Monday, December 31, 2007

O pássaro ainda voa


Pedro J. Bondaczuk


O tempo da nossa vida pode ser comparado a um pássaro em permanente vôo. Leva, em suas asas, alegrias, tristezas, sucessos, fracassos, mágoas e saudades, ditadas pelas nossas circunstâncias. A nós compete, se soubermos viver, determinar o que a ave levará para o futuro.
O pássaro do tempo ora voa em céu tempestuoso, em meio a nuvens cor de chumbo, de tempestades e nevascas, ora num azul sem mácula, em dias plenos de sol e de luz. Os anos se sucedem, as estações passam e tornam a voltar, num ciclo que parece não ter fim. Mas tem.
Um dia o pássaro do tempo partirá rumo ao mistério e ao infinito: o da morte e, possivelmente, da eternidade (ninguém tem essa certeza, destaque-se) ou da minha absoluta extinção. “És pó e ao pó retornarás”, diz, peremptório, o texto bíblico.
Para onde ele vai seguir, dependerá de mim (ou de nós), de meu estado de espírito, crenças, sonhos, otimismo, esperanças e fé. Pois, como diz o poeta Mauro Sampaio, nos versos do poema “Oráculo”:

“Quando o pássaro partir
para o seu vôo de inverno
/há de levar nas asas o pólen da saudade”.

Sempre leva. Por piores que tenham sido os dias passados, sempre haverá um, um único que seja, que irá nos despertar lembranças agradáveis. Podem ser muitos, é verdade, embora nunca possam ser todos. Sempre haverá dores, mágoas, tristezas e tragédias para temperar as coisas.
Estas considerações vêm a propósito de mais um ano que se encerra, com suas vitórias, derrotas, alegrias, tristezas, esperanças frustradas e sonhos realizados. Cada pessoa, certamente, terá sua avaliação particular do período que se fecha, dependendo do que lhe aconteceu, de bom e/ou de ruim. Uns vão considerá-lo positivo. Outros... vão festejar, com um “ufa!!!” de alívio, o seu término.
Da minha parte, o ano que se encerra trouxe vitórias (muitas), fracassos (poucos) e até uma tragédia, que foi a morte do meu pai, com o qual nutria uma amizade ímpar, como nunca tive com nenhuma outra pessoa. Mas ele permanecerá sempre vivo, enquanto eu viver, não apenas na lembrança, mas nos genes que me legou.
Contudo, no cômputo de ganhos e de perdas, prevalecem os primeiros. Afinal, terminei o período gozando de plena saúde, física e mental, o que é uma grande bênção, levando em conta minha já não tão pequena idade. Não perdi um único dia de trabalho por motivo de doença, o que, sem dúvida, é para ser festejado, e muito. Se médicos e farmacêuticos dependessem de mim, no ano que ora se encerra, morreriam à míngua.
Todavia, não consegui lançar um novo livro, como havia planejado. A culpa foi minha. Não me empenhei para isso. Por essa razão, não tenho do que lamentar (e não lamento). Tudo virá no seu devido tempo. Escrevi, e muito. Foram em torno de 520 crônicas redigidas no período o que, apesar do número expressivo, não se constituiu sequer no meu recorde pessoal. Aliás, esteve longe dele. Ademais, dei seqüência ao meu primeiro romance, que estava parado desde 2004, o que foi um fato altamente positivo. Pelo jeito, agora ele sai.
Compus 20 poemas novos, o que considero produção pífia nesse gênero. Fazer o quê? Sou um só e o tempo tem limites, ora se tem. Em compensação, li e reli, incansável e furiosamente, desde os clássicos a inúmeros escritores desconhecidos, que tiveram a gentileza de me enviar suas produções, exigindo minha avaliação. Quem sou eu?! Mas estou com a consciência tranqüila por haver atendido a todos com cortesia e honestidade. Alguns não gostaram dos meus comentários. Ainda bem que não sou expert literário e muito menos dono da verdade. Pelo menos os mal-avaliados têm a esperança de que fui incompetente e não soube apreciar, devidamente, determinadas nuances de suas obras. Tomara que seja isso!
Outra vitória, que me envaidece, no ano que finda, foi o sucesso deste espaço Literário. Atribuo-o, claro, não à minha atuação, mas à qualidade dos colegas jornalistas e estudantes de jornalismo que nos honraram com o seu prestígio. Contudo, tenho orgulho de fazer parte deste vitorioso time.
No campo esportivo, o período foi neutro. Minha Ponte Preta, uma das minhas grandes (e inexplicáveis) paixões, tanto no Campeonato Paulista, quanto no Brasileiro da Série B, nadou, nadou... e morreu na praia. O consolo é que, ao contrário do ano passado, não foi rebaixada. Ufa! Mas foi por pouco!
Agora, só me resta esperar o que o pássaro do tempo irá trazer em suas asas. E, claro, fazer a minha parte para tornar o próximo ano um dos melhores, senão o melhor, da minha vida. Ademais, preciso conservar o otimismo e o bom-humor e me empenhar ao máximo nas tarefas que me couberem. Planos? Tenho muitos (seria insensato se não os tivesse), mas estes prefiro não revelar sequer à minha esposa. Questão de superstição.
Finalmente, embora meus implacáveis críticos condenem citações em crônicas (do que discordo, mas cujo repúdio respeito, como respeito todas as opiniões com as quais não concordo), peço licença aos meus escassos e pacientes leitores para encerrar estas divagações com a reprodução do poema “Esperança”, de um dos meus poetas preferidos, meu conterrâneo Mário Quintana, extraído da “Nova Antologia Poética” (Editora Globo – São Paulo – 1998):

“Lá bem no alto do décimo-segundo andar do Ano
vive uma louca chamada Esperança
e ela pensa que quando todas as sirenas
todas as buzinas
todos os reco-recos tocarem
atira-se
e
--- ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
--- Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela dirá
(é preciso dizer-lhes tudo de novo!)
ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
--- O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...”

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