Três presidentes fuzilados
Pedro J. Bondaczuk
Os militares do Yemen do Sul fuzilaram, ontem, o terceiro dos quatro presidentes que o país já teve em sua curta (e tormentosa) vida de Estado independente. O motivo é o de sempre em sociedades onde o jogo democrático não é mais do que uma expressão retórica: complô para um golpe.
A desditosa vítima, desta vez, foi Abdel Fattah Ismail, que renunciou ao cargo em 21 de abril de 1980, a pretexto de estar com a saúde muito abalada. Hoje se sabe que na verdade foi deposto num chamado "golpe branco", expediente do qual um país latino-americano, o Panamá, tem se mostrado exímio. Na ocasião, Ismail foi "recomendado" a mudar de ares, passando uma temporada na União Soviética.
O Yemen do Sul é o "primo pobre" na comunidade árabe. Situado no extremo Sul da Península Arábica, na entrada do Golfo de Áden, caminho obrigatório para os navios que atravessam o Canal de Suez e Mar Vermelho, ou que vêm do Mar Mediterrâneo rumo ao Oceano Pacífico, e vice-versa, é hoje um grande aliado da União Soviética. Seu regime é o marxista.
Mas se os russos são pródigos no fornecimento de armas a essa paupérrima República, que possui apenas 1% de seu território arável, não são tão mãos abertas assim em se tratando de outro tipo de auxílio: o econômico. Os sul-iemenitas detêm uma das rendas per capita mais baixas da comunidade islâmica, com irrisórios US$ 430 anuais.
Aliada à pobreza, ou mais exatamente, em decorrência dela, o Yemen do Sul tem caracterizado a sua vida institucional pela violência política. Atentem os leitores para este revelador detalhe: desde que os britânicos se foram de vez da área, em 1967, após uma sangrenta guerra de independência, esse país teve quatro presidentes (contando o atual, Ali Nasser Mohammed). O primeiro foi Qayttan Al-Shaabi, que renunciou em 1969, ocasião em que foi substituído por um conselho presidencial de cinco membros. Pouco tempo depois, foi acusado de traição e executado.
O segundo presidente foi Salim Ali Rubay, que promoveu diversas reformas, buscando ocidentalizar os costumes sul-iemenitas. Entre essas mudanças está a implantação da monogamia no país, ocorrida em 1974. Entretanto, esse político foi implicado numa estranha conspiração contra o governo do vizinho Yemen do Norte, no qual morreu o presidente dessa República, Al Gashmi. Como os militares dos dois países estavam em franco "namoro", visando à fusão de ambos os Estados, o incidente causou profunda irritação nos dois lados. Rubay foi deposto, julgado sumariamente e fuzilado em 26 de junho de 1978.
Ontem, finalmente, o terceiro dos presidentes teve idêntico destino. Resta saber quando ocorrerá o mesmo com o atual, Ali Nasser Mohammed. Enquanto os poderosos brigam pelos miseráveis espólios políticos, por um "escorregadio" poder, o povo continua sofrendo as agruras de ter que viver numa terra onde, à exceção de petróleo, tudo precisa ser importado. Até água para se beber!
Em 1981, segundo dados das Nações Unidas, 20% da população sul-iemenita vegetava abaixo do nível de pobreza. O analfabetismo alcançava a 60% e a dívida externa, em 1982, era de US$ 760 milhões, devendo girar, atualmente, na casa dos US$ 1,3 bilhão.
Tal vez a salvação do Yemen do Sul esteja, mesmo, na fusão com seu vizinho e homônimo do Norte, que embora territorialmente menor, é bem mais desenvolvido. Há um pacto firmado entre os dois Estados em 1972 e reforçado em 1979, objetivando a unificação. Unidos, os dois países vão somar quase dez milhões de habitantes (2.300.000 de sul-iemenitas e 7.300.000 de norte-iemenitas) e um Produto Nacional Bruto de US$ 5,362 bilhões. Quem sabe, dessa maneira, consigam deixar a incômoda primazia de constituírem a mais pobre das unidades (ou uma das mais) da vasta comunidade árabe.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 14 de janeiro de 1986)
Pedro J. Bondaczuk
Os militares do Yemen do Sul fuzilaram, ontem, o terceiro dos quatro presidentes que o país já teve em sua curta (e tormentosa) vida de Estado independente. O motivo é o de sempre em sociedades onde o jogo democrático não é mais do que uma expressão retórica: complô para um golpe.
A desditosa vítima, desta vez, foi Abdel Fattah Ismail, que renunciou ao cargo em 21 de abril de 1980, a pretexto de estar com a saúde muito abalada. Hoje se sabe que na verdade foi deposto num chamado "golpe branco", expediente do qual um país latino-americano, o Panamá, tem se mostrado exímio. Na ocasião, Ismail foi "recomendado" a mudar de ares, passando uma temporada na União Soviética.
