Susto para dar graça à estréia
Pedro J. Bondaczuk
A Seleção Brasileira iniciou a vitoriosa campanha da Copa do Mundo de 1970, no México, dando um baita de um susto na torcida (e em mim também, claro). Depois de prolongado período de preparação física e intenso treinamento técnico, tanto aqui no Brasil, quanto em solo do país anfitrião, a equipe canarinho estreou na competição em 2 de junho de 1970, no Estádio Jalisco de Guadalajara, diante de um público de 52 mil pessoas, com arbitragem do uruguaio Ramón Barreto, enfrentando um adversário qualificado, velho conhecido e rival de longa data: a Checoslováquia.
Acompanhei esse jogo, assim como todos os outros desse mundial, à exceção da final, pela televisão em cores, na casa do meu amigo e colega de escola, de trabalho e de clube, Rony Bueno. Morávamos no mesmo bairro de Campinas, em Barão Geraldo, ele numa confortável casa e eu numa república de estudantes e operários.
Diferente do que havia ocorrido em 1966, a Rhodia, multinacional francesa do ramo químico, em que eu continuava trabalhando, reduziu o horário de expediente em dias de jogos do Brasil, de sorte que os funcionários que não fossem de setores essenciais pudessem acompanhar as partidas.
Mas, como dizia, a Seleção Brasileira iniciou essa Copa dando um grande susto na torcida. Logo aos 10 minutos do primeiro tempo, o avante checo Petras abriu o placar. E num gesto que ficaria marcante, ele, que defendia o selecionado de um país comunista, que supostamente seria ateu, ajoelhou-se no gramado e fez o sinal da cruz.
Os que estavam na sala da casa do Rony, à frente da TV (éramos umas quinze pessoas), entreolhamo-nos, preocupados, mas em absoluto silêncio, sem conseguir disfarçar a tensão. A mulher do meu amigo era excelente anfitriã. Abasteceu-nos de cerveja, muita cerveja, além de pipoca, amendoim e variados salgadinhos.
O silêncio na sala era absoluto. Só se ouvia a voz do narrador da TV, Geraldo José de Almeida, cuja característica era o otimismo e o entusiasmo. No México, porém, a Seleção, aparentemente, não se abalou com o gol adversário. Tocava a bola com fluência, leveza, sem afobação, passando-nos um pouco mais de confiança.
Não tardou para que deixássemos escapar o primeiro (de tantos) grito de gol daquela Copa. Rivelino, num chute preciso e indefensável, empatou o jogo. E assim terminou o primeiro tempo, com o Brasil dominando as ações. O placar não refletia, até então, o que era o jogo. Os checos pouco ameaçavam a meta de Félix, contidos com segurança por Brito e Piazza.
Na segunda etapa, foi um show brasileiro. Com passes longos e certeiros, o Brasil foi construindo, implacavelmente, um folgado marcador. Primeiro foi Jairzinho a visitar as redes adversárias. Depois, foi a vez de Pelé deixar sua marca. E finalmente, de novo, Jairzinho fez um golaço. De repente, o susto inicial transformou-se em euforia. O empate não tardou a virar goleada a nosso favor. O Brasil não só era contundente e eficiente, como também dava espetáculo, com inúmeras jogadas de efeito, de malabarismo e imensa técnica.
Entusiasmados, dissemos, uns para os outros: “Se jogarmos dessa forma até o fim do mundial, não vai ter para ninguém!”. E não teve mesmo. O técnico Zagallo valeu-se, pela primeira vez, da nova regra, quando o jogo já estava virtualmente decidido, e substituiu Gerson, para poupá-lo, por outro jogador genial, Paulo César Caju.
Se é verdade que com a alteração o time perdeu a precisão do passe, sobretudo o longo, de trinta ou quarenta metros, não é menos verdadeiro que ganhou em rapidez. Aqueles 4 a 1 contra a Checoslováquia foram uma das mais primorosas exibições que vi a Seleção Brasileira fazer até hoje. E olhem que se tratava de um adversário de peso, qualificado, apontado por boa parte da crônica esportiva mundial como um dos potenciais candidatos à conquista da Copa.
Os otimistas (eu no meio) ficaram eufóricos e multiplicaram por mil o seu otimismo. Os pessimistas, por seu turno, em vez de curtirem o resultado, alertavam para o fato de que o Brasil, em várias outras oportunidades, começara bem uma competição, mas terminara de forma desastrosa. Quando essas cassandras de mau agouro faziam tais previsões sombrias, supersticiosamente, eu dava três batidinhas na madeira, para espantar o azar. E creio que espantei de fato.
