Tuesday, December 25, 2007

Sentimento e pensamento


Pedro J. Bondaczuk


As tradições natalinas, sejam quais forem suas origens e natureza, sempre me fascinaram, encantaram e comoveram. Estudei várias delas e pesquiso o tema desde que me conheço por gente. Ou, para não ser exagerado, desde que me tornei jornalista e, posteriormente, este projeto de escritor. Gosto de tudo o que se refira a Natal, tanto no seu aspecto religioso, litúrgico, espiritual, quanto no profano, da festa em si, mesmo quando os que festejam se esquecem do aniversariante do dia.
Curiosamente, todavia, festejei poucas vezes a data, se levar em conta a minha já não tão pequena idade. Isso ocorreu, no entanto, não pela causa que meus desafetos e detratores me atribuem. Ou seja, por causa de uma pretensa e arrogante racionalidade da minha parte que, na verdade, sequer possuo. Há, até, quem me considere empedernido ateu. É o cúmulo do julgamento irresponsável! Embora isso não diga respeito a quem quer que seja, a não ser a mim mesmo, confesso, de público: sou um contrito crente em Deus e na Sua infinita bondade, justiça e misericórdia. À minha maneira, portanto, sou profundamente religioso.
Celebrei poucos Natais em minha vida em decorrência de circunstâncias que sempre fugiram ao meu controle. Quando criança, por exemplo, meus pais, fidelíssimos evangélicos (posso dizer, até, sem nenhum laivo de ofensa a eles, fundamentalistas) nunca festejaram a data.
Achavam – com razão, conforme posterior comprovação histórica – que Nosso Senhor Jesus Cristo não nasceu em 25 de dezembro, conforme diz a tradição, mas em outra ocasião qualquer, embora nas circunstâncias exatas dos relatos bíblicos.
Argumentavam que a data que até hoje celebramos foi estabelecida quando a primitiva igreja cristã se corrompeu, após a conversão do Imperador Constantino, que misturou dogmas da religião então nascente com crenças pagãs, para torná-la, digamos, “palatável” aos romanos.. Uma delas referia-se ao “nascimento” do Sol, adorado, como divindade, desde os primórdios da humanidade por inúmeros povos, e que, no Hemisfério Norte, tem seu solstício de inverno justamente na passagem de 24 para 25 de dezembro.
Até concordo com o argumento dos meus pais. Em termos de História, eles estão corretíssimos! Não há como contestar! Mas não vejo razão para não celebrar tão importante evento sem se importar com datas. Não importa o dia exato em que Cristo nasceu. O fato aconteceu, foi marcante e decisivo para o homem e isso é que é importante. Se a tradição dos povos adotou o Natal como sendo em 25 de dezembro, que seja! Não vejo mal algum nisso.
Ademais, os cristãos contemporâneos (e me incluo entre eles) estão adorando o Deus que se fez homem e não o sol, mesmo que em certa época este é que era adorado nesse período do ano, disfarçadamente, inicialmente em Roma, e depois em outras partes do mundo. O que não concebo é que tão transcendental acontecimento passe (e me perdoem o clichê) “em brancas nuvens”.
Já adulto, e dono do próprio nariz, celebrei poucos Natais em decorrência de responsabilidades profissionais das quais não podia e não deveria abrir mão. Por uma dessas casualidades que jamais consegui explicar, meus plantões, nos jornais em que trabalhei, sempre coincidiam exatamente com esse dia, para a minha frustração pessoal, claro, e, mais tarde (quando casei), da mulher e dos filhos.
De uns tempos para cá, porém, venho recuperando o tempo perdido. Nunca é tarde, enquanto se está vivo, não é verdade? Passei alguns Natais recentes longe da família, mas em casa de pessoas de várias condições sociais, algumas muito pobres, outras com situações financeiras privilegiadas, e todos eles foram inesquecíveis. Os melhores, por mais estranho que possa parecer, foram os festejados em lares humildes, onde faltava tudo, desde gêneros alimentícios básicos, comidas e bebidas, a presentes, mesmo os mais reles, os de R$ 1,99. Mas sobejavam alegria e espontaneidade.
Já festejei a data, algumas vezes, com pessoas absolutamente estranhas, que nunca antes havia visto ou conhecido, sequer de vista. Isso ocorreu em alguns hotéis, distantes da minha cidade, durante imprevistas e inadiáveis viagens a trabalho, por este imenso Brasil afora. Subitamente, no entanto, elas se tornaram íntimas, ao longo da celebração. Com muitas delas, inclusive, mantenho, ainda hoje, estreitas relações de afeto e amizade. A causa? Certamente o tão criticado, mas tão precioso “espírito de Natal”.
Cometemos, amiúde, o crasso erro de misturar sentimentos e pensamentos. Queremos ser racionais quando deveríamos ser sentimentais e vice-versa. Cada um desses comportamentos tem o seu espaço, no seu devido tempo. Há momentos (creio que na maioria do tempo) em que ambos podem e até devem conviver harmoniosamente, sem qualquer conflito. Há outros, porém, em que devemos optar por um ou pelo outro. A esse propósito, o professor e eminente conferencista norte-americano, Brian J. Collins, especializado em palestras de auto-ajuda, observou: “Metade dos nossos erros na vida nasce do fato de sentirmos quando devíamos pensar e pensarmos quando devíamos sentir”.
E não tem razão o mestre? Claro que sim! O Natal, no meu entender, é uma ocasião mais para sentimentos do que para pensamentos. Por isso, contesto os que classificam aqueles que aproveitam a data para dar expansão às suas emoções – que, ao longo do ano, por uma razão ou outra, permanecem esquecidas ou represadas – de “cínicos” e de “hipócritas” e aos seus sentimentos de “piegas”. Acho, pois, lindo – e não cínico como afirmam essas pessoas, elas sim hipocritamente – o tal “espírito natalino”. Por isso, desejo um Feliz Natal a todos conhecidos e/ou desconhecidos, sobretudo aos que me honram, há tempos, com a sua generosa e paciente leitura!

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