O que há por trás do glamour
Pedro J. Bondaczuk
O mundo do cinema, notadamente Hollywood, sempre despertou grande interesse no público, fascinado com seu glamour e beleza. Biografias de atores e atrizes famosos abundam e logo viram best-sellers. Há revistas especializadas em trazer notícias de cinema e de seus personagens em profusão. Algumas tratam do assunto com objetividade e uma certa seriedade, mas... muitas optam pelo que se convencionou chamar de “fofocas”, ou seja, intrigas e escândalos, velados ou escrachados.
Em texto anterior sobre o tema citei que Hollywood é rica em histórias, ora cômicas, ora trágicas, a maioria das quais permanece em seu próprio e restrito âmbito. Algumas vazam para a imprensa que, quando isso acontece, faz enorme estardalhaço em torno delas, para delírio do público, ávido por esse tipo de casos, via de regra escandalosos, como o da atriz flagrada fazendo sexo em pleno parque público ou da estrela famosa presa em um shopping center por furto de algum objeto. Raros são os escritores do próprio meio que se dispõem, ou se arriscam a abordar o que acontece, de fato, por lá.
Joanna Barnes, todavia, é exceção. Além de atriz, com vários trabalhos marcantes quer na telinha (na TV), quer na telona (no cinema), foi (e não sei se ainda é) colunista do “The Chicago Tribune” e autora de novelas (não sei se alguma delas foi lançada no Brasil), três das quais tive a oportunidade de conhecer: “The Deceivers” (1970), “Pastora” (1980) e “Silverwood” (1985).
No cinema, integrou os elencos de diversos filmes famosos, entre os quais “Spartacus”. Contracenou com atores consagrados, como John Wayne e Kirk Douglas, entre outros. Foi, por exemplo, a 13ª Jane, mulher de Tarzan, do cinema, no filme “Tarzan, o homem macaco” (1959), que teve como intérprete do rei da selva Denny Miller. Mas o que nos importa é a sua faceta de escritora. E, mais especificamente, sua novela “Silverwood”. E o que este livro em particular tem de tão especial? Nele, Joanna conta algumas histórias de Hollywood, posto que disfarçadas para não constranger os protagonistas e/ou não correr risco de ser processada. Ela garante que os episódios que aborda são todos baseados em fatos reais. É o testemunho, posto que de forma ficcional, portanto, de alguém do ramo, desse meio.
A heroína da novela é uma mulher, que ascende ao círculo da alta sociedade, após casar-se com um multimilionário. Para tanto, inventa antecedentes e uma história familiar rigorosamente fictícia. Forja uma biografia e convence o ricaço apaixonado que é tudo verdade. E ele acredita. Joanna garantiu, em longa e deliciosa entrevista, concedida em 1985 (cujo texto tenho em mãos), que isso é super comum no meio artístico. Ou seja, não se pode fiar muito nas pseudo-biografias de atores e atrizes. E observa, a propósito: “Não lhes posso dizer quantas vezes fizeram isso algumas das maiores estrelas de Hollywood”.
Na referida entrevista, Joanna conta histórias “cabeludas”, omitindo, claro, quem as protagonizou (mas apenas em alguns casos; naqueles em que não há revelações negativas, ela identifica os protagonistas). Ela afirma, em certo trecho: “Vocês ficariam surpresos com o número de atores e atrizes que mudam o nome e seus antecedentes de família, incluindo estrelas com cartaz, como Merle Oberon”. E acrescenta: “O grande problema em escrever novelas envolvendo pessoas dos meios de cinema e televisão é que a verdade, caso se quisesse trazê-la à baila, é ainda mais descabelada, absurda, estranha e pornográfica do que possamos imaginar. Se a pusesse no livro... ninguém acredita. E as pessoas perguntariam, incrédulas: ‘é possível que essas coisas tenham, mesmo, acontecido?’”.
Para não deixar as coisas no ar, Joanna cita um exemplo: “Quem acreditaria na verdadeira história de um ator, ansioso por se divorciar da esposa, mas que não tinha nenhum direito legal à fortuna dela? Assim, propôs, a seu assessor de imprensa, que fizesse um seguro de vida e depois simulasse que seduzia sua mulher, para que pudesse ser feito um flagrante de adultério”. E narra o desfecho do caso, que garante ser rigorosamente verídico: “O funcionário aceitou participar desse engodo, embora, particularmente, não sentisse a menor atração pela mulher do chefe. Seduziu-a, o ator os surpreendeu, como haviam combinado, e conseguiu, dessa forma, o divórcio que queria. Todavia, pouco tempo depois, o assessor suicidou-se. Vocês acreditariam nisso caso lessem em uma novela?!”. De fato, é inacreditável. Mas aconteceu, como garante a atriz-escritora.
