Pedro J. Bondaczuk
Os que não crêem em milagres são céticos, apenas, porque não atentam para a natureza. A cada instante, diria a cada fração de segundo, a vida se renova, de forma fantástica e miraculosa, e se manifesta onde jamais supúnhamos fosse possível. Basta atentar para o que ocorre ao nosso redor.
A própria existência da Terra, com a distância ideal do Sol, nem próxima demais para ser tórrida como os planetas Mercúrio e Vênus, e nem distante em demasia, para ser gélida, como ocorre com Marte, é magnífico milagre. Ou não é? Assim como são o seu tamanho, gravidade, composição química etc.etc.etc.
Há palavras que devemos evitar, por se revestirem de perturbadora ambigüidade, trazerem embutidas promessas que não temos condições de cumprir e previsões que não dependem de nós para se concretizar. As três principais que se incluem nesse caso são: nunca, sempre e jamais.
Claro que as dizemos, impensadamente, a cada momento, sem sequer refletir sobre seu significado. Afirmar, por exemplo, à amada, que “sempre” a iremos amar pode expressar boa-intenção, mas não uma possibilidade. O tempo e as circunstâncias findam por tornar vã essa promessa.
Garantir que “jamais” as injustiças serão banidas do mundo é desconfiar da garra e determinação das futuras gerações. Ou dizer que “nunca” um vencido haverá de se recuperar é uma afirmação irresponsável e tola. Afinal, desconhecemos suas circunstâncias futuras.
Bertolt Brecht ilustra, a caráter, o que afirmei nestes versos com que encerra o poema “Elogio da dialética”: “Quem se atreve a dizer: jamais?/De quem depende a continuação desse domínio?/De quem depende a sua destruição?/Igualmente de nós./Os caídos que se levantem!/Os que estão perdidos que lutem!/Quem reconhece a situação como pode calar-se?/Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã./E o ‘hoje’ nascerá do ‘jamais’".
Outras palavras ambíguas referem-se ao tempo – que não passa de mera abstração, de convenção humana para contabilizar a passagem da sua vida – ou seja, o passado, o presente e o futuro. O que os três são, de fato? Dá para demarcar cada um deles, com rigorosa exatidão e definir onde um termina e o outro começa? Como?
A rigor, só o passado é concreto. O presente, no imediato momento que acontece, deixa de existir. E o futuro é o que ainda não aconteceu. Pode ou não acontecer, para uma determinada pessoa tomada por referencial. E é, até, mais, muito mais volátil do que o presente. No instante exato em que acontece, deixa de ser.
Não posso, pois, deixar de dar razão a Joseph Conrad, quando afirma: “O passado não está nunca definitivamente concluído, ele continua agindo em nós com a sua perturbadora ambigüidade”. Afinal, só ele é concreto, extenso, caudaloso (diria, infinito) A escritora portuguesa, Agustina Bessa-Luís, no entanto, discorda. Escreve, no livro “O comum dos mortais” (Editora Unicamp): “O passado é ficção e mais nada”. Seria mesmo? Qual dos dois tem razão? Ambos? Nenhum deles? Conrad? Agustina? Depende do ponto de vista.
O passado, dada a sua abrangência, segue agindo, sem cessar, em nós, até a nossa extinção (e, não raro, além dela). Determina o que somos e como agimos no rapidíssimo e sumamente efêmero presente. Isso não há como negar. Ponto, portanto, para Conrad.
Todavia, o que passou não pode ser mudado. Mesmo que houvesse essa máquina miraculosa, criada pela ficção científica, que nos permitisse retroceder no tempo, não poderia ser alterado. Se pudesse, as conseqüências seriam imprevisíveis. Ponto, portanto, para Agustina.
Aliás, por falar em ambigüidade, ninguém foi mais ambíguo, em sua trajetória de vida, do que Joseph Conrad. Para começar, seu nome verdadeiro sequer era este. Era Jozef Teodor Nilecz Korevenioswi. Nasceu na Polônia e, no entanto foi um dos maiores escritores de língua inglesa de todos os tempos, com uma obra respeitabilíssima, tanto em quantidade (35 livros, com destaque para “O coração das trevas”, considerado um clássico da literatura mundial) quanto pela qualidade do que escreveu.
Aprendeu o inglês quando tinha 21 anos, mas identificou-se de tal sorte com o idioma, que não conseguia escrever nada em polonês. A melhor definição para seu estilo é “visceral”. Ou seja, em toda a sua obra, quer em romances, quer em novelas, contos ou poesias, Conrad vai ao âmago do coração humano, sem nenhum receio de ser mal-interpretado.
E por falar em ambigüidade... Existe algo mais ambíguo do que esta despretensiosa e esquisita crônica? Comecei falando em milagres, passei pelas palavras “sempre”, “nunca” e “jamais”; derivei para as três condições do tempo e fui parar na vida de um escritor polonês que só escrevia em inglês. Mas conversa entre amigos é assim mesmo: descompromissada, variada e até meio maluca. Em suma: é ambígua!
