Saturday, July 21, 2007

O enredo da saudade


Pedro J. Bondaczuk

Ah! Como a saudade nos enreda
em suas tramas traiçoeiras!
Máquina do tempo
que somente retrocede
na lembrança, na memória
e nos joga, de repente,
num longínquo passado
que julgávamos sepultado
sob toneladas de escombros.

Rostos queridos,
rostos amigos
que o tempo (sempre o tempo),
taciturno e rabugento,
deformou e consumiu.

Sonhos e anseios
que os fatos
frios e feios,
transformaram em frustrações.

Vozes amigas,
frases antigas,
suaves cantigas,
torpes intrigas
que o vento levou.

Campos floridos,
trigais maduros,
rios esquecidos,
bosques escuros
de tantas andanças
que o tempo tornou
em lembranças.

Noites claras de luar
pastoreando estrelas,
ronda da boitatá
pretendendo devorar,
com apetite, os olhos.

A agonia de Jacob,
que com anjo contendeu
toda uma noite,
no vale de Jaboc
até o raiar da Alba.

Contenda criadora,
luta corpo-a-corpo
com o léxico
para ser abençoado
com uma rima rara,
com um verso rico,
com a pepita dourada
da lavra do bem-querer.

O enlevo nefelibata
contemplando os
lagos místicos
dos olhos da Ludmila
e o êxtase
incomparável
do sorriso precioso
da amorosa Tatiana.

A salamandra prateada,
o encantado
pássaro de fogo
da fanada primavera,
colibri de âmbar,
pomba de marfim,
piano de vidro,
toque de incoerência,
hipocampo corcel
para cavalgar
a minha pressa.
Rede tecida de algas
para acalentar o sono.
Trombeta de chifres
apregoando protestos,
mocho de ébano
soletrando augúrios,
espelho de cristal
que mostra o invisível,
cão de azeviche
que ouve e aprova calado.
Sombras. Fantasmas. Saudades.
Escombros do passado...

(Poema composto em Campinas, em 3 de janeiro de 1978).

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