, sensibilidade e capacidade de entendimento? Ou essa “inteligência”, que tanto nos orgulha e que nos distingue dos bilhões de outros seres vivos, não passa de função mecânica, de efeito elétrico, de conseqüência de sinapses dos terminais nervosos, portanto explicável cientificamente e passiva de replicação? Quem pode responder a essa questão sem margem à mínima dúvida, sem recorrer a hipóteses, suposições e crenças? Ser humano nenhum pode!
Bem que cientistas já fizeram essa tentativa, e várias vezes. Houve inúmeros ensaios para de se transplantar cérebros brilhantes em corpos mais saudáveis do que aqueles que originalmente eles comandavam. Em vão! Parece, portanto, que a inteligência é intransferível. Mas onde a certeza? É outro grande talvez.
Na hipótese (a meu ver improvável) porém, da sobrevivência dessa nossa parte essencial, genericamente denominada de “alma” (ou de “espírito”, como querem alguns), como isso se dá? Onde fica essa parte imaterial? Pairando no espaço? Fica na própria Terra? Segue para outro planeta ou outra dimensão? Qual?
Muitos (não sei se a maioria) optam pela fé. Esta, até por definição, não requer a mínima explicação. É a crença absoluta e total, profunda e irrestrita no que é, objetivamente, incrível. No que, se fôssemos racionalizar, não acreditaríamos jamais.
Há quem tenha essa capacidade e ela, certamente, lhe é um bem. Faz com que quem tem fé não tema a morte e até, eventualmente, sinta ansiedade para que chegue logo. Mas isso não está no terreno racional da certeza. Por isso, não tenho como contestar o autor dos célebres “Gargântua” e “Pantagruel”, François Rabelais, quando constatou, a propósito da morte: “Vou em busca de um grande talvez”.Todos nós iremos um dia...

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