Os que não crêem em milagres são céticos, apenas, porque não atentam para a natureza. A cada instante, diria a cada fração de segundo, a vida se renova, de forma fantástica e miraculosa, e se manifesta onde jamais supúnhamos fosse possível. Basta atentar para o que ocorre ao nosso redor.
A própria existência da Terra, com a distância ideal do Sol, nem próxima demais para ser tórrida como os planetas Mercúrio e Vênus, e nem distante em demasia, para ser gélida, como ocorre com Marte, é magnífico milagre. Ou não é? Assim como são o seu tamanho, gravidade, composição química etc.etc.etc.
Há palavras que devemos evitar, por se revestirem de perturbadora ambigüidade, trazerem embutidas promessas que não temos condições de cumprir e previsões que não dependem de nós para se concretizar. As três principais que se incluem nesse caso são: nunca, sempre e jamais.
Claro que as dizemos, impensadamente, a cada momento, sem sequer refletir sobre seu significado. Afirmar, por exemplo, à amada, que “sempre” a iremos amar pode expressar boa-intenção, mas não uma possibilidade. O tempo e as circunstâncias findam por tornar vã essa promessa.
Garantir que “jamais” as injustiças serão banidas do mundo é desconfiar da garra e determinação das futuras gerações. Ou dizer que “nunca” um vencido haverá de se recuperar é uma afirmação irresponsável e tola. Afinal, desconhecemos suas circunstâncias futuras.
Bertolt Brecht ilustra, a caráter, o que afirmei nestes versos com que encerra o poema “Elogio da dialética”: “Quem se atreve a dizer: jamais?/De quem depende a continuação desse domínio?/De quem depende a sua destruição?/Igualmente de nós./Os caídos que se levantem!/Os que estão perdidos que lutem!/Quem reconhece a situação como pode calar-se?/Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã./E o ‘hoje’ nascerá do ‘jamais’".
Outras palavras ambíguas referem-se ao tempo – que não passa de mera abstração, de convenção humana para contabilizar a passagem da sua vida – ou seja, o passado, o presente e o futuro. O que os três são, de fato? Dá para demarcar cada um deles, com rigorosa exatidão e definir onde um termina e o outro começa? Como?
A rigor, só o passado é concreto. O presente, no imediato momento que acontece, deixa de existir. E o futuro é o que ainda não aconteceu. Pode ou não acontecer, para uma determinada pessoa tomada por referencial. E é, até, mais, muito mais volátil do que o presente. No instante exato em que acontece, deixa de ser.
Não posso, pois, deixar de dar razão a Joseph Conrad, quando afirma: “O passado não está nunca definitivamente concluído, ele continua agindo em nós com a sua perturbadora ambigüidade”. Afinal, só ele é concreto, extenso, caudaloso (diria, infinito) A escritora portuguesa, Agustina Bessa-Luís, no entanto, discorda. Escreve, no livro “O comum dos mortais” (Editora Unicamp): “O passado é ficção e mais nada”. Seria mesmo? Qual dos dois tem razão? Ambos? Nenhum deles? Conrad? Agustina? Depende do ponto de vista.
O passado, dada a sua abrangência, segue agindo, sem cessar, em nós, até a nossa extinção (e, não raro, além dela). Determina o que somos e como agimos no rapidíssimo e sumamente efêmero presente. Isso não há como negar. Ponto, portanto, para Conrad.
Todavia, o que passou não pode ser mudado. Mesmo que houvesse essa máquina miraculosa, criada pela ficção científica, que nos permitisse retroceder no tempo, não poderia ser alterado. Se pudesse, as conseqüências seriam imprevisíveis. Ponto, portanto, para Agustina.
Aliás, por falar em ambigüidade, ninguém foi mais ambíguo, em sua trajetória de vida, do que Joseph Conrad. Para começar, seu nome verdadeiro sequer era este. Era Jozef Teodor Nilecz Korevenioswi. Nasceu na Polônia e, no entanto foi um dos maiores escritores de língua inglesa de todos os tempos, com uma obra respeitabilíssima, tanto em quantidade (35 livros, com destaque para “O coração das trevas”, considerado um clássico da literatura mundial) quanto pela qualidade do que escreveu.
Aprendeu o inglês quando tinha 21 anos, mas identificou-se de tal sorte com o idioma, que não conseguia escrever nada em polonês. A melhor definição para seu estilo é “visceral”. Ou seja, em toda a sua obra, quer em romances, quer em novelas, contos ou poesias, Conrad vai ao âmago do coração humano, sem nenhum receio de ser mal-interpretado.
E por falar em ambigüidade... Existe algo mais ambíguo do que esta despretensiosa e esquisita crônica? Comecei falando em milagres, passei pelas palavras “sempre”, “nunca” e “jamais”; derivei para as três condições do tempo e fui parar na vida de um escritor polonês que só escrevia em inglês. Mas conversa entre amigos é assim mesmo: descompromissada, variada e até meio maluca. Em suma: é ambígua!
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