Ao vivo nos estádios
Pedro J. Bondaczuk
Acompanhei a Copa do Mundo de 1970, no México, ao vivo, e nos estádios. Calma, não ganhei na loteria e nem enriqueci subitamente. Ocorre que esse Mundial foi o primeiro a ser transmitido direto pela televisão, e em cores. Era, pois, melhor e muito mais seguro e confortável do que estar presente fisicamente nos locais de disputa. Mas era como se estivesse ali.
As Copas anteriores, como já relatei, acompanhei pelas mágicas ondas de rádio. Em termos de emoção, não me arrependo. Esse veículo excita a imaginação de qualquer um e formamos, em nossa mente, as imagens mais variadas possíveis dos lances com base na narração do locutor.
Nas transmissões televisivas, não precisamos imaginar nada. Tudo é explícito e o que temos é que nos manter atentos, de olhos bem abertos, para não perder nenhum detalhe de qualquer jogada. Provavelmente por ser do ramo, ou seja, radialista, ainda hoje, mesmo com a exi9stência de TV em HD ou em 3D, honestamente, ainda prefiro mil vezes mais o rádio.
Mas, como ia dizendo, a modernidade, em termos de telecomunicação, havia, enfim, chegado ao Brasil. Poucas pessoas, é verdade, tinham condições financeiras de adquirir um receptor em cores. Mesmo eu, que tinha um bom salário e nenhuma obrigação, pois era solteiríssimo da silva,não tinha cacife para comprar esse então preciosíssimo bem.
Como, então, assisti aquela Copa ao vivo e em cores? Afinal, na ocasião, eu não tinha sequer TV em preto e branco. Explico. Assisti as transmissões daquele Mundial, quase todas, exceto uma, na casa do amigo, e colega de trabalho na Rhodia (que fora companheiro de classe no curso científico do Colégio Cesário Motta, de Campinas), e conselheiro, como eu, da Ponte Preta, o Rony Bueno.
Eu morava, então, como ele, no Distrito de Barão Geraldo. A diferença é que ele residia em uma casa com a família e eu em uma república. Na ocasião, já havia desistido do meu grande sonho (desistência essa que se constituirá para sempre na maior frustração da minha vida), que era o de ser médico. E pensar que havia chegado tão perto!
Havia cursado o primeiro ano da Faculdade de Medicina, após conquistar, a duras penas, uma vaga, com inaudito esforço, no vestibular, mas, sem trabalhar – o curso era em período integral, o que inviabilizava qualquer emprego – não tinha como assegurar meu sustento. Um ano deu para me virar, posto que endividado até o pescoço. Mas chegou um momento em que se tornou quase impossível permanecer na faculdade.
Tranquei, pois, a matrícula, pensando, apenas, em dar um tempo, ate encontrar solução para o impasse. Nunca encontrei. Não consegui bolsa de estudos e ninguém se dispôs a financiar-me por pelo menos quatro ou cinco anos, até a fase de residência médica. Além do que, a “vida me levou”, sem que eu pudesse ao menos cogitar de destrancar a tal matrícula.
Mas... eu não tinha do que me queixar. É verdade que tive que matar no ninho o meu grande sonho de criança, reitero, por falta de recursos. Porém tinha uma profissão, a de jornalista. Aliás, tinha duas, com a de radialista também, posto que estivesse dando um tempo no rádio, irritado com a tal censura federal.
Retornara à Rhodia, da qual havia me demitido quando fora aprovado no vestibu8lar. Tive muita sorte. Voltei para a mesma função anterior (a de assessor de imprensa) e com o mesmo salário, que era dos melhores.
Em 1970, na época da disputa da Copa do Mundo do México, eu estava com vinte e sete anos e meio. Estava pensando, seriamente, em casar. A exemplo de 1958, estava, de novo, amando e mais, apaixonadíssimo. Mantinha um namoro firme que já durava cinco anos (e creio que irá durar enquanto eu viver, pois minha namorada de então, eterna amada, há décadas é minha esposa, mãe dos meus quatro filhos e avó dos meus dois netos).
Se politicamente, os tempos de então eram dos mais bicudos, pelo au8ge da ditadura militar, com a plena vigência do odioso AI-5 e sob o férreo e feroz comando do general Garrastazu Medici, afetivamente, era dos mais favoráveis para mim.
Depois de desistir de ser médico, sonhava, agora, em dar mais um passo na profissão e trabalhar em alguma redação de jornal diário – até já vendia alguns frilas pára os dois diários locais – mas temia entrar em choque com os ditadores de plantão. Sempre fui um sujeito impulsivo e essa impulsividade poderia colocar minha liberdade (e talvez a minha vida) em risco. E ademais, não há profissão mais perigosa do que o jornalismo diário, se exercido com ética e correção, notadamente quando o país está submetido a regimes ditatoriais, como o que havia no Brasil (e em toda a América Latina) no início dos anos 70.
Decidi continuar mais um tempo onde estava. Sendo assessor de imprensa, não deixava de ser jornalista, tinha um salário do qual não tinha do que me queixar e não corria nenhum risco de me chocar com os ignorantes censores das rádios, TVs e jornais.
Querem saber uma curiosidade? Assisti a Copa de 1970 inteira ao vivo, menos um jogo, e o mais importante de todos: a final contra a Itália, aquele em que goleamos a “azurra” por 4 a 1. Mas não foi por medo de fracasso da Seleção Brasileira ou por alguma eventual superstição. Esse jogo assisti, sim, mas em vídeo. E, sem exagero, não apenas uma, mas centenas de vezes. Mas não ao vivo, no dia e hora da disputa. Por que? Bem, saiba a razão na sequência desta série de reminiscências sobre as Copas do Mundo que acompanhei.
