Pedro J. Bondaczuk
A chuva tem o poder mágico de despertar melancolia nas pessoas. Nossas emoções ficam aguçadas, receptivas, tensas. É verdade que são cinzentas, são gris como o próprio céu nublado. Mas são mais intensas, mais prolongadas, mais profundas. O tempo úmido facilita a introspecção e faz com que as reminiscências sejam mais vivas, mais presentes e mais abundantes, em especial quando estamos sós e sem muito ou nada que fazer. Pelo menos no meu caso, ocorre dessa maneira. O homem é um ser meteorológico. Talvez esse comportamento, essa influência climática, se deva à mudança na pressão atmosférica. Não posso garantir que seja por isso. Não sei explicar a razão.
Gosto de escrever em dias chuvosos, com a água simulando uma suave canção de ninar ao escorrer mansamente pela calha. Meu poder de concentração torna-se maior. As palavras, frases, sentenças e períodos alinham-se com maior facilidade e coerência. E em geral, com um certo tom de tristeza indefinida, vaga, sem razão objetiva. Aprecio particularmente a chuva mansa, persistente, contínua, que dura horas consecutivas, em especial nos finais de semana, quando não tenho compromissos fora de casa e posso me entregar modorrentamente aos meus textos.
Mesmo a caminho do serviço, o cenário molhado das casas, das árvores e das ruas tem sobre mim um efeito sedativo, calmante, apaziguador. Evito de conversar com o motorista do veículo que me conduz nessas ocasiões. E o faço não apenas para não lhe desviar a atenção, pois com as pistas escorregadias o risco de acidentes se torna maior, mas para poder meditar, para auscultar as minhas emoções e conversar comigo mesmo. Meu senso de observação fica mais aguçado. Olho pessoas atravessando, apressadas, guarda-chuvas nas mãos, as movimentadas avenidas campineiras. O que será que lhes vai pela alma? , questiono. Talvez nada. Talvez muito. Talvez tudo... Uma estudante parada em um ponto de ônibus leva um banho de água suja e lama à passagem de um carro junto à sarjeta onde há enxurrada. Percebe-se que o gesto foi proposital. Palavrões são ditos pela pedestre. Riso de zombaria do motorista.
Mas prefiro, mesmo, o calor e a familiaridade do meu gabinete de trabalho. Minhas estantes de livros, que considero o maior tesouro que possuo. Meus quadros na parede, cada um com seu valor e sua história sentimental. A máquina de escrever ao canto, sobre a escrivaninha, pois ainda não consegui dinheiro suficiente para a aquisição de um micro. Os arquivos de aço repletos de páginas de jornal que produzi, quer com textos meus, assinados (artigos, crônicas, ensaios e até contos), quer com minhas edições. Este é o meu mundo, o meu paraíso, o meu universo, onde me sinto rei e experimento até um arremedo de felicidade.
Fico rememorando um sem-número de poemas e de canções inspirados pela chuva. O poeta J. G. de Araújo Jorge (muito lido nos anos 50 e 60), tem uns versos magistrais a respeito. Do Carlos Drummond de Andrade não conheço nenhum, mas deve ter algum. Quanto às composições de música popular (brasileira ou não) sobre o tema, há tantas que dariam para preencher vários programas de rádio e ainda sobrariam algumas por tocar. Aliás, quando eu era radialista, na "Rádio ABC" de Santo André, no início da década de 60, fiz uma seleção desse tipo, com grande sucesso entre os ouvintes.
Casualmente, encontro a cópia de um poema de Fernando Gregh, traduzido por Guilherme de Almeida, intitulado "Chove", no meio de um livro, que é uma preciosidade. Leiam e certamente me darão razão: "Chove./A vidraça chora.//O vento põe no parque um soluço de outono./Range uma porta e bate, e parece que implora/numa voz de abandono./Chove.//Dir-se-ia que milhões de alfinetes acertam/nos vidros frios/e se espetam.//Chove./A vidraça chora.//O céu esconde a última nesga azul, que existe,/sob um manto cinzento e móvel./Chove./A vida é triste.//--- que importa!/Ulule o vento, bata a porta/e tombe a chuva!/Que importa!//Tenho nos olhos um clarão que nada turva,/tenho na vida um céu azul e imóvel; tenho na alma um jardim ondulante de palmas/balançado em pleno anil por brisas calmas:/e eu penso nela!//Chove.../--- a vida é bela!". Lindo, concordam? ! Melancolia...Dor-de-cotovelo...Ternura... É poesia pura!!