Joanna Barnes perguntou se alguém acreditaria na história de uma jovem atriz que, por engano, achou que estava na lista negra, na época em que ocorreu a chamada “caça às bruxas” em Hollywood e na Broadway, de artistas supostamente simpatizantes do comunismo, no período do tal do macartismo. Aflita, ela levou o caso ao presidente do Sindicato dos Atores Cinematográficos em busca de ajuda. Este não somente a ajudou, mas veio a se casar com ela. Anos mais tarde, o marido chegou ao clímax de vitoriosa carreira política, ou seja, à presidência dos Estados Unidos.
“Impossível?”, perguntou Joanna. E explicou: “Aconteceu com Nancy Davis. Quando estava sob contrato com a MGM, outra atriz, que tinha o mesmo nome, havia sido colocada na tal lista negra. Por causa da homônima, a Nancy, da MGM, temia que sua carreira viria a sofrer com a confusão dos nomes. Foi quando o produtor Mervyn Leroy lhe disse que o sindicato poderia ajudá-la. Apresentou-a a Ronald Reagan, que então presidia a entidade. O casal enamorou-se, casou-se e todos conhecem o resto da história. Mas qual escritor teria a coragem de inventar um enredo como este numa novela ou romance? É uma história demasiado improvável e inverossímil. Mas aconteceu”.
Indagada sobre qual das duas atividades que exerce, a de atriz e a de escritora, mais lhe agradava, Joanna Barnes respondeu: “Encenar é mais divertido. Já escrever, é algo que se deve fazer só e dá muito mais trabalho e traz maiores riscos. Se alguém fracassar em um papel, por exemplo, pode jogar a culpa, e quase sempre joga, no diretor, nos autores do roteiro e até em outros atores. Mas se falhar em um livro... só terá um remédio: ir para casa e olhar-se bem no espelho”. E não é o que acontece?!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
O mundo do cinema, notadamente Hollywood, sempre despertou grande interesse no público, fascinado com seu glamour e beleza. Biografias de atores e atrizes famosos abundam e logo viram best-sellers. Há revistas especializadas em trazer notícias de cinema e de seus personagens em profusão. Algumas tratam do assunto com objetividade e uma certa seriedade, mas... muitas optam pelo que se convencionou chamar de “fofocas”, ou seja, intrigas e escândalos, velados ou escrachados.
Em texto anterior sobre o tema citei que Hollywood é rica em histórias, ora cômicas, ora trágicas, a maioria das quais permanece em seu próprio e restrito âmbito. Algumas vazam para a imprensa que, quando isso acontece, faz enorme estardalhaço em torno delas, para delírio do público, ávido por esse tipo de casos, via de regra escandalosos, como o da atriz flagrada fazendo sexo em pleno parque público ou da estrela famosa presa em um shopping center por furto de algum objeto. Raros são os escritores do próprio meio que se dispõem, ou se arriscam a abordar o que acontece, de fato, por lá.
Joanna Barnes, todavia, é exceção. Além de atriz, com vários trabalhos marcantes quer na telinha (na TV), quer na telona (no cinema), foi (e não sei se ainda é) colunista do “The Chicago Tribune” e autora de novelas (não sei se alguma delas foi lançada no Brasil), três das quais tive a oportunidade de conhecer: “The Deceivers” (1970), “Pastora” (1980) e “Silverwood” (1985).
No cinema, integrou os elencos de diversos filmes famosos, entre os quais “Spartacus”. Contracenou com atores consagrados, como John Wayne e Kirk Douglas, entre outros. Foi, por exemplo, a 13ª Jane, mulher de Tarzan, do cinema, no filme “Tarzan, o homem macaco” (1959), que teve como intérprete do rei da selva Denny Miller. Mas o que nos importa é a sua faceta de escritora. E, mais especificamente, sua novela “Silverwood”. E o que este livro em particular tem de tão especial? Nele, Joanna conta algumas histórias de Hollywood, posto que disfarçadas para não constranger os protagonistas e/ou não correr risco de ser processada. Ela garante que os episódios que aborda são todos baseados em fatos reais. É o testemunho, posto que de forma ficcional, portanto, de alguém do ramo, desse meio.
