Mudança de status
Pedro J. Bondaczuk
A Copa do Mundo de 1962, disputada entre 30 de maio e 17 de junho daquele ano, no Chile, representou um período de transição tanto para a Seleção Brasileira, cuja base foi a mesma da vitoriosa campanha de 1958, quanto para o País e para a minha vida. Começo pelo fim. Pelas mudanças que aconteceram em minha realidade vital.
Eu estava, então, com dezenove anos e meio de idade. Sentia-me um adulto, pois até votar já votara (no plebiscito de janeiro de 1962, que restabeleceu o regime presidencialista no Brasil, acabando com nosso incipiente parlamentarismo). E mais, trabalhara na eleição, como mesário, o que me fez sentir “importante”. E então eu já era profissional do rádio, ou seja, do mesmo veículo de comunicação de que me valera para acompanhar os três mundiais anteriores.
A natureza privilegiou-me com uma boa voz, grave, modulada, suave (“aveludada”, como garantiram minhas fãs), que dispensava, até, impostação. Casava-se com naturalidade com qualquer microfone. Ainda é assim, posto que mais “cansada”.
Um ano antes da Copa, em 1961, atuando numa pequena emissora de Santo André, a Rádio Emissora ABC, existente até hoje, eu havia conquistado o troféu de “locutor revelação”. Fiquei cheio de marra por isso e os amigos garantem, ainda hoje, que fiquei um tanto “mascarado” na ocasião, fruto, claro, da juventude e conseqüente inexperiência.
Está bem, admito. Mascarei um pouco. Mas isso não durou muito tempo. Em contato com radialistas experientes, raposas velhas dos microfones, baixei a crista e fui posto no meu devido lugar. Ou seja, entendi que era apenas mais um entre muitos.
Como novato, e ávido por aprender todos os macetes da profissão, fiz um pouco de tudo. Fui discotecário, programador, locutor comercial, disk-jockey, apresentador de programa de auditório, repórter e... comentarista esportivo. Era o que mais gostava de fazer. Foi quando comecei a formar meu arquivo, que só “engordou” no correr dos anos (lembrem-se que na época não tínhamos computador e, portanto, não tínhamos o Google).
Os ouvintes nem desconfiavam da minha juventude, quase adolescência. Não fazia muito que eu passara a fazer a barba, de início duas vezes por semana e depois todos os dias. Tratavam-me como veterano. E os colegas de serviço agiam da mesma forma.
Em 1962, eu dera um bom salto na minha curtíssima carreira. Fora contratado por uma grande emissora de São Paulo (diria, uma gigante, cujo nome prefiro omitir, por haver saído brigado dela para outra rádio de igual porte), de alcance não somente nacional, mas mundial.
E observem como o rádio é “perverso” com aqueles que lhe dão vida. Atuei nesse meio por muitos anos – ora exclusivamente, ora fazendo “dobradinha” com jornal – à frente de poderosos microfones. Milhões ouviram não somente minha voz, mas minhas reportagens e meus comentários, ora concordando e ora discordando deles. Todavia, hoje sou reconhecido, somente, como jornalista (o que, claro, não é pouca coisa).
Meus textos, mesmo os escritos há décadas, circulam, até hoje na internet. Mas... quantos se lembram de mim como radialista? Seu pai se lembra, amável leitor (você, certamente, sequer era nascido)? Ou seu tio? Ou, quem sabe, seu avô? Creio que não.
Poucos, pouquíssimos lembram de mim como radialista. Apenas os amigos mais chegados, e olhem lá. Até mesmo alguns parentes se esqueceram do locutor Pedro Bondaczuk, aquele do vozeirão. E olhem que sempre trabalhei com meu nome de batismo, nunca adotei algum pseudônimo como a maioria dos meus companheiros e, convenhamos, meu sobrenome nem é comum, portanto, não tive homônimos.
Ainda assim, tive orgulho de haver trabalho em rádio, de ter conhecido e convivido com tanta gente ilustre e talentosa e de ter informado e entretido milhões e milhões de ouvintes. É rigorosamente impossível contabilizar o número dos que me ouviram algum dia. Só posso assegurar que foi enorme!
Como jornalista e escritor estou certo que jamais atingirei um por cento se tanto do público que atingi à frente de algum microfone.
Apresentei esse retrospecto (ligeiro) da minha carreira de radialista apenas para que você, meu leitor, tenha uma remota idéia de qual era a minha “cabeça” na época. Até porque, acompanhei a partida final da Copa do Mundo de 1962 no estúdio da emissora em que trabalhava, porquanto, na sequência da transmissão do jogo, participaria de mesa-redonda em que debateríamos (e de fato debatemos) a performance brasileira naquele mundial.
Em todos os jogos anteriores, todavia, segui uma espécie de ritual. Ouvi-os no meu então já velho rádio de cabeceira, à válvula, o mesmíssimo que me proporcionou a alegria, quatro anos antes, de constatar que o Brasil era detentor do melhor futebol do mundo. Acompanhei-os trancado em meu quarto, sozinho e na penumbra. Igualzinho havia feito na final de 1958.