Pedro J. Bondaczuk
Acompanhei a Copa do Mundo de 1970, no México, ao vivo, e nos estádios. Calma, não ganhei na loteria e nem enriqueci subitamente. Ocorre que esse Mundial foi o primeiro a ser transmitido direto pela televisão, e em cores. Era, pois, melhor e muito mais seguro e confortável do que estar presente fisicamente nos locais de disputa. Mas era como se estivesse ali.
As Copas anteriores, como já relatei, acompanhei pelas mágicas ondas de rádio. Em termos de emoção, não me arrependo. Esse veículo excita a imaginação de qualquer um e formamos, em nossa mente, as imagens mais variadas possíveis dos lances com base na narração do locutor.
Nas transmissões televisivas, não precisamos imaginar nada. Tudo é explícito e o que temos é que nos manter atentos, de olhos bem abertos, para não perder nenhum detalhe de qualquer jogada. Provavelmente por ser do ramo, ou seja, radialista, ainda hoje, mesmo com a exi9stência de TV em HD ou em 3D, honestamente, ainda prefiro mil vezes mais o rádio.
Mas, como ia dizendo, a modernidade, em termos de telecomunicação, havia, enfim, chegado ao Brasil. Poucas pessoas, é verdade, tinham condições financeiras de adquirir um receptor em cores. Mesmo eu, que tinha um bom salário e nenhuma obrigação, pois era solteiríssimo da silva,não tinha cacife para comprar esse então preciosíssimo bem.
Como, então, assisti aquela Copa ao vivo e em cores? Afinal, na ocasião, eu não tinha sequer TV em preto e branco. Explico. Assisti as transmissões daquele Mundial, quase todas, exceto uma, na casa do amigo, e colega de trabalho na Rhodia (que fora companheiro de classe no curso científico do Colégio Cesário Motta, de Campinas), e conselheiro, como eu, da Ponte Preta, o Rony Bueno.
Eu morava, então, como ele, no Distrito de Barão Geraldo. A diferença é que ele residia em uma casa com a família e eu em uma república. Na ocasião, já havia desistido do meu grande sonho (desistência essa que se constituirá para sempre na maior frustração da minha vida), que era o de ser médico. E pensar que havia chegado tão perto!
Havia cursado o primeiro ano da Faculdade de Medicina, após conquistar, a duras penas, uma vaga, com inaudito esforço, no vestibular, mas, sem trabalhar – o curso era em período integral, o que inviabilizava qualquer emprego – não tinha como assegurar meu sustento. Um ano deu para me virar, posto que endividado até o pescoço. Mas chegou um momento em que se tornou quase impossível permanecer na faculdade.
Tranquei, pois, a matrícula, pensando, apenas, em dar um tempo, ate encontrar solução para o impasse. Nunca encontrei. Não consegui bolsa de estudos e ninguém se dispôs a financiar-me por pelo menos quatro ou cinco anos, até a fase de residência médica. Além do que, a “vida me levou”, sem que eu pudesse ao menos cogitar de destrancar a tal matrícula.
Mas... eu não tinha do que me queixar. É verdade que tive que matar no ninho o meu grande sonho de criança, reitero, por falta de recursos. Porém tinha uma profissão, a de jornalista. Aliás, tinha duas, com a de radialista também, posto que estivesse dando um tempo no rádio, irritado com a tal censura federal.
Retornara à Rhodia, da qual havia me demitido quando fora aprovado no vestibu8lar. Tive muita sorte. Voltei para a mesma função anterior (a de assessor de imprensa) e com o mesmo salário, que era dos melhores.
Em 1970, na época da disputa da Copa do Mundo do México, eu estava com vinte e sete anos e meio. Estava pensando, seriamente, em casar. A exemplo de 1958, estava, de novo, amando e mais, apaixonadíssimo. Mantinha um namoro firme que já durava cinco anos (e creio que irá durar enquanto eu viver, pois minha namorada de então, eterna amada, há décadas é minha esposa, mãe dos meus quatro filhos e avó dos meus dois netos).
Se politicamente, os tempos de então eram dos mais bicudos, pelo au8ge da ditadura militar, com a plena vigência do odioso AI-5 e sob o férreo e feroz comando do general Garrastazu Medici, afetivamente, era dos mais favoráveis para mim.
Depois de desistir de ser médico, sonhava, agora, em dar mais um passo na profissão e trabalhar em alguma redação de jornal diário – até já vendia alguns frilas pára os dois diários locais – mas temia entrar em choque com os ditadores de plantão. Sempre fui um sujeito impulsivo e essa impulsividade poderia colocar minha liberdade (e talvez a minha vida) em risco. E ademais, não há profissão mais perigosa do que o jornalismo diário, se exercido com ética e correção, notadamente quando o país está submetido a regimes ditatoriais, como o que havia no Brasil (e em toda a América Latina) no início dos anos 70.
Decidi continuar mais um tempo onde estava. Sendo assessor de imprensa, não deixava de ser jornalista, tinha um salário do qual não tinha do que me queixar e não corria nenhum risco de me chocar com os ignorantes censores das rádios, TVs e jornais.
Querem saber uma curiosidade? Assisti a Copa de 1970 inteira ao vivo, menos um jogo, e o mais importante de todos: a final contra a Itália, aquele em que goleamos a “azurra” por 4 a 1. Mas não foi por medo de fracasso da Seleção Brasileira ou por alguma eventual superstição. Esse jogo assisti, sim, mas em vídeo. E, sem exagero, não apenas uma, mas centenas de vezes. Mas não ao vivo, no dia e hora da disputa. Por que? Bem, saiba a razão na sequência desta série de reminiscências sobre as Copas do Mundo que acompanhei.
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