Pedro J. Bondaczuk
(CONTINUAÇÃO)
POESIA OU PROSA?
Uma das tantas características femininas é a sensibilidade. É a profundidade das suas emoções. São os sentimentos à flor da pele. Isso, supostamente, ditaria, quase que automaticamente, às mulheres, certa predileção, e mais, maior aptidão para a poesia. O gênero seria a caráter para elas, vistas como eminentemente sentimentais e, por conseqüência, pouco racionais. Na prática, todavia, a teoria é outra.
Pelo menos na Literatura Brasileira, há nítida predominância de escritoras que se dedicam à prosa, notadamente ao romance. “Mas como?”, indagará, perplexo, o leitor, “e Cecília Meirelles?! E Hilda Hilst?! E Francisca Júlia?! Elas não contam?! E Cora Coralina?!”. Claro que contam, e muito. Mas quais tantas outras de renome e de visibilidade o leitor é capaz de citar? Poucas, pouquíssimas, não é verdade?!
Já no romance, no conto, no ensaio etc. poderia desfiar um rosário interminável de nomes. E isso ocorre não apenas no Brasil, mas no mundo todo. Para cada excelente poetisa, há dez ou mais romancistas, contistas e ensaístas de destaque, esgotando edições e mais edições de livros. É verdade que a poesia, de uns tempos para cá, não é vista, pelos editores, como um bom “produto” comercial.
A maioria dos escritores do gênero tem que recorrer, invariavelmente, ao próprio bolso para custear suas obras, sob pena destas permanecerem inéditas para sempre. E isso vale tanto para os homens, quanto para as mulheres. Um poeta, para ter seu livro publicado, sem ser bancado por ele, tem que ser excepcional. É coisa para figuras como Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Affonso Romano de Sant’Anna ou João Cabral de Mello. E em edições bastante restritas, que não raro encalham nas prateleiras das livrarias. Ainda assim, o número de poetas é muito, muitíssimo maior do que o de poetisas.
Outro aspecto a destacar é o fato das mulheres apenas recentemente se “atreverem” a disputar esse mercado. Até há não muito tempo, seu papel quase que exclusivo na sociedade restringia-se ao comando do lar, à geração, criação e educação dos filhos, aos cuidados dos afazeres domésticos. Claro que sempre houve exceções (como ocorre com todas as regras).
Poucas mulheres se dispunham a mostrar seus escritos, mesmo em âmbito particular, embora muitas, há tempos, já escrevessem, e muito bem. Publicar livros? Nem pensar! As raras que tinham essa pretensão sequer eram levadas a sério. Ademais, por muito tempo, se considerou que a freqüência feminina às escolas e universidades era um “luxo”. Seu papel já estava estabelecido e o máximo que precisavam aprender era a ler, a cozinhar, a costurar, a fazer crochê e a desenvolver outras habilidades domésticas. Algumas, aprendiam a tocar instrumentos, mas apenas para completarem “a educação feminina”, sem nenhum sentido mais prático.
Para uma escritora ter oportunidade de publicar algum livro, tinha que contar com um talento anormal, acima da média, beirando a genialidade. E, ainda assim, recebia tratamento diferenciado, quer da indústria editorial, quer da crítica especializada, quer do público ou da própria sociedade. Era um comportamento rançoso, eivado de preconceito, até negado enfaticamente por todos, porém real.
Não havia jeito: a literatura era tida e havida como atividade quase que exclusivamente masculina. E na prática, havia, de fato, essa exclusividade. Tanto que a Academia Brasileira de Letras, por exemplo, fundada em 20 de julho de 1897, só veio a admitir a primeira mulher, entre seus pares, 80 anos depois da sua fundação, em 4 de agosto de 1977. A pioneira a entrar nesse até então “Clube do Bolinha” foi a cearense Rachel de Queiroz, eleita, na oportunidade, para a cadeira de número cinco da instituição fundada por Machado de Assis.
Seus passos foram seguidos, pouco depois, por Dinah Silveira de Queiroz e por Lygia Fagundes Telles. Destaque-se que todas essas três escritoras eram prosadoras, portanto não poetisas. Rompida essa barreira, outras tantas academias de letras pelo país afora passaram a imitar, com excelentes resultados, o exemplo da ABL.
Aliás, nesse aspecto, a nossa Academia Campinense de Letras saiu na frente e fez história. Oito anos antes da Academia Brasileira de Letras, elegeu, a 2 de junho de 1969, a romancista Maria José Morais Pupo Nogueira para a cadeira de número 32. O fato valeu manchetes não somente nos jornais da cidade, “Diário do Povo” e “Correio Popular”, como em vários outros, país afora.
Depois dessa competente e corajosa pioneira, outras três escritoras ingressaram na instituição: Conceição de Arruda Toledo (em 6 de julho de 1970), a historiadora e professora Maria Celestina Teixeira Mendes Torres (em 1º de março de 1971) e a jornalista e romancista Maria Dezzone Pacheco Fernandes (1º de setembro de 1980).
Hoje, tanto a ABL, quanto a ACL contam com um número expressivo de mulheres entre seus membros, todas com brilhante atuação e alto nível de participação nas mais diversas atividades acadêmicas, rompendo, dessa forma, um tabu que era fruto, apenas, de tolo e absurdo preconceito.