A chuva tem o poder mágico de despertar melancolia nas pessoas. Nossas emoções ficam aguçadas, receptivas, tensas. É verdade que são cinzentas, são gris como o próprio céu nublado. Mas são mais intensas, mais prolongadas, mais profundas. O tempo úmido facilita a introspecção e faz com que as reminiscências sejam mais vivas, mais presentes e mais abundantes, em especial quando estamos sós e sem muito ou nada que fazer. Pelo menos no meu caso, ocorre dessa maneira. O homem é um ser meteorológico. Talvez esse comportamento, essa influência climática, se deva à mudança na pressão atmosférica. Não posso garantir que seja por isso. Não sei explicar a razão.
Gosto de escrever em dias chuvosos, com a água simulando uma suave canção de ninar ao escorrer mansamente pela calha. Meu poder de concentração torna-se maior. As palavras, frases, sentenças e períodos alinham-se com maior facilidade e coerência. E em geral, com um certo tom de tristeza indefinida, vaga, sem razão objetiva. Aprecio particularmente a chuva mansa, persistente, contínua, que dura horas consecutivas, em especial nos finais de semana, quando não tenho compromissos fora de casa e posso me entregar modorrentamente aos meus textos.
Mesmo a caminho do serviço, o cenário molhado das casas, das árvores e das ruas tem sobre mim um efeito sedativo, calmante, apaziguador. Evito de conversar com o motorista do veículo que me conduz nessas ocasiões. E o faço não apenas para não lhe desviar a atenção, pois com as pistas escorregadias o risco de acidentes se torna maior, mas para poder meditar, para auscultar as minhas emoções e conversar comigo mesmo. Meu senso de observação fica mais aguçado. Olho pessoas atravessando, apressadas, guarda-chuvas nas mãos, as movimentadas avenidas campineiras. O que será que lhes vai pela alma? , questiono. Talvez nada. Talvez muito. Talvez tudo... Uma estudante parada em um ponto de ônibus leva um banho de água suja e lama à passagem de um carro junto à sarjeta onde há enxurrada. Percebe-se que o gesto foi proposital. Palavrões são ditos pela pedestre. Riso de zombaria do motorista.
Mas prefiro, mesmo, o calor e a familiaridade do meu gabinete de trabalho. Minhas estantes de livros, que considero o maior tesouro que possuo. Meus quadros na parede, cada um com seu valor e sua história sentimental. A máquina de escrever ao canto, sobre a escrivaninha, pois ainda não consegui dinheiro suficiente para a aquisição de um micro. Os arquivos de aço repletos de páginas de jornal que produzi, quer com textos meus, assinados (artigos, crônicas, ensaios e até contos), quer com minhas edições. Este é o meu mundo, o meu paraíso, o meu universo, onde me sinto rei e experimento até um arremedo de felicidade.
Fico rememorando um sem-número de poemas e de canções inspirados pela chuva. O poeta J. G. de Araújo Jorge (muito lido nos anos 50 e 60), tem uns versos magistrais a respeito. Do Carlos Drummond de Andrade não conheço nenhum, mas deve ter algum. Quanto às composições de música popular (brasileira ou não) sobre o tema, há tantas que dariam para preencher vários programas de rádio e ainda sobrariam algumas por tocar. Aliás, quando eu era radialista, na "Rádio ABC" de Santo André, no início da década de 60, fiz uma seleção desse tipo, com grande sucesso entre os ouvintes.
Casualmente, encontro a cópia de um poema de Fernando Gregh, traduzido por Guilherme de Almeida, intitulado "Chove", no meio de um livro, que é uma preciosidade. Leiam e certamente me darão razão: "Chove./A vidraça chora.//O vento põe no parque um soluço de outono./Range uma porta e bate, e parece que implora/numa voz de abandono./Chove.//Dir-se-ia que milhões de alfinetes acertam/nos vidros frios/e se espetam.//Chove./A vidraça chora.//O céu esconde a última nesga azul, que existe,/sob um manto cinzento e móvel./Chove./A vida é triste.//--- que importa!/Ulule o vento, bata a porta/e tombe a chuva!/Que importa!//Tenho nos olhos um clarão que nada turva,/tenho na vida um céu azul e imóvel; tenho na alma um jardim ondulante de palmas/balançado em pleno anil por brisas calmas:/e eu penso nela!//Chove.../--- a vida é bela!". Lindo, concordam? ! Melancolia...Dor-de-cotovelo...Ternura... É poesia pura!!
1 comment:
Estava procurando imagens sobre melancolia e achei teu blog.
Gostei muito, tanto que estou a seguir tuas notícias.
Ficaria honrada em receber um comentário em meu blog. Obrigada!
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