Saturday, July 28, 2007

Caminho limite


Pedro J. Bondaczuk

Afinal, atinei com a senda incógnita,
caminho misterioso é áspero,
da lendária fonte de Ponce de Leon.
Receptáculo de Pandora, em que o prazer e a dor,
vida e morte, Eros e Tanatos
se misturam, se anulam e se confundem.

Suprema delícia dos deuses,
prazer que ensandece ou deifica,
que conspurca ou que purifica,
que condena ou que justifica,
torna possesso ou pacifica e que
simultaneamente, confunde e explica.

Prazer circunstancial: criador ou fatal.
Fonte de todas as delícias e pecados,
vera origem do bem e do mal;
Nirvana de paz ou o atroz Hades;
princípio e fim, noite e dia,
positivo e negativo, preto e branco,
calidoscópio de contrastes,
simultâneos, mas mutantes,
homem-mulher, luz e trevas,
água e fogo, Ormuz e Harimã.

Caminho das supremas delícias
que os lábios, ansiosos, percorreram,
e os sentidos – alertas, vigilantes, inquiridores –
ensinaram a razão a avaliar.

As mãos, trêmulas, acharam a passagem,
os dedos, ágeis, ensinaram o segredo
para abrir a versátil fechadura.
O corpo (perecível), em êxtase e agonia,
metafisicamente, em cada tecido e célula
intensa e sofregamente fruiu.
O espírito, versátil acumulador de experiências,
dínamo de sensações, gerador de atos,
que fabrica fatos, lucidamente,
consistente, concentrado, racional,
fria, objetiva e analiticamente,
analisou, compreendeu e se ilustrou.

Fonte do Amor, esconderijo da Vida,
manjar dos deuses, banquete dos faunos
e das ninfas, lúbricas e desejáveis.

Amor almado, amor biológico,
amor intelectual, posto selvagem,
amor animal, instintivo, fecundo,
efêmero, contudo transcendental:
Amor total!

No sopé do encantado monte,
teto de um mundo de fantasias,
um perfume, estonteante, de madressilvas
intoxica os sentidos, injeta fogo nas veias.

Os lábios, sedentos, ressequidos,
rachados, ansiosos, feridos,
conduziram à embriaguez desenfreada,
em vinho espumante e capitoso.

Sobreveio incontrolável alucinação.
De alucinógenos cogumelos?
De selvagens cactus mexicanos?
De Marijuana? De haxixe? De mescalina?
Não! Foi uma sensação superlativa
e atóxica, viagem não-viciosa
nas asas do pássaro de fogo.

No mágico itinerário descendente,
rumo ao vale da luz e da vida,
os aromas (sempre os aromas)
dos nardos, petúnias e jacintos
guiaram-se às colinas de látex,
gêmeas homozigóticas, manando leite e mel.
E os lábios, gaviões vorazes,
prenderam, em suas garras mucosas,
famintos, sôfregos, libidinosos,
as minúsculas fontes nutrizes,
entregues ao açoite da língua.

Descendo, lebres velozes,
alces musculosos e enérgicos,
bosquejaram um poço ressequido.
Galgaram o Monte de Vênus,
mas detendo, instantaneamente,
o poderoso ímpeto viril.

Sofrendo a angústia da espera,
dorido exercício de contenção,
anticlímax, nervoso, ansioso,
já antevendo, em delírio,
o repasto animal dos sentidos,
detive-me, em admirada contemplação.

Dopado, com os nervos retesados,
com batidas de tambor nos ouvidos,
areia fina na boca, entre os dentes,
e terremoto devastador no coração,
os sentidos excitados, enlouquecidos,
perderam-se, desorientados,
na densa mata amazônica
que ocultava o vale encantado
onde ela, a incrível fonte
da juventude e dos prazeres
estava receptiva, à espera.

E outra vez os intensos aromas,
agora causando vertigens,
exortaram-me ao avanço.
Embriagadores perfumes...
Narcóticos cheiros, que faziam
a cabeça girar, doidamente,
convidativos chamarizes olfativos,
engodos que atraem, papa-moscas,
hipnotizadores, coatores, imperativos,
anestesiaram todas minhas inibições.

E os lábios, afinal, pousaram
sobre róseos lábios laterais,
macios, mornos, mucosos,
úmidos, receptivos, palpitantes,
trêmulos e ligeiramente salgados.
E a serpente sôfrega, assanhada,
silvando, vibrando, se contorcendo,
tamanduá-bandeira faminto,
penetrou, furiosa, lúbrica,
na caverna encantada dos amores.

E sobreveio o delírio...
Passeava nos jardins da Babilônia,
saboreando os vinhos do deserto
e petiscos no solar de Semiramis.
Nos palácios faustosos dos césares,
nu, em um divã refestelado,
amando brancas ninfas lígias,
intoxiquei de pecados meus sentidos.
Exaurindo minha insaciável virilidade,
eis-me copulando, vezes sem fim,
o sexo ninfomaníaco de Messalina.

Com o cetro imperativo dos deuses,
poderoso, viril, conquistador,
invado a cidadela dos prazeres,
conquisto, me aposso e me multiplico.

Atinjo as cytereas paragens,
alucinado com as luzes do Éden.
os nervos explodem no escroto
e me torno incorpóreo e volátil.

Avanço as barreiras do tempo,
sobrepujo a insignificância,
nas asas do pássaro de fogo
dos desejos e das paixões.
Achei o caminho sem limites,
nas fronteiras do Nirvana de paz
e do Hades aterrador da inquietação.

(Poema composto em Campinas, em 21 de novembro de 1976).

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