Pedro J. Bondaczuk
O livro "O Feijão e o Sonho", de Orígenes Lessa, o mais importante desse escritor, vale já pelo seu próprio título. Simboliza duas espécies diferentes de pessoas: as que vivem com a cabeça nas nuvens, indiferentes às coisas do dia a dia, e as práticas, que mesmo sem perder a prerrogativa de sonhar, conseguem manter os pés bem presos ao chão e se mostram racionais em qualquer circunstância.
O ideal é o indivíduo que reúna, simultaneamente, as duas características. Que sonhe sempre, e muito, compulsivamente até. Mas que não se limite apenas a isto. Que tenha a capacidade de colocar tudo o quanto sonhar em prática, ou pelo menos tentar isso.
O Natal, que se aproxima, é uma festa que assume as duas características. Para uns, é um período de sonhos, principalmente aqueles que os acalentaram na infância. Para outros, é nitidamente a época do feijão. Nesta categoria há os dois extremos: os que comem demais e os que nada têm para comer.
É verdade que este contraste não acontece apenas neste dia. A data simplesmente enfatiza – por ser a do "aniversário" de um Deus, que esteve entre os homens e foi rejeitado por eles, por haver pregado a fórmula que humanizaria a humanidade, a da solidariedade e do altruísmo – estes extremos.
Enquanto dois terços da população mundial não têm o que comer e vivem às voltas com a desnutrição e doenças provenientes da fome, o um terço restante esbanja e desperdiça. Ressalte-se que ambos os grupos são compostos por pessoas absolutamente semelhantes: física, mental e psicologicamente.
Os membros, dos dois lados, são mortais e transitórios. No entanto, uns têm demais, até para jogar fora. Outros...Uns detêm o poder, o dinheiro e a arrogância. Aos outros sobram as frustrações, as privações, a revolta auto-sufocada e a falta de perspectivas.
Neste Natal, enquanto muitos, certamente, terão mesas fartas – e alguns precisarão, como em todos os anos, ser socorridos em prontos-socorros por se excederem na comida e na bebida – milhões não vão ter sequer um pão seco para lhes tapear o estômago.
No Rio de Janeiro, enquanto vivo, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, realizava campanhas para que pelo menos nesse dia nenhuma pessoa passasse fome na cidade. Muitos passavam. Milhares ainda vão passar. Era pouco esse empenho e diminuto o objetivo? Claro que era! Mas era melhor do que nada, convenhamos. Se em toda a parte alguém agisse da mesma maneira, pelo menos no Natal não haveria um único faminto, o que já seria demais. Representaria um dia inteiro sem a vitória do egoísmo e da indiferença sobre a solidariedade.
Aliás, o padre Antônio Vieira tem um sermão magistral a propósito de comer ou não comer intitulado "O fim a que mira o trabalho do homem". O sacerdote constata, nessa brilhante oração: "A maior pensão com que Deus criou o homem é o comer (...) Os pobres dão pelo pão o trabalho, os ricos dão pelo pão a fazenda, os de espírito generoso dão pelo pão a vida, os de espírito baixo dão pelo pão a alma, e nenhum há que não dê pelo pão, e ao pão todo o seu cuidado. Parece-vos que tenho dito muito? Pois ainda não está discorrido tudo. Tirai o pensamento dos homens, e lançai-o por todas as outras coisas do mundo; achareis que todas elas estão servindo a este fim, ou pensão do sustento humano. A este fim nascem as ervas, a este fim crescem as plantas, a este fim florescem as árvores, a este fim produzem e amadurecem os frutos, a este fim trabalham os animais domésticos em casa, a este fim se criam os silvestres nas brenhas, a este fim os do mar e os do rio nadam em suas águas; enfim tudo o que nasce e vive neste mundo, a este fim nasce e vive".
Que tal se neste Natal, pelo menos nele, cada um de nós resolvêssemos fazer nossa campanha particular contra a fome?! Que tal se reuníssemos alguns gêneros alimentícios de primeira necessidade e os doássemos a orfanatos, a creches, a asilos, a famílias carentes que conheçamos etc.! Mas isso teria que ser feito sem propaganda, sem alarde e sem que os beneficiados se sentissem humilhados. Seria a forma ideal de unir o "sonho" (da convivência solidária) ao "feijão" (da subsistência física). Mas há outro tipo de "alimento" que podemos doar, sem que a doação nos custe um único centavo: o do calor humano.
Uma visita às instituições supracitadas, ou a hospitais, para levar compreensão e uma palavra amiga aos que lá estejam internados, teria valor muito maior do que podemos supor. Ou somente para ouvir suas aflições. Que falta muitas vezes nos faz um bom ouvinte! Afinal, como afirmou o norte-americano E. Weilenmann: "Nada no mundo é mais interessante do que o ser humano. E no ser humano o mais interessante é sua vida interior. E na vida interior o mais misterioso é o que se revela nos sonhos".
A ex-primeira-dama dos Estados Unidos, Eleanor Roosevelt, foi mais longe e acentuou: "O futuro pertence aos que acreditam na busca daquilo que sonham".
Que o nosso seja o de um mundo justo, onde nunca mais haja os humilhados e os ofendidos. E que façamos tudo o que for necessário para que ele se torne real... A você, meu paciente leitor, desejo, de coração, um abençoado Natal!