O Yemen do Sul é o "primo pobre" na comunidade árabe. Situado no extremo Sul da Península Arábica, na entrada do Golfo de Áden, caminho obrigatório para os navios que atravessam o Canal de Suez e Mar Vermelho, ou que vêm do Mar Mediterrâneo rumo ao Oceano Pacífico, e vice-versa, é hoje um grande aliado da União Soviética. Seu regime é o marxista.
Mas se os russos são pródigos no fornecimento de armas a essa paupérrima República, que possui apenas 1% de seu território arável, não são tão mãos abertas assim em se tratando de outro tipo de auxílio: o econômico. Os sul-iemenitas detêm uma das rendas per capita mais baixas da comunidade islâmica, com irrisórios US$ 430 anuais.
Aliada à pobreza, ou mais exatamente, em decorrência dela, o Yemen do Sul tem caracterizado a sua vida institucional pela violência política. Atentem os leitores para este revelador detalhe: desde que os britânicos se foram de vez da área, em 1967, após uma sangrenta guerra de independência, esse país teve quatro presidentes (contando o atual, Ali Nasser Mohammed). O primeiro foi Qayttan Al-Shaabi, que renunciou em 1969, ocasião em que foi substituído por um conselho presidencial de cinco membros. Pouco tempo depois, foi acusado de traição e executado.
O segundo presidente foi Salim Ali Rubay, que promoveu diversas reformas, buscando ocidentalizar os costumes sul-iemenitas. Entre essas mudanças está a implantação da monogamia no país, ocorrida em 1974. Entretanto, esse político foi implicado numa estranha conspiração contra o governo do vizinho Yemen do Norte, no qual morreu o presidente dessa República, Al Gashmi. Como os militares dos dois países estavam em franco "namoro", visando à fusão de ambos os Estados, o incidente causou profunda irritação nos dois lados. Rubay foi deposto, julgado sumariamente e fuzilado em 26 de junho de 1978.
Ontem, finalmente, o terceiro dos presidentes teve idêntico destino. Resta saber quando ocorrerá o mesmo com o atual, Ali Nasser Mohammed. Enquanto os poderosos brigam pelos miseráveis espólios políticos, por um "escorregadio" poder, o povo continua sofrendo as agruras de ter que viver numa terra onde, à exceção de petróleo, tudo precisa ser importado. Até água para se beber!
Em 1981, segundo dados das Nações Unidas, 20% da população sul-iemenita vegetava abaixo do nível de pobreza. O analfabetismo alcançava a 60% e a dívida externa, em 1982, era de US$ 760 milhões, devendo girar, atualmente, na casa dos US$ 1,3 bilhão.
Tal vez a salvação do Yemen do Sul esteja, mesmo, na fusão com seu vizinho e homônimo do Norte, que embora territorialmente menor, é bem mais desenvolvido. Há um pacto firmado entre os dois Estados em 1972 e reforçado em 1979, objetivando a unificação. Unidos, os dois países vão somar quase dez milhões de habitantes (2.300.000 de sul-iemenitas e 7.300.000 de norte-iemenitas) e um Produto Nacional Bruto de US$ 5,362 bilhões. Quem sabe, dessa maneira, consigam deixar a incômoda primazia de constituírem a mais pobre das unidades (ou uma das mais) da vasta comunidade árabe.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 14 de janeiro de 1986)
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O que comprar:
Cronos e Narciso (crônicas, Editora Barauna, 110 páginas) – “Nessa época do eterno presente, em que tudo é reduzido à exaustão dos momentos, este livro de Pedro J. Bondaczuk reaviva a fome de transcendência! (Nei Duclós, escritor e jornalista).
Lance fatal (contos, Editora Barauna, 73 páginas) – Um lance, uma única e solitária jogada, pode decidir uma partida e até um campeonato, uma Copa do Mundo. Assim como no jogo – seja de futebol ou de qualquer outro esporte), uma determinada ação, dependendo das circunstâncias, decide uma vida. Esta é a mensagem implícita nos quatro instigantes contos de Pedro J. Bondaczuk neste pequeno grande livro.
Como comprar:
Pela internet – WWW.editorabarauna.com.br – Acessar o link “Como comprar” e seguir as instruções.
Em livraria – Em qualquer loja da rede de livrarias Cultura espalhadas pelo País.
Cronos e Narciso (crônicas, Editora Barauna, 110 páginas) – “Nessa época do eterno presente, em que tudo é reduzido à exaustão dos momentos, este livro de Pedro J. Bondaczuk reaviva a fome de transcendência! (Nei Duclós, escritor e jornalista).
Lance fatal (contos, Editora Barauna, 73 páginas) – Um lance, uma única e solitária jogada, pode decidir uma partida e até um campeonato, uma Copa do Mundo. Assim como no jogo – seja de futebol ou de qualquer outro esporte), uma determinada ação, dependendo das circunstâncias, decide uma vida. Esta é a mensagem implícita nos quatro instigantes contos de Pedro J. Bondaczuk neste pequeno grande livro.
Como comprar:
Pela internet – WWW.editorabarauna.com.br – Acessar o link “Como comprar” e seguir as instruções.
Em livraria – Em qualquer loja da rede de livrarias Cultura espalhadas pelo País.
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