Pedro J. Bondaczuk
A Copa do Mundo de 1962, disputada entre 30 de maio e 17 de junho daquele ano, no Chile, representou um período de transição tanto para a Seleção Brasileira, cuja base foi a mesma da vitoriosa campanha de 1958, quanto para o País e para a minha vida. Começo pelo fim. Pelas mudanças que aconteceram em minha realidade vital.
Eu estava, então, com dezenove anos e meio de idade. Sentia-me um adulto, pois até votar já votara (no plebiscito de janeiro de 1962, que restabeleceu o regime presidencialista no Brasil, acabando com nosso incipiente parlamentarismo). E mais, trabalhara na eleição, como mesário, o que me fez sentir “importante”. E então eu já era profissional do rádio, ou seja, do mesmo veículo de comunicação de que me valera para acompanhar os três mundiais anteriores.
A natureza privilegiou-me com uma boa voz, grave, modulada, suave (“aveludada”, como garantiram minhas fãs), que dispensava, até, impostação. Casava-se com naturalidade com qualquer microfone. Ainda é assim, posto que mais “cansada”.
Um ano antes da Copa, em 1961, atuando numa pequena emissora de Santo André, a Rádio Emissora ABC, existente até hoje, eu havia conquistado o troféu de “locutor revelação”. Fiquei cheio de marra por isso e os amigos garantem, ainda hoje, que fiquei um tanto “mascarado” na ocasião, fruto, claro, da juventude e conseqüente inexperiência.
Está bem, admito. Mascarei um pouco. Mas isso não durou muito tempo. Em contato com radialistas experientes, raposas velhas dos microfones, baixei a crista e fui posto no meu devido lugar. Ou seja, entendi que era apenas mais um entre muitos.
Como novato, e ávido por aprender todos os macetes da profissão, fiz um pouco de tudo. Fui discotecário, programador, locutor comercial, disk-jockey, apresentador de programa de auditório, repórter e... comentarista esportivo. Era o que mais gostava de fazer. Foi quando comecei a formar meu arquivo, que só “engordou” no correr dos anos (lembrem-se que na época não tínhamos computador e, portanto, não tínhamos o Google).
Os ouvintes nem desconfiavam da minha juventude, quase adolescência. Não fazia muito que eu passara a fazer a barba, de início duas vezes por semana e depois todos os dias. Tratavam-me como veterano. E os colegas de serviço agiam da mesma forma.
Em 1962, eu dera um bom salto na minha curtíssima carreira. Fora contratado por uma grande emissora de São Paulo (diria, uma gigante, cujo nome prefiro omitir, por haver saído brigado dela para outra rádio de igual porte), de alcance não somente nacional, mas mundial.
E observem como o rádio é “perverso” com aqueles que lhe dão vida. Atuei nesse meio por muitos anos – ora exclusivamente, ora fazendo “dobradinha” com jornal – à frente de poderosos microfones. Milhões ouviram não somente minha voz, mas minhas reportagens e meus comentários, ora concordando e ora discordando deles. Todavia, hoje sou reconhecido, somente, como jornalista (o que, claro, não é pouca coisa).
Meus textos, mesmo os escritos há décadas, circulam, até hoje na internet. Mas... quantos se lembram de mim como radialista? Seu pai se lembra, amável leitor (você, certamente, sequer era nascido)? Ou seu tio? Ou, quem sabe, seu avô? Creio que não.
Poucos, pouquíssimos lembram de mim como radialista. Apenas os amigos mais chegados, e olhem lá. Até mesmo alguns parentes se esqueceram do locutor Pedro Bondaczuk, aquele do vozeirão. E olhem que sempre trabalhei com meu nome de batismo, nunca adotei algum pseudônimo como a maioria dos meus companheiros e, convenhamos, meu sobrenome nem é comum, portanto, não tive homônimos.
Ainda assim, tive orgulho de haver trabalho em rádio, de ter conhecido e convivido com tanta gente ilustre e talentosa e de ter informado e entretido milhões e milhões de ouvintes. É rigorosamente impossível contabilizar o número dos que me ouviram algum dia. Só posso assegurar que foi enorme!
Como jornalista e escritor estou certo que jamais atingirei um por cento se tanto do público que atingi à frente de algum microfone.
Apresentei esse retrospecto (ligeiro) da minha carreira de radialista apenas para que você, meu leitor, tenha uma remota idéia de qual era a minha “cabeça” na época. Até porque, acompanhei a partida final da Copa do Mundo de 1962 no estúdio da emissora em que trabalhava, porquanto, na sequência da transmissão do jogo, participaria de mesa-redonda em que debateríamos (e de fato debatemos) a performance brasileira naquele mundial.
Em todos os jogos anteriores, todavia, segui uma espécie de ritual. Ouvi-os no meu então já velho rádio de cabeceira, à válvula, o mesmíssimo que me proporcionou a alegria, quatro anos antes, de constatar que o Brasil era detentor do melhor futebol do mundo. Acompanhei-os trancado em meu quarto, sozinho e na penumbra. Igualzinho havia feito na final de 1958.
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