A heroína da novela é uma mulher, que ascende ao círculo da alta sociedade, após casar-se com um multimilionário. Para tanto, inventa antecedentes e uma história familiar rigorosamente fictícia. Forja uma biografia e convence o ricaço apaixonado que é tudo verdade. E ele acredita. Joanna garantiu, em longa e deliciosa entrevista, concedida em 1985 (cujo texto tenho em mãos), que isso é super comum no meio artístico. Ou seja, não se pode fiar muito nas pseudo-biografias de atores e atrizes. E observa, a propósito: “Não lhes posso dizer quantas vezes fizeram isso algumas das maiores estrelas de Hollywood”.
Na referida entrevista, Joanna conta histórias “cabeludas”, omitindo, claro, quem as protagonizou (mas apenas em alguns casos; naqueles em que não há revelações negativas, ela identifica os protagonistas). Ela afirma, em certo trecho: “Vocês ficariam surpresos com o número de atores e atrizes que mudam o nome e seus antecedentes de família, incluindo estrelas com cartaz, como Merle Oberon”. E acrescenta: “O grande problema em escrever novelas envolvendo pessoas dos meios de cinema e televisão é que a verdade, caso se quisesse trazê-la à baila, é ainda mais descabelada, absurda, estranha e pornográfica do que possamos imaginar. Se a pusesse no livro... ninguém acredita. E as pessoas perguntariam, incrédulas: ‘é possível que essas coisas tenham, mesmo, acontecido?’”.
Para não deixar as coisas no ar, Joanna cita um exemplo: “Quem acreditaria na verdadeira história de um ator, ansioso por se divorciar da esposa, mas que não tinha nenhum direito legal à fortuna dela? Assim, propôs, a seu assessor de imprensa, que fizesse um seguro de vida e depois simulasse que seduzia sua mulher, para que pudesse ser feito um flagrante de adultério”. E narra o desfecho do caso, que garante ser rigorosamente verídico: “O funcionário aceitou participar desse engodo, embora, particularmente, não sentisse a menor atração pela mulher do chefe. Seduziu-a, o ator os surpreendeu, como haviam combinado, e conseguiu, dessa forma, o divórcio que queria. Todavia, pouco tempo depois, o assessor suicidou-se. Vocês acreditariam nisso caso lessem em uma novela?!”. De fato, é inacreditável. Mas aconteceu, como garante a atriz-escritora.
Joanna Barnes perguntou se alguém acreditaria na história de uma jovem atriz que, por engano, achou que estava na lista negra, na época em que ocorreu a chamada “caça às bruxas” em Hollywood e na Broadway, de artistas supostamente simpatizantes do comunismo, no período do tal do macartismo. Aflita, ela levou o caso ao presidente do Sindicato dos Atores Cinematográficos em busca de ajuda. Este não somente a ajudou, mas veio a se casar com ela. Anos mais tarde, o marido chegou ao clímax de vitoriosa carreira política, ou seja, à presidência dos Estados Unidos.
“Impossível?”, perguntou Joanna. E explicou: “Aconteceu com Nancy Davis. Quando estava sob contrato com a MGM, outra atriz, que tinha o mesmo nome, havia sido colocada na tal lista negra. Por causa da homônima, a Nancy, da MGM, temia que sua carreira viria a sofrer com a confusão dos nomes. Foi quando o produtor Mervyn Leroy lhe disse que o sindicato poderia ajudá-la. Apresentou-a a Ronald Reagan, que então presidia a entidade. O casal enamorou-se, casou-se e todos conhecem o resto da história. Mas qual escritor teria a coragem de inventar um enredo como este numa novela ou romance? É uma história demasiado improvável e inverossímil. Mas aconteceu”.
Indagada sobre qual das duas atividades que exerce, a de atriz e a de escritora, mais lhe agradava, Joanna Barnes respondeu: “Encenar é mais divertido. Já escrever, é algo que se deve fazer só e dá muito mais trabalho e traz maiores riscos. Se alguém fracassar em um papel, por exemplo, pode jogar a culpa, e quase sempre joga, no diretor, nos autores do roteiro e até em outros atores. Mas se falhar em um livro... só terá um remédio: ir para casa e olhar-se bem no espelho”. E não é o que acontece?!
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