Friday, March 09, 2012







Comunicar é preciso

Pedro J. Bondaczuk

A comunicação – de pensamentos, sentimentos, fatos etc. – é fundamental para o ser humano, qualquer que ele seja. Até aí, eu não disse nada de novo. É uma afirmação para lá de óbvia. Aliás, tão óbvia que caberia a caráter na boca daquele célebre personagem de Eça de Queiroz, o Conselheiro Acácio, caracterizado por dizer obviedades como se fossem o suprassumo da sabedoria.

Quanto mais clara, precisa e inequívoca for a comunicação, menores serão as chances de equívocos e males entendidos e, por conseqüência, de conflitos. É certo que a espécie não tem uma única linguagem, quer oral quer escrita, que seja padronizada e entendida pela totalidade dos mais de sete bilhões de indivíduos humanos que habitam o Planeta.

Surge, de cara, a questão: e os demais animais, também se comunicam? Todos os seres vivos têm suas formas de comunicação. Inclusive os vegetais. As de uns são mais rudimentares, as de outros são mais evoluídas e chegam mesmo a se aproximar, posto que remotamente, da dos humanos. Duvidam? Vou tentar demonstrar que não há equívoco ou exagero nesta afirmação.

Leio na página 265, do livro “Grades enigmas da humanidade”, de Luiz Carlos Lisboa e Roberto Pereira de Andrade (Círculo do Livro, 1986), a seguinte (e surpreendente) informação: “O prof. Bastian gravou longamente as ‘conversas’ dos golfinhos e com a ajuda dos computadores chegou à conclusão de que eles possuem uma linguagem articulada, embora simples, e que combinam seus sons-base para formar e exprimir idéias. Partindo dessa premissa, aceitou que, sendo capaz de operar pelo sistema de escolha binária, o golfinho ‘operava’ em sistema basicamente igual ao da nossa fala, sendo, portanto, possível encontrar meios de mútua comunicação. E mais. Essas possibilidades seriam maiores entre o golfinho e o homem que entre o golfinho e qualquer outro animal”.

Foram feitos vários testes com esses fascinantes e “comunicativos” animais, para aferir seu potencial de comunicabilidade, mediante combinações de sinais luminosos e acústicos. E os golfinhos foram aprovados com louvor nesse quesito. Os autores do livro concluem que eles “podem, pois, transformar diferentes combinações de sinais luminosos em sinais acústicos, coisa que até há pouco tempo era considerado apanágio da espécie humana. Gravando esses sinais e estudando-os, os cientistas pretendem definir as diferenças entre os significados de cada som, até conseguir entendê-los e conversar com os golfinhos”. Fascinante, concordam?!

Mas... como surgiram as linguagens humanas (são várias, como todos sabem), que permitiram com que as pessoas se comunicassem? E quando isso se deu? À primeira questão é possível responder, posto que se valendo, apenas, da intuição (embora certeza, certeza mesmo não se tenha e jamais se terá). Quanto à segunda... fica por conta, só, da imaginação de cada um.

Podemos narrar a história (ou proto-história ou simplesmente a estória, sei lá) dessa fundamental descoberta mais ou menos assim: “Há tempos, quando habitava as cavernas primitivas, o Homo Sapiens sentiu a necessidade de se fazer entendido pelos espécimes da mesma espécie que o cercavam. A princípio, isso era feito, somente, mediante um conjunto de meia dúzia ou pouco mais de gestos básicos, mas inequívocos, que todos compreendiam e imitavam, e que refletiam ameaça, fome, desejo, frio, calor, amor e ódio. Talvez outras sensações e outros sentimentos pudessem ser expressados dessa forma. É até provável que sim.

Posteriormente, nossos remotíssimos ancestrais teriam “descoberto” que podiam emitir sons, usando suas cordas vocais. E que estes, mediante convenção tácita, poderiam ser entendidos e substituir, com inegáveis vantagens, a primitiva linguagem gestual. Daí à comunicação simbólica, representada por rústicos desenhos, foi um passo. É provável, todavia, que ele não tenha sido dado de imediato. Talvez haja demorado décadas ou quiçá séculos. Mas o fato é que esta evolução um dia aconteceu.

No princípio, essas pinturas rudimentares, feitas nas paredes das cavernas – muitas das quais subsistem até hoje e nos intrigam e fascinam – tinham finalidades mágicas. Como sabemos disso? Há qualquer prova ou evidência a propósito? Claro que não! Na verdade, não sabemos disso. Somente “intuímos”. Somos, todos nós, homens modernos, descendentes daquele primitivíssimo Homo Sapiens. Embora não venhamos a nos dar conta, diz a lógica que, se eles não existissem, também não existiríamos. Trazemos, pois, em nosso código genético, uma quantidade razoável dos seus genes. É possível que resquícios de sua memória subsistam na nossa. É impossível provar, mas faz sentido.

O psiquiatra suíço, Carl Gustav Jung, tratou com proficiência e competência dessa questão. Ademais, se o homem pode descobrir, registrar e interpretar a linguagem dos golfinhos, por que não poderia chegar à origem da forma de expressão da própria espécie? Sim, por que não?

Mas... voltemos às nossas especulações originais. Os sacerdotes dos diversos clãs – nossos ancestrais já tinham religião e haviam “criado” seus deuses, com base nas forças naturais – acreditavam que desenhando, por exemplo, um bisão, a “alma” desse animal ficaria aprisionada nesses traços, por sortilégios para eles (e muito mais para nós) inexplicáveis. Dessa forma, a tarefa dos caçadores, que precisavam abater aquelas presas para prover a tribo de alimentos, seria simplificada e muito facilitada.

Tempos depois, esses desenhos “mágicos” teriam adquirido caráter menos nobre, digamos, “homicida”. Pretendiam prender não mais a “alma” de outros animais, como bisões ou mamutes, ou javalis, que proveriam sua alimentação, mas a de outros homens, de grupos rivais, com os quais disputavam a posse de territórios de caça e de fontes de água (quando não suas fêmeas).

Hoje, essa arte primitiva é o único registro que restou desse longínquo período, de quando nossos ancestrais ainda habitavam as cavernas. Dela nasceriam todos os alfabetos e, desses, essa maravilha das maravilhas, que é a linguagem escrita. Mas... esta é uma outra história (ou estória?) que fica para uma outra vez.

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