O livro "O Feijão e o Sonho", de Orígenes Lessa, o mais importante desse escritor, vale já pelo seu próprio título. Simboliza duas espécies diferentes de pessoas: as que vivem com a cabeça nas nuvens, indiferentes às coisas do dia a dia, e as práticas, que mesmo sem perder a prerrogativa de sonhar, conseguem manter os pés bem presos ao chão e se mostram racionais em qualquer circunstância.
O ideal é o indivíduo que reúna, simultaneamente, as duas características. Que sonhe sempre, e muito, compulsivamente até. Mas que não se limite apenas a isto. Que tenha a capacidade de colocar tudo o quanto sonhar em prática, ou pelo menos tentar isso.
O Natal, que se aproxima, é uma festa que assume as duas características. Para uns, é um período de sonhos, principalmente aqueles que os acalentaram na infância. Para outros, é nitidamente a época do feijão. Nesta categoria há os dois extremos: os que comem demais e os que nada têm para comer.
É verdade que este contraste não acontece apenas neste dia. A data simplesmente enfatiza – por ser a do "aniversário" de um Deus, que esteve entre os homens e foi rejeitado por eles, por haver pregado a fórmula que humanizaria a humanidade, a da solidariedade e do altruísmo – estes extremos.
Enquanto dois terços da população mundial não têm o que comer e vivem às voltas com a desnutrição e doenças provenientes da fome, o um terço restante esbanja e desperdiça. Ressalte-se que ambos os grupos são compostos por pessoas absolutamente semelhantes: física, mental e psicologicamente.
Os membros, dos dois lados, são mortais e transitórios. No entanto, uns têm demais, até para jogar fora. Outros...Uns detêm o poder, o dinheiro e a arrogância. Aos outros sobram as frustrações, as privações, a revolta auto-sufocada e a falta de perspectivas.
Neste Natal, enquanto muitos, certamente, terão mesas fartas – e alguns precisarão, como em todos os anos, ser socorridos em prontos-socorros por se excederem na comida e na bebida – milhões não vão ter sequer um pão seco para lhes tapear o estômago.
No Rio de Janeiro, enquanto vivo, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, realizava campanhas para que pelo menos nesse dia nenhuma pessoa passasse fome na cidade. Muitos passavam. Milhares ainda vão passar. Era pouco esse empenho e diminuto o objetivo? Claro que era! Mas era melhor do que nada, convenhamos. Se em toda a parte alguém agisse da mesma maneira, pelo menos no Natal não haveria um único faminto, o que já seria demais. Representaria um dia inteiro sem a vitória do egoísmo e da indiferença sobre a solidariedade.
Aliás, o padre Antônio Vieira tem um sermão magistral a propósito de comer ou não comer intitulado "O fim a que mira o trabalho do homem". O sacerdote constata, nessa brilhante oração: "A maior pensão com que Deus criou o homem é o comer (...) Os pobres dão pelo pão o trabalho, os ricos dão pelo pão a fazenda, os de espírito generoso dão pelo pão a vida, os de espírito baixo dão pelo pão a alma, e nenhum há que não dê pelo pão, e ao pão todo o seu cuidado. Parece-vos que tenho dito muito? Pois ainda não está discorrido tudo. Tirai o pensamento dos homens, e lançai-o por todas as outras coisas do mundo; achareis que todas elas estão servindo a este fim, ou pensão do sustento humano. A este fim nascem as ervas, a este fim crescem as plantas, a este fim florescem as árvores, a este fim produzem e amadurecem os frutos, a este fim trabalham os animais domésticos em casa, a este fim se criam os silvestres nas brenhas, a este fim os do mar e os do rio nadam em suas águas; enfim tudo o que nasce e vive neste mundo, a este fim nasce e vive".
Que tal se neste Natal, pelo menos nele, cada um de nós resolvêssemos fazer nossa campanha particular contra a fome?! Que tal se reuníssemos alguns gêneros alimentícios de primeira necessidade e os doássemos a orfanatos, a creches, a asilos, a famílias carentes que conheçamos etc.! Mas isso teria que ser feito sem propaganda, sem alarde e sem que os beneficiados se sentissem humilhados. Seria a forma ideal de unir o "sonho" (da convivência solidária) ao "feijão" (da subsistência física). Mas há outro tipo de "alimento" que podemos doar, sem que a doação nos custe um único centavo: o do calor humano.
Uma visita às instituições supracitadas, ou a hospitais, para levar compreensão e uma palavra amiga aos que lá estejam internados, teria valor muito maior do que podemos supor. Ou somente para ouvir suas aflições. Que falta muitas vezes nos faz um bom ouvinte! Afinal, como afirmou o norte-americano E. Weilenmann: "Nada no mundo é mais interessante do que o ser humano. E no ser humano o mais interessante é sua vida interior. E na vida interior o mais misterioso é o que se revela nos sonhos".
A ex-primeira-dama dos Estados Unidos, Eleanor Roosevelt, foi mais longe e acentuou: "O futuro pertence aos que acreditam na busca daquilo que sonham".
Que o nosso seja o de um mundo justo, onde nunca mais haja os humilhados e os ofendidos. E que façamos tudo o que for necessário para que ele se torne real... A você, meu paciente leitor, desejo, de coração, um abençoado Natal!
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