Pedro J. Bondaczuk
A Seleção Brasileira iniciou a vitoriosa campanha da Copa do Mundo de 1970, no México, dando um baita de um susto na torcida (e em mim também, claro). Depois de prolongado período de preparação física e intenso treinamento técnico, tanto aqui no Brasil, quanto em solo do país anfitrião, a equipe canarinho estreou na competição em 2 de junho de 1970, no Estádio Jalisco de Guadalajara, diante de um público de 52 mil pessoas, com arbitragem do uruguaio Ramón Barreto, enfrentando um adversário qualificado, velho conhecido e rival de longa data: a Checoslováquia.
Acompanhei esse jogo, assim como todos os outros desse mundial, à exceção da final, pela televisão em cores, na casa do meu amigo e colega de escola, de trabalho e de clube, Rony Bueno. Morávamos no mesmo bairro de Campinas, em Barão Geraldo, ele numa confortável casa e eu numa república de estudantes e operários.
Diferente do que havia ocorrido em 1966, a Rhodia, multinacional francesa do ramo químico, em que eu continuava trabalhando, reduziu o horário de expediente em dias de jogos do Brasil, de sorte que os funcionários que não fossem de setores essenciais pudessem acompanhar as partidas.
Mas, como dizia, a Seleção Brasileira iniciou essa Copa dando um grande susto na torcida. Logo aos 10 minutos do primeiro tempo, o avante checo Petras abriu o placar. E num gesto que ficaria marcante, ele, que defendia o selecionado de um país comunista, que supostamente seria ateu, ajoelhou-se no gramado e fez o sinal da cruz.
Os que estavam na sala da casa do Rony, à frente da TV (éramos umas quinze pessoas), entreolhamo-nos, preocupados, mas em absoluto silêncio, sem conseguir disfarçar a tensão. A mulher do meu amigo era excelente anfitriã. Abasteceu-nos de cerveja, muita cerveja, além de pipoca, amendoim e variados salgadinhos.
O silêncio na sala era absoluto. Só se ouvia a voz do narrador da TV, Geraldo José de Almeida, cuja característica era o otimismo e o entusiasmo. No México, porém, a Seleção, aparentemente, não se abalou com o gol adversário. Tocava a bola com fluência, leveza, sem afobação, passando-nos um pouco mais de confiança.
Não tardou para que deixássemos escapar o primeiro (de tantos) grito de gol daquela Copa. Rivelino, num chute preciso e indefensável, empatou o jogo. E assim terminou o primeiro tempo, com o Brasil dominando as ações. O placar não refletia, até então, o que era o jogo. Os checos pouco ameaçavam a meta de Félix, contidos com segurança por Brito e Piazza.
Na segunda etapa, foi um show brasileiro. Com passes longos e certeiros, o Brasil foi construindo, implacavelmente, um folgado marcador. Primeiro foi Jairzinho a visitar as redes adversárias. Depois, foi a vez de Pelé deixar sua marca. E finalmente, de novo, Jairzinho fez um golaço. De repente, o susto inicial transformou-se em euforia. O empate não tardou a virar goleada a nosso favor. O Brasil não só era contundente e eficiente, como também dava espetáculo, com inúmeras jogadas de efeito, de malabarismo e imensa técnica.
Entusiasmados, dissemos, uns para os outros: “Se jogarmos dessa forma até o fim do mundial, não vai ter para ninguém!”. E não teve mesmo. O técnico Zagallo valeu-se, pela primeira vez, da nova regra, quando o jogo já estava virtualmente decidido, e substituiu Gerson, para poupá-lo, por outro jogador genial, Paulo César Caju.
Se é verdade que com a alteração o time perdeu a precisão do passe, sobretudo o longo, de trinta ou quarenta metros, não é menos verdadeiro que ganhou em rapidez. Aqueles 4 a 1 contra a Checoslováquia foram uma das mais primorosas exibições que vi a Seleção Brasileira fazer até hoje. E olhem que se tratava de um adversário de peso, qualificado, apontado por boa parte da crônica esportiva mundial como um dos potenciais candidatos à conquista da Copa.
Os otimistas (eu no meio) ficaram eufóricos e multiplicaram por mil o seu otimismo. Os pessimistas, por seu turno, em vez de curtirem o resultado, alertavam para o fato de que o Brasil, em várias outras oportunidades, começara bem uma competição, mas terminara de forma desastrosa. Quando essas cassandras de mau agouro faziam tais previsões sombrias, supersticiosamente, eu dava três batidinhas na madeira, para espantar o azar. E creio que espantei de fato.
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