(CONTINUA)
(CONTINUAÇÃO)
POESIA OU PROSA?
Uma das tantas características femininas é a sensibilidade. É a profundidade das suas emoções. São os sentimentos à flor da pele. Isso, supostamente, ditaria, quase que automaticamente, às mulheres, certa predileção, e mais, maior aptidão para a poesia. O gênero seria a caráter para elas, vistas como eminentemente sentimentais e, por conseqüência, pouco racionais. Na prática, todavia, a teoria é outra.
Pelo menos na Literatura Brasileira, há nítida predominância de escritoras que se dedicam à prosa, notadamente ao romance. “Mas como?”, indagará, perplexo, o leitor, “e Cecília Meirelles?! E Hilda Hilst?! E Francisca Júlia?! Elas não contam?! E Cora Coralina?!”. Claro que contam, e muito. Mas quais tantas outras de renome e de visibilidade o leitor é capaz de citar? Poucas, pouquíssimas, não é verdade?!
Já no romance, no conto, no ensaio etc. poderia desfiar um rosário interminável de nomes. E isso ocorre não apenas no Brasil, mas no mundo todo. Para cada excelente poetisa, há dez ou mais romancistas, contistas e ensaístas de destaque, esgotando edições e mais edições de livros. É verdade que a poesia, de uns tempos para cá, não é vista, pelos editores, como um bom “produto” comercial.
A maioria dos escritores do gênero tem que recorrer, invariavelmente, ao próprio bolso para custear suas obras, sob pena destas permanecerem inéditas para sempre. E isso vale tanto para os homens, quanto para as mulheres. Um poeta, para ter seu livro publicado, sem ser bancado por ele, tem que ser excepcional. É coisa para figuras como Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Affonso Romano de Sant’Anna ou João Cabral de Mello. E em edições bastante restritas, que não raro encalham nas prateleiras das livrarias. Ainda assim, o número de poetas é muito, muitíssimo maior do que o de poetisas.
Outro aspecto a destacar é o fato das mulheres apenas recentemente se “atreverem” a disputar esse mercado. Até há não muito tempo, seu papel quase que exclusivo na sociedade restringia-se ao comando do lar, à geração, criação e educação dos filhos, aos cuidados dos afazeres domésticos. Claro que sempre houve exceções (como ocorre com todas as regras).
Poucas mulheres se dispunham a mostrar seus escritos, mesmo em âmbito particular, embora muitas, há tempos, já escrevessem, e muito bem. Publicar livros? Nem pensar! As raras que tinham essa pretensão sequer eram levadas a sério. Ademais, por muito tempo, se considerou que a freqüência feminina às escolas e universidades era um “luxo”. Seu papel já estava estabelecido e o máximo que precisavam aprender era a ler, a cozinhar, a costurar, a fazer crochê e a desenvolver outras habilidades domésticas. Algumas, aprendiam a tocar instrumentos, mas apenas para completarem “a educação feminina”, sem nenhum sentido mais prático.
Para uma escritora ter oportunidade de publicar algum livro, tinha que contar com um talento anormal, acima da média, beirando a genialidade. E, ainda assim, recebia tratamento diferenciado, quer da indústria editorial, quer da crítica especializada, quer do público ou da própria sociedade. Era um comportamento rançoso, eivado de preconceito, até negado enfaticamente por todos, porém real.
Não havia jeito: a literatura era tida e havida como atividade quase que exclusivamente masculina. E na prática, havia, de fato, essa exclusividade. Tanto que a Academia Brasileira de Letras, por exemplo, fundada em 20 de julho de 1897, só veio a admitir a primeira mulher, entre seus pares, 80 anos depois da sua fundação, em 4 de agosto de 1977. A pioneira a entrar nesse até então “Clube do Bolinha” foi a cearense Rachel de Queiroz, eleita, na oportunidade, para a cadeira de número cinco da instituição fundada por Machado de Assis.
Seus passos foram seguidos, pouco depois, por Dinah Silveira de Queiroz e por Lygia Fagundes Telles. Destaque-se que todas essas três escritoras eram prosadoras, portanto não poetisas. Rompida essa barreira, outras tantas academias de letras pelo país afora passaram a imitar, com excelentes resultados, o exemplo da ABL.
Aliás, nesse aspecto, a nossa Academia Campinense de Letras saiu na frente e fez história. Oito anos antes da Academia Brasileira de Letras, elegeu, a 2 de junho de 1969, a romancista Maria José Morais Pupo Nogueira para a cadeira de número 32. O fato valeu manchetes não somente nos jornais da cidade, “Diário do Povo” e “Correio Popular”, como em vários outros, país afora.
Depois dessa competente e corajosa pioneira, outras três escritoras ingressaram na instituição: Conceição de Arruda Toledo (em 6 de julho de 1970), a historiadora e professora Maria Celestina Teixeira Mendes Torres (em 1º de março de 1971) e a jornalista e romancista Maria Dezzone Pacheco Fernandes (1º de setembro de 1980).
Hoje, tanto a ABL, quanto a ACL contam com um número expressivo de mulheres entre seus membros, todas com brilhante atuação e alto nível de participação nas mais diversas atividades acadêmicas, rompendo, dessa forma, um tabu que era fruto, apenas, de tolo e absurdo preconceito.
(CONTINUA)
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