Sunday, November 01, 2009




Eloqüente desmentido a Terry

Pedro J. Bondaczuk

O
novo presidente peruano, Alan Garcia Perez, que iniciou, ontem, um giro pela Europa, num roteiro parecido com o empreendido pelo falecido presidente brasileiro, Tancredo Neves, após a sua eleição, entre os inúmeros problemas que irá herdar do atual chefe do Executivo, Fernado Belaunde Terry, terá a seu cargo a tarefa de pôr um fim à guerrilha.
Ao contrário de há dois anos, o movimento rebelde já não se restringe, hoje, apenas ao grupo maoísta, do ex-professor de Filosofia, Abimae Guzman. Um outro, o Tupac Amaru, contrafação peruana dos tristemente célebres Tupamaros uruguaios, veio somar-se ao virulento Sendero Luminoso, tornando o Peru cada vez mais inseguro e colocando essa sociedade no perigoso caminho de uma confrontação nacional.
É estranho quando políticos sérios vêm a público na tentativa de desmentir o óbvio. Quando procuram fazer afirmações que todos sabem que não correspondem à realidade dos fatos. Foi o que aconteceu no final da semana passada, quando o presidente Belaunde Terry, em final de mandato, numa entrevista à imprensa, afirmou que uma das conquistas do seu governo foi a de neutralizar a guerrilha.
Disse que o estado de emergência que vigorou nos cinco anos em que ocupou a presidência, em boa parte do território peruano, especialmente na região de Ayacucho, deu os seus frutos. E que o Sendero, acossado pelas autoridades militares e pelas tropas, acabou confinado a áreas bem remotas do território nacional, tendo sua atuação bastante restringida.
Ora, todos sabem que isso não corresponde exatamente à realidade. Que o grupo de Aabimael Guzman nunca esteve tão forte e atrevido quanto agora. Não há semana em que não se tome conhecimento, através das agências internacionais, ou por meio da imprensa peruana, de ataques ousados do Sendero Luminoso, trucidando camponeses, amedrontando empresários e desafiando, até, as autoridades de Lima.
Isso foi feito durante a visita do papa João Paulo II, em fevereiro passado, quando, não contentes por causarem um blecaute na capital, na hora em que o avião do Pontífice pousava no aeroporto militar da cidade, os senderistas ainda deixaram a sua “assinatura” em fogo, projetando, nas colinas limenhas, a imagem da foice e do martelo.
Ontem mesmo, com a explosão de um carro-bomba, bem nas proximidades do palácio do governo, e num momento em que o presidente recebia um ilustre visitante, o argentino Raul Alfonsin, o Sendero deixou a sua mensagem, o seu desmentido às afirmações irrealistas de Belaunde Terry.
De todas as questões, portanto, que vão sobrar para Alan Garcia encontrar solução, a da guerrilha, certamente, não será a menor. E nem a menos urgente. O jovem presidente eleito já mandou um recado para os rebeldes. Afirmou que não pretende negociar com os guerrilheiros e que espera esvaziar esse movimento com um programa social, de promoção dos desvalidos, o que equivale a dizer, de mais de 60% da população.
O caminho correto é, realmente, este. Resta saber onde Garcia obterá recursos para uma tarefa desse porte, quando se sabe que o Peru, com uma dívida de US$ 13,5 bilhões, está, praticamente, à beira da insolvência. E que a receita recessiva, imposta, sem qualquer critério aos endividados pelo Fundo Monetário Internacional, tende a penalizar, exatamente, àqueles que o novo presidente pretende redimir. É um autêntico beco sem saída para o mais jovem governante da história do Peru.

(Artigo publicado na página 20, Internacional, do Correio Popular, em 9 de junho de